Introdução
O treinamento na área da educação física se caracteriza por um processo sistematizado e repetitivo com o intuito de aperfeiçoar o desempenho físico, técnico e tático em modalidades esportivas ou não (Barbanti et al., 2004; Viveiros et al. , 2011).
O propósito do treinar é maximizar o desempenho, que advém de uma quantidade ideal de cargas e de equilíbrio entre volume e intensidade, com períodos de recuperação apropriados com vistas à competição e ao rendimento (Nakamura et al., 2010). Promove adaptações desejadas e prevê a melhoria do desempenho físico-esportivo através da aplicação de um processo organizado e sistemático composto por exercícios físicos (Foster et al., 2001; Roschel et al., 2011).
Porém, nem sempre esse desempenho é parâmetro suficiente para avaliar e/ou programar o treinamento ou as competições, pois desconsidera aspectos relacionados à existencialidade do ser atleta e não detecta e interpreta as sensações e os sentimentos vindos do corpo durante a preparação ou execução do gesto esportivo (Marques e Brandão, 2010; Viveiros et al., 2011).
É imperioso abarcar o desempenho humano, entendido aqui como "[...] a natureza humana em toda a sua dimensão, ou seja, o indivíduo e suas relações biopsicossociais". (Pellegrinotti, 2002, p. 191). É compreender a própria vida, considerar que há mais do que resultados numéricos e estatisticamente comprovados. Há fatores de sensibilidade subjetivos relacionados a escolhas das diferentes possibilidades da prática esportiva.
Apesar dos vários estudos relacionados ao processo de treinamento (Gil et al., 2011; Matos et al., 2014), ainda são escassos os trabalhos que se preocupam em avaliar a percepção subjetiva do sentir do atleta. Um instrumento bastante usado é a Percepção Subjetiva do Esforço (PSE) proposta por Borg (1982) e adaptada por Foster (1998) para treino (Milanez e Pedro, 2012; Freitas et al., 2015). Estudos sobre a PSE têm sido usados, nas últimas quatro décadas, para analisar a percepção da sobrecarga a algum tipo de exercício físico (Pedro et al., 2014).
Entretanto, a maioria das investigações que usa essa proposta está reduzida a valores numéricos e, portanto, há uma carência na literatura no que se refere a pesquisas e ou instrumentos que se propõem a "escutar" o ser humano atleta/jogador e consequentemente entender como ele percebe seu corpo nas exigências do treinamento.
Marques Junior (2013), ao apresentar o estado da arte das escalas de PSE, destaca a existência apenas da proposta de Borg e suas adequações, além de identificar relação linear com as medidas fisiológicas, recomenda que sejam criados mecanismos para analisar a intensidade subjetiva do esforço no treino.
Com vistas a sanar essa lacuna, o objetivo deste estudo foi elaborar, validar e dar confiabilidade a um instrumento que avalia a percepção do corpo no desempenho esportivo, o Pecopes.
Procedimentos metodológicos
Delineamento para a elaboração do instrumento
O desenvolvimento e a validação do Pecopes iniciaram-se a partir do parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Metodista de Piracicaba (Parecer 92/2015), garantiram-se o consentimento dos respondentes, a confidencialidade e o anonimato das respostas.
A pesquisa contemplou três momentos com diferentes procedimentos: teórico, empírico ou experimental e analítico ou estatístico (Zequião e Cardoso, 2013; Coluci et al., 2015).
Procedimento teórico
Os referenciais teóricos que permearam a elaboração e construção inicial do Pecopes foram as publicações do Banco Virtual de Teses e Dissertações (BVTD) da Capes, com especial atenção sobre estudos que propunham instrumentos e ou investigações com questionários de avaliação da percepção subjetiva (Devon et al., 2007; Zequião e Cardoso, 2013). Apesar da maior afinidade com esse tema, outros trabalhos não deixaram de ser consultados e foram usados para esse fim. Nessa fase também foram consideradas as experiências dos pesquisadores sobre o tema (Keszei et al., 2010).
Esse acervo também contribuiu para a construção do questionário de dados demográficos (gênero, idade, escolaridade, início das atividades esportivas, participação em competições, tempo de treinamento), para caracterizar o público alvo das possíveis investigações.
Procedimento empírico
Nessa fase foram usados procedimentos quantitativos e qualitativos (Pasquali, 2011; Alexandre e Coluci, 2011), distribuídos em três etapas: 1) pesquisa qualitativa com atletas de alto nível para a formulação das perguntas; 2) analise do conteúdo do instrumento por um grupo de especialistas; 3) avaliação da clareza do conteúdo por atletas.
Etapa 1. Pesquisa qualitativa com atletas
Foram entrevistados 24 atletas de basquetebol de uma cidade do interior do Estado de São Paulo, 13 homens de 18 a 37 anos e 11 mulheres entre 18 e 27 anos, todos com experiência de mais de cinco anos em competições do ranking nacional.
Os voluntários responderam a quatro perguntas geradoras: 1) O que significa treinar para você?: 2) Como o seu corpo reage nos diferentes momentos do treinamento? 3) No treinamento, que momentos você considera prazeroso e que momentos você considera desconfortante? e 4) Como seu corpo responde quando as capacidades físicas são trabalhadas no treinamento? As respostas foram gravadas, transcritas e analisadas pela "técnica de elaboração e análise de unidades de significado", proposta por Moreira et al. (2005), a qual prevê a partir do relato ingênuo a identificação dos indicadores e a interpretação das unidades de significado.
A partir da análise dos resultados da entrevista, assim como as questões consideradas pelos autores como relevantes, foi elaborada a primeira versão do Pecopes, com 34 questões distribuídas em duas dimensões: Dimensão 1) Treinamento físico com 13 questões e Dimensão 2) Treinamento técnico e tático com 21, além de uma escala do tipo Likert de seis pontos para a Dimensão 1 com as opções de escolha: (1) tranquilo; (2) disposição; (3) pouca disposição; (4) condições de continuar; (5) condições limitadas e (6) exausto; e para a Dimensão 2: (1) nunca; (2) quase nunca; (3) poucas vezes; (4) às vezes; (5) quase sempre e (6) sempre, com o propósito de registrar o nível de concordância ou discordância em relação a atitudes e ou comportamentos a partir de uma declaração dada (Parreiras, 2008; Cunha, 2008; Simões, 2011).
Etapa 2. Validação do conteúdo pelos experts
A validação do conteúdo refere-se à análise minuciosa do instrumento, com vistas a verificar se os itens propostos contemplam o que se deseja avaliar (Bunchaft e Cavas, 2002; Alexandre e Coluci, 2011; Coluci et al., 2015). Esse procedimento ocorre pela apreciação de um comitê de experts (juízes).
Não há um consenso na literatura em relação ao número mínimo de especialistas, embora alguns autores (Grant e Davis, 1997; Alexandre e Coluci, 2011) recomendem entre seis e vinte, o critério adotado para a seleção é a característica do instrumento, a formação, a experiência e a disponibilidade dos envolvidos sobre o que se pretende estudar.
Foram selecionados 13 profissionais denominados de experts com saberes diferenciados em níveis e contextos distintos, envolvidos direta (exercício profissional) ou indiretamente (estudos científicos) com o assunto em pauta, sete doutores docentes universitários, dois mestrandos e quatro técnicos (dois de basquete, um de futebol e um de futsal).
Foi enviada por e-mail a cada um dos experts uma carta convite, um roteiro com as instruções de preenchimento e um questionário com as opções "concordo" ou "discordo" em relação à apresentação, clareza na linguagem, ao conteúdo, ao grau de relevância, à ambiguidade, compreensão, sequência e aplicabilidade do instrumento (Burns e Grove, 1997; Folle et al., 2014). Caso eles não concordassem com algum item ou se houvesse alguma sugestão de inclusão ou eliminação, havia um espaço para esse fim (Martins et al., 2010; Folle et al., 2014).
Para incorporação das sugestões dos especialistas foi considerada a porcentagem obtida na seguinte fórmula: número de participantes que concordaram x 100, dividido pela totalidade de vezes em que os experts poderiam responder (Alexandre e Coluci, 2011).
Neste estudo, a análise de concordância considerada foi de 80%. Assim, a questão que obteve pontuação menor do que a estabelecida sofreu alteração ou foi excluída do instrumento (Cassepp-Borges et al., 2009; Yamada e Santos, 2009). Entretanto, mesmo quando o item recebeu pontuação total acima de 80%, mas algum dos experts deferiu pontuação menor do que 80%, a justificativa/sugestão foi analisada.
Etapa 3. Avaliação de clareza
Após a fase de validação do conteúdo, foi elaborada a segunda versão do Pecopes, reduzida para 20 questões, oito para a Dimensão 1) Treinamento físico e 12 para a Dimensão 2) Treinamento técnico e tático.
Procedeu-se à aplicação dessa nova proposta a 33 atletas de futebol masculino da categoria sub-20 de uma cidade interiorana paulista e a oito atletas universitários (três de futsal, dois de futebol de campo, dois de handebol e um de natação) matriculados regularmente em um curso de bacharelado em educação física de uma universidade pública mineira, com o objetivo de verificar aspectos gerais, objetividade, concordância em relação à relevância dos dados, clareza dos itens e redundância nas questões. Essa etapa foi feita de forma presencial e todos receberam o questionário com as opções "concordo" ou "discordo" e com um espaço para redigir sugestões.
Pela análise dos experts e dos atletas, houve o ajuste semântico das 20 questões e a escala de respostas tanto da primeira como da segunda dimensão sofreu alteração, constituiu-se no Pecopes, como apresentado a seguir.
Percepção do corpo no desempenho esportivo - Pecopes (Perception of Body in Performance Sports) | ||||
De acordo com o período de treinamento que você se encontra, por favor assinale com X o número que corresponde à percepção do seu corpo nesse período. Avalie a sua percepção atual, e não a comissão técnica. | ||||
DIMENSÃO 1. TREINAMENTO FÍSICO | ||||
01 Como você percebe seu corpo no treinamento | ||||
1. Com total condição | 2. Com condição | 3. Com pouca condição | 4. Com condição limitada | 5. Exausto |
02 Como você percebe seu corpo no treinamento de resistência aeróbia (atividade contínua e baixa intensidade) | ||||
1. Com total condição | 2. Com condição | 3. Com pouca condição | 4. Com condição limitada | 5. Exausto |
03 Como você percebe seu corpo no treinamento de resistência anaeróbia (atividade curta, veloz e alta intensidade) | ||||
1. Com total condição | 2. Com condição | 3. Com pouca condição | 4. Com condição limitada | 5. Exausto |
04 Como você percebe seu corpo no treinamento de força muscular | ||||
1. Com total condição | 2. Com condição | 3. Com pouca condição | 4. Com condição limitada | 5. Exausto |
05 Como você percebe seu corpo no treinamento de potência (explosão) | ||||
1. Com total condição | 2. Com condição | 3. Com pouca condição | 4. Com condição limitada | 5. Exausto |
06 Como você percebe seu corpo no treinamento de agilidade e velocidade | ||||
1. Com total condição | 2. Com condição | 3. Com pouca condição | 4. Com condição limitada | 5. Exausto |
07 Quando você treina as capacidades físicas (força, resistência) na sua modalidade (jogo) como você se sente | ||||
1. Com total condição | 2. Com condição | 3. Com pouca condição | 4. Com condição limitada | 5. Exausto |
08 O nível de exigência de esforço no treinamento para o seu corpo é | ||||
