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NAVEGAR É PRECISO: As jornadas da cocaína e a expansão das facções pelo Brasil

Navigation is Needed: The Cocaine Journeys and the Expansion of Criminal Groups across Brazil

RESUMO

Apresentamos modos práticos e rotineiros da expansão e circulação da cocaína por fronteiras e territórios brasileiros a partir de uma perspectiva etnográfica das jornadas de cloridrato e da pasta base percorridas por transportadores para atender o mercado nacional e internacional.

PALAVRAS-CHAVE:
mercados ilegais; facções; cocaína; jornadas; mobilidades

ABSTRACT

We present practical and routine modes of cocaine’s expansion and circulation across Brazilian borders and territories from an ethnographic perspective of the journeys of hydrochloride and base paste made by transporters to serve the national and international markets.

KEYWORDS:
illegal markets; criminal groups; cocaine; journeys; mobilities

INTRODUÇÃO

Neste artigo, propomos uma compreensão do transporte da cocaína tanto na forma de cloridrato, comumente direcionada para o mercado externo, quanto na forma de pasta base, que tem como destino típico o mercado interno. Para tanto, argumentamos que aqueles que transportam as substâncias navegam por múltiplas trilhas, infraestruturas e barreiras e, assim, produzem jornadas de mercadorias distintas, apesar de fazerem parte de uma mesma cadeia de valor.

As jornadas da cocaína pelo território brasileiro começam na fronteira oeste, a partir de países vizinhos como Peru, Bolívia e Colômbia (países produtores) e pelo Paraguai (país de trânsito). As fronteiras do Brasil com esses países são pontos de atravessamento transnacional e territórios onde funcionam mercados ilegais transfronteiriços. Por isso são estratégicos para grupos criminais que operam economias ilícitas, como as facções. Nossa pesquisa tem mostrado uma crescente expansão de facções nacionais para essas regiões, sobretudo do Primeiro Comando da Capital (PCC) e do Comando Vermelho (CV). Nos últimos dez anos, a literatura tem chamado a atenção para esse fenômeno (Candotti; Cunha; Siqueira, 2017Candotti, Fábio Magalhães; Cunha, Flávia Melo da; Siqueira, Ítalo Barbosa Lima. “A grande narrativa do Norte: considerações na fronteira entre crime e Estado”. In: Crozera, Francisco et al. (orgs.). BR 111: as rotas das prisões brasileiras. São Paulo: Veneta, 2017, pp. 35-47.; Feltran, 2018Feltran, Gabriel. Irmãos: uma história do PCC. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.; Couto, 2020Couto, Aiala Colares. “Gangues, pichações e facções: evolução e configuração geográfica dos territórios do tráfico de drogas na periferia de Belém”. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Pará (IHGP), v. 7, n. 2, 2020, pp. 119-41.; Lessing; Willis, 2019Lessing, Benjamin; Willis, Graham. “Legitimacy in Criminal Governance: Managing a Drug Empire from Behind Bars”. American Political Science Review, v. 113, 2019, pp. 584-606.; Manso; Dias, 2018Manso, Bruno Paes; Dias, Camila Nunes. A guerra: a ascensão do PCC e o mundo do crime no Brasil. São Paulo: Todavia, 2018.; Melo; Paiva, 2021Melo, Juliana; Paiva, Luiz Fábio S. “Violências em territórios faccionados do nordeste do brasil: notas sobre as situações do Rio Grande do Norte e do Ceará”. Revista USP, n. 129, jul. 2021, pp. 47-62.; Rodrigues, 2020Rodrigues, Fernando de Jesus. “‘Corro com o PCC’, ‘Corro com o CV’, ‘Sou do crime’: facções, sistema socioeducativo e os governos do ilícito em Alagoas”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 35, n. 103, 2020, pp. 1-21.), porém ainda se sabe pouco sobre os modos práticos dessa expansão. O que se sabe, contudo, é que essa expansão se dá de maneira diferente entre as facções. Enquanto o PCC tende a fazer alianças locais, o CV preconiza um domínio territorial (Hirata; Grillo, 2017Hirata, Daniel; Grillo, Carolina. “Sintonia e amizade entre patrões e donos de morro: perspectivas comparativas entre o comércio varejista de drogas em São Paulo e no Rio de Janeiro”. Tempo social, v. 29, n. 2, 2017, pp. 75-97.).

