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CONTRIBUIÇÃO À CRÍTICA DA POLÍTICA INDUSTRIAL NO BRASIL ENTRE 2004 E 2014

Contribution to the Critique of Brazilian Industrial Policy (2004-2014)

RESUMO

Partindo da apresentação das três modalidades de ativismo estatal que predominaram no Brasil desde os anos 1930, este artigo analisa as políticas industriais formuladas e implementadas entre 2004 e 2014. Argumenta a favor de uma política industrial vertical e seletiva, priorizando setores capazes de difundir progresso técnico e inovações para toda a estrutura produtiva, e advoga a necessidade de fortalecimento e reorientação institucional da estrutura de governança da política industrial.

PALAVRAS-CHAVE:
política industrial; novo ativismo estatal; Brasil

ABSTRACT

Beginning from the presentation of the three different forms of state activism in Brazil throughout the twenties and twenties one, this paper aims to analyze the industrial policy formulation and implementation processes in the renewed state activism of the last twenty years. It argues in favor of a selective industrial policy, capable of innovation and productivity dissemination throughout all sectors.

KEYWORDS:
industrial policies; new state activism; Brazil

Há coisas que se podem fazer pela metade,

mas enfrentar o mar pede a nossa alma toda inteira.

Era o que dizia tio Jaime.

Mia Couto, O beijo da palavrinha

APRESENTAÇÃO

Uma primeira versão deste artigo foi elaborada quatro anos atrás,1 1 Optei por manter como referência temporal o artigo de julho de 2018, momento em que ele foi efetivamente preparado para submissão à revista Novos Estudos. A ideia foi não perder de vista seus dois contextos de produção: início das campanhas eleitorais de 2014 e 2018. para a Fundação João Mangabeira, na forma de texto para discussão e subsídio ao programa de governo do então candidato à Presidência Eduardo Campos.2 2 Aproveito para agradecer a Si­noel Batista e a Monika Dowbor, que avaliaram as primeiras e as últimas versões deste trabalho, discutiram-nas comigo e deram importantes contribuições e sugestões. Seu objetivo era discutir a política industrial (PI) brasileira. Agora, em novo momento de escolha do líder máximo da sociedade brasileira, retomo-o, revisando sua forma e atua­lizando a discussão, mas mantendo seu argumento central. Acredito que, uma vez passado o furacão em cujo olho ainda estamos, discutir os processos de formulação e implementação de PIs seja algo atual e importante, entre outros motivos apontados a seguir, porque tal questão passa pela sociedade que queremos construir.

O presente artigo assume o pressuposto de que uma PI que priorize setores e tenha a inovação e o desenvolvimento tecnológico como eixo central é necessária, desejável e legítima para o Brasil.3 3 Esse pressuposto não é consensual no debate econômico. Para outras argumentações, sugiro Ferreira e Hamdan (2003) e Canêdo-PInheiro et al. (2007). A PI pode ser definida como um conjunto integrado de políticas públicas voltadas a promover a transformação industrial e criar capacidade em um conjunto de setores-chave da economia, mediante diferentes mecanismos e instrumentos (Amsden, 2009_______. A ascensão do “resto”. São Paulo: Editora Unesp, 2009.). Os mecanismos e instrumentos empregados variam conforme os objetivos da PI, assim como os critérios para a seleção de setores variam conforme a capacidade institucional do Estado, as prioridades da sociedade e as características da estrutura produtiva e da inserção internacional da economia. Exemplos desses critérios são a geração de emprego e renda, a incorporação de valor agregado, a diminuição do déficit da balança de pagamentos e/ou a difusão de progresso técnico e inovações. Defendo que o critério mais apropriado atualmente para a economia brasileira é a priorização de setores e atividades capazes de difundir progresso técnico e inovações, dadas sua inserção transversal na estrutura produtiva e a ampliação da competitividade de toda a economia.

Uma PI bem-sucedida leva à mudança socioeconômica e política da sociedade, tendo muito pouco a ver com as noções de equilíbrio próprias da economia ortodoxa.4 4 A noção de desenvolvimento disso derivada centra-se na diversificação produtiva e na mudança socioeconômica, estando em oposição às visões mais tradicionais de desenvolvimento, fundamentadas nas ideias de crescimento ou ganhos de produtividade. Ver Jacobs (1970), Furtado (2000), Sen (2000), Evans (2004) e Nelson e Winter (2005). A PI fomenta as mudanças econômico-social e política ao promover, pactuar e estabelecer diretrizes para os processos de transformação industrial, criando e destruindo, fortalecendo e enfraquecendo agentes econômicos e não econômicos. Seus resultados ultrapassam a transformação da estrutura produtiva, atingindo também a estrutura redistributiva e o equilíbrio de poder (Evans, 2004Evans, Peter. Autonomia e parceria: Estados e transformação industrial. Rio de Janeiro: UFRJ/FDC/Funcex, 2004.). Esse é um dos motivos de a construção de consensos em torno de formatos específicos de PIs ser tão problemática: mesmo vencida a barreira à adoção de uma PI vertical (setorialmente seletiva) em detrimento de uma PI horizontal (considerada, a partir daqui, uma anti-PI), restam importantes questões sobre que setores priorizar e quais mecanismos e instrumentos utilizar.

A PI está diretamente relacionada com outras políticas, notadamente a macroeconômica e a de ciência, tecnologia e inovação (CT&I). Embora não se resuma a nenhuma delas, na medida em que pode convergir com elas ou divergir delas, seus resultados são por elas maximizados ou minimizados. Por exemplo, políticas macroeconômicas excessivamente restritivas e voltadas para o combate à inflação via câmbio e juros podem, no limite, inviabilizar a PI; igualmente, uma política de CT&I demasiado voltada para a pesquisa básica pode gerar entraves à inovação (Suzigan; Furtado, 2006Suzigan, Wilson; Furtado, João. “Política Industrial e desenvolvimento”. Revista de Economia e Política, v. 26, n. 2, 2006.).

Além desta apresentação, o artigo se divide em cinco seções. A primeira periodiza as diferentes formas de ativismo estatal no Brasil. A segunda discute as respectivas PIs desses ativismos, destacando seus sucessos e fracassos. A terceira apresenta as três peças de PI entre 2004 e 2014. A quarta analisa e problematiza o arranjo político-institucional para a formulação, implementação, acompanhamento e gestão da PI. A quinta, conclusiva, sintetiza os argumentos desenvolvidos e tece considerações mais gerais sobre os desafios e potencialidades para a retomada de PIs verticais no Brasil.

I. ATIVISMO ESTATAL NO BRASIL: NACIONAL-DESENVOLVIMENTISMO, MERCADISMO E NOVO ATIVISMO

Ao longo do século XX e no início do XXI, a estruturação e consolidação do Estado brasileiro como promotor de políticas públicas nas áreas econômica e não econômicas foi acompanhada de três tipos de ativismo, cada qual animando PIs com características específicas. O primeiro período, que durou de 1930 até meados dos anos 1980, chamado de nacional-desenvolvimentismo, pode ser descrito como a trajetória da construção de uma matriz industrial complexa, relativamente integral e integrada. Combinou forte intervencionismo do Estado -inclusive como produtor direto via estatais - com protecionismo, ênfase no mercado interno e substituição de importações, além de algum incentivo às exportações nos anos 1970. O objetivo último nesse período, mais que constituir competitividade internacional, era gerar um parque industrial à imagem e semelhança das economias avançadas. Por isso o foco na criação de capacidade mediante substituição de importações e a adoção do déficit em balança como importante critério para a seleção de setores. Decorre disso também a construção de um parque industrial crescentemente mais intensivo em setores pesados, como os de bens duráveis de consumo e de produção.

O II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND, 1974) pode ser tomado como marco desse período, simultaneamente síntese, completude e esgotamento do nacional-desenvolvimentismo. Ele levou o processo de substituição de importações às últimas consequências (Castro, 1985Castro, Antonio Barros. “Ajustamento vs. transformação: a economia brasileira de 1974 a 1984”. In: Castro, Antonio Barros; Souza, Francisco (orgs.). A economia brasileira em marcha forçada. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.; Suzigan; Furtado, 2006Suzigan, Wilson; Furtado, João. “Política Industrial e desenvolvimento”. Revista de Economia e Política, v. 26, n. 2, 2006.), consolidando um setor de bens de capital relativamente capaz de internalizar a dinâmica econômica e setores de insumos e matérias-primas que supriam a demanda daquelas recém-estruturadas atividades. Ao completar o ciclo de construção da matriz industrial brasileira, o plano teria, até por seus sucessos, trazido novas questões à PI, como superar as políticas de substituição de importações, elevar a competitividade internacional da indústria e, principalmente, desenhar estratégias para se adaptar à crescente integração à economia mundial e avançar nas agendas da inovação e dos novos setores mais intensivos em tecnologia.

Contudo, o caminho trilhado nos anos 1980 e no início dos 1990 não foi a revisão e reestruturação das estratégias de desenvolvimento, mas o abandono da própria estratégia de desenvolvimento e da prerrogativa de formular e implementar PIs. Há uma tripla causa: (1) crise de financiamento do Estado brasileiro e redução de sua capacidade de intervenção; (2) mudança de percepção acerca das possibilidades de atuação do Estado; e (3) dilemas do processo de redemocratização. Predominou a percepção do Estado como mau alocador e fonte de ineficiência e corrupção (Evans, 2004Evans, Peter. Autonomia e parceria: Estados e transformação industrial. Rio de Janeiro: UFRJ/FDC/Funcex, 2004.), segundo a qual sua intervenção na economia deve tender ao mínimo. Portanto, uma política horizontal e exclusiva à correção de falhas de mercado.

Esse período pode ser caracterizado como de fraco ativismo estatal, com uma anti-PI, voltada para ações horizontais e que objetivavam um choque de competitividade na indústria brasileira. Isso seria feito via exposição do parque produtivo nacional à concorrência internacional, mediante drásticos processos de abertura comercial e liberalização econômica, e via passagem da atuação estatal da produção para a regulação, com privatizações e constituição das agências reguladoras (Mattos, 2006Mattos, Paulo Todescan Lessa. O novo Estado regulador no Brasil: eficiência e legitimidade. São Paulo: Singular, 2006.). As políticas macroeconômica e monetária passaram a divergir radicalmente de uma agenda voltada para o desenvolvimento e para a competitividade (fosse ela baseada em ações horizontais ou não), pois privilegiaram a estabilização monetária e o combate à inflação.

O quadro de fraco ativismo estatal permanece até o início dos anos 2000, quando do lançamento da Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (Pitce), em 2004. A Pitce representou a volta das PIs à agenda de desenvolvimento brasileira, inaugurando um novo período de ativismo estatal que, pode-se dizer, perdurou até 2014.5 5 A definição de toda e qualquer data traz consigo uma dose de arbi­trariedade. Neste caso, destaco, por um lado, que até 2014 não havia grandes dúvidas a respeito da consolidação de certa normalidade institucional e social entre nós; e, por outro lado, e apesar da continuidade de muitos instrumentos de PI forjados entre 1999 e 2014, esse renovado ativismo começa a ser desconstruído a partir de 2015, com a guinada liberal do segundo governo de Dilma Rousseff, representada pela nomeação de Joaquim Levy como ministro da Fazenda, e a deposição do próprio governo, no ano seguinte. Os ventos dessa mudança já vinham sendo sentidos desde 1999, com a criação dos Fundos de Ciência e Tecnologia, os Fundos Setoriais (FSs). Por vincularem parcela da receita orçamentária do governo federal à CT&I e serem estruturados setorialmente (Almeida, 2009aAlmeida, Mansueto. “A Constituição Federal de 1988 e as políticas de incentivo à CT&I brasileiras”. In: Cardoso Jr., José Celso (org.). A Constituição brasileira revisitada: recuperação histórica e desafios atuais das políticas públicas nas áreas econômica e social, v. 1. Brasília: Ipea, 2009a.), os FSs representaram: crescimento e estabilização de recursos para a inovação; possibilidade de retomada de políticas de CT&I pelo Estado brasileiro; convergência das políticas de CT&I com a agenda de desenvolvimento; e foco crescente no I da CT&I.

Esse novo ativismo estatal não é redutível nem ao dirigismo autoritário do nacional-desenvolvimentismo nem à inação mercadista dos 1990 (Arbix; Martin, 2010Arbix, Glauco; Martin, Scott. “Beyond Developmentalism and Market Fundamentalism in Brazil”. Workshop on states, development and global governance of the Global Legal Studies Center and the Center for World Affairs and Global Economy, Madison, WI, 2010.). Tratou-se de um esforço de construção de ambiente econômico pró-negócios com criação e renovação institucional, no qual a inovação passou a ser considerada elemento fundamental da competitividade horizontal da economia, assim como, e principalmente, da criação de capacidade em setores-chave (Arbix et al., 2017Arbix, Glauco et al. “Avanços, equívocos e instabilidade das políticas de inovação no Brasil”. Novos Estudos Cebrap, n. 109, 2017.).

Nesse novo ativismo, os objetivos, mecanismos e instrumentos da PI e de CT&I convergem claramente. Destaco, por um lado, o recurso a instrumentos já utilizados no passado e/ou em outros países de industrialização tardia,6 6 Para uma discussão das estratégias de desenvolvimento e PIs de outros países de industrialização tardia, ver: Amsden (1989, 2009), Johnson (1982), Arbix et al. (2002, 2010), Cardoso Jr. et al. (2009), Evans (2004) e Wade (1990). como a redução dos riscos associados aos investimentos via atuação de banco de desenvolvimento, a gestação de grandes grupos e o estabelecimento de metas e contrapartidas. Por outro lado, observou-se o uso de instrumentos mais novos, como o compartilhamento de riscos via participação acionária e atuação no mercado de capital de risco, os contratos de direito privado e a ênfase na empresa como lugar da inovação (Mattos, 2009Mattos, Paulo Todescan Lessa “O sistema jurídico-institucional de investimentos público-privados em inovação no Brasil”. Revista de Direito Público da Economia, v. 7, n. 28, 2009.).

II. CONSEQUÊNCIAS E LIMITES DAS PIS ANIMADAS PELOS TRÊS ATIVISMOS ESTATAIS

O novo ativismo animou três peças de PI, além dos FSs: a Pitce (2004-2008), a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP, 2008-2010) e o Plano Brasil Maior (PBM, 2011-2014). A aproximação entre CT&I e PI é inédita: nos dois períodos anteriores, as políticas públicas de desenvolvimento não necessariamente convergiram com a inovação, sendo esta ora considerada subproduto do processo de industrialização, ora subproduto da competição no mercado. Comum aos dois períodos foi um fraquíssimo desempenho de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) (Arbix, 2010_______. “Caminhos cruzados: rumo a uma estratégia de desenvolvimento baseada na inovação”. Novos Estudos Cebrap, n. 87, 2010.; Arbix et al., 2017Arbix, Glauco et al. “Avanços, equívocos e instabilidade das políticas de inovação no Brasil”. Novos Estudos Cebrap, n. 109, 2017.).

Complementarmente, a política de CT&I no período nacional-desenvolvimentista foi caracterizada pela construção de sistema universitário com viés para a pós-graduação, cujo resultado, em que pese o vigor dado a esse segmento, contribuiu para o isolamento da universidade do cotidiano da sociedade e das empresas. Encerrou uma concepção linear de inovação, segundo a qual ela parte da pesquisa básica (universidade) para a pesquisa aplicada (empresas), cabendo aos poderes públicos incentivar a primeira (Stokes, 2005Stokes, Donald E. O quadrante de Pasteur: a ciência básica e a inovação tecnológica. Campinas: Editora Unicamp , 2005.). Nos anos 1980-1990, quando ainda predominava a concepção linear, os recursos destinados a C&T diminuíram progressivamente (Almeida, 2009aAlmeida, Mansueto. “A Constituição Federal de 1988 e as políticas de incentivo à CT&I brasileiras”. In: Cardoso Jr., José Celso (org.). A Constituição brasileira revisitada: recuperação histórica e desafios atuais das políticas públicas nas áreas econômica e social, v. 1. Brasília: Ipea, 2009a.). Com a criação dos FSs, em 1999, houve a recomposição dos recursos para a CT&I e, principalmente, o deslocamento do foco para a inovação.

Sobre a PI no período nacional-desenvolvimentista, convém destacar que ela foi bem-sucedida na construção de uma matriz industrial complexa, relativamente integrada e integral. Contudo, não o foi em transferir o foco, até então voltado à criação de setores, para a produtividade, a qualidade e a inovação a partir do momento em que o parque industrial nacional estava minimamente consolidado. Como condicionantes, tem-se, além da já citada desconexão entre desenvolvimento e inovação, o enrijecimento institucional do Estado brasileiro, incapaz de adaptar e/ou constituir novas instituições.

Nesse contexto que reúne incapacidade do Estado brasileiro para gestar mudanças institucionais e de ênfase da PI, crise orçamentária-fiscal do Estado e colonização da agenda econômica por políticas macroeconômicas restritivas, emergiu uma modalidade de ativismo estatal caracterizada pelo desmonte das instituições nacional-desenvolvimentistas e pela configuração da aqui chamada anti-PI.7 7 Para uma discussão mais ampla desse processo, que o interpreta como crise do Estado desenvolvimentista, ver: Sallum Jr. (1996). Em que pese a manutenção de políticas quase-setoriais para automóveis e informática (Arbix; Martin, 2010Arbix, Glauco; Martin, Scott. “Beyond Developmentalism and Market Fundamentalism in Brazil”. Workshop on states, development and global governance of the Global Legal Studies Center and the Center for World Affairs and Global Economy, Madison, WI, 2010.), levou-se a cabo um conjunto de reformas destinadas a reduzir o intervencionismo estatal e potencializar o mecanismo de mercado como indutor do desenvolvimento. Concretamente: abertura comercial, liberalização da economia, privatizações, integração regional via Mercosul e estabilização monetária por meio do Plano Real (Lyra, 1996Lyra, Flávio. A política industrial brasileira. Texto para discussão n. 413. Brasília: Ipea , 1996.).

Os resultados dessas reformas sobre a economia brasileira foram ambíguos. Tomando-os em conjunto, destaco que, apesar da estabilização monetária, não foi gerado crescimento minimamente robusto e sustentável, configurando o “modelo de crescimento instável e de baixo dinamismo” (Amitrano, 2006Amitrano, Claudio. “O modelo de crescimento da economia brasileira no período recente: condicionantes, características e limites”. In: Carneiro, Ricardo (org.). A supremacia dos mercados e a política econômica do governo Lula. São Paulo: Editora Unesp, 2006.), com intercalação de taxas altas e pífias. Além disso, houve nos anos 1990 uma combinação insustentável de veloz abertura e câmbio valorizado, que impôs sistemáticos e crescentes déficits comerciais, mais expressivos nos momentos de expansão da indústria - dependente de máquinas, equipamentos e insumos importados (Laplane; Sarti, 2006Laplane, Mariano; Sarti, Fernando. “Prometeu acorrentado: o Brasil na indústria mundial no início do século XXI”. In: Carneiro, Ricardo (org.). A supremacia dos mercados e a política econômica do governo Lula. São Paulo: Editora Unesp , 2006.). Foi tal situação que tornou imperativa a desvalorização cambial de 1999, definindo os sustentáculos da política macroeconômica a partir de então - câmbio flutuante, metas de inflação e superávit primário (Sallum Jr., 1999Sallum Jr., Brasílio “O Brasil sob Cardoso: neoliberalismo e desenvolvimentismo”. Tempo Social, v. 11, n. 2, 1999.).

Ao mesmo tempo, se abertura e liberalização foram bem-sucedidas em integrar rapidamente - em padrão subordinado - a economia brasileira à internacional (Sallum Jr., 1999Sallum Jr., Brasílio “O Brasil sob Cardoso: neoliberalismo e desenvolvimentismo”. Tempo Social, v. 11, n. 2, 1999.; Bresser-Pereira, 2012Bresser-Pereira, Luiz. “Brasil, sociedade nacional-dependente”. Novos Estudos Cebrap, n. 93, 2012.), seus efeitos sobre o setor produtivo foram duvidosos, em especial o de manufatura, pois impuseram à economia brasileira uma forte reestruturação produtiva de caráter defensivo (Coutinho; Ferraz, 1994Coutinho, Luciano; Ferraz, João Carlos. Estudo da competitividade da indústria brasileira. Campinas: Papirus, 1994.; Ferraz et al., 1996Ferraz, João Carlos et al. Made in Brazil: desafios competitivos para a indústria. Rio de Janeiro: Campus, 1996.). Caracterizada por rápida modernização tecnológica das empresas via importação de máquinas e equipamentos (Castro, 2001Castro, Antonio Barros “A reestruturação industrial brasileira nos anos 90: uma interpretação”. Revista de Economia e Política. v. 21, n. 3, 2001.), a reestruturação produtiva resultou em aumento da produtividade sem aumento do emprego (Saboia; Carvalho, 1997Saboia, João L. M.; Carvalho, Paulo G. M. Produtividade na indústria brasileira: questões metodológicas e análise empírica. Texto para discussão n. 504. Brasília: Ipea , 1997.) e teve como principais determinantes a externalização de atividades não ligadas ao centro da produção, a introdução de novas formas de organização da produção e a eliminação de linhas menos competitivas (Kupfer; Rocha, 2004Kupfer, David; Rocha, Carlos. Dinâmica da produtividade e heterogeneidade estrutural da indústria brasileira. Seminário El Reto de Acelerar el Crecimiento en América Latina. Santiago: Cepal, 2004.).

O ativismo fraco dos anos 1990, em que pese ter reorientado o papel do Estado e abalado instituições próprias do nacional-desenvolvimentismo, não desmontou institucionalmente o Estado. Instrumentos e mecanismos que pudessem ser empregados em atividades de planejamento, coordenação e promoção do desenvolvimento foram mantidos, como que aguardando a emergência de um renovado ativismo (Arbix; Martin, 2010Arbix, Glauco; Martin, Scott. “Beyond Developmentalism and Market Fundamentalism in Brazil”. Workshop on states, development and global governance of the Global Legal Studies Center and the Center for World Affairs and Global Economy, Madison, WI, 2010.). Os anos de 1999 (criação dos FSs) e 2004 (promulgação da Pitce) caracterizam o período de gestação desse novo ativismo estatal. Nele, voltaram à agenda a mobilização da capacidade institucional do Estado e de mecanismos e instrumentos de planejamento, embora com diferentes ritmos e intensidades, variando segundo a área governamental e demandando uma (re)aprendizagem institucional.

III. AS TRÊS PEÇAS DA PI BRASILEIRA, 2004-2014

Os FSS visaram disponibilizar e ampliar os recursos para as atividades de CT&I, independentemente das prioridades de cada governo.8 8 Para uma avaliação dos FSs, ver: Araújo et al. (2012). Os recursos para CT&I aumentaram após a criação desses fundos. De aproximadamente R$ 100 milhões em 1998, pularam para R$ 250 milhões em 1999 e, depois, cresceram aceleradamente até 2003, quando quase alcançaram R$ 1,7 bilhão. Entre 2003 e 2007 a variação foi menor, mas consistente, chegando a R$ 2 bilhões no último ano (Almeida, 2009a). Foram criados dezesseis fundos:9 9 A saber: Aeronáutico, Agronegócio, Amazônia, Aquaviário, Biotecnologia, Energia, Espacial, Infraestrutura, Mineral, Petróleo e Gás Natural, Recursos Hídricos, Saúde, Telecomunicações, TIC, Transporte, Verde-Amarelo. treze setoriais e três transversais (Verde-Amarelo, Amazônia e Infraestrutura). Seu caráter majoritariamente setorial implica que os recursos arrecadados em um setor devem ser gastos nele mesmo, assegurando estabilidade de recursos à CT&I em cada setor econômico. Os recursos dos FSs são compostos por receitas vinculadas às contribuições da exploração de recursos naturais de titularidade da União, à Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) incidente sobre a importação de tecnologia e a parcela do IPI.

A governança dos FSs é composta por comitês gestores para cada fundo e por um Comitê de Coordenação dos Fundos Setoriais (CCFS), criado em 2003. Os comitês gestores são presididos por representantes do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT)10 10 Hoje, Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), dada a fusão entre MCT e Ministério das Comunicações, em 2016. e compostos por representantes dos ministérios correlatos, de agências reguladoras, da academia, de entidades do setor, de agências do MCT, da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), além de assessoria técnica do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), criado em 2001. O ccfs é presidido pelo secretário-executivo do MCT e composto pelos presidentes de cada comitê gestor, da Finep e do CNPq.

Em que pese o caráter quase consensual dos FSs, Mansueto Almeida (2009aAlmeida, Mansueto. “A Constituição Federal de 1988 e as políticas de incentivo à CT&I brasileiras”. In: Cardoso Jr., José Celso (org.). A Constituição brasileira revisitada: recuperação histórica e desafios atuais das políticas públicas nas áreas econômica e social, v. 1. Brasília: Ipea, 2009a.) lista três desafios relativos a seu funcionamento. O primeiro deles diz respeito à falta de garantia de execução de seus recursos, em consequência da vinculação de parcela da arrecadação à CT&I11 11 Entre 2003 e 2007 a taxa de execução dos recursos dos FSs variou entre 30% e 40% (Almeida, 2009a). - resultado agravado pelos contingenciamentos sistemáticos de recursos dos FSs para fins de economia do setor público e superávit primário. O segundo desafio tem a ver com a atuação relativamente desarticulada da Finep e do CNPq com os FSs favorecendo a Finep, cuja atuação já é orientada para o financiamento de PD&I nas empresas (Pereira, 2005Pereira, Newton. Fundos Setoriais: avaliação das estratégias de implementação e gestão. Texto para discussão n. 1.136. Brasília: Ipea , 2005.). Por fim, o direcionamento de 50% dos recursos de cada fundo para ações transversais representou um maior controle do governo federal vis-à-vis o setor privado na operacionalização dos FSs, tornando seu funcionamento mais hierarquizado - apesar de o novo arranjo possibilitar maior flexibilidade na execução dos recursos dos fss e maior articulação com os objetivos da PI.

O lançamento da Pitce, em 2004, inaugura e consolida o novo modelo de ativismo estatal, gestado desde 1999 e prenunciado pelos FSs. Nesse novo ativismo, a convergência entre PI e política de CT&I é clara. A mera existência da Pitce e do grupo de trabalho que a precedeu, entre o fim de 2002 e 2003, sinaliza que o forte consenso anti-PI dos anos 1990 havia desvanecido. A Pitce consistiu em um plano de ação do governo federal cujos objetivos declarados eram o aumento da eficiência da estrutura produtiva, o incremento da capacidade de inovação da indústria e a expansão das exportações. Está estruturada em dois eixos, um horizontal e outro vertical. O eixo horizontal abrangia linhas de ação relacionadas à promoção da inovação e do desenvolvimento tecnológico em todo o tecido industrial, à modernização da estrutura produtiva e da promoção de investimentos, à mudança de patamar da inserção externa via promoção das exportações e à adequação e renovação do ambiente institucional. O eixo vertical tinha duas linhas de ação: promoção de setores estratégicos (bens de capital, fármacos, semicondutores e software) e desenvolvimento dos chamados “setores portadores de futuro”: biomassa, nano e biotecnologia.

Wilson Suzigan e João Furtado (2006Suzigan, Wilson; Furtado, João. “Política Industrial e desenvolvimento”. Revista de Economia e Política, v. 26, n. 2, 2006.) argumentam que a grande questão da PI brasileira foi priorizar setores capazes de difundir tecnologias, inovações e produtividade para toda a estrutura produtiva. Ou seja, a busca por setores transversais justificou-se por sua capacidade de gerar não superávits comerciais, empregos ou crescimento, mas externalidades positivas para a economia e a sociedade como um todo. Essa pretensão da Pitce foi se esvaindo na PDP e no PBM (Arbix et al., 2017Arbix, Glauco et al. “Avanços, equívocos e instabilidade das políticas de inovação no Brasil”. Novos Estudos Cebrap, n. 109, 2017.).

Mário Schapiro (2013Schapiro, Mário. Ativismo estatal e industrialismo defensivo: instrumentos e capacidades na Política Industrial brasileira. Texto para discussão, n. 1.856. Brasília: Ipea , 2013.) aponta três conjuntos de desdobramentos positivos associados à Pitce: coordenação de agenda legislativa articulada à PI; reorientação estratégica das agências de Estado, notadamente BNDES e Finep, para os objetivos da PI; e constituição de um novo arranjo político-institucional para formulação, implementação, acompanhamento e gestão da PI. Do primeiro conjunto, pontuo a adequação do marco jurídico ao incentivo às atividades de PD&I, com destaque para a Lei da Inovação (n. 10.973/2004) e para a Lei do Bem (n. 11.196/2005).12 12 Destaco, ainda, a Lei de Biossegurança (n. 11.105/2005), que regula a produção e comercialização de organismos geneticamente modificados e a pesquisa com células-tronco. A Lei da Inovação regulou os artigos 218 e 219 da Constituição Federal de 1988, destinados às atividades de CT&I, e estabeleceu mecanismos de incentivo à inovação e estímulos à cooperação entre centros de pesquisa, universidades e empresas. O principal mecanismo é a subvenção econômica, que permitiu a aplicação de recursos não reembolsáveis para atividades de PD&I nas empresas. Também foram previstos o compartilhamento de infraestrutura e tecnologia entre instituições de C&T e empresas, a participação da União em empresas para projetos de CT&I e a remuneração adicional para pesquisadores de universidades vinculados a projetos empresariais de inovação.

A Lei do Bem substituiu os antigos e restritos Programas de Desenvolvimento Tecnológico Industrial e da Agropecuária (PDTI e PDTA) e trouxe três pontos importantes para o fomento das atividades de inovação. O primeiro é um conjunto de incentivos fiscais para empresas de software que produzem no Brasil e exportam. O segundo é a possibilidade de dedução automática no imposto de renda dos dispêndios em PD&I. O terceiro consiste na subvenção, pelas agências de fomento do governo federal, de pesquisadores mestres ou doutores em atividades empresariais de inovação tecnológica.

Com relação à reorientação estratégica das agências de Estado, vale destacar que, embora positiva, foi parcial, sobretudo no caso do BNDES. Em que pese a introdução de programas específicos para o financiamento dos setores de fármacos (Profarma) e de software (Prosoft), o banco mantém a maior parte de sua carteira dedicada ao financiamento a juros subsidiados de grandes empresas em setores tradicionais;13 13 Segundo dados do próprio BNDES, em 2012, o orçamento para financiamento de longo prazo foi de quase R$ 160 bilhões. Desse valor, R$ 110 bilhões foram para grandes empresas de setores tradicionais. Mais informações no relatório de desempenho de 2012, disponível em: <www.bndes.gov.br/SiteBN DES/bndes/bndes_pt/Hotsites/Relatorio_Anual_2012>. além disso, a partir de 2008, direcionou sua atuação para política não explícita na PDP de formação de campeões nacionais, por meio de fusões e aquisições em setores nos quais o Brasil já é competitivo.

Como novidades na atuação do BNDES mais em conformidade com os objetivos da PI, figurou a orientação de parcela diminuta, mas significativa, de suas ações para o compartilhamento dos riscos associados aos investimentos privados. Isso ocorreu por meio de uma conjunção de instrumentos de alocação do capital no mercado e instrumentos contratuais e societários do direito privado, a fim de possibilitar a participação de instituições estatais em joint ventures cooperativas de PD&I com o setor privado e/ou a entrada direta no capital de empresas privadas (Mattos, 2009Mattos, Paulo Todescan Lessa “O sistema jurídico-institucional de investimentos público-privados em inovação no Brasil”. Revista de Direito Público da Economia, v. 7, n. 28, 2009.). Um exemplo de iniciativa de compartilhamento de riscos é o Fundo Tecnológico (Funtec), voltado para a constituição de joint ventures cooperativas de pesquisa entre universidades ou centros de pesquisa e empresas. Outro é a atuação do BNDESPAR tanto na estruturação, indução e consolidação de fundos de investimentos privados, em que o banco entra com participação minoritária em capital de risco direcionado para empresas nascentes e/ou de base tecnológica,14 14 Para uma abordagem ampla e integrada das diferentes ações públicas de fomento a empreendedorismo e pequenas e médias empresas (pmes) inovadoras e/ou de base tecnológica no período em questão, ver: Torres Freire et al. (2017). quanto na participação direta em empresas de base tecnológica ou orientadas para a inovação.

Por fim, quanto à constituição de novo arranjo político-institucional para a formulação e implementação da PI, destaco a criação da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI),15 15 Composto por igual número de representantes do governo federal e da sociedade civil. ambas em 2005. Enquanto a ABDI devia coordenar e articular os atores envolvidos na PI, bem como os instrumentos dela, o CNDI assumiu funções consultivas e de supervisão da ABDI. A princípio, tais mudanças institucionais são positivas, uma vez que muitas vezes faltava articulação entre as ações do Estado brasileiro, embora ele já fosse dotado de importantes e eficientes órgãos de: (1) financiamento da atividade, como o BNDES; (2) apoio à PD&I, como a Finep, o MCT, os FSs, as fundações estaduais de amparo à pesquisa (FAPs), o CNPq e a Capes; (3) apoio à exportação, como a Agência Brasileira de Promoção das Exportações (Apex); e (4) apoio às micro e pequenas empresas, como o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).

Esses três desdobramentos da Pitce consolidaram um marco jurídico-institucional para a formulação, implementação, acompanhamento e gestão da PI, o qual também balizou as PIs posteriores tanto em seus acertos (viés pela inovação) quanto em suas insuficiências (dificuldades de implementação e de comando político/governança). Não foi, porém, por esses problemas - que permaneceram - que a PI foi modificada. A Pitce foi alvo de dois conjuntos de críticas, vocalizadas até por segmentos do setor privado. Por um lado, condenava-se seu forte viés seletivo. Por outro, havia carência de metas minimamente objetivas e mensuráveis.

A substituição da Pitce pela Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) visou responder a esses dois conjuntos de críticas, e não às dificuldades de implementação e tibieza de sua estrutura de governança. Lançada em 2008, antes da crise econômica internacional, a PDP expandiu para 24 os setores contemplados e erigiu quatro grandes metas. Embora se possa considerar que a relação da PDP com a Pitce foi predominantemente de continuidade (Ferraz, 2009Ferraz, Max Benjoino. “Retomando o debate: a nova política industrial do governo Lula”. Planejamento e Políticas Públicas, n. 32, 2009.), a ênfase na promoção de setores estratégicos e portadores de futuro, ou seja, na indústria que se quer ter, foi perdendo lugar para a promoção de setores em que a indústria brasileira já era competitiva, ou seja, a indústria real (Almeida, 2009b_______. Desafios da real política industrial brasileira do século XXI. Texto para discussão n. 1.452. Brasília: Ipea, 2009b.; Arbix et al., 2017Arbix, Glauco et al. “Avanços, equívocos e instabilidade das políticas de inovação no Brasil”. Novos Estudos Cebrap, n. 109, 2017.).

Os 24 setores contemplados foram agrupados em três eixos estruturantes: (1) programas para consolidar e expandir a liderança;16 16 Nos seguintes setores: aeronáutico; petróleo e gás; bioetanol; celulose e papel; siderurgia e mineração; carnes. (2) programas para fortalecer a competitividade;17 17 Nestes setores: automotivo; bens de caPItal; têxtil; moveleiro; higiene e perfumaria; construção; naval; calçados; agroindústria; biodiesel; plásticos; complexo de serviços (transportes, turismo, engenharia e construção, finanças, seguros e comunicações). e (3) programas mobilizadores em áreas estratégicas.18 18 A saber: saúde; tics; energia nuclear; defesa; nanotecnologia; biotecnologia. A PDP tinha, também, uma dimensão sistêmica, estruturada em dois eixos (ações sistêmicas e destaques estratégicos) e voltada para a ampliação da competitividade da economia, a inovação, a integração produtiva, as micro e pequenas empresas (MPEs) e as exportações. As quatro metas da PI, todas para 2010, eram: aumentar o investimento de 17,6% do Produto Interno Bruto (PIB) para 21%; elevar o gasto privado em P&D de 0,51% do PIB para 0,65%; ampliar a participação das exportações brasileiras no total mundial de 1,18% para 1,25%; e fazer crescer o número de MPEs exportadoras em 10% (referência: 2006).

A estrutura de governança da PDP pode ser lida a partir de sua coor­denação geral, pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). Esta era aconselhada pelo CNDI e apoiada pela secretaria executiva (composição: ABDI, BNDES e Ministério da Fazenda - MF) e por um comitê gestor (composição: Casa Civil, MCT, MF e Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão - MPOG). Sua operacionalização ficou organizada em cinco comitês executivos, cada qual coordenado por um órgão específico do governo e formado por representantes do governo e do setor privado. O acompanhamento era da ABDI.

Pelo menos dois tipos de críticas podem ser tecidos à PDP. O primeiro refere-se à estruturação das metas, todas elas de curto prazo e coincidentes com o ciclo eleitoral. Esse fato é problemático porque os resultados da PI, sobretudo aqueles relacionados a mudanças significativas na estrutura produtiva, são de médio e longo prazo. Além disso, havia uma relativa inadequação das metas, pois eram dúbias quanto à sua vinculação com ações da PI e/ou com sua desejabilidade. Exemplo da primeira situação é a ampliação da participação do investimento no PIB, uma vez que a meta apenas projeta para um futuro próximo taxas pretéritas de crescimento do investimento. Exemplo da segunda situação é o crescimento das exportações, pois ele pode apenas refletir um aumento em setores que já vendem para o exterior, independentemente de um incremento de produtos de maior intensidade tecnológica ou valor agregado na pauta de exportações brasileira (Almeida, 2009b_______. Desafios da real política industrial brasileira do século XXI. Texto para discussão n. 1.452. Brasília: Ipea, 2009b.). Ao fim e ao cabo, e em que pese o acerto em definir objetivos mensuráveis, nenhuma das quatro metas da PDP foi atingida (Arbix et al., 2017Arbix, Glauco et al. “Avanços, equívocos e instabilidade das políticas de inovação no Brasil”. Novos Estudos Cebrap, n. 109, 2017.).

FIGURA 1
PDP, estrutura de governança

O segundo tipo de crítica refere-se à “priorização” de 24 setores. Uso o termo entre aspas porque priorizar 24 setores é, no limite, não priorizar nenhum, e as implicações disso estão relacionadas com diluição da capacidade de hierarquizar prioridades e substituição de viés da PI da indústria que se quer ter para a indústria que se tem. Ou seja, o objetivo de promover setores estratégicos capazes de difundir tecnologias e inovações por toda a estrutura produtiva deu lugar à ampliação da competitividade dos setores já competitivos, o que, na estrutura produtiva brasileira, significa setores de menor intensidade tecnológica e, em geral, intensivos em recursos naturais (Furtado e Quadros, 2005Furtado, André; Quadros, Rui. “Padrões de intensidade tecnológica na indústria brasileira”. São Paulo em Perspectiva, v. 19, n. 1, 2005.; Abdal et al., 2016Abdal, Alexandre et al. “Rethinking Sectorial Typologies: A Classification of Activity According to Knowledge and Technological Intensity”. Revista de Administração e Inovação, n. 13, 2016.).

Além disso, vale observar que a PI desse momento assumiu para si um objetivo não declarado na letra da PDP: formação de campeões nacionais mediante o fomento à criação de grandes grupos internacionalmente competitivos por meio de fusões e aquisições. À parte ser problemático que a PI tenha objetivo e instrumentos não formalizados, porque pouco transparentes e carentes de pactuação mais ampla com a sociedade, tal iniciativa se voltava para grandes empresas brasileiras já estabelecidas e, majoritariamente, de setores tradicionais. Isso significava que seu sucesso implicaria a consolidação das especializações presentes da estrutura industrial brasileira e o reforço de sua inserção externa (Almeida, 2009b_______. Desafios da real política industrial brasileira do século XXI. Texto para discussão n. 1.452. Brasília: Ipea, 2009b.).

No início de 2011 foi lançado o PBM. Embora o discurso pró-inovação e competitividade da indústria brasileira deem continuidade à Pitce e à PDP, o programa consolida a ruptura com a abordagem seletiva. O PBM manteve a “seleção” de, originalmente, dezenove setores19 19 Agroindústria; automotivo; bens de caPItal; comércio; complexo da saúde; construção civil; couro, calçados, têxtil, confecções, gemas e joias; defesa, aeronáutica e espacial; energias renováveis; higiene pessoal, perfumaria e cosméticos; logística; metalurgia; mineração; móveis; papel e celulose; petróleo, gás e naval; químico; serviços; TI e complexo eletroeletrônico. e implementou ações predominantemente nos campos fiscal, financeiro ou institucional, com impactos horizontais e, quase sempre, de caráter defensivo (Schapiro, 2013Schapiro, Mário. Ativismo estatal e industrialismo defensivo: instrumentos e capacidades na Política Industrial brasileira. Texto para discussão, n. 1.856. Brasília: Ipea , 2013.). Duas exceções: (1) o Novo Regime Automotivo (Inovar-Auto), que, ao estabelecer rígidas contrapartidas de isenção fiscal das montadoras por nacionalização de peças e componentes e por realização de PD&I em território nacional, orientaria o setor para transformações qualitativas; e (2) o avanço no marco jurídico de compras públicas (Lei de Licitações), com o estabelecimento do mecanismo de margem de preferência de bens e serviços nacionais e a crescente exigência de conteúdo nacional mínimo, que, em conjunto, permitiriam o fortalecimento de cadeias produtivas.

Ao contrário da PDP, o PBM foi lançado em momento de crescentes dificuldades para a economia e para a indústria, com: acirramento da crise internacional; alta dos juros, posteriormente revertida, e desvalorização do câmbio; e crescente competição enfrentada pela manufatura, em contexto de expansão das exportações do Leste Asiático e retração dos mercados dos países desenvolvidos. O esforço de concatenação dos objetivos da política macroeconômica, especialmente queda da taxa de juros (2012-2013), com os objetivos da PI teve fôlego curto, dadas sua insustentabilidade e sua perda de apoio social e político (Singer, 2015Singer, André. “Cutucando onças com vara curta: o ensaio desenvolvimentista no primeiro mandato de Dilma Rousseff (2010-2014)”. Novos Estudos Cebrap, v. 34, n. 102, 2015.). No limite, o PBM, com exceção de um breve interregno, começa e termina com seus objetivos divergindo da política macroeconômica, assim como ocorrera com a Pitce e a PDP.

O PBM teve duas agendas, uma chamada sistêmica, e outra, setorial. Cada agenda contou com conjuntos de ação e estrutura de governança próprios. A agenda sistêmica, de foco transversal e viés mais horizontal, buscou resolver questões que afetam a competitividade de toda a estrutura industrial. Sua governança se estruturou em torno de nove temas transversais,20 20 Ações especiais em desenvolvimento regional; bem-estar do consumidor; comércio exterior; competitividade de pequenos negócios; condições de trabalho; desenvolvimento regional; inovação; investimento; produção sustentável; qualificação. cada qual com uma coordenação. A agenda estruturante, de foco setorial e viés mais indutivo, teve o objetivo declarado de construir um novo perfil industrial a partir de inovação e competitividade. Sua governança se estruturou em dezenove comitês executivos setoriais e dezenove conselhos de competitividade. Enquanto os comitês executivos foram instâncias governamentais e deliberativas, compostas por representantes das agências de Estado e representantes do governo federal; os conselhos de competitividade foram instâncias consultivas da sociedade, formadas por representantes dos diversos setores e dos trabalhadores.

Para gerenciamento, deliberação e aconselhamento da PI, o PBM contou, ainda, com um grupo executivo, um comitê gestor e um conselho superior. O grupo executivo e o comitê gestor eram responsáveis por gerenciar, executar e articular a PI, sendo o primeiro coordenado pelo MDIC e composto por ABDI, BNDES, Casa Civil, Finep, MCT, MF e Ministério Público (MP), e o segundo, por Casa Civil, MCT, MDIC, MF e MPOG. Ao conselho superior (CNDI) coube o aconselhamento superior da política industrial. O acompanhamento seguiu sob responsabilidade da ABDI.

Como apontam Mário Schapiro (2013Schapiro, Mário. Ativismo estatal e industrialismo defensivo: instrumentos e capacidades na Política Industrial brasileira. Texto para discussão, n. 1.856. Brasília: Ipea , 2013.) e Glauco Arbix et al. (2017Arbix, Glauco et al. “Avanços, equívocos e instabilidade das políticas de inovação no Brasil”. Novos Estudos Cebrap, n. 109, 2017.), a maior parte das ações do PBM implementadas ou teve caráter horizontal e defensivo, concentrando-se nos campos fiscal (isenções e reduções generalizadas de tributos), financeiro (aporte de recursos públicos) e institucional (leis, regras e normas), ou se destinou à diminuição do custo de produzir e contratar mão de obra em território nacional. Não afirmo que ações para aumento da competitividade e redução dos custos sistêmicos da economia não sejam importantes, mas é fato que tendem a reforçar a atual estrutura produtiva. Assim, o PBM reforçou a ruptura já presente na PDB com a indústria que se quer ter.

FIGURA 2
Estrutura de governança do PBM

IV. O ARRANJO POLÍTICO-INSTITUCIONAL PARA A FORMULAÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO, ACOMPANHAMENTO E GESTÃO DA PI

Os três conjuntos de desdobramentos da Pitce (coordenação de agenda legislativa, reorientação estratégica das agências de Estado e constituição de novo arranjo político-institucional) foram importantes, pois consolidaram um marco jurídico-institucional para a formulação, a implementação, o acompanhamento e a gestão da PI brasileira. Foi nele que a PI passou a ser feita. Houve aperfeiçoamento ao longo do tempo, com pontos positivos como pôr a agenda da inovação no coração da PI, buscar crescente participação do setor privado nos fóruns de deliberação, tomada de decisão e acompanhamento, e coordenar com os objetivos da política a agenda legislativa e a atuação das agências de Estado. Cabe agora, porém, destacar dificuldades e desafios desse arranjo político-institucional.

O arranjo político-institucional instituído pela Pitce e mantido, ao menos em linhas gerais, pela PDP e pelo PBM tem a ABDI e o CNDI como organizações com funções centrais. À primeira, caberia coordenar e articular os atores e os instrumentos da PI, inclusive seu monitoramento. Ao segundo, as funções consultivas e de supervisão. Contudo, a ABDI padeceu de dificuldades crônicas para cumprir suas prerrogativas de agência coordenadora e articuladora da PI. O CNDI sintetiza as dificuldades de fazer funcionar a estrutura de governança da política industrial, que supõe institucionalizar e formalizar a participação do setor privado e da sociedade civil em sua formulação, implementação, gestão e acompanhamento.

A origem das dificuldades da ABDI em exercer suas funções está na forma como foi criada, que implicou uma frágil inserção no arranjo político-institucional da PI (Suzigan; Furtado, 2006Suzigan, Wilson; Furtado, João. “Política Industrial e desenvolvimento”. Revista de Economia e Política, v. 26, n. 2, 2006.; Schapiro, 2013Schapiro, Mário. Ativismo estatal e industrialismo defensivo: instrumentos e capacidades na Política Industrial brasileira. Texto para discussão, n. 1.856. Brasília: Ipea , 2013.; Arbix et al., 2017Arbix, Glauco et al. “Avanços, equívocos e instabilidade das políticas de inovação no Brasil”. Novos Estudos Cebrap, n. 109, 2017.). A ABDI não foi criada como autarquia e, portanto, integrante direta ou indireta da administração pública, mas como um serviço social autônomo, uma entidade do Sistema S. Ao menos formalmente, a ABDI não faz parte do governo. Além dessa frágil inserção institucional, ela teve seu espaço reduzido ao longo do tempo, sobretudo com a presença esmagadora do BNDES e o fortalecimento da Finep pós-PDP (Arbix, 2010_______. (orgs.). Inovação: estratégias de sete países. Brasília: abdi, 2010.).

Simultaneamente causa e consequência dessa situação, a governança da PI é, no diagnóstico de Mário Schapiro (2013Schapiro, Mário. Ativismo estatal e industrialismo defensivo: instrumentos e capacidades na Política Industrial brasileira. Texto para discussão, n. 1.856. Brasília: Ipea , 2013.), excessivamente descentralizada e ocorre em espécie de hub institucional, do qual participa um grande número de órgãos de Estado, ministérios, agências, bancos e outras entidades. Isso levaria a no mínimo três resultados problemáticos: cacofonia decisória (dificuldade na coordenação dos processos de tomada de decisão); institucionalidade estruturalmente oca (competências decisórias formais permanecendo nos órgãos originários); e desincentivos à construção de comprometimento e à identificação com a PI (responsáveis pela formulação da política permanecem institucionalmente vinculados a seus órgãos de origem) - vide a atuação do MF, que participou mais que o MDIC na elaboração das medidas do PBM (idem).21 21 Isso é problemático, pois o objetivo primordial da Fazenda não é promover a transformação industrial.

Conjugando fragilidade institucional da ABDI, cacofonia decisória, institucionalidade estruturalmente oca e desincentivos à construção de comprometimento e identidade com a PI, pode-se afirmar que a política ainda padece de falta de prestígio dentro da estrutura do Estado. Ou seja, ainda que a Pitce tenha vencido o consenso anti-PI que imperou até o início dos anos 2000, ela não foi capaz de criar uma autoridade institucionalmente forte, que fizesse valer suas prerrogativas e fosse dotada de orçamento adequado e poder de agenda para coordenar e articular a PI. Tampouco pôde manter a inovação, o viés seletivo e a busca da indústria que se quer ter com o mesmo grau de prioridade na agenda da PI ao longo do tempo. Por fim, os sinais emitidos pelo próprio Executivo Federal permaneceram ambíguos: os objetivos de combate à inflação permaneceram mais importantes que os de transformação industrial, e os órgãos responsáveis pela política macroeconômica e monetária (MF e Banco Central) foram mais prestigiados que os responsáveis pela PI (MDIC e ABDI).

Dois problemas podem ser indicados no funcionamento do cndi e das outras instâncias da PI que supõem participação do setor privado e da sociedade civil, como os conselhos de competitividade setorial: insuficiente institucionalização dos canais de participação e inadequação das formas de representação do setor privado (Suzigan; Furtado, 2006Suzigan, Wilson; Furtado, João. “Política Industrial e desenvolvimento”. Revista de Economia e Política, v. 26, n. 2, 2006.; Almeida, 2009b_______. Desafios da real política industrial brasileira do século XXI. Texto para discussão n. 1.452. Brasília: Ipea, 2009b.; Schapiro, 2013Schapiro, Mário. Ativismo estatal e industrialismo defensivo: instrumentos e capacidades na Política Industrial brasileira. Texto para discussão, n. 1.856. Brasília: Ipea , 2013.). Com relação ao primeiro problema, destaca-se, por um lado, a ausência de critérios claros para a composição dos diferentes conselhos e a irregularidade em seu funcionamento. Por outro, a permanência de instâncias de formulação e implementação da PI paralelas à estrutura formal, como no caso da política de formação de campeões nacionais, e a persistência de canais informais robustos, inclusive entre empresários individuais e governo, gerou discricionariedade, ausência de transparência e, como decorrência, enfraquecimento dos canais formais. Quanto ao segundo problema, nota-se a fragmentação da estrutura de representação, com duplicidade de representantes, representantes com pouca legitimidade e persistência de estrutura corporativista. Em conjunto, ambos os problemas apontam para uma dificuldade na construção de consensos e objetivos compartilhados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O argumento aqui desenvolvido foi que uma PI vertical, que priorize setores e tenha a inovação como Pilar central, é legítima, desejável e necessária. A assunção desse pressuposto não visou esconder o dissenso que existe acerca da legitimidade, da eficiência e da eficácia de uma PI desse tipo, e sim pactuar com o leitor, mesmo que provisoriamente, bases comuns. Isso permite principiar a discussão em um segundo nível, que não diz mais respeito a adotar ou não uma PI, mas a debater qual política adotar e com quais instrumentos. No presente caso, quais as possibilidades e os limites da PI existente no período 2004-2014 e como melhorá-los - assumindo, é claro, a retomada de um contexto político geral que permita essa discussão. Convém enfatizar, aliás, que as regras atuais da OMC - das quais o Brasil é signatário - restringem o recurso ao protecionismo sistêmico, mas permitem e incentivam o fomento à atividade econômica mediante CT&I (Weiss, 2005Weiss, Linda. “The State-augmenting Effects of Globalization”. New Political Economy. v. 10, n. 3, 2005.; Suzigan; Furtado, 2006Suzigan, Wilson; Furtado, João. “Política Industrial e desenvolvimento”. Revista de Economia e Política, v. 26, n. 2, 2006.).

Uma lição possível das três peças de PI analisadas é a de que uma PI pode ter mais de uma dimensão. Ou seja, uma dimensão sistêmica e horizontal pode apoiar e se beneficiar de uma dimensão operacionalmente seletiva e vertical. Recupero o argumento de que tal seleção pode trazer frutos para toda a estrutura produtiva e para toda a sociedade, contanto que os setores escolhidos sejam transversais e difusores de tecnologias e inovações, com capacidade de elevar os padrões da estrutura produtiva no conjunto.

Mecanismos e instrumentos para fomentar os setores selecionados em contexto de economia aberta e democracia podem ser divididos em dois grupos. Por um lado, ações voltadas para a mobilização de capitais e de atores dispostos a entrar nesses setores. Por outro, ações relacionadas a exigências de comportamentos específicos dos entrantes. No primeiro grupo de ações, destacaria: (1) incentivos fiscais e linhas de crédito direcionadas, eventualmente a juros subsidiados; (2) apoio a empresas nascentes de base tecnológica, incluindo mecanismos redutores dos riscos do investimento privado e incentivos para a utilização comercial do conhecimento gerado nas universidades; (3) políticas de garantia da demanda (compras governamentais); e (4) política transparente e pactuada de formação de grandes grupos. No segundo grupo de ações, destacaria o estabelecimento de contrapartidas para os beneficiários, que, dependendo do caso, podem variar desde patamares mínimos de produtividade e nacionalização de peças e componentes até participação no mercado internacional e/ou realização de P&D.

Nem a verticalidade da PI nem as medidas e os instrumentos empregados, contudo, podem ser impostos de cima. Ao contrário, sua legitimidade depende de construção conjunta com os envolvidos e interessados na política industrial e com a sociedade. Se é verdade que o foco em alguns setores pode trazer resultados positivos para a competitividade de toda a indústria e para toda a sociedade, também é verdade que tal focalização só terá legitimidade se for objeto de pactuação social. Uma importante questão da passagem da indústria que se quer ter para a indústria que se tem (Pitce-PDP-PBM) foi a carência de legitimidade. Ainda que o lançamento da Pitce possa ser considerado histórico por ter demarcado a retomada de PI pelo Estado brasileiro, não foi suficientemente forte para romper resistências a políticas públicas de desenvolvimento seletivas.

Argumento, portanto, pela necessidade do debate em torno da indústria que se quer ter e da adoção de medidas para nela chegar. E, principalmente, insisto que isso demanda recuperação e fortalecimento institucional das instâncias de formulação, implementação, gestão e acompanhamento da PI criadas entre 1999 e 2014. Um primeiro caminho é libertar a PI dos ciclos eleitorais, de modo que seja concebida como realmente deve ser: uma política de Estado e de longo prazo.

Um segundo caminho consiste no aperfeiçoamento da estrutura de governança da PI mediante a criação de uma instituição (autoridade) efetivamente capaz de realizar aquilo que a ABDI nasceu para fazer: coordenar e articular os agentes e os instrumentos. Seguindo a sugestão de Glauco Arbix (2010_______. (orgs.). Inovação: estratégias de sete países. Brasília: abdi, 2010.), essa autoridade pode constituir-se como superagência de desenvolvimento, diretamente vinculada à Presidência da República e com agenda direcionada à inovação. Com responsabilidades claras, orçamento fortalecido e adequado, poder de agenda e pessoal qualificado e integralmente dedicado, essa superagência não enfraqueceria as demais agências envolvidas na PI, como Finep, BNDES, Apex etc.; ao contrário, ela as fortaleceria na medida em que coordenaria as ações delas aos objetivos da política. A vinculação direta com a Presidência da República é estratégica, pois prestigia a PI, sinalizando que ela é uma política de Estado da mesma importância que a política social ou a macroeconômica. Também permite a identificação imediata do(s) responsável(is) pelos sucessos e fracassos da política (Rodrik, 2009Rodrik, Dani. “Industrial Policy: Don’t Ask Why, Ask How”. Middle East Development Journal. v. 1, n. 1, 2009.).

Na ponta de baixo da PI sugere-se fortalecer as coordenações setoriais (arranjo de comitês executivos e comitês de competitividade setorial) mediante aprofundamento institucional, com o preenchimento de todas as cadeiras com representantes dos atores envolvidos, cronograma periódico e transparente de encontros, pautas claras e valorização das decisões, além de aprofundamento deliberativo e decisório, com ampliação do poder dos representantes da sociedade. Quanto mais efetivas como mecanismo de tomada de decisão são as instituições setoriais, mais os atores interessados as veem como legítimas e importantes, orientando suas ações para elas (Gomide; Pires, 2014Gomide, Alexandre; Pires, Roberto Rocha (orgs.). Capacidades estatais e democracia: arranjos institucionais de políticas públicas. Brasília: Ipea , 2014.; Evans, 2004Evans, Peter. Autonomia e parceria: Estados e transformação industrial. Rio de Janeiro: UFRJ/FDC/Funcex, 2004.).

Por fim, uma maior convergência dos objetivos da PI com outras políticas é necessária. Se nos últimos quinze anos houve convergência com a política de CT&I em trazer a inovação para o centro da agenda, mesmo que essa centralidade tenha minguado entre Pitce, PDP e PBM, o mesmo não pode ser dito da política macroeconômica. O foco excessivo no combate à inflação e no controle do tripé juros, câmbio e superávit primário jogou contra a transformação industrial desde, pelo menos, os anos 1990. A proposta aqui é a produção de convergência mínima da PI com a política macroeconômica, tendo como ponto de partida o compromisso claro do governo federal de não contingenciar recursos relacionados à PI e a CT&I para fins de superávit primário. Resolvido esse primeiro ponto, o caminho pode ser uma gestão da política macroeconômica capaz de apoiar, em vez de sabotar, a transformação industrial, por exemplo, por meio da incorporação (de parte) da agenda do novo desenvolvimentismo.22 22 Ver, por exemplo, os trabalhos e as discussoes do grupo de economistas e cientistas sociais associados a chamada teoria novo‑desenvolvimentista — uma sintese pode ser encontrada em Bresser-Pereira (2016). Ver, tambem, a discussao sobre precos macroeconomicos em autores como Amsden (2009) e Chang (2004).

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  • Weiss, Linda. “The State-augmenting Effects of Globalization”. New Political Economy v. 10, n. 3, 2005.
  • 1
    Optei por manter como referência temporal o artigo de julho de 2018, momento em que ele foi efetivamente preparado para submissão à revista Novos Estudos. A ideia foi não perder de vista seus dois contextos de produção: início das campanhas eleitorais de 2014 e 2018.
  • 2
    Aproveito para agradecer a Si­noel Batista e a Monika Dowbor, que avaliaram as primeiras e as últimas versões deste trabalho, discutiram-nas comigo e deram importantes contribuições e sugestões.
  • 3
    Esse pressuposto não é consensual no debate econômico. Para outras argumentações, sugiro Ferreira e Hamdan (2003Ferreira, Pedro; Hamdan, Guilherme. “Política Industrial no Brasil: ineficaz e regressiva”. Econômica, v. 5, n. 2, 2003.) e Canêdo-PInheiro et al. (2007Canêdo-Pinheiro, Maurício et al. “Por que o Brasil não precisa de política industrial”. Ensaios econômicos da EPGE-FGV, n. 644, 2007.).
  • 4
    A noção de desenvolvimento disso derivada centra-se na diversificação produtiva e na mudança socioeconômica, estando em oposição às visões mais tradicionais de desenvolvimento, fundamentadas nas ideias de crescimento ou ganhos de produtividade. Ver Jacobs (1970Jacobs, Jane. The Economy of Cities. Nova York: Vintage Books, 1970.), Furtado (2000Furtado, Celso. Introdução ao desenvolvimento: enfoque histórico-estrutural. Rio de Janeiro: Paz e Terra , 2000.), Sen (2000), Evans (2004Evans, Peter. Autonomia e parceria: Estados e transformação industrial. Rio de Janeiro: UFRJ/FDC/Funcex, 2004.) e Nelson e Winter (2005Nelson, Richard; Winter, Sidney. Uma teoria evolucionária da mudança econômica. Campinas: Editora Unicamp, 2005.).
  • 5
    A definição de toda e qualquer data traz consigo uma dose de arbi­trariedade. Neste caso, destaco, por um lado, que até 2014 não havia grandes dúvidas a respeito da consolidação de certa normalidade institucional e social entre nós; e, por outro lado, e apesar da continuidade de muitos instrumentos de PI forjados entre 1999 e 2014, esse renovado ativismo começa a ser desconstruído a partir de 2015, com a guinada liberal do segundo governo de Dilma Rousseff, representada pela nomeação de Joaquim Levy como ministro da Fazenda, e a deposição do próprio governo, no ano seguinte.
  • 6
    Para uma discussão das estratégias de desenvolvimento e PIs de outros países de industrialização tardia, ver: Amsden (1989Amsden, Alice. Asia’s Next Giant: South Korea and Late Industrialization. Nova York: Oxford University Press, 1989., 2009_______. A ascensão do “resto”. São Paulo: Editora Unesp, 2009.), Johnson (1982Johnson, Chalmers. MITI and the Japonese Miracle. Tóquio: Charles E. Tuttle Co., 1982.), Arbix et al. (2002Arbix, Glauco et al. (orgs.). Brasil, México, África do Sul e China: diálogo entre os que chegaram depois. São Paulo: Editora Unesp/Edusp, 2002., 2010_______. (orgs.). Inovação: estratégias de sete países. Brasília: abdi, 2010.), Cardoso Jr. et al. (2009Cardoso Jr., José Celso et al. (orgs.). Trajetórias recentes de desenvolvimento: estudos de experiências internacionais selecionadas. Brasília: Ipea , 2009.), Evans (2004Evans, Peter. Autonomia e parceria: Estados e transformação industrial. Rio de Janeiro: UFRJ/FDC/Funcex, 2004.) e Wade (1990Wade, Robert. Governing the Market: Economic Theory and the Role of Government in East Asian Industrialization. Princeton: Princeton University Press, 1990.).
  • 7
    Para uma discussão mais ampla desse processo, que o interpreta como crise do Estado desenvolvimentista, ver: Sallum Jr. (1996Sallum Jr., Brasílio. Labirintos: dos generais à Nova República. São Paulo, Hucitec, 1996.).
  • 8
    Para uma avaliação dos FSs, ver: Araújo et al. (2012Araújo, Bruno et al. Impactos dos Fundos Setoriais nas empresas. Texto para discussão n. 1.737. Brasília: Ipea , 2012.). Os recursos para CT&I aumentaram após a criação desses fundos. De aproximadamente R$ 100 milhões em 1998, pularam para R$ 250 milhões em 1999 e, depois, cresceram aceleradamente até 2003, quando quase alcançaram R$ 1,7 bilhão. Entre 2003 e 2007 a variação foi menor, mas consistente, chegando a R$ 2 bilhões no último ano (Almeida, 2009aAlmeida, Mansueto. “A Constituição Federal de 1988 e as políticas de incentivo à CT&I brasileiras”. In: Cardoso Jr., José Celso (org.). A Constituição brasileira revisitada: recuperação histórica e desafios atuais das políticas públicas nas áreas econômica e social, v. 1. Brasília: Ipea, 2009a.).
  • 9
    A saber: Aeronáutico, Agronegócio, Amazônia, Aquaviário, Biotecnologia, Energia, Espacial, Infraestrutura, Mineral, Petróleo e Gás Natural, Recursos Hídricos, Saúde, Telecomunicações, TIC, Transporte, Verde-Amarelo.
  • 10
    Hoje, Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), dada a fusão entre MCT e Ministério das Comunicações, em 2016.
  • 11
    Entre 2003 e 2007 a taxa de execução dos recursos dos FSs variou entre 30% e 40% (Almeida, 2009aAlmeida, Mansueto. “A Constituição Federal de 1988 e as políticas de incentivo à CT&I brasileiras”. In: Cardoso Jr., José Celso (org.). A Constituição brasileira revisitada: recuperação histórica e desafios atuais das políticas públicas nas áreas econômica e social, v. 1. Brasília: Ipea, 2009a.).
  • 12
    Destaco, ainda, a Lei de Biossegurança (n. 11.105/2005), que regula a produção e comercialização de organismos geneticamente modificados e a pesquisa com células-tronco.
  • 13
    Segundo dados do próprio BNDES, em 2012, o orçamento para financiamento de longo prazo foi de quase R$ 160 bilhões. Desse valor, R$ 110 bilhões foram para grandes empresas de setores tradicionais. Mais informações no relatório de desempenho de 2012, disponível em: <www.bndes.gov.br/SiteBN DES/bndes/bndes_pt/Hotsites/Relatorio_Anual_2012>.
  • 14
    Para uma abordagem ampla e integrada das diferentes ações públicas de fomento a empreendedorismo e pequenas e médias empresas (pmes) inovadoras e/ou de base tecnológica no período em questão, ver: Torres Freire et al. (2017Torres Freire, Carlos et al. “Inovação e empreendedorismo: políticas públicas e ações privadas”. Novos Estudos Cebrap, n. 109, 2017.).
  • 15
    Composto por igual número de representantes do governo federal e da sociedade civil.
  • 16
    Nos seguintes setores: aeronáutico; petróleo e gás; bioetanol; celulose e papel; siderurgia e mineração; carnes.
  • 17
    Nestes setores: automotivo; bens de caPItal; têxtil; moveleiro; higiene e perfumaria; construção; naval; calçados; agroindústria; biodiesel; plásticos; complexo de serviços (transportes, turismo, engenharia e construção, finanças, seguros e comunicações).
  • 18
    A saber: saúde; tics; energia nuclear; defesa; nanotecnologia; biotecnologia.
  • 19
    Agroindústria; automotivo; bens de caPItal; comércio; complexo da saúde; construção civil; couro, calçados, têxtil, confecções, gemas e joias; defesa, aeronáutica e espacial; energias renováveis; higiene pessoal, perfumaria e cosméticos; logística; metalurgia; mineração; móveis; papel e celulose; petróleo, gás e naval; químico; serviços; TI e complexo eletroeletrônico.
  • 20
    Ações especiais em desenvolvimento regional; bem-estar do consumidor; comércio exterior; competitividade de pequenos negócios; condições de trabalho; desenvolvimento regional; inovação; investimento; produção sustentável; qualificação.
  • 21
    Isso é problemático, pois o objetivo primordial da Fazenda não é promover a transformação industrial.
  • 22
    Ver, por exemplo, os trabalhos e as discussoes do grupo de economistas e cientistas sociais associados a chamada teoria novo‑desenvolvimentista — uma sintese pode ser encontrada em Bresser-Pereira (2016_______. “Teoria novo-desenvolvimentista: uma síntese”. Cadernos do Desenvolvimento, v. 11, n. 19, 2016.). Ver, tambem, a discussao sobre precos macroeconomicos em autores como Amsden (2009_______. A ascensão do “resto”. São Paulo: Editora Unesp, 2009.) e Chang (2004Chang, Ha-Joon. Chutando a escada: a estratégia do desenvolvimento em perspectiva histórica. São Paulo: Editora Unesp , 2004.).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Set 2019
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2019

Histórico

  • Recebido
    11 Set 2018
  • Aceito
    05 Maio 2019
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