1. Com total condição | 2. Com condição | 3. Com pouca condição | 4. Com condição limitada | 5. Exausto |
Dimensão 2. Treinamento técnico e tático | ||||
09 Quando a sua confiança interfere na execução das habilidades | ||||
1. Nunca | 2. Quase nunca | 3. Às vezes | 4. Quase sempre | 5. Sempre |
10 Quando os problemas pessoais interferem no treinamento | ||||
1. Nunca | 2. Quase nunca | 3. Às vezes | 4. Quase sempre | 5. Sempre |
11 Você percebe quando está próximo de se lesionar | ||||
1. Nunca | 2. Quase nunca | 3. Às vezes | 4. Quase sempre | 5. Sempre |
12 Quando os sintomas dolorosos o impedem de continuar | ||||
1. Nunca | 2. Quase nunca | 3. Às vezes | 4. Quase sempre | 5. Sempre |
13 Quando você percebe insatisfação com seu corpo | ||||
1. Nunca | 2. Quase nunca | 3. Às vezes | 4. Quase sempre | 5. Sempre |
14 Quando você acredita que treinou bem | ||||
1. Nunca | 2. Quase nunca | 3. Às vezes | 4. Quase sempre | 5. Sempre |
15 O seu desempenho interfere na eficiência da equipe | ||||
1. Nunca | 2. Quase nunca | 3. Às vezes | 4. Quase sempre | 5. Sempre |
16 A forma de cobrança do treinador interfere no seu rendimento | ||||
1. Nunca | 2. Quase nunca | 3. Às vezes | 4. Quase sempre | 5. Sempre |
17 Você percebe que seu corpo vai até o limite do treinamento | ||||
1. Nunca | 2. Quase nunca | 3. Às vezes | 4. Quase sempre | 5. Sempre |
18 Você percebe que consegue se recuperar durante os períodos de repouso | ||||
1. Nunca | 2. Quase nunca | 3. Às vezes | 4. Quase sempre | 5. Sempre |
19 Você percebe que sua preparação física permite desempenhar as habilidades com sucesso | ||||
1. Nunca | 2. Quase nunca | 3. Às vezes | 4. Quase sempre | 5. Sempre |
20 O esforço no treinamento é um fator para o abandono do esporte | ||||
1. Nunca | 2. Quase nunca | 3. Às vezes | 4. Quase sempre | 5. Sempre |
Procedimento analítico ou estatístico
Na análise da consistência interna dos 20 itens da escala foi aplicado o teste alfa de Cronbach (α) em 40 participantes. Esse teste permitiu confirmar os itens na escala, uma vez que o valor de α = 0,756 não teve seu escore aumentado pela exclusão de qualquer um dos itens, segundo Barbetta (2002) valores para α iguais ou superiores a 0,75 são considerados suficientemente adequados.
A versão do Pecopes com 20 itens foi usada para a coleta de dados, a amostra foi definida com base em Pasquali (1999), o qual recomenda que seja composta por 10 participantes por item, o que no caso deste estudo corresponderia a 200.
Considerando esse valor, 230 atletas de ambos os sexos e de diferentes modalidades esportivas (atletismo - 42; basquete - 34; futebol de campo - 14; futsal - 15; ginástica rítmica - 4; handebol - 59; judô -16; natação -seis; tênis de mesa - oito; voleibol - 17; caratê - seis; ginástica acrobática - quatro e canoagem - cinco) participaram da investigação.
O acesso aos atletas das modalidades foi feito de forma aleatória com técnicos de várias cidades dos estados de São Paulo e de Minas Gerais, os quais autorizaram a pesquisa.
Os critérios para participação na investigação foram: 1) estar vinculado oficialmente a uma modalidade esportiva; 2) ter treinamento regular entre três e cinco vezes por semana; 3) ter participado de no mínimo uma competição e 4) concordar e assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) (para maiores de 18 anos) e ou pelo responsável (para os menores de 18 anos).
A idade desses participantes não foi controlada, pois o intuito não era avaliar o atleta, e sim se o instrumento conseguia mensurar o que se pretendia.