Nosso esforço, aqui, será mostrar duas jornadas “típicas”, que no mundo concreto podem se entrecruzar de diferentes maneiras. Não assumimos que essas são as únicas jornadas possíveis, mas as que se revelaram mais regulares em nosso trabalho de campo, feito de forma colaborativa, a partir da observação repetida de muitos micromovimentos da cocaína, no atacado e no varejo. As jornadas são formadas por diversas trilhas pelas quais os transportadores navegam, conforme as circunstâncias, improvisos, situações inesperadas e barreiras.

As jornadas nos permitem pensar como o Brasil se tornou protagonista, ao longo dos anos, no consumo, na circulação e também na distribuição transnacional de drogas, especialmente de cocaína. Hoje o país figura como um dos grandes importadores e exportadores mundiais dessa mercadoria (UNODC Research; Europol, 2021UNODC Research; Europol. Cocaine Insights: The Illicit Trade of Cocaine from Latin America to Europe - From Oligopolies to Free-for-All? Viena: UNODC, 2021. Disponível em: <Disponível em: https://www.UNODC.org/documents/data-and-analysis/cocaine/Cocaine_Insights_2021.pdf >. Acesso em: 13/03/2023.
https://www.UNODC.org/documents/data-and...
).

Diferentes atores criminais, inclusive aqueles ligados às facções nacionais, agenciam esses pontos de intermediação em pequena e grande escala. Um motivo importante para se tornarem transportadores adequados de cocaína são os seus conhecimentos especializados de infraestrutura, logística e funcionamento dos serviços de vigilância. O cloridrato e a pasta base percorrem longos caminhos até chegar ao seu destino ou parar nas barreiras policiais; podem ser apreendidos com o transportador ou retroalimentar o mercado, agora pelas forças de segurança, que os reintroduzem nas tramas comerciais. A mobilidade das drogas, portanto, pode ser analisada sob diferentes perspectivas, a depender da posição dos agentes na produção dupla de barreiras e fluxos. Há diferentes produções de sentido sobre o movimento de pessoas e coisas pelas redes comerciais nacionais e internacionais e pelas infraestruturas que viabilizam as jornadas da cocaína.

SOBRE JORNADAS, NAVEGAÇÕES E ROTAS

O desafio de compreender como pessoas, coisas e imaginários se deslocam e se fixam nos territórios tem sido enfrentado por uma tradição de estudos conhecida como “virada das mobilidades” ou “giro móvel” (Freire-Medeiros; Lages, 2020Freire-Medeiros, Bianca; Lages, Mauricio Piatti. “A virada das mobilidades: fluxos, fixos e fricções”. Revista Crítica de Ciências Sociais, v. 3, 2020, pp. 121-42.; Sheller; Urry, 2016Sheller, Mimi; Urry, John. “Mobilizing the New Mobilities Paradigm”. Applies Mobilities, v. 1, n. 1, 2016, pp. 10-25.). Esses estudos nos inspiraram a adotar novas abordagens metodológicas e analíticas com relação ao movimento, tempo e espaço das jornadas da cocaína. Também dialogamos com a crítica logística (Cowen, 2014Cowen, Deborah. The Deadly Life of Logistics: Mapping Violence in Global Trade. Minneapolis, University of Minnesota Press, 2014.; Toscano, 2014Toscano, Alberto. “Lineaments of the Logistical State”. Viewpoint Magazine, 2014.; Chua et al., 2018Chua, Charmaine et al. “Introduction: Turbulent Circulