Acessibilidade / Reportar erro

Dieta elevada em carboidratos complexos minimiza necessidade de suplementação durante jogo-treino de rúgbi: foco no sistema imune

Diet high in complex carbohydrates minimizes necessity for supplementation during rugby training game: focus on immune system

Una dieta elevada en hidratos de carbono complejos minimiza la necesidad de suplementación durante el entrenamiento en el deporte del rugby: foco en el sistema inmunitario

Resumo

O estudo analisou a imunidade oral após treino de rúgbi em atletas submetidos à dieta com alto teor de carboidratos (DATC). Em estudo randomizado, duplo-cego e placebo controlado, 20 atletas consumiram DATC por três dias antes do experimento. Os atletas receberam aleatoriamente bebida carboidratada (CHO) ou placebo (PLA) e participaram de duas sessões de treino de rúgbi, separados por sete dias. Coletas de saliva foram feitas antes (Pré-E), imediatamente após (Pós-E) e 1 h após (1 h Pós-E) o jogo-treino. Houve diferença significativa em taxa de secreção de IgA-s para PLA somente no tempo 1 h Pós-E. DATC, dias antes de treino de rúgbi, preserva função imunológica oral independente da suplementação de CHO durante treino.

PALAVRAS-CHAVE
Sistema imune; Suplementos dietéticos; Exercício físico; Carboidratos

Abstract

The study analyzed the oral immunity after rugby training in athletes undergoing diet high in carbohydrates (DATC). In a randomized, double-blind, placebo-controlled, 20 athletes consumed DATC for three days before the experiment. The athletes were randomly carbohydrate drink (CHO) or placebo (PLA) and participated in two training sessions of rugby, separated by seven days. Saliva samples were taken before (Pre-E), immediately after (Post-E) and 1 h after (1 h post-E) training. Significant difference in rate of s-IgA secretion to PLA only at time 1 h post-E. DATC, days before training rugby, preserves immune function independent of oral CHO supplementation during training.

KEYWORDS
Immune system; Dietary supplements; Physical exercise; Carbohydrates

Resumen

El estudio analizó la inmunidad oral después del entrenamiento de rugby en jugadores sometidos a una dieta elevada en hidratos de carbono (DEHC). En un estudio aleatorizado, a doble ciego, controlado con placebo, 20 jugadores consumieron una DEHC durante 3 días antes del experimento. Los jugadores recibieron aleatoriamente bebida de hidratos de carbono (CHO) o placebo (PLA), y participaron en dos sesiones de entrenamiento de rugby, separadas entre sí 7 días. Las muestras de saliva fueron antes (pre-E), inmediatamente después (post-E) y 1 hora después (1 h post-E). Hubo una diferencia significativa en la tasa de secreción de s-IgA a PLA sólo en 1 h post-E. La DEHC, días antes de la sesión de rugby, preserva la función inmunológica independientemente de la suplementación de CHO durante el entrenamiento.

PALABRAS CLAVE
Sistema inmunitario; Suplementos dietéticos; Ejercicio físico; Hidratos de carbono

