Acessibilidade / Reportar erro

O não reconhecimento sistemático e a prática da crítica: Bourdieu, Boltanski e o papel da teoria crítica

Resumos

A "virada pragmática" proposta por Boltanski e outros não deveria levar-nos a abandonar o projeto da Teoria Crítica, como se toda a crítica necessária já estivesse articulada nas práticas cotidianas de crítica. As capacidades reflexivas dos atores "ordinários" e suas práticas de justificação e crítica, que são convincentemente reconstruídas pela sociologia da crítica, constituem a base social e metodológica da teoria crítica. Isso não deveria, contudo, levar-nos a atribuir uma autoridade epistêmica à perspectiva dos participantes que seja imune a ser colocada em questão de um ponto de vista informado em termos teóricos.

Teoria Crítica; virada pragmática; não reconhecimento sistemático; justificação


The "pragmatic turn'" proposed by Boltanski and others should not lead us to abandon the project of Critical Theory, as if all necessary criticism were already articulated within everyday practices of critique. The reflective capacities of "ordinary" actors and their practices of justification and critique, which are convincingly reconstructed by the sociology of critique, constitute the social and methodological basis of critical theory. However, this should not lead us to attribute an epistemic authority to the perspective of the participants that is immune to being put into question from a theoretically informed point of view.

Critical Theory; pragmatic turn; systematic misrecognition; justification


DOSSIÊ TEORIA CRÍTICA

O não reconhecimento sistemático e a prática da crítica: Bourdieu, Boltanski e o papel da teoria crítica* [* ] Publicado originalmente em: Bankowsky, M. e Le Goff, A. (orgs.). Recognition theory and contemporary french moral and political philosophy: reopening the dialogue (reappraising the political). Manchester: Manchester University Press, 2012.

Robin Celikates

Tradução de Fernando Costa Mattos

RESUMO

A "virada pragmática" proposta por Boltanski e outros não deveria levar-nos a abandonar o projeto da Teoria Crítica, como se toda a crítica necessária já estivesse articulada nas práticas cotidianas de crítica. As capacidades reflexivas dos atores "ordinários" e suas práticas de justificação e crítica, que são convincentemente reconstruídas pela sociologia da crítica, constituem a base social e metodológica da teoria crítica. Isso não deveria, contudo, levar-nos a atribuir uma autoridade epistêmica à perspectiva dos participantes que seja imune a ser colocada em questão de um ponto de vista informado em termos teóricos.

Palavras-chave: Teoria Crítica; virada pragmática; não reconhecimento sistemático; justificação.

ABSTRACT

The "pragmatic turn'" proposed by Boltanski and others should not lead us to abandon the project of Critical Theory, as if all necessary criticism were already articulated within everyday practices of critique. The reflective capacities of "ordinary" actors and their practices of justification and critique, which are convincingly reconstructed by the sociology of critique, constitute the social and methodological basis of critical theory. However, this should not lead us to attribute an epistemic authority to the perspective of the participants that is immune to being put into question from a theoretically informed point of view.

Keywords: Critical Theory; pragmatic turn; systematic misrecognition; justification.

Nos últimos anos, a sociologia da crítica, tal como elaborada por Luc Boltanski e seu grupo de pesquisa em oposição explícita à concepção objetivista da ciência social crítica de Pierre Bourdieu, emergiu como um novo paradigma na teoria social. No entanto, somente agora as sobreposições e diferenças em relação à Teoria Crítica da tradição da Escola de Frankfurt se fazem ver. No que segue, explorarei essa relação defendendo três teses: 1) que o modelo de ciência social crítica de Bourdieu se baseia na suposição - problemática tanto empírica como metodologicamente - de uma forma sistemática de não reconhecimento que assume o papel tradicionalmente desempenhado pela ideologia; 2) que a sociologia da crítica oferece uma alternativa convincente ao modelo de Bourdieu ao levar a sério a autocompreensão dos atores e, portanto, as categorias empregadas em suas práticas de justificação e crítica; e 3) que, com todo respeito a Boltanski, uma versão revisada da Teoria Crítica - cujos elementos podem ser encontrados na obra de Axel Honneth - pode desempenhar um papel complementar decisivo, já que tais autocompreensões e práticas podem sofrer do que se poderia denominar "patologias de segunda ordem". Essa forma de entender a Teoria Crítica oferece uma nova perspectiva sobre a política de reconhecimento,tanto no nível teórico como no da prática social, ao ligar a "micropolítica do reconhecimento", negociada no âmbito das práticas cotidianas de justificação e crítica, às suas condições "macropolíticas", i.e., a formas institucionalizadas e estruturais de reconhecimento e não reconhecimento.

Em contraste com abordagens objetivistas que tendem a compreender os atores sociais como "idiotas desprovidos de juízo"1 [1 ] Celikatesusa a expressão"judgmental dopes", que traduzimos por "idiotas desprovidos de juízo".(N.T.) , e não como agentes dotados de capacidades reflexivas, a sociologia pragmática da crítica rejeita, com razão, a ideia de uma separação entre o ponto de vista supostamente objetivo do cientista social e a perspectiva irrefletida dos chamados agentes "ordinários"2 [2 ] Cf. Garfinkel, H. Studies in ethno-methodology. Cambridge: Polity,1984, pp.67-73. . Em vez disso, os atores são considerados capazes daquelas formas de reflexividade crítica que observadores científicos frequentemente consideram monopólio seu.De fato,ser capaz de tomar distância do contexto prático imediato e refletir criticamente sobre ele é "uma capacidade cuja existência tem de ser pressuposta se quisermos compreender o modo como os membros de uma sociedade complexa criticam e questionam as instituições, discutem uns com os outros ou convergem para um acordo"3 [3 ] Boltanski, L.eThévenot, L. On justification. Princeton: Princeton University Press, 2006, p.15. .

Enquanto é típico das abordagens no interior do paradigma da ciência social crítica identificar, no nível macro, estruturas sociais e mecanismos que explicam a reprodução do status quo, a sociologia da crítica segue o exemplo da etnometodologia e se coloca no nível micro, descrevendo práticas situadas de crítica e justificação. Ainda, contudo, que isso se justifique em termos de um alargamento da perspectiva teórica, essa inversão tende a negligenciar a possibilidade de certas condições sociais bloquearem o exercício ou mesmo a formação das capacidades reflexivas e críticas dos atores. Para dar conta dessa possibilidade, a teoria social tem de focar - no "nível meso" - aquelas condições sociais, amplamente ignoradas pela sociologia da crítica, que podem criar obstáculos para práticas de crítica e justificação no mundo real.Em contraste com a abordagem de Bourdieu,no entanto, a hipótese de que certas condições bloqueiam as capacidades reflexivas dos atores não implica que os atores sejam eles mesmos estruturalmente (i.e., em virtude da estrutura da prática em que se engajam) incapazes de compreender essa situação e, portanto, estejam presos em uma posição ingênua, pré-reflexiva.

A "virada pragmática" proposta por Boltanski e outros não deveria levar-nos a abandonar o projeto da Teoria Crítica, como se toda a crítica necessária já estivesse articulada nas práticas cotidianas de crítica. As capacidades reflexivas dos atores "ordinários" e suas práticas de justificação e crítica, que são convincentemente reconstruídas pela sociologia da crítica,constituem a base social e metodológica da Teoria Crítica.Isso não deveria,contudo,levar-nos a atribuir uma autoridade epistêmica à perspectiva dos participantes que seja imune a ser colocada em questão de um ponto de vista informado em termos teóricos4 [4 ] Para uma discussão mais detalhada dessas questões, cf. Celikates, R. Kritik als soziale Praxis. Frankfurt am Main: Campus, 2009. .

CIÊNCIA SOCIAL CRÍTICA E NÃO RECONHECIMENTO ESTRUTURAL

De acordo com um modelo teórico que poderia ser chamado de "ortodoxo", a ciência social crítica começa substituindo uma questão por outra:em vez de perguntar-se por que,em um caso particular,pessoas se rebelam ou entram em greve, nós deveríamos perguntar-nos por que, na maior parte do tempo, elas não apenas toleram o status quo como participam na sua reprodução e o veem como natural e/ou legítimo5 [5 ] Cf. a excelente introdução de Rosen, M. On voluntary servitude: false consciousness and the theory and ideology. Cambridge: Polity, 1996. . Uma vez que parece haver uma óbvia contradição entre o comportamento das pessoas e seus interesses básicos,é razoável suspeitar que os atores ordinários não reconhecem [misrecognise] sua situação objetiva e seus reais interesses de um modo sistemático, i.e., de um modo não totalmente fortuito.

Para explicar o fenômeno do não reconhecimento sistemático [systematic misrecognition], a ciência social crítica aponta para o "fato" de que os agentes não sabem realmente o que estão fazendo - de que eles são, na verdade, prisioneiros de uma ideologia que mascara sua situação e seus interesses6 [6 ] Cf. Giddens, A. The constitution of society. Berkeley: University of California Press, p. xvi: o modelo ortodoxo tem por premissa a compreensão da ação social como "o resultado de forças que os atores nem controlam nem compreendem". Para uma compreensão alternativa, não ortodoxa, da críticada ideologia, cf. Jaeggi, R. "Rethinking ideology". In: de Bruin, B.e Zurn, C.F.(orgs.). New waves in political philosophy. Houndmills: Palgrave Macmillan,2009,pp.63-86. . Ser prisioneiro de uma ideologia significa estar confinado em uma forma falsa de consciência que é tanto objetivamente necessária como necessariamente falsa. Essa noção "ortodoxa" de ideologia não apenas implica que os atores não sabem o que estão fazendo, mas também que não compreendem, nem podem compreender,o quanto o que eles estão fazendo e pensando contribui para a reprodução da ordem social. O sistemático não reconhecimento da parte dos atores é então contrastado com o discernimento dos "reais" mecanismos de reprodução social,disponível para aqueles que conseguem, como que "de um ponto de vista externo", diagnosticar formas de falsa consciência. Nessa forma de compreendê-la, a ideologia pode ser identificada desde um ponto de vista objetivo e epistemicamente privilegiado, situado fora do contexto ideológico e que tem de ser fornecido pela ciência social.

A concepção "ortodoxa" da ciência social crítica implica, portanto, uma oposição assimétrica entre ciência e crítica, de um lado, e, de outro, a perspectiva ingênua dos agentes "ordinários", submetidos a formas estruturais de não reconhecimento. Consequentemente, os atores sociais são vistos como objetos do discurso crítico, e não como interlocutores em seu próprio direito,cuja autocompreensão pudesse fornecer mais que meras informações adicionais. Foi esse dogma da assimetria, e o imperativo metodológico de uma ruptura metodológica com a perspectiva dos participantes a ele associado, que animaram o projeto de uma sociologia que é a um só tempo científica e crítica. Isso está no centro da sociologia crítica de Bourdieu. Para ele, a ruptura com a autocompreensão dos atores é tanto epistemológica como metodológica.Ela presume uma radical descontinuidade entre,de um lado, a consciência ordinária, o senso comum e a perspectiva dos participantes e, de outro, a perspectiva das ciências sociais. Essa ruptura é levada a cabo por meio de uma operação dupla: a delimitação metateórica da ciência por oposição ao senso comum (juntamente com a desqualificação epistemológica do último) e o imperativo metodológico de lutar pelo conhecimento científico contra o senso comum, a opinião vulgar e a ideologia.Bourdieu e seus coautores se situam claramente nesse quadro durkheimiano ao caracterizar do seguinte modo o primeiro princípio metodológico de sua abordagem: "O fato social é conseguido contra a ilusão do conhecimento imediato", exigindo uma permanente "vigilância epistemológica" da parte do sociólogo7 [7 ] Bourdieu, P., Chamboredon, J.-C. e Passeron, J.-C. The craft of sociology. Berlim: W. de Gruyter,1991,p.13. . Segundo esse entendimento, a sociologia está engajada em uma luta contínua contra a "sociologia espontânea" dos agentes ordinários e sua autocompreensão,contra os "movimentos espontâneos da prática ingênua" que ameaçam "contaminar" a análise sociológica8 [8 ] Ibidem,p.24. . Há um conflito estrutural insolúvel entre a análise sociológica científica e as interpretações dos atores, que, em virtude de sua imersão na prática social, são incapazes de distanciar-se daquilo que estão fazendo e se tornam vítimas de uma mera "ilusão de reflexividade"9 [9 ] Ibidem. .

Essa concepção de uma forma de não reconhecimento que não é contingente, mas estrutural - no sentido de que é constitutiva para o funcionamento da prática em questão e a reprodução da ordem social -, vem desempenhando um papel decisivo no trabalho de Bourdieu desde sua análise da troca de presentes. A verdade dessa troca - que ela não é,na realidade,uma questão de presentes desinteressados,mas sim uma luta sublimada por poder simbólico e vantagem material - não pode ser reconhecida a partir de dentro da autocompreensão "oficial" que molda a perspectiva dos participantes. O que os atores estão fazendo (objetivamente) não coincide com o que eles pensam (subjetivamente) estar fazendo. Esse não reconhecimento da estrutura de sua prática é necessário no sentido de que é um dos fundamentos da mesma: a prática em questão, nesse caso a troca de presentes, existe e funciona "porque, estritamente falando, os sujeitos não sabem o que estão fazendo", de modo que "o que eles fazem tem mais significado do que o que eles sabem"10 [10 ] Bourdieu, P. Outline of a theory of practice. Cambridge: Cambridge University Press,1977,p.79. .

Para dar conta dessa estrutura de não reconhecimento, Bourdieu fala de uma "verdade dúplice". Por um lado, o presente realmente é, e tem de ser,aquilo que parece ser - um ato generoso,sem interesse ou cálculo; mas, por outro lado, esse ato está sujeito à lógica implacável e à "força sem força" da troca de presentes11 [11 ] Cf. Bourdieu, P. Pascalian meditations. Stanford: Stanford University Press, 2000, pp.188-202. . Essa "verdade dúplice" só é acessível do ponto de vista do sociólogo observador - os próprios atores estão presos na meia verdade que lhes é disponível do lado de dentro. Segundo Bourdieu, a contradição entre a "verdade subjetiva" dos participantes e a análise objetiva do observador sociológico não se limita à troca de presentes; ela explica o caráter distintivo de todas as práticas simbólicas. A automistificação dessas práticas só pode ser desmascarada por uma "ciência geral da economia das práticas"12 [12 ] Bourdieu, Outline of a theory of practice,op.cit.,p.183. .