Os dados foram coletados no próprio local de treinamento, os atletas receberam uma cópia do questionário de dados demográficos, uma do Pecopes e uma caneta para responder.
Os resultados dos instrumentos foram organizados em uma planilha do Microsoft Office Excel 2007. Foi usada a análise descritiva para a caracterização dos participantes, que contemplou os seguintes itens: sexo; escolaridade, profissão; patrocínio, estado civil; idade de início do esporte e incentivo. Recursos de estatística descritiva – frequências absolutas e relativas, média e desvio-padrão (DP) para avaliação da análise dos experts.
Os dados estatísticos foram tratados no programa SPSS (Statistic Package of Social Science), versão 20.0 e a avaliação do grau de confiabilidade interna das medidas obtidas foi via alfa de Cronbach (Pasquali, 2011; Goetz e Camargo, 2014).
A classificação para avaliar as duas dimensões do Pecopes teve como referência as médias e os desvios-padrão obtidos nos resultados de ambas.
Resultados
Validação do conteúdo pelos experts
O questionário foi apresentado para cada profissional com experiência no treinamento e na tabela 1 encontram-se as respostas.
Tabela 1 Validação de conteúdo feita pelos especialistas
Questões | Experts | ||||
---|---|---|---|---|---|
Concordo | Discordo | ||||
VA | VR | VA | VR | ||
1 | 11 | 84,61 | 2 | 15,38 | |
2 | 12 | 92,30 | 1 | 7,69 | |
3 | 12 | 92,30 | 1 | 7,69 | |
4 | 11 | 84,61 | 2 | 15,38 | |
5 | 10 | 76,92 | 3 | 23,07 | |
6 | 10 | 76,92 | 3 | 23,07 | |
7 | 11 | 84,61 | 2 | 15,38 | |
8 | 11 | 84,61 | 2 | 15,38 | |
9 | 10 | 76,92 | 3 | 23,07 | |
10 | 10 | 76,92 | 3 | 23,07 | |
11 | 10 | 76,92 | 3 | 23,07 | |
12 | 10 | 76,92 | 3 | 23,07 | |
13 | 9 | 69,23 | 4 | 30,76 | |
14 | 10 | 76,92 | 3 | 23,07 | |
15 | 9 | 69,23 | 4 | 30,76 | |
16 | 9 | 69,23 | 4 | 30,76 | |
17 | 13 | 100,00 | 0 | 0 | |
18 | 12 | 92,30 | 1 | 7,69 | |
19 | 11 | 84,61 | 2 | 15,38 | |
20 | 9 | 69,23 | 4 | 30,76 | |
21 | 13 | 100,00 | 0 | 0 | |
22 | 9 | 69,23 | 4 | 30,76 | |
23 | 13 | 100,00 | 0 | 0 | |
24 | 10 | 76,92 | 3 | 23,07 | |
25 | 10 | 76,92 | 3 | 23,07 | |
26 | 12 | 92,30 | 1 | 7,69 | |
27 | 11 | 84,61 | 2 | 15,38 | |
28 | 11 | 84,61 | 2 | 15,38 | |
29 | 12 | 92,30 | 1 | 7,69 | |
30 | 11 | 84,61 | 2 | 15,38 | |
31 | 8 | 61,53 | 5 | 38,46 | |
32 | 12 | 92,30 | 1 | 7,69 | |
33 | 11 | 84,61 | 2 | 15,38 | |
34 | 11 | 84,61 | 2 | 15,38 | |
Total | 364 | 82,35 | 78 | 17,64 |
Fonte: Coleta de dados, 2016.
VA, valor absoluto; VR, valor relativo.
Na tabela 1, o "concordo" foi de 82,35% e 17,64% "discordo". As questões avaliadas apresentaram comentários no contexto semântico, de conteúdo e de entendimento das percepções corporais. Cada questão foi discutida entre os autores, foram feitas as alterações sugeridas pelos especialistas e ou excluídas.
Avaliação da clareza pelos atletas
Participaram dessa etapa atletas de futebol masculino sub-20 e atletas universitários e os resultados estão descritos nas tabelas 2 e 3.
Tabela 2 Validação de conteúdo feita pelos atletas de futebol de campo
Questões | Atletas de futebol | ||||
---|---|---|---|---|---|
Concordo | Discordo | ||||
VA | VR | VA | VR | ||
1 | 32 | 96,96 | 1 | 3,03 | |
2 | 33 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
3 | 32 | 96,96 | 1 | 3,03 | |
4 | 31 | 93,93 | 2 | 6,06 | |
5 | 33 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
6 | 33 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
7 | 28 | 84,84 | 5 | 15,15 | |
8 | 27 | 81,81 | 6 | 18,18 | |
9 | 33 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
10 | 33 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
11 | 33 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
12 | 33 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
13 | 33 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
14 | 32 | 96,96 | 1 | 3,03 | |
15 | 33 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
16 | 33 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
17 | 33 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
18 | 33 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
19 | 33 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
20 | 30 | 90,90 | 3 | 9,09 | |
Total | 641 | 97,12 | 19 | 2,87 |
Fonte: Coleta de dados, 2016.
VA, valor absoluto; VR, valor relativo.
Tabela 3 Validação de conteúdo feita pelos atletas universitários
Questões | Atletas universitários | ||||
---|---|---|---|---|---|
Concordo | Discordo | ||||
VA | VR | VA | VR | ||
1 | 7 | 87,50 | 1 | 12,50 | |
2 | 8 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
3 | 8 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
4 | 7 | 87,50 | 1 | 12,50 | |
5 | 8 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
6 | 8 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
7 | 7 | 87,50 | 1 | 12,50 | |
8 | 5 | 62,50 | 3 | 37,50 | |
9 | 8 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
10 | 8 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
11 | 8 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
12 | 7 | 87,50 | 1 | 12,50 | |
13 | 7 | 87,50 | 1 | 12,50 | |
14 | 8 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
15 | 7 | 87,50 | 1 | 12,50 | |
16 | 8 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
17 | 7 | 87,50 | 1 | 12,50 | |
18 | 8 | 100,00 | 0 | 0,00 | |
19 | 7 | 87,50 | 1 | 12,50 | |
20 | 4 | 50,00 | 4 | 50,00 | |
Total | 145 | 90,62 | 15 | 9,37 |
Fonte: Coleta de dados, 2016.
VA, valor absoluto; VR, valor relativo.
Após essas tabulações, verificou-se que na tabela 2, o "concordo" foi de 97,12% e o "discordo" de 2,87%. Na tabela 3, o "concordo" foi de 90,62 e o "discordo" de 9,37%. Apesar do resultado positivo, foram feitas modificações para melhor adequá-lo em relação à apresentação, à organização, à troca de terminologias, à numeração dos itens e à clareza e coerência do conteúdo.
Análise estatística dos dados coletados
Dos 230 atletas que responderam os questionários, 170 são homens com média de 19,97 ± 4,38 anos e 60 mulheres com média de 21,53 ± 4,54. Desses, quatro têm Ensino Fundamental incompleto e nove completo, 49 Ensino Médio incompleto e 56 completo, 30 Ensino Superior incompleto e 80 completo, um tem pós-graduação incompleta e um completa.
A maioria não tem outra atividade profissional (194) ou patrocínio individual (220). Cada atleta já participou em pelo menos uma competição municipal, uma estadual e uma nacional e os pais foram os maiores incentivadores para a prática esportiva (107), seguidos de amigos (54), professores (39), técnicos (22) e irmãos (25).
A natação, o futebol e vôlei foram os outros esportes mais praticados além do atual e boa parte iniciou a prática de esporte a partir dos oito anos. O volume de treinamento da maioria é de cinco vezes por semana durante três horas.
Análise fatorial
Inicialmente foram verificadas as pressuposições para análise fatorial (Pereira, 1999). Verificou-se que os coeficientes de correlação são em sua maioria significativamente diferentes de zero (68%). O coeficiente para o teste de esfericidade de Bartlet é igual a 1.098,375 (p < 0,001), permitiu concluir que a matriz de correlação é adequada para o uso da análise fatorial. A adequação da amostra verificada pelo teste de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO = 0,789) indicou boa adequação dos dados para a análise fatorial.
O método de rotação Varimax foi aplicado para avaliar a estrutura interna do Pecopes, consideraram-se como base as duas dimensões (tabela 4).
Tabela 4 Resultados da análise fatorial Varimax
N Item | Autovalores | % acumulada da variância | Dimensão 1 | Dimensão 2 |
---|---|---|---|---|
1 | 4,4651 | 22,33% | 0,733 | |
2 | 2,1936 | 33,29% | 0,600 | |
3 | 1,5765 | 41,18% | 0,697 | |
4 | 1,3218 | 47,78% | 0,667 | |
5 | 1,0984 | 53,28% | 0,728 | |
6 | 1,0454 | 58,50% | 0,700 | |
7 | 0,8956 | 62,98% | 0,725 | |
8 | 0,8780 | 67,37% | 0,591 | |
9 | 0,8179 | 71,46% | - | 0,405 |
10 | 0,7568 | 75,25% | - | 0,386 |
11 | 0,6810 | 78,65% | - | 0,389 |
12 | 0,6729 | 82,01% | - | 0,437 |
13 | 0,6081 | 85,06% | - | 0,340 |
14 | 0,5691 | 87,90% | - | 0,471 |
15 | 0,5108 | 90,45% | - | 0,448 |
16 | 0,5005 | 92,96% | - | 0,502 |
17 | 0,3789 | 94,85% | - | 0,557 |
18 | 0,3710 | 96,71% | - | 0,351 |
19 | 0,3505 | 98,46% | - | 0,473 |
20 | 0,3081 | 100,00% | - | 0,297 |
Fonte: Análise estatística, 2016.
Os resultados confirmam as duas dimensões. Os autovalores maiores do que um explicam 58% da variância total do instrumento composto de 20 itens, com cargas fatoriais de 0,30 em todos os itens.
Observa-se a configuração para o agrupamento dos itens em duas dimensões: (1) durante o treinamento físico – TF; (2) durante o treinamento técnico e tático – TTT. A estrutura do instrumento aplicado na amostra n = 230 apresentou um coeficiente de Cronbach satisfatório (αtotal = 0,73); (αTF = 0,85) e (αTTT = 0,58), indicou uma boa consistência interna de seus itens na avaliação.
Os valores da média geral e o desvio padrão de cada uma das dimensões (tabela 5) serviram de referência para obter os valores para classificar cada uma das dimensões.
Tabela 5 Médias e desvios-padrão das dimensões: 1 - Treinamento físico (TF) e 2 - Treinamento técnico e tático (TTT)
Dimensão | N | M | DP |
---|---|---|---|
1. Treinamento físico | 230 | 16 | 4 |
2. Treinamento técnico e tático | 230 | 35 | 5 |
Fonte: Autores, coleta de dados, 2016.
Considerando esses valores, para a Dimensão 1 foi feita a classificação de avaliação da tabela 6 e na Dimensão 2 da tabela 7. Para identificar a classificação é necessário fazer a soma das respostas assinaladas com X pelo atleta.
Tabela 6 Classificação da percepção do corpo no desempenho esportivo (Pecopes) após a soma das respostas da Dimensão 1
Referência | Escore | Classificação |
---|---|---|
Média menos um desvio-padrão | ≤ 12 | Muito adequado |
Menos um desvio a média | 13 - 16 | Adequado |
Média mais um desvio-padrão | 17 - 20 | Pouco adequado |
Media mais dois desvios-padrão | 21 - 24 | Exaustivo |
Média e mais de três desvios-padrão | ≥ 25 | Muito exaustivo |
Fonte: Análise estatística do instrumento.
Tabela 7 Classificação da percepção do corpo no desempenho esportivo (Pecopes) após a soma das respostas da Dimensão 2
Referência | Escore | Classificação |
---|---|---|
Média mais um desvio-padrão | ≥ 40 | Muito adequado |
Mais um desvio-padrão a média | 39 - 35 | Adequado |
Média menos um desvio-padrão | 34 - 30 | Pouco adequado |
Média menos dois desvios-padrão | 29 - 25 | Exaustivo |
Média e menos de três desvios-padrão | ≤ 24 | Muito exaustivo |
Fonte: Análise estatística do instrumento.
Discussão
A construção e a validação de um instrumento de avaliação subjetiva no treinamento é um processo complexo em que é preciso considerar diferentes aspectos, como o perfil do atleta, a modalidade esportiva, o tipo de treinamento, o ambiente, a comissão técnica, entre outros.
A avaliação dos experts para os ajustes do instrumento, o índice de clareza identificado pelos atletas do estudo e a análise estatística determinaram que o instrumento proposto é compreensível para a população que se deseja avaliar (Pasquali, 2011).
A homogeneidade e estabilidade do questionário foram determinadas pela consistência interna e a confiabilidade, revelaram a possibilidade de reprodução do estudo com outros atletas de acordo com apontamentos de Martins (2006) e Coluci et al. (2015).
O instrumento avalia os aspectos físicos de forma homogênea e o tático e técnico como o atleta se percebe. Nessa direção os aspectos objetivo-subjetivo-subjetivos do desempenho do atleta nos programas de treinamento podem ser analisados, pelo atleta e pela comissão técnica, para entender como as intensidades e as frequências dos esforços são percebidas por meio da sensibilidade corporal do atleta, que é quem recebe as sobrecargas para melhoria do rendimento. O instrumento busca analisar, além dos valores quantitativos de um teste ou repetição de determinado gesto da modalidade, a compreensão da percepção-sensibilidade do atleta com seu corpo.
O presente estudo tentou não só superar a escassez de trabalhos para avaliar a percepção subjetiva corporal do atleta (Gil et al., 2011; Matos et al., 2014), uma vez que o uso defendido na literatura ainda é a proposta de Borg (1982) e de Foster (1998), mas também proporcionar um instrumento que pudesse ser usado pela comissão técnica com o intuito de analisar o ser humano que pratica esporte.
Os dados das duas dimensões aplicados numa amostra com 230 atletas apontam o coeficiente alpha de Cronbach satisfatório (αtotal = 0,73); (αTF = 0,85) e (αTTT = 0,58), indicam uma boa consistência interna de seus itens na avaliação. Os resultados asseguram que as duas dimensões avaliam a sensibilidade do atleta em relação ao seu corpo quando submetido ao conjunto de exigências físicas, técnicas e táticas da modalidade. A confiabilidade do instrumento se constitui como ferramenta importante na compreensão do sentimento do atleta quanto à exigência de seu corpo para melhoria ou manutenção do desempenho.
Como forma de entender a expressão de sensibilidade corporal do atleta, o instrumento tem classificações para as duas dimensões, conforme a tabela 7. Assim, tanto o atleta quanto o professor responsável identificarão o quanto é percebido corporalmente o programa de treinamento aplicado. Sensibilidade essa que extrapola as avalições de percepções momentâneas de cargas de sessões ou repetições de gestos específicos.
Conclusão
Considerou-se que os dados obtidos com este estudo são aplicáveis a atletas de diferentes modalidades esportivas e em diversos momentos do treinamento. A pertinência do instrumento foi comprovada em decorrência da consistência interna e pela avaliação dos experts.
Tornar um conceito subjetivo em algo mensurável não é uma tarefa fácil e são essenciais mais estudos que visem a auxiliar esse processo. Esta proposta é um ponto de partida para que mais trabalhos sejam feitos, na tentativa de ampliar reflexões relacionadas à analise do ser humano atleta.