Introdução

O conjunto de alterações induzidas pelo exercício agudo na quantidade de células brancas, citocinas e determinados hormônios altera a função imune e resulta na imunodepressão. A imunodepressão causada pelo exercício pode durar de 3 a 72 horas, período denominado "janela aberta" ou open window (Nieman, 2007Nieman DC. Marathon training and immune function. Sports Medicine. 2007;37(4-5):412-5.). Embora seja temporária, a função imunológica diminuída após o exercício intenso aumenta a exposição do atleta a infecções, especialmente durante a rotina de treinos, e prejudica a busca de melhor desempenho esportivo nas competições (Koch et al., 2007Koch AJ, Wherry AD, Petersen MC, Johnson JC, Stuart MK, Sexton WL. Salivary immunoglobulin A response to a collegiate rugby game. J Strength Cond Res. 2007;21(1):86-90.). Inúmeras pesquisas têm focado na concentração da imunoglobulina A salivar (IgA-s) após o exercício (Blannin et al., 1998Blannin AK, Robson PJ, Walsh NP, Clark AM, Glennon L, Gleeson M. The effect of exercising to exhaustion at different intensities on saliva immunoglobulin A, protein and electrolyte secretion. Int J Sports Med. 1998;19(8):547-52.; Nehlsen-Cannarella et al., 2000Nehlsen-Cannarella SL, Nieman DC, Fagoaga OR, Kelln WJ, Henson DA, Shannon M, et al. Saliva immunoglobulins in elite women rowers. Eur J Appl Physiol. 2000;81(3):222-8.; Koch et al., 2007Koch AJ, Wherry AD, Petersen MC, Johnson JC, Stuart MK, Sexton WL. Salivary immunoglobulin A response to a collegiate rugby game. J Strength Cond Res. 2007;21(1):86-90.; Walsh et al., 2011Walsh NP, Gleeson M, Shephard RJ, Gleeson M, Woods JA, Bishop NC, et al. Position statement. Part one: Immune function and exercise. Exerc Immunol Rev. 2011;17:6-63.), pois sua secreção é a principal função efetora do sistema imune da mucosa do trato respiratório superior (TRS) e fornece a "primeira linha de defesa" contra patógenos, ação essa em conjunto com as defesas inatas. A redução da expressão de IgA-s após o exercício intenso está associada ao maior risco para infecção nesse local (Walsh et al., 2011Walsh NP, Gleeson M, Shephard RJ, Gleeson M, Woods JA, Bishop NC, et al. Position statement. Part one: Immune function and exercise. Exerc Immunol Rev. 2011;17:6-63.).

Vários estudos relataram diminuição da IgA-s após exercícios intensos (Mackinnon e Jenkins, 1993Mackinnon LT, Jenkins DG. Decreased salivary immunoglobulins after intense interval exercise before and after training. Medicine and Science in Sports and Exercise. 1993;25(6):678-83.; Steerenberg et al., 1997Steerenberg PA, van Asperen IA, Amerongen AN, Biewenga J, Mol D, Medema G. Salivary levels of immunoglobulin A in triathletes. European Journal of Oral Sciences. 1997;105(4):305-9.; Fahlman et al., 2001Fahlman MM, Engels HJ, Morgan AL, Kolokouri I. Mucosal IgA response to repeated wingate tests in females. International Journal of Sports Medicine. 2001;22(2):127-31.; Nieman et al., 2003Nieman DC, Dumke CI, Henson DA, McAnulty SR, McAnulty LS, Lind RH, et al. Immune and oxidative changes during and following the Western States Endurance Run. Int J Sports Med. 2003;24(7):541-7.). Entretanto, o mecanismo preciso pelo qual o exercício intenso afeta a expressão de IgA-s permanece a ser elucidado. Reid et al. (2001)Reid MR, Drummond PD, Mackinnon LT. The effect of moderate aerobic exercise and relaxation on secretory immunoglobulin A. Int J Sports Med. 2001;22(2):132-7. sugerem que a redução na expressão da IgA-s está associada a mudanças no transporte da IgA através do epitélio da mucosa do TRS ou por vasoconstrição mediada pelo sistema simpático na submucosa oral e consequente redução na migração de células que secretam e sintetizam IgA. A ocorrência incomum do aumento de IgA-s encontrado após o exercício possivelmente está associada ao fator psicológico (Walsh et al., 1999Walsh NP, Blannin AK, Clark AM, Cook L, Robson PJ, Gleeson M. The effects of high-intensity intermittent exercise on saliva IgA, total protein and alpha-amylase. J Sports Sci. 1999;17(2):129-34.) ou pela estimulação mecânica da secreção de IgA induzida pela ingestão de líquidos (Nehlsen-Cannarella et al., 2000Nehlsen-Cannarella SL, Nieman DC, Fagoaga OR, Kelln WJ, Henson DA, Shannon M, et al. Saliva immunoglobulins in elite women rowers. Eur J Appl Physiol. 2000;81(3):222-8.).

O consumo de bebida carboidratada (CHO) antes e durante o exercício intenso está relacionado à melhoria do desempenho e da capacidade atlética. Investigações conduzidas com uso de CHO enfatizam sua função na manutenção do balanço hídrico e energético, além da prevenção à hipoglicemia durante o exercício prolongado. A desidratação também pode influenciar a incidência de doenças do TRS, pois o ressecamento da mucosa oral e respiratória pode torná-la mais vulnerável ao ataque de patógenos (Walsh et al., 2011Walsh NP, Gleeson M, Shephard RJ, Gleeson M, Woods JA, Bishop NC, et al. Position statement. Part one: Immune function and exercise. Exerc Immunol Rev. 2011;17:6-63.).

Sabe-se que dieta com alto teor de carboidratos complexos (DATC) para atletas, nos períodos preparatórios e competitivos, apresenta efeitos positivos, como a maximização dos estoques de glicogênio hepático e muscular, fundamental para otimizar o desempenho em treinamentos e competições (Atkinson et al., 2011Atkinson G, Taylor CE, Morgan N, Ormond LR, Wallis GA. Pre-race dietary carbohydrate intake can independently influence sub-elite marathon running performance. Int J Sports Med. 2011;32(8):611-7.). Nesse sentido, postulamos que a suplementação com bebida CHO não apresentaria efeito em presença do prévio consumo de DATC a uma competição, exerceria efeito direta ou indiretamente para maior qualidade de respostas imunológicas. Até o devido momento, nenhum estudo procurou investigar a efetividade do consumo de DATC, em períodos que antecedem treino ou competição, sobre marcadores da imunidade oral em atletas suplementados com bebida CHO durante treino ou jogo de rúgbi, essa uma modalidade esportiva pouco difundida no Brasil. Dessa forma, o objetivo do presente estudo foi avaliar o efeito da suplementação com bebida CHO em jogadores que consumiram DATC previamente a um jogo-treino de rúgbi, com foco na concentração e secreção de IgA-s.

Material e métodos

Amostra

Participaram deste estudo 20 atletas universitários de rúgbi filiados à equipe Taurus Rugby da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Tal seleção foi feita pelo número disponível de indivíduos que atendessem aos critérios de inclusão, que foram: ao menos um ano de experiência prévia na modalidade, participar dos treinamentos da equipe ao menos três vezes na semana, não fumar e não usar qualquer gênero de recursos ergogênicos. Este estudo foi previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (protocolo #1515) e os sujeitos assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Desenho experimental

Os sujeitos foram orientados a seguir DATC três dias antes aos experimentos, pois esse parece ser o tempo mínimo para que ocorra aumento dos níveis de glicogênio muscular (Sherman et al., 1981Sherman WM, Costill DL, Fink WJ, Miller JM. Effect of exercise-diet manipulation on muscle glycogen and its subsequent utilization during performance. Int J Sports Med. 1981;2(2):114-8.). Em seguida, nos dias dos experimentos, foram submetidos a sessões de treino de rúgbi, com sete dias de intervalo entre elas. Na primeira sessão, dez atletas foram escolhidos aleatoriamente para consumir solução contendo carboidrato comercial (CHO - 6% de carboidrato). Os demais atletas consumiram solução placebo (PLA - 0% de carboidrato). A intervenção foi invertida na segunda sessão. Em ambos os treinamentos os indivíduos não sabiam se ingeriam carboidrato ou placebo.

Sessão de jogo-treino

Cada sessão de treino durou 120 min, 40 min de ginástica, 40 min de técnica e 40 min de jogo-treino. O treinamento de ginástica foi composto por exercícios de aquecimento, exercícios localizados e de condicionamento. O treinamento técnico foi composto por movimentações específicas do rúgbi (passes, tackle, ruck, maul e scrum). O jogo-treino foi feito caracteristicamente como uma partida de rúgbi entre os próprios jogadores que compuseram duas equipes (Koch et al., 2007Koch AJ, Wherry AD, Petersen MC, Johnson JC, Stuart MK, Sexton WL. Salivary immunoglobulin A response to a collegiate rugby game. J Strength Cond Res. 2007;21(1):86-90.) com orientações do técnico. Os atletas repousaram 60 min após o fim do jogo, que é caracterizado como uma modalidade extenuante (Duthie et al., 2003Duthie G, Pyne D, Hooper S. Applied physiology and game analysis of rugby union. Sports Medicine. 2003;33(13):973-91.). Todos os jogadores fizeram as mesmas atividades de forma controlada pela equipe pesquisadora.

Procedimentos

Os atletas foram orientados a não treinar no dia anterior ao teste e a manter jejum nas oito horas que antecederam as coletas de dados. Os procedimentos experimentais iniciaram-se às 7 h, no local de treinamento, com a primeira coleta de saliva. Logo após foi oferecido o desjejum individual que atendia às necessidades individuais de cada atleta a partir do software para Windows® DietPro 5.5i®. Uma hora após o desjejum os atletas iniciaram a sessão de treino. Durante todo o treino, cada jogador recebeu bebida (CHO ou PLA) a cada 15 min. Imediatamente após o término da sessão de jogo-treino foram coletadas novas amostras de saliva. Esse procedimento foi repetido uma hora após o término da sessão, no qual, durante esse tempo, os atletas continuaram a ingestão das bebidas.

Composição da dieta e refeição pré-exercício

Após avaliação dos hábitos alimentares dos atletas, por meio de questionário e de recordatório de 24 horas, calculou-se a dieta individualizada para eles consumirem nos três dias anteriores ao início do experimento (Institute Medicine, 2002Institute Medicine. Dietary references intakes for energy, carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol, protein, and amino acids, 50. Washington DC: Food and Nutrition Board, The National Academy Press; 2002. p. 936, Report (0-309-08525-X).) com o software para Windows® DietPro 5,5i®. O teor energético da dieta atendia de 90 a 110% (desvio padrão aceitável) da necessidade estimada de energia (Estimate Energy Requeriment - EER) segundo gênero, idade, peso, estatura e nível de atividade física de cada atleta e foi composta por 70% de carboidratos (dos quais 80% eram complexos), 15% de proteínas e 15% de lipídios, distribuídos em seis refeições ao dia (Institute Medicine, 2002Institute Medicine. Dietary references intakes for energy, carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol, protein, and amino acids, 50. Washington DC: Food and Nutrition Board, The National Academy Press; 2002. p. 936, Report (0-309-08525-X).; Carvalho e Mara, 2010Carvalho T, Mara LS. Hydration and nutrition in sports. Revista Brasileira de Medicina do Esporte. 2010;16(2):144-8.). O desjejum foi padronizado. A refeição pré-exercício, composta por suco industrializado, pão de forma integral, requeijão integral e maçã, atendia a de 15 a 20% de energia da EER de cada atleta.

Composição das soluções e protocolo de hidratação

Usou-se como solução que contivesse carboidrato um repositor hidroeletrolítico comercial (Gatorade®) com a seguinte composição: carboidrato (sacarose e frutose) 6 g/100 ml; sódio 45 mg/100 ml; potássio, 12 mg/100 ml; cloreto, 42 mg/100 ml. A solução placebo foi elaborada no Curso de Nutrição da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM) (Brito, 2005Brito C. Hidratação com e sem carboidratos durante o treinamento de judô. p.92 Dissertação (Mestrado em Ciências da Nutrição). Departamento de Educação Física, Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, 2005.). Foi usado preparado sólido para refresco de baixa caloria (Clight®), sabor tangerina, com cor, sabor e textura idênticos às da solução com carboidrato, com a seguinte composição: sódio, 87 mg/100 ml; cloreto, 80 mg/100 ml. Cada atleta consumiu 3 ml/kg de peso corporal das bebidas a cada 15 min (Gisolfi e Duchman, 1992Gisolfi CV, Duchman SM. Guidelines for optimal replacement beverages for different athletic events. Medicine and Science in Sports and Exercise. 1992;24(6):679-87.). Os atletas se hidrataram nos minutos 0, 15, 30, 45, 60, 75, 90 e 120 do treinamento e nos minutos 135, 150, 165 e 180 após (recuperação). As soluções foram servidas em copos identificados, devidamente marcados por diferentes pesquisadores em relação aos outros responsáveis pela análise dos dados, o que garantiu o caráter duplo cego do experimento.

Amostras salivares

Os atletas foram orientados a fazer uma deglutição inicial para esvaziar a boca e, após, permanecer sentados com a cabeça ligeiramente inclinada à frente e sem movimentos orofaciais durante a coleta. Em seguida, a saliva total não estimulada foi expelida dentro de um frasco de plástico com tampa (Bijou®) pré-pesado (7 ml de capacidade) por dois minutos de acordo com o trabalho de Li e Gleeson (2004)Li TL, Gleeson M. The effect of single and repeated bouts of prolonged cycling and circadian variation on saliva flow rate, immunoglobulin A and alpha-amylase responses. Journal of Sports Sciences. 2004;22(11-12):1015-24.. O peso da saliva em gramas foi assumido como mililitros, pois a densidade específica da saliva é muito próxima de 1 g.mL-1 (Chicharro et al., 1998Chicharro JL, Lucía A, Pérez M, Vaquero AF, Ureña R. Saliva composition and exercise. Sports Med. 1998;26(1):17-27.). A taxa de fluxo salivar (mL. min-1) foi obtida e a concentração de IgA-s (mg.dL-1) foi determinada pelo método imune ensaio de absorção por acoplamento enzimático (Elisa) (Tomasi et al., 1982Tomasi TB, Trudeau FB, Czerwinski D, Erredge S. Immune parameters in athletes before and after strenuous exercise. J Clin Immunol. 1982;2(3):173-8.). A taxa de secreção da IgA-s (µg.min-1) foi obtida pelo produto entre a concentração da IgA-s e taxa de fluxo salivar.

Análise estatística

Para verificar as alterações induzidas pelo exercício sobre a taxa de fluxo salivar, concentração de IgA-s e taxa de secreção da IgA-s, fez-se Anova (carboidrato e placebo x 3 pontos de coleta) considerando-se as medidas repetidas para determinar os efeitos do tempo e a interação entre tempo e o tratamento. Quando as diferenças foram significativas, usou-se o post hoc de Bonferroni para localizar onde as diferenças ocorriam. Quando o objetivo foi comparar médias obtidas por diferentes soluções, usou-se o teste t para amostras independentes. Os dados foram analisados com o software SPSS (Statistical Package for Social Sciences, versão 17 para Windows®). Adotou-se 5% como nível de significância em todos os procedimentos.

Resultados e discussão

A idade dos jogadores foi de 24,06 ± 2,59 anos (média ± desvio padrão), massa corporal de 76,78 ± 9,42 kg e IMC de 24,45 ± 2,45 kg/m2.

Não houve diferença significativa para concentração de IgA-s entre grupos, mas sim entre os tempos (fig. 1A). Houve diferença significativa para taxa de fluxo salivar entre grupos, não ocorreu o mesmo com os tempos (fig. 1B). Houve diferença significativa entre grupos para taxa de secreção de IgA-s somente no momento 1 h Pós-E.

Figura 1
A) Concentração média de IgA-S durante o treino de rúgbi. Anov: * = efeito do tempo (p < 0,001); interação tempo vs. tratamento (p = 0,583); efeito do tratamento (p = 0,749); B) Taxa de fluxo salivar média durante o treino de rúgbi. Anova: efeito do tempo (p = 0,668); interação tempo vs. tratamento (p = 0,507); † = efeito do tratamento (p < 0,001); C) Taxa de secreção da IgA-S durante o treino de rúgbi. Anova: efeito do tempo (p = 0,069); interação tempo vs. tratamento (p = 0,534); † = efeito do tratamento (p > 0,001).

A hipótese de que a suplementação com bebida CHO em presença do consumo prévio de DATC por três dias de um jogo-treino de rúgbi não exerceria efeito sobre indicadores imunológicos da mucosa oral foi confirmada no presente estudo. Possivelmente, DATC elevou estoques energéticos de glicogênio muscular e hepático, influenciou a glicemia sanguínea - efeito esse pertencente ao uso de bebida CHO durante a prática esportiva (Bacurau et al., 2002Bacurau RF, Bassit RA, Sawada L, Navarro F, Martins E, Costa Rosa LF. Carbohydrate supplementation during intense exercise and the immune response of cyclists. Clin Nutr. 2002;21(5):423-9.) - de forma a assegurar respostas semelhantes sobre a concentrações de IgA-s, taxa de secreção de IgA-s e taxa de secreção salivar, independentemente da solução consumida durante o treino de rúgbi.

Efeitos benéficos da suplementação com carboidratos durante exercícios intensos sobre o sistema imune foram reportados na literatura científica. Bacurau et al. (2002)Bacurau RF, Bassit RA, Sawada L, Navarro F, Martins E, Costa Rosa LF. Carbohydrate supplementation during intense exercise and the immune response of cyclists. Clin Nutr. 2002;21(5):423-9. relataram modulação da resposta imune em ciclistas suplementados com carboidratos por minimizar o uso de glutamina sanguínea e, assim, promover resposta imunológica satisfatória. Gleeson et al. (2004)Gleeson M, Nieman DC, Pedersen BK. Exercise, nutrition and immune function. Journal of Sports Sciences. 2004;22(1):115-25. destacaram que a suplementação de carboidratos atenua o aumento do cortisol, hormônio que afeta negativamente a resposta imunológica. Judocas que consumiram CHO durante o treino apresentaram maior contagem de células imunológicas, melhores níveis de hidratação e desempenho (Brito, 2005Brito C. Hidratação com e sem carboidratos durante o treinamento de judô. p.92 Dissertação (Mestrado em Ciências da Nutrição). Departamento de Educação Física, Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, 2005.) e atenuação do hormônio cortisol durante a recuperação (Mendes et al., 2009Mendes E, Brito CJ, Batista ES, Silva CHO, Paula SO, Natali AJ. Influence of carbohydrate supplementation in the immune response of judoists during training. Rev Bras Med Esporte. 2009;15(1):58-61.) em relação ao placebo. No entanto, Sari-Sarraf et al. (2011)Sari-Sarraf V, Doran DA, Clarke ND, Atkinson G, Reilly T. Effects of carbohydrate beverage ingestion on the salivary IgA response to intermittent exercise in the heat. Int J Sports Med. 2011;32(9):659-65. reportaram que a suplementação de CHO foi incapaz de influenciar a resposta imunológica na mucosa oral independentemente da solução consumida, o que corrobora os achados do presente estudo. Porém, deve-se levar em consideração que o cuidado com o controle da dieta nos dias que antecederam o início do protocolo DATC do experimento não foi tomado. Mesmo que atletas apresentem elevado consumo de carboidratos e proteínas (Mulvaney e Herbold, 2013Mulvaney A, Herbold N. The texting athlete: using text and picture messages to record food intake at sporting events. Journal of Nutrition Education and Behavior. 2013;45(4):374-6.), o controle com a ingesta alimentar deve estar presente, para que, dessa forma, se evitem vieses no momento da interpretação dos resultados.

Outros trabalhos relatam diminuição da concentração de IgA-s em exercícios com uma hora ou mais de duração (Tomasi et al., 1982Tomasi TB, Trudeau FB, Czerwinski D, Erredge S. Immune parameters in athletes before and after strenuous exercise. J Clin Immunol. 1982;2(3):173-8.; Tharp e Barnes, 1990Tharp GD, Barnes MW. Reduction of saliva immunoglobulin levels by swim training. European Journal of Applied Physiology and Occupational Physiology. 1990;60(1):61-4.; Mackinnon e Jenkins, 1993Mackinnon LT, Jenkins DG. Decreased salivary immunoglobulins after intense interval exercise before and after training. Medicine and Science in Sports and Exercise. 1993;25(6):678-83.), o que pode levar o atleta a um quadro ITRS. Porém, nesses estudos a concentração de IgA-s foi expressa relativamente à concentração de proteína total da saliva. O ritmo da secreção de proteínas para dentro dos ductos salivares aumenta durante o exercício prolongado e pode tornar duvidosa a correção para a concentração total de proteínas (Blannin et al., 1998Blannin AK, Robson PJ, Walsh NP, Clark AM, Glennon L, Gleeson M. The effect of exercising to exhaustion at different intensities on saliva immunoglobulin A, protein and electrolyte secretion. Int J Sports Med. 1998;19(8):547-52.).

A imunodepressão induzida pelo exercício precisa ser cuidadosamente estudada de acordo com a especificidade. Enquanto há estudos que mostram o efeito imunodepressor de uma atividade física intensa (Blannin et al., 1998Blannin AK, Robson PJ, Walsh NP, Clark AM, Glennon L, Gleeson M. The effect of exercising to exhaustion at different intensities on saliva immunoglobulin A, protein and electrolyte secretion. Int J Sports Med. 1998;19(8):547-52.; Fahlman et al., 2001Fahlman MM, Engels HJ, Morgan AL, Kolokouri I. Mucosal IgA response to repeated wingate tests in females. International Journal of Sports Medicine. 2001;22(2):127-31.; Koch et al., 2007Koch AJ, Wherry AD, Petersen MC, Johnson JC, Stuart MK, Sexton WL. Salivary immunoglobulin A response to a collegiate rugby game. J Strength Cond Res. 2007;21(1):86-90.; Walsh et al., 2011Walsh NP, Gleeson M, Shephard RJ, Gleeson M, Woods JA, Bishop NC, et al. Position statement. Part one: Immune function and exercise. Exerc Immunol Rev. 2011;17:6-63.; Gleeson e Bishop, 2013Gleeson M, Bishop NC. URI in Athletes: are mucosal immunity and cytokine responses key risk factors? Exercise and Sport Sciences Reviews. 2013;41(3):148-53.), outro estudo demonstrou que com seis meses de treinamento com exercícios moderados obtiveram-se resultados significativos no aumento da secreção de IgA-s em idosos, independentemente do sexo ou da idade (Shimizu et al., 2007Shimizu K, Kimura F, Akimoto T, Akama T, Otsuki T, Nishijima T, et al. Effects of exercise, age and gender on salivary secretory immunoglobulin A in elderly individuals. Exerc Immunol Rev. 2007;13:55-66.). Estudos como esses sugerem que o exercício pode ser uma ferramenta apropriada para desencadear processos estimulantes ou depressores no sistema imune, a depender da forma com que é executado.

Conclusão

O carboidrato tem efeito protetor contra imunodepressão associada ao exercício extenuante. O consumo deve ser feito nos períodos anteriores a qualquer atividade atlética na forma de carboidratos complexos, para que assim os estoques energéticos sejam maximizados e o efeito protetor no sistema imunológico esteja presente.

DATC, por três dias antes de jogo-treino de rúgbi, preserva a função imunológica oral independentemente da suplementação de CHO.

Referências

  • Atkinson G, Taylor CE, Morgan N, Ormond LR, Wallis GA. Pre-race dietary carbohydrate intake can independently influence sub-elite marathon running performance. Int J Sports Med. 2011;32(8):611-7.
  • Bacurau RF, Bassit RA, Sawada L, Navarro F, Martins E, Costa Rosa LF. Carbohydrate supplementation during intense exercise and the immune response of cyclists. Clin Nutr. 2002;21(5):423-9.
  • Blannin AK, Robson PJ, Walsh NP, Clark AM, Glennon L, Gleeson M. The effect of exercising to exhaustion at different intensities on saliva immunoglobulin A, protein and electrolyte secretion. Int J Sports Med. 1998;19(8):547-52.
  • Brito C. Hidratação com e sem carboidratos durante o treinamento de judô. p.92 Dissertação (Mestrado em Ciências da Nutrição). Departamento de Educação Física, Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, 2005.
  • Carvalho T, Mara LS. Hydration and nutrition in sports. Revista Brasileira de Medicina do Esporte. 2010;16(2):144-8.
  • Chicharro JL, Lucía A, Pérez M, Vaquero AF, Ureña R. Saliva composition and exercise. Sports Med. 1998;26(1):17-27.
  • Duthie G, Pyne D, Hooper S. Applied physiology and game analysis of rugby union. Sports Medicine. 2003;33(13):973-91.
  • Fahlman MM, Engels HJ, Morgan AL, Kolokouri I. Mucosal IgA response to repeated wingate tests in females. International Journal of Sports Medicine. 2001;22(2):127-31.
  • Gisolfi CV, Duchman SM. Guidelines for optimal replacement beverages for different athletic events. Medicine and Science in Sports and Exercise. 1992;24(6):679-87.
  • Gleeson M, Bishop NC. URI in Athletes: are mucosal immunity and cytokine responses key risk factors? Exercise and Sport Sciences Reviews. 2013;41(3):148-53.
  • Gleeson M, Nieman DC, Pedersen BK. Exercise, nutrition and immune function. Journal of Sports Sciences. 2004;22(1):115-25.
  • Institute Medicine. Dietary references intakes for energy, carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol, protein, and amino acids, 50. Washington DC: Food and Nutrition Board, The National Academy Press; 2002. p. 936, Report (0-309-08525-X).
  • Koch AJ, Wherry AD, Petersen MC, Johnson JC, Stuart MK, Sexton WL. Salivary immunoglobulin A response to a collegiate rugby game. J Strength Cond Res. 2007;21(1):86-90.
  • Li TL, Gleeson M. The effect of single and repeated bouts of prolonged cycling and circadian variation on saliva flow rate, immunoglobulin A and alpha-amylase responses. Journal of Sports Sciences. 2004;22(11-12):1015-24.
  • Mackinnon LT, Jenkins DG. Decreased salivary immunoglobulins after intense interval exercise before and after training. Medicine and Science in Sports and Exercise. 1993;25(6):678-83.
  • Mendes E, Brito CJ, Batista ES, Silva CHO, Paula SO, Natali AJ. Influence of carbohydrate supplementation in the immune response of judoists during training. Rev Bras Med Esporte. 2009;15(1):58-61.
  • Mulvaney A, Herbold N. The texting athlete: using text and picture messages to record food intake at sporting events. Journal of Nutrition Education and Behavior. 2013;45(4):374-6.
  • Nehlsen-Cannarella SL, Nieman DC, Fagoaga OR, Kelln WJ, Henson DA, Shannon M, et al. Saliva immunoglobulins in elite women rowers. Eur J Appl Physiol. 2000;81(3):222-8.
  • Nieman DC. Marathon training and immune function. Sports Medicine. 2007;37(4-5):412-5.
  • Nieman DC, Dumke CI, Henson DA, McAnulty SR, McAnulty LS, Lind RH, et al. Immune and oxidative changes during and following the Western States Endurance Run. Int J Sports Med. 2003;24(7):541-7.
  • Reid MR, Drummond PD, Mackinnon LT. The effect of moderate aerobic exercise and relaxation on secretory immunoglobulin A. Int J Sports Med. 2001;22(2):132-7.
  • Sari-Sarraf V, Doran DA, Clarke ND, Atkinson G, Reilly T. Effects of carbohydrate beverage ingestion on the salivary IgA response to intermittent exercise in the heat. Int J Sports Med. 2011;32(9):659-65.
  • Sherman WM, Costill DL, Fink WJ, Miller JM. Effect of exercise-diet manipulation on muscle glycogen and its subsequent utilization during performance. Int J Sports Med. 1981;2(2):114-8.
  • Shimizu K, Kimura F, Akimoto T, Akama T, Otsuki T, Nishijima T, et al. Effects of exercise, age and gender on salivary secretory immunoglobulin A in elderly individuals. Exerc Immunol Rev. 2007;13:55-66.
  • Steerenberg PA, van Asperen IA, Amerongen AN, Biewenga J, Mol D, Medema G. Salivary levels of immunoglobulin A in triathletes. European Journal of Oral Sciences. 1997;105(4):305-9.
  • Tharp GD, Barnes MW. Reduction of saliva immunoglobulin levels by swim training. European Journal of Applied Physiology and Occupational Physiology. 1990;60(1):61-4.
  • Tomasi TB, Trudeau FB, Czerwinski D, Erredge S. Immune parameters in athletes before and after strenuous exercise. J Clin Immunol. 1982;2(3):173-8.
  • Walsh NP, Blannin AK, Clark AM, Cook L, Robson PJ, Gleeson M. The effects of high-intensity intermittent exercise on saliva IgA, total protein and alpha-amylase. J Sports Sci. 1999;17(2):129-34.
  • Walsh NP, Gleeson M, Shephard RJ, Gleeson M, Woods JA, Bishop NC, et al. Position statement. Part one: Immune function and exercise. Exerc Immunol Rev. 2011;17:6-63.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2017

Histórico

  • Recebido
    03 Jul 2013
  • Aceito
    09 Set 2013
Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte Universidade de Brasilia - Campus Universitário Darcy Ribeiro, Faculdade de Educação Física, Asa Norte - CEP 70910-970 - Brasilia, DF - Brasil, Telefone: +55 (61) 3107-2542 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: rbceonline@gmail.com