O não reconhecimento, que é constitutivo para o funcionamento das práticas sociais, é o resultado de um trabalho de negação e repressão que é interiorizado pelos sujeitos no curso de sua iniciação a essas práticas através da educação ou "adestramento". Como uma "segunda natureza", o habitus que resulta dessa formação permite aos atores que se movam no mundo social "como peixes na água": nós sabemos, imediata e intuitivamente, qual comportamento é apropriado e o que devemos fazer;e geralmente o fazemos sem maiores reflexões.Como o habitus condiciona e estrutura nossas experiências, pensamentos, avaliações e práticas, ele impõe estritos limites à reflexão e à crítica. Dentro desses limites - a que poderíamos chamar "a caverna da prática" - encontramos o reino da doxa.A doxa dos participantes de uma prática garante que eles não reconheçam o que estão pensando e fazendo, e que não façam perguntas para as quais não haja uma resposta imediata e "oficial".A imunidade das práticas - e,na verdade,do mundo social como um todo - à reflexão crítica e ao questionamento se ancora, através do habitus, nas autocompreensões dos atores, assegurando o funcionamento e a reprodução da ordem social.

No quadro teórico de Bourdieu,o habitus e o não reconhecimento sistemático desempenham, em dois aspectos, uma função análoga à da ideologia no modelo "ortodoxo". Primeiramente, eles são elementos cruciais na reprodução do status quo e têm de ser analisados desde uma perspectiva funcionalista. Em segundo lugar, o seu funcionamento tem, por razões estruturais, de permanecer opaco aos atores, que estão aprisionados na doxa, e só pode ser desvelado pelo sociólogo que rompe com essa forma incorporada e necessariamente falsa de consciência13 [13 ] Sobre a relação entre não reconhecimento, dominação simbólica e ideologia, cf. Bourdieu, P. e Eagleton, T. "Doxa and common life. An interview". In: Zizek, S. (org.). Mapping ideology. Londres: Verso, 1994, pp. 265-77; Wacquant, L."De l'idéologie àla violence symbolique". In: Lojkine, J. (org.). Les sociologies critiques du capitalisme.Paris: PUF, 2002, pp. 25-40; Voirol, O. "Reconnaissanceet méconnaissance". Informations sur les sciences sociales, vol.43,nº3,2004,pp.403-33. . O sistema semi-ideológico de convicções e disposições que constitui o habitus é ao mesmo tempo necessário e adequado de um ponto de vista objetivo e falso, já que se baseia em um fundamental não reconhecimento de suas próprias condições, causas e efeitos.

O que Bourdieu denomina dominação simbólica - uma forma de dominação que é bem-sucedida em ocultar o seu caráter dominante - se baseia tão somente no reconhecimento que lhe é conferido pelo dominado, mas esse (não) reconhecimento está enraizado na "imposição dissimulada (e, portanto, não reconhecida) de sistemas de classificação e estruturas mentais que são objetivamente ajustados a estruturas sociais"14 [14 ] Bourdieu, P. Language and Symbolic Power. Cambridge-MA: Harvard University Press,1991,p.169. e,por serem parte do habitus,estão realmente protegidos contra serem postos em questão.De acordo com Bourdieu,os atores são cúmplices na (re)produção de sua própria dominação, mas lhes é impossível chegar a uma compreensão adequada desse processo, para assim transformá-lo, porque ele parece constituir um círculo vicioso: "1. O sistema se reproduz porque não é reconhecido. 2. Por reproduzir-se, o sistema produz o efeito do não reconhecimento"15 [15 ] Rancière, J. "L'éthique de la sociologie". In: Rancière, J. Les scènes du peuple. Paris: Horlieu,2003,p.367. . Tendo praticamente bloqueado, assim, o acesso cognitivo dos atores "ordinários" à realidade social,o sociólogo "se instala em uma posição de eterno denunciante de um sistema que é capaz de mascarar-se eternamente em relação a seus sujeitos"16 [16 ] Ibidem. Para uma defesa da posição de Bourdieu, cf. Gautier, C. "Critique sociologique et sens commun". In: Gautier, C. e Laugier, S. (orgs.). Normativités du sens commun. Paris:PUF, 2009, pp.419-45, e a contribuição de Christian Lazzeri para o livro Recognition theory and contemporary french moral and political philosophy...,op. cit. .

A SOCIOLOGIA DA CRÍTICA E O RECONHECIMENTO DOS ATORES "ORDINÁRIOS"

Em contraste com a subestimação das capacidades reflexivas dos atores e a superestimação do conhecimento sociológico que são características do modelo de ciência social crítica proposto por Bourdieu, a sociologia da crítica começa supondo uma simetria básica entre agentes "ordinários" e sociólogos "profissionais". Ela rejeita o imperativo metodológico de uma ruptura com a perspectiva dos participantes e enfatiza a reflexividade envolvida e requerida nas práticas sociais cotidianas.Podemos caracterizar a estrutura teórica e metodológica dessa abordagem através dos quatro princípios a seguir17 [17 ] Cf. Nachi, M. Introduction à la sociologie pragmatique. Paris: Armand Colin,2006, cap.1. Quanto à relação entre a sociologia crítica e a sociologia da crítica ,cf. Bénatouil, T. "Atale of two sociologies". European Journal of Social Theory,vol.2,nº3,1999,pp. 379-96. :

Princípio da simetria:a rejeição da ruptura que é constitutiva para o modelo ortodoxo da ciência social crítica anda lado a lado com o reconhecimento da "simetria entre, de um lado, as linguagens descritivas ou princípios explicativos empregados pelas ciências sociais e, de outro, os modos de justificação ou crítica empregados pelos atores"18 [18 ] Boltanskie Thévenot, On justification, op. cit., p.11. Sobre o potencial crítico do senso comum, cf. também Anderson, E. Value in ethics and economics. Cambridge-ma: Harvard University Press, 1993, cap.5. .

Princípio do pluralismo: a rejeição da ideia de um círculo vicioso de não reconhecimento e reprodução do status quo anda lado a lado com o reconhecimento de uma pluralidade de modos de ação (ao ver de Boltanski: violência, amor, rotina e justificação), bem como da pluralidade interna desses modos de ação,em especial o metarregime de justificação.

Princípio das capacidades reflexivas: a rejeição da compreensão dos agentes "ordinários" como "idiotas desprovidos de juízo" anda lado a lado com o reconhecimento de suas capacidades reflexivas e, mais genericamente, "daquilo de que as pessoas são capazes" (ce dont les gens sont capables)19 [19 ] Cf. Boltanski, L. L'amour et la justice comme compétences. Paris: Métailié, 1990, parteI. .

Princípio das gramáticas do consenso:a rejeição da ideia de que as regras do jogo social se imponham pelas costas dos atores ignorantes anda lado a lado com o reconhecimento de que os próprios atores têm de negociar e renegociar constantemente essas regras, coordenando suas ações em contextos sociais concretos e produzindo críticas efetivas uns dos outros, assim como justificações aceitáveis.

Nos conflitos da vida cotidiana, atores "ordinários" fornecem ampla evidência de sua capacidade para assumir diferentes pontos de vista, distanciar-se da situação e envolver-se em complexos discursos de crítica e justificação. A fragilidade da ordem social e a pluralidade de regimes de justificação tanto possibilitam quanto exigem dos atores que ajam de um modo reflexivo e crítico. Assim, eles não apenas têm de possuir um "senso prático" incorporado,mas também certo tipo de maestria na "arte de viver em diferentes mundos"20 [20 ] Boltanskie Thévenot, On justification, op. cit., p.148. que lhes permita orientar-se em contextos sociais heterogêneos e espaços argumentativos que só se sobrepõem parcialmente:

A habilidade para desligar-se do contexto imediato, para sair da confusão daquilo que é presente [...] constitui a habilidade mínima que os seres humanos têm de possuir se querem envolver-se em situações sem perder-se inteiramente nelas

21 [21 ] Ibidem, p. 146. Cf. também Boltanski, L'amour et la justice comme compétences, op. cit., p.74.

.

No interior das práticas de crítica e justificação, e de seus repertórios de argumentação social e culturalmente mediados, os agentes podem fazer referência a uma pluralidade de ordens normativas e regimes de justificação22 [22 ] Boltanskie Thévenot, On justification, op. cit., p.235. . Tanto a possibilidade como a necessidade da crítica dependem não apenas dessa pluralidade e dos conflitos que vêm com ela,mas também da "força factual do normativo" - a eficácia das expectativas normativas - e da "força normativa do factual" - a permanente frustração dessas expectativas.

Para ser válida, a crítica tem de ser capaz de justificar-se a si mesma,

i.e. esclarecer os fundamentos normativos que a sustentam, especialmente quando confrontada com as justificações que aqueles que estão sujeitos à crítica fornecem para suas ações. Assim, ela continua a referir-se à justiça, pois, se a justiça for uma ilusão, qual o sentido de criticar? Por outro lado, no entanto, a crítica apresenta um mundo em que a exigência de justiça é incessantemente violada. Ela desmascara a hipocrisia das pretensões morais que ocultam a realidade das relações de força, exploração e dominação

23 [23 ] Boltanski, L.e Chiapello, E. The new spirit of capitalism. Londres: Verso, 2005, p.18.

.

A pluralidade de regimes de justificação e a permanente possibilidade de tensões entre eles abrem dois caminhos para a crítica social que são corriqueiramente tomados pelos agentes "ordinários" no curso de suas vidas cotidianas. O primeiro tipo de crítica aceita o regime de justificação em questão (e o tipo de "teste" que vem com ele) e coloca em questão a sua aplicação a uma situação concreta - ele pode, portanto, ser entendido como um tipo de crítica interna ou reformista. O segundo tipo de crítica coloca em questão, como inadequado à situação, o próprio regime de justificação, sendo assim mais radical:

A primeira [forma de crítica] é

corretiva

em sua intenção:uma crítica que revela aqueles aspectos [...] que infringem a justiça e, em particular, as forças mobilizadas por alguns dos protagonistas sem que os demais tenham ciência disso [...].Uma segunda maneira de fazer a crítica [...] pode ser dita

radical. Nesta instância, já não se trata de corrigir as condições do teste com vistas a torná-lo mais justo, mas de suprimi-lo e, no fim das contas,substituí-lo por um teste diferente

24 [24 ] Ibidem, pp. 32-3. Cf. também Boltanskie Thévenot, On justification, op. cit., pp. 219-25.

.

Essas duas formas de crítica não devem ser entendidas como sintomas de uma sociologia espontânea e ingênua, como sugere Bourdieu, mas antes como uma espécie muito elaborada de "sociologia popular" que também mobiliza recursos teóricos introduzidos no discurso social pela sociologia:

Quando se trata de questionar ideologias e representações sociais, devem ser asseguradas a todos os seres humanos as mesmas capacidades elementares dos cientistas sociais. Deve ser reconhecido que aquilo que as ciências sociais produzem já está incluído no círculo hermenêutico da sociedade

25 [25 ] Chiapello, E. "Reconciling the two principal meanings of the notion of ideology". European Journal of Social Theory,vol.6,nº2,2003,p.157.

.

Dessa descrição do mundo social se segue uma máxima metodológica que é a um só tempo simples e desafiadora: "siga os próprios atores". Os sociólogos têm de seguir os atores "ordinários" em suas ações, interpretações e avaliações porque são estes que possuem conhecimento relevante sobre o mundo social. Eles já não devem ser considerados como meros informantes produzindo dados adicionais, mas sim como sociólogos leigos produzindo interpretações e explicações do que estão fazendo que não são nem um pouco menos sofisticadas do que aquelas de seus colegas profissionais26 [26 ] Cf. Latour, B. Reassembling the social. Oxford: Oxford University Press, 2005, Introd.; e Boltanski, L'amour et la justice comme compétences, op. cit., cap.I.3. . Em contraste com o modelo de Bourdieu, o sociólogo é agora entendido como estando sempre, em certo sentido, um pouquinho atrasado. Sua única chance de ganhar algum terreno é levar os atores a sério e analisar as suas práticas de crítica e justificação sem impor um quadro teórico que os transforme em "idiotas desprovidos de juízo". A sociologia da crítica tenta seguir essa máxima em três níveis: no nível da pragmática, ela analisa práticas efetivas de crítica e justificação; no nível da "gramática",ela analisa as regras e condições às quais os atores têm de aderir de modo a participar de maneira bem-sucedida dessas práticas;e no nível da "tópica" ela analisa os repertórios de argumentação e os modos de falar que os atores empregam em diferentes contextos sociais.Apesar, contudo, das promissoras perspectivas abertas por essa abordagem, temos de perguntar: é suficientemente complexa a análise proposta pela sociologia da crítica?

Partir do "fato" da crítica e da justificação, como faz a sociologia da crítica, envolve fazer duas suposições consideravelmente fortes em relação às condições desse "fato". As condições "subjetivas" das práticas de justificação e crítica são as capacidades e competências que os atores se atribuem mutuamente e que o sociólogo também tem de atribuir a eles de modo a entender o que estão fazendo. As condições "objetivas" consistem na existência de um metarregime de justificação e de uma pluralidade de regimes de justificação a que os atores podem referir-se quando se dedicam à crítica corretiva ou radical. Mas será que podemos realmente pressupor que as condições subjetivas e objetivas das práticas de crítica - e, portanto, o ponto de partida da sociologia da crítica - estão dados na realidade social? Não há condições sociais sob as quais as capacidades reflexivas dos atores são bloqueadas ou reprimidas? A sociologia da crítica parece excluir a possibilidade de uma distribuição desigual, ou de restrições estruturais, da capacidade de distanciamento do próprio contexto e de envolvimento com a crítica. E esta é, contudo, uma possibilidade que uma abordagem sociológica com foco nas capacidades reflexivas deveria levar a sério. De modo similar, ela teria de levar em conta, no que diz respeito às condições "objetivas" das práticas sociais de justificação e crítica,a possibilidade de que certos contextos sociais sejam eficazmente blindados contra a pressão da justificação, e de que certos discursos hegemônicos de justificação suprimam recursos alternativos de argumentação.Essas são formas de reduzir significativamente as possibilidades de crítica disponíveis em uma sociedade.Em poucas palavras,as condições subjetivas e objetivas das práticas de crítica podem ser restringidas de maneiras que não podem ser ignoradas caso a teoria social queira conservar sua relevância prática27 [27 ] Cf. também Honneth, A. "Verflüssigungen desSozialen". WestEnd. Neue Zeitschrift für Sozialforschung, vol. 5, nº2, 2008, pp. 84-103. .

A TEORIA CRÍTICA E AS "PATOLOGIAS DE SEGUNDA ORDEM"

A sociologia da crítica se vê,assim,confrontada com um duplo problema. Seu ponto focal parece muito restrito: limitar-se aos discursos críticos que já são parte do "círculo hermenêutico da sociedade" implica excluir formas de crítica que são ao mesmo tempo mais teóricas e mais radicais.Conforme o próprio Boltanski sublinhou recentemente, os atores são muitas vezes "realistas" e se adaptam ao que consideram possível, eventualmente "fechando os olhos" para o que lhes parece fora de lugar. Se a crítica deve ir além desse viés realista - e, portanto, além das formas ordinárias e estabelecidas de crítica -, ela necessita de uma Teoria Crítica que permita construir uma posição alternativa. "Tornar a realidade inaceitável" (rendre la réalité inacceptable) - mostrando aos atores que ela é inaceitável do ponto de vista deles mesmos - através de uma explicação teórica ou redescrição é,por vezes, o único modo de escapar ao jugo da realidade e à predominância dos "realistas"28 [28 ]Cf. Boltanski, L. De la critique. Paris: Gallimard, 2009; Boltanski, L. Rendre la réalité inacceptable. Paris: Demopolis, 2008; Boltanski, L.e Honneth, A. "Soziologie der Kritik oder Kritische Theorie? Ein Gespräch mit Robin Celikates". In: Jaeggi, R. e Wesche, T. (orgs.). Was ist Kritik? Frankfurt am Main: Suhrkamp, 2009, pp.83-116. . Além disso, como já indiquei, a sociologia da crítica não parece levar em conta as condições sociais do exercício ou da formação das capacidades reflexivas e críticas que pressupõe. A sociologia da crítica não nega,é claro,que os atores adquiram e exercitem suas capacidades no interior de contextos sociais existentes e,portanto,sempre sob determinadas condições sociais. Devido, porém, à sua orientação "situacionista", essa abordagem tende a considerar esses contextos e condições como meros recursos que os atores podem mobilizar,e não como potenciais restrições estruturais às suas capacidades reflexivas e práticas críticas.

Como defendeu o próprio Boltanski, em um artigo escrito com Bourdieu há bastante tempo, a ideia de um "comunismo linguístico", i.e., a crença em uma distribuição igual (de facto) das capacidades comunicativas e da habilidade de fazer-se ouvir parece não ser mais que uma "ilusão"29 [29 ] Boltanski, L. e Bourdieu,P. "Le fétichisme de la langue (etl'illusion ducommunisme linguistique)". Actes de la Recherche en Sciences Sociales,vol. 1,nº4, 1975,pp.2-33. Cf. também Bourdieu, Language and symbolic power,op. cit., p.43. .Dependendo de sua posição social,os atores possuem "voz" e poder social de justificação - poder de demandar justificações e produzi-las - em graus que variam radicalmente. A Teoria Crítica tem,portanto,de perguntar-se sob quais condições sociais - ou,mais especificamente e seguindo Axel Honneth, dentro de quais relações de reconhecimento - os atores podem formar e exercer suas capacidades reflexivas. É precisamente essa a questão que torna necessário ir além do horizonte da sociologia da crítica e reintroduzir o ponto de vista da Teoria Crítica, sem abandonar, contudo, as descobertas teóricas do "igualitarismo metodológico" daquela.

Se certas condições sociais - relações de reconhecimento que são assimétricas, ideológicas ou patológicas, i.e., relações de não reconhecimento30 [30 ] Cf. Honneth, A. "Recognition as ideology". In: Van den Brink, B. e Owen, D.(orgs.). Recognition and power. Cambridge: Cambridge University Press, 2007, pp. 323-47; Celikates, R."Recognition, system justification and reconstructive critique". In: Lazzeri,C. e Nour, S. (orgs.). De l'inclusion.Paris: Presses Universitairesde Paris 10, 2009, pp.85-99. - bloqueiam a formação e o exercício das capacidades reflexivas dos atores, parecemos estar diante de um caso daquilo que pode ser denominado uma "patologia de segunda ordem", que se manifesta na forma de um "déficit reflexivo estrutural" da parte dos atores31 [31 ] Cf. Honneth, A. "Pathologies ofthe social". In: Rasmussen, D. (org.). The handbook of Critical Theory. Oxford: Blackwell, 1996, pp. 369-99; Zurn, C. "Social pathologies as second-order disorders". In: Petherbridge, D. (org.). The critical theory of Axel Honneth. Leiden: Brill, 2011; Fischbach, F. Manifeste pour une philosophie sociale. Paris: La Découverte, 2009, pp. 155-9. . Em tal situação,as condições de primeira ordem que parecem ser problemáticas do ponto de vista normativo - relações de injustiça, exploração, não reconhecimento etc. - não são, em um sentido relevante, acessíveis aos afetados, seja porque não são vivenciadas ou reconhecidas como tal, seja porque são intuitivamente percebidas, mas equivocadamente interpretadas e, por conseguinte, aceitas como legítimas ou naturais. A teoria social deveria perguntar-se, portanto, por que certas situações não são vivenciadas como injustas, alienantes ou envolvendo não reconhecimento, e por que a percepção de uma situação como injusta, alienante ou envolvendo não reconhecimento nem sempre se traduz em uma consciência coletiva correspondente, para não falar em uma ação coletiva transformadora32 [32 ] Cf. Honneth, A. "Moral consciousness and class domination". In: Disrespect. Cambridge: Polity, 2007, pp. 80-96.Cf. também a excelente discussão em Renault, E. L'expérience de l'injustice. Paris: La Découverte, 2004, bem como a contribuição de Christian Lazzeri para o livro Recognition theory and contemporary french moral and political philosophy..., op. cit. .

Uma resposta a essas questões tem de fazer referência aos obstáculos materiais e simbólicos que podem impedir os atores de se engajarem em práticas de crítica. Neste sentido, a aparência ideológica legítima e natural de certas práticas e instituições, i.e., o seu não reconhecimento pelos atores envolvidos, pode ser caracterizado como um fenômeno de segunda ordem. Ele diminui efetivamente a probabilidade de que se reflita criticamente sobre as opiniões,disposições e modos de agir que podem ser situados no primeiro nível, e que embasam essas práticas e instituições. "Patologias de segunda ordem" podem, portanto, ser entendidas como formas de bloquear a avaliação, a crítica e a transformação das "patologias de primeira ordem". Deve-se notar que o diagnóstico das "patologias de segunda ordem" não precisa necessariamente fazer referência a uma concepção substancial de uma vida "normal" ou "saudável". Se essas "patologias" são, em vez disso, entendidas de um modo formal e "negativo",o diagnóstico delas pode basear-se em uma análise das restrições estruturais das capacidades dos atores que resultam de certas relações sociais (de reconhecimento e não reconhecimento).

É crucial que essas restrições sejam em quase todos os casos parciais:que uma capacidade seja restringida,i.e.,que sua formação ou seu exercício sejam bloqueados,não significa que a pessoa afetada seja inteiramente desprovida dela,mas sim que,sob certas condições sociais, ela só a possui em um nível restrito.Sob quase todas as circunstâncias, nós temos de atribuir ao menos capacidades reflexivas elementares aos atores. Além disso, eles mesmos é que julgam, no fim das contas, se estão realmente enfrentando uma "patologia". Os próprios atores têm de entender reflexivamente, com base em sua autocompreensão, que certas condições sociais são inaceitáveis. Para que possa funcionar, portanto, a Teoria Crítica já pressupõe certa receptividade para as suas hipóteses por parte dos atores:

Se os proponentes de uma teoria crítica querem esclarecer e emancipar um grupo de agentes, eles têm de encontrar na experiência, na forma de consciência e na crença

desses

agentes os meios de emancipação e esclarecimento. Se não conseguimos encontrar as experiências apropriadas de sofrimento e frustração,e os princípios de aceitabilidade reflexiva,na vida e na forma de consciência desses agentes, a

Ideologiekritik não pode começar, e nós não temos nenhum direito de chamá-los de "iludidos"

33 [33 ] Geuss, R. The idea of a critical theory. Cambridge: Cambridge University Press,1981,p.65.

.

A tarefa crítica e emancipatória da teoria social está, portanto, em identificar, analisar e criticar, no contexto de um discurso envolvendo os afetados,as condições sociais que impedem ou bloqueiam a formação ou o exercício de suas capacidades reflexivas.Desse ponto de vista, a teoria social crítica é uma reflexão sobre as condições (sociais) de possibilidade da crítica e,nesse sentido,uma forma de "metacrítica"34 [34 ] Cf. também Boltanski, De la critique, op. cit. .

Permitam-me passar agora a um exemplo, de modo a dar alguma substância a essas algo abstratas observações metodológicas. Em As almas da gente negra, o sociólogo e escritor afroamericano W. E. B. Du Bois apresenta uma análise e uma "densa descrição" dos efeitos sociais e psicológicos da "segregação racial", centrando o foco na perda da capacidade de alguém enxergar a si mesmo com os próprios olhos, i.e., sem a mediação do olhar não reconhecedor da população branca. Du Bois vincula o "estranho significado de ser negro" sob essas condições ao fato de os afroamericanos serem "separados"35 [35 ] A expressão de Du Boisque traduzimos por "separados"é shut out. (N. T.) do mundo das pessoas brancas por um "enorme véu"36 [36 ] Du Bois, W. E. B. "The souls of the blackfolk". In : The Oxford W. E. B Du Bois reader. Oxford: Oxford University Press,1996,pp.100-1. . A metáfora do "véu" implica que, para além dos efeitos mais imediatos de ser excluído de certas atividades e lugares (i.e., formas políticas e sociais de exclusão), essa exclusão também repercute na autopercepção dos excluídos e no seu modo de vivenciar o mundo.É claro que Du Bois considera o véu, primariamente, como o testamento da cegueira da população branca, mas também como algo que deforma as capacidades cognitivas e perceptivas dos afroamericanos, impedindo-os de desenvolver uma "verdadeira autoconsciência":

É uma peculiar sensação essa consciência dupla, esse senso de estar sempre olhando para si mesmo através dos olhos de outrem, de medir a própria alma com o metro de um mundo que a vê com tranquilo desprezo e pena.

Essa experiência afeta a integridade física do sujeito:

Não se sente nunca a própria duplicidade - um americano,um negro; duas almas, dois pensamentos, dois esforços irreconciliáveis; dois ideais conflitantes em um corpo escuro que só não sucumbe devido à sua obstinada força

37 [37 ] Ibidem,p.102.

.

O "duplo eu" é "deficiente", e uma atmosfera social repressiva e cheia de preconceito o empurra para um permanente "autoquestionamento, autodepreciação"38 [38 ] Ibidem,pp.102,105. . As "almas aprisionadas no véu" vivem em "dois mundos separados", e a sua consciência dúplice, individual e coletiva, não lhes permite ter a autoconfiança epistêmica e prática que é básica para o seu agir39 [39 ] Ibidem,pp.147,150. .Sob essas condições de um não reconhecimento institucionalizado e estrutural, os atores são impedidos de desenvolver ou exercitar as suas capacidades reflexivas. Essas deformações podem resultar em "feridas ontológicas, cicatrizes psíquicas e hematomas existenciais"40 [40 ] West,C. "Black strivingsina twilight civilization". In: West, C. The Cornel West reader. Nova York: Basic Civitas Books,1999,p.102. . A permanente experiência de ser classificado e tratado como uma "semipessoa", com capacidades cognitivas reduzidas, não permite aos afetados distanciar-se do mundo social de que dependem - ainda mais por estarem excluídos da ontologia social dominante41 [41 ] Sobre os efeitos de uma experiência pessoal da "subpessoalidade", cf. Mills, C. Blackness visible. Ithaca: Cornell University Press, 1998, cap.1. .

Como é bem sabido, Du Bois julgava que seria necessária uma avant-garde cultural (os conhecidos "10% talentosos" ) para iniciar um processo de emancipação agindo em nome e no verdadeiro interesse das massas mal-educadas.Sua solução revela as tentações do elitismo e os perigos do paternalismo epistemológico e político que são inerentes ao diagnóstico dos déficits estruturais de reflexividade e das "patologias de segunda ordem".Mesmo que esses déficits e patologias não se identifiquem com uma incapacidade de refletir, a problemática solução de Du Bois ilustra um dilema com que a Teoria Crítica se defronta em todas as suas variantes.Como observou Henry Louis Gates em relação à crítica do colonialismo:

Você pode fortalecer discursivamente o nativo e se arriscar às acusações de subestimar a violência epistêmica (e literal) do colonialismo; ou pode superestimar a natureza absoluta da dominação colonial e arriscar-se às acusações de negar a subjetividade e a capacidade de agir dos colonizados, repetindo assim, no texto, as operações repressivas do colonialismo

42 [42 ] Gates,H.L. "Criticalfanonism". Critical Inquiry, vol.17, nº3, 1991,p.462.

.

Para ser fiel ao seu intuito emancipatório, a Teoria Crítica tem de evitar a "armadilha da incapacitação", i.e., o perigo de restringir ainda mais as capacidades dos atores através do seu diagnóstico; mas ela acaba por cair inevitavelmente nessa tensão43 [43 ] Cf. Bader, V. "Misrecognition, power, and democracy". In: Van den Brink, e Owen (orgs.), Recognition and power,op.cit.,pp.258-9. . O único modo de levar essa tensão em conta é insistir que as restrições estruturais das capacidades reflexivas dos atores têm de ser diagnosticadas e trazidas a um diálogo entre os teóricos críticos e os atores sociais - um diálogo que, até certo ponto, já pressupõe as próprias capacidades que são restringidas. Ao mesmo tempo, o "igualitarismo metodológico" e o "princípio da simetria", que são de fundamental importância para uma concepção não paternalista e não autoritária da Teoria Crítica, não podem esconder as assimetrias em termos de poder,conhecimento,influência e capacidades argumentativas que podem ser explicadas por déficits estruturais de reflexividade.Como quer que essas assimetrias sejam compreendidas, o seu diagnóstico não pode ser validado a partir da posição supostamente privilegiada do sociólogo observador; elas constituem sempre uma hipótese a ser empiricamente verificada em um discurso envolvendo os concernidos.O próprio diagnóstico - e, mais especificamente, a sua falsificação e verificação - está intimamente ligado à autocompreensão dos atores e não pode ser avaliado independentemente desta.

Em vez de dedicar-se a uma crítica substancial e normativa daquelas autocompreensões que considera falsas, a Teoria Crítica deveria limitar-se a identificar e analisar as restrições das capacidades reflexivas dos atores que conduzem a distorções sistemáticas do processo social em que tais autocompreensões são formuladas e reformuladas. Isso torna necessário levar em conta as condições "macropolíticas" do reconhecimento institucionalizado e estrutural44 [44 ] Cf. também Deranty, J.-P.e Renault, E. "Politicizing Honneth's ethics of recognition". Thesis Eleven, vol.88,nº1,2007,pp.92-111. . Uma vez que a teoria social focaliza as condições sociais - aquelas relações de reconhecimento assimétrico ou não reconhecimento - que funcionam como "patologias de segunda ordem", bloqueando as práticas sociais de crítica,ela pode ser entendida como uma crítica de segunda ordem: uma espécie de metacrítica voltada a restabelecer as condições sociais da crítica, a torná-las acessíveis às práticas reflexivas e transformadoras dos próprios atores. "Aquilo de que as pessoas são capazes" (ce dont les gens sont capables) é, portanto, a um só tempo o ponto de partida e o objetivo da Teoria Crítica. A ideia condutora por trás dessa concepção ainda é, talvez, melhor captada pelo jovem Marx:"Assim,nós podemos expressar o objetivo de nosso periódico em uma frase: uma autocompreensão (filosofia crítica) da época envolvendo suas lutas e aspirações"45 [45 ] Marx, K. Writings of the young Marx on philosophy and society. Indianapolis: Hackett,1997,p.215. .

Recebido para publicação em 4 de setembro de 2011.

Robin Celikates é professor de filosofia política e social na Universidade de Amsterdam.

  • [*] Publicado originalmente em: Bankowsky, M. e Le Goff, A. (orgs.). Recognition theory and contemporary french moral and political philosophy: reopening the dialogue (reappraising the political) Manchester: Manchester University Press, 2012.
  • [3] Boltanski, L.eThévenot, L.On justification. Princeton: Princeton University Press, 2006, p.15.
  • [7] Bourdieu, P., Chamboredon, J.-C. e Passeron, J.-C.The craft of sociology. Berlim: W. de Gruyter,1991,p.13.
  • [10] Bourdieu, P. Outline of a theory of practice. Cambridge: Cambridge University Press,1977,p.79.
  • [13] Sobre a relação entre não reconhecimento, dominação simbólica e ideologia, cf. Bourdieu, P. e Eagleton, T. "Doxa and common life. An interview". In: Zizek, S. (org.). Mapping ideology. Londres: Verso, 1994, pp. 265-77; Wacquant, L."De l'idéologie àla violence symbolique". In: Lojkine, J. (org.). Les sociologies critiques du capitalisme.Paris: PUF, 2002, pp. 25-40;
  • Voirol, O. "Reconnaissanceet méconnaissance". Informations sur les sciences sociales, vol.43,nş3,2004,pp.403-33.
  • [14] Bourdieu, P. Language and Symbolic Power. Cambridge-MA: Harvard University Press,1991,p.169.
  • [15] Rancière, J. "L'éthique de la sociologie". In: Rancière, J. Les scènes du peuple. Paris: Horlieu,2003,p.367.
  • [23] Boltanski, L.e Chiapello, E. The new spirit of capitalism. Londres: Verso, 2005, p.18.
  • [25] Chiapello, E. "Reconciling the two principal meanings of the notion of ideology". European Journal of Social Theory,vol.6,nş2,2003,p.157.
  • [28]Cf. Boltanski, L. De la critique. Paris: Gallimard, 2009; Boltanski, L. Rendre la réalité inacceptable. Paris: Demopolis, 2008; Boltanski, L.e Honneth, A. "Soziologie der Kritik oder Kritische Theorie? Ein Gespräch mit Robin Celikates". In: Jaeggi, R. e Wesche, T. (orgs.). Was ist Kritik? Frankfurt am Main: Suhrkamp, 2009, pp.83-116.
  • [29] Boltanski, L. e Bourdieu,P. "Le fétichisme de la langue (etl'illusion ducommunisme linguistique)". Actes de la Recherche en Sciences Sociales,vol. 1,nş4, 1975,pp.2-33.
  • [30] Cf. Honneth, A. "Recognition as ideology". In: Van den Brink, B. e Owen, D.(orgs.). Recognition and power. Cambridge: Cambridge University Press, 2007, pp. 323-47; Celikates, R."Recognition, system justification and reconstructive critique". In: Lazzeri,C. e Nour, S. (orgs.). De l'inclusion.Paris: Presses Universitairesde Paris 10, 2009, pp.85-99.
  • [31] Cf. Honneth, A. "Pathologies ofthe social". In: Rasmussen, D. (org.). The handbook of Critical Theory. Oxford: Blackwell, 1996, pp. 369-99; Zurn, C. "Social pathologies as second-order disorders". In: Petherbridge, D. (org.). The critical theory of Axel Honneth. Leiden: Brill, 2011;
  • Fischbach, F. Manifeste pour une philosophie sociale Paris: La Découverte, 2009, pp. 155-9.
  • [33] Geuss, R. The idea of a critical theory. Cambridge: Cambridge University Press,1981,p.65.
  • [36] Du Bois, W. E. B. "The souls of the blackfolk". In: The Oxford W. E. B Du Bois reader. Oxford: Oxford University Press,1996,pp.100-1.
  • [40] West,C. "Black strivingsina twilight civilization". In: West, C. The Cornel West reader. Nova York: Basic Civitas Books,1999,p.102.
  • [42] Gates,H.L. "Criticalfanonism". Critical Inquiry, vol.17, nş3, 1991,p.462.
  • [45] Marx, K. Writings of the young Marx on philosophy and society. Indianapolis: Hackett,1997,p.215.
  • [*
    ] Publicado originalmente em: Bankowsky, M. e Le Goff, A. (orgs.).
    Recognition theory and contemporary french moral and political philosophy: reopening the dialogue (reappraising the political). Manchester: Manchester University Press, 2012.
  • [1
    ] Celikatesusa a expressão"judgmental dopes", que traduzimos por "idiotas desprovidos de juízo".(N.T.)
  • [2
    ] Cf. Garfinkel, H.
    Studies in ethno-methodology. Cambridge: Polity,1984, pp.67-73.
  • [3
    ] Boltanski, L.eThévenot, L.
    On justification. Princeton: Princeton University Press, 2006, p.15.
  • [4
    ] Para uma discussão mais detalhada dessas questões, cf. Celikates, R.
    Kritik als soziale Praxis. Frankfurt am Main: Campus, 2009.
  • [5
    ] Cf. a excelente introdução de Rosen, M.
    On voluntary servitude: false consciousness and the theory and ideology. Cambridge: Polity, 1996.
  • [6
    ] Cf. Giddens, A.
    The constitution of society. Berkeley: University of California Press, p. xvi: o modelo ortodoxo tem por premissa a compreensão da ação social como "o resultado de forças que os atores nem controlam nem compreendem". Para uma compreensão alternativa, não ortodoxa, da críticada ideologia, cf. Jaeggi, R. "Rethinking ideology". In: de Bruin, B.e Zurn, C.F.(orgs.).
    New waves in political philosophy. Houndmills: Palgrave Macmillan,2009,pp.63-86.
  • [7
    ] Bourdieu, P., Chamboredon, J.-C. e Passeron, J.-C.
    The craft of sociology. Berlim: W. de Gruyter,1991,p.13.
  • [8
    ] Ibidem,p.24.
  • [9
    ] Ibidem.
  • [10
    ] Bourdieu, P.
    Outline of a theory of practice. Cambridge: Cambridge University Press,1977,p.79.
  • [11
    ] Cf. Bourdieu, P.
    Pascalian meditations. Stanford: Stanford University Press, 2000, pp.188-202.
  • [12
    ] Bourdieu,
    Outline of a theory of practice,op.cit.,p.183.
  • [13
    ] Sobre a relação entre não reconhecimento, dominação simbólica e ideologia, cf. Bourdieu, P. e Eagleton, T. "Doxa and common life. An interview". In: Zizek, S. (org.).
    Mapping ideology. Londres: Verso, 1994, pp. 265-77; Wacquant, L."De l'idéologie àla violence symbolique". In: Lojkine, J. (org.).
    Les sociologies critiques du capitalisme.Paris: PUF, 2002, pp. 25-40; Voirol, O. "Reconnaissanceet méconnaissance".
    Informations sur les sciences sociales, vol.43,nº3,2004,pp.403-33.
  • [14
    ] Bourdieu, P.
    Language and Symbolic Power. Cambridge-MA: Harvard University Press,1991,p.169.
  • [15
    ] Rancière, J. "L'éthique de la sociologie". In: Rancière, J.
    Les scènes du peuple. Paris: Horlieu,2003,p.367.
  • [16
    ] Ibidem. Para uma defesa da posição de Bourdieu, cf. Gautier, C. "Critique sociologique et sens commun". In: Gautier, C. e Laugier, S. (orgs.).
    Normativités du sens commun. Paris:PUF, 2009, pp.419-45, e a contribuição de Christian Lazzeri para o livro
    Recognition theory and contemporary french moral and political philosophy...,op. cit.
  • [17
    ] Cf. Nachi, M.
    Introduction à la sociologie pragmatique. Paris: Armand Colin,2006, cap.1. Quanto à relação entre a sociologia crítica e a sociologia da crítica ,cf. Bénatouil, T. "Atale of two sociologies".
    European Journal of Social Theory,vol.2,nº3,1999,pp. 379-96.
  • [18
    ] Boltanskie Thévenot,
    On justification, op. cit., p.11. Sobre o potencial crítico do senso comum, cf. também Anderson, E.
    Value in ethics and economics. Cambridge-ma: Harvard University Press, 1993, cap.5.
  • [19
    ] Cf. Boltanski, L.
    L'amour et la justice comme compétences. Paris: Métailié, 1990, parteI.
  • [20
    ] Boltanskie Thévenot,
    On justification, op. cit., p.148.
  • [21
    ] Ibidem, p. 146. Cf. também Boltanski,
    L'amour et la justice comme compétences, op. cit., p.74.
  • [22
    ] Boltanskie Thévenot,
    On justification, op. cit., p.235.
  • [23
    ] Boltanski, L.e Chiapello, E.
    The new spirit of capitalism. Londres: Verso, 2005, p.18.
  • [24
    ] Ibidem, pp. 32-3. Cf. também Boltanskie Thévenot,
    On justification, op. cit., pp. 219-25.
  • [25
    ] Chiapello, E. "Reconciling the two principal meanings of the notion of ideology".
    European Journal of Social Theory,vol.6,nº2,2003,p.157.
  • [26
    ] Cf. Latour, B.
    Reassembling the social. Oxford: Oxford University Press, 2005, Introd.; e Boltanski,
    L'amour et la justice comme compétences, op. cit., cap.I.3.
  • [27
    ] Cf. também Honneth, A. "Verflüssigungen desSozialen".
    WestEnd. Neue Zeitschrift für Sozialforschung, vol. 5, nº2, 2008, pp. 84-103.
  • [28
    ]Cf. Boltanski, L.
    De la critique. Paris: Gallimard, 2009; Boltanski, L.
    Rendre la réalité inacceptable. Paris: Demopolis, 2008; Boltanski, L.e Honneth, A. "Soziologie der Kritik oder Kritische Theorie? Ein Gespräch mit Robin Celikates". In: Jaeggi, R. e Wesche, T. (orgs.).
    Was ist Kritik? Frankfurt am Main: Suhrkamp, 2009, pp.83-116.
  • [29
    ] Boltanski, L. e Bourdieu,P. "Le fétichisme de la langue (etl'illusion ducommunisme linguistique)".
    Actes de la Recherche en Sciences Sociales,vol. 1,nº4, 1975,pp.2-33. Cf. também Bourdieu,
    Language and symbolic power,op. cit., p.43.
  • [30
    ] Cf. Honneth, A. "Recognition as ideology". In: Van den Brink, B. e Owen, D.(orgs.).
    Recognition and power. Cambridge: Cambridge University Press, 2007, pp. 323-47; Celikates, R."Recognition, system justification and reconstructive critique". In: Lazzeri,C. e Nour, S. (orgs.).
    De l'inclusion.Paris: Presses Universitairesde Paris 10, 2009, pp.85-99.
  • [31
    ] Cf. Honneth, A. "Pathologies ofthe social". In: Rasmussen, D. (org.).
    The handbook of Critical Theory. Oxford: Blackwell, 1996, pp. 369-99; Zurn, C. "Social pathologies as second-order disorders". In: Petherbridge, D. (org.).
    The critical theory of Axel Honneth. Leiden: Brill, 2011; Fischbach, F.
    Manifeste pour une philosophie sociale. Paris: La Découverte, 2009, pp. 155-9.
  • [32
    ] Cf. Honneth, A. "Moral consciousness and class domination". In:
    Disrespect. Cambridge: Polity, 2007, pp. 80-96.Cf. também a excelente discussão em Renault, E.
    L'expérience de l'injustice. Paris: La Découverte, 2004, bem como a contribuição de Christian Lazzeri para o livro
    Recognition theory and contemporary french moral and political philosophy..., op. cit.
  • [33
    ] Geuss, R.
    The idea of a critical theory. Cambridge: Cambridge University Press,1981,p.65.
  • [34
    ] Cf. também Boltanski,
    De la critique, op. cit.
  • [35
    ] A expressão de Du Boisque traduzimos por "separados"é
    shut out. (N. T.)
  • [36
    ] Du Bois, W. E. B. "The souls of the blackfolk". In
    : The Oxford W. E. B Du Bois reader. Oxford: Oxford University Press,1996,pp.100-1.
  • [37
    ] Ibidem,p.102.
  • [38
    ] Ibidem,pp.102,105.
  • [39
    ] Ibidem,pp.147,150.
  • [40
    ] West,C. "Black strivingsina twilight civilization". In: West, C.
    The Cornel West reader. Nova York: Basic Civitas Books,1999,p.102.
  • [41
    ] Sobre os efeitos de uma experiência pessoal da "subpessoalidade", cf. Mills, C.
    Blackness visible. Ithaca: Cornell University Press, 1998, cap.1.
  • [42
    ] Gates,H.L. "Criticalfanonism".
    Critical Inquiry, vol.17, nº3, 1991,p.462.
  • [43
    ] Cf. Bader, V. "Misrecognition, power, and democracy". In: Van den Brink, e Owen (orgs.),
    Recognition and power,op.cit.,pp.258-9.
  • [44
    ] Cf. também Deranty, J.-P.e Renault, E. "Politicizing Honneth's ethics of recognition".
    Thesis Eleven, vol.88,nº1,2007,pp.92-111.
  • [45
    ] Marx, K.
    Writings of the young Marx on philosophy and society. Indianapolis: Hackett,1997,p.215.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Set 2012
    • Data do Fascículo
      Jul 2012

    Histórico

    • Recebido
      04 Set 2011
    Centro Brasileiro de Análise e Planejamento Rua Morgado de Mateus, 615, CEP: 04015-902 São Paulo/SP, Brasil, Tel: (11) 5574-0399, Fax: (11) 5574-5928 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: novosestudos@cebrap.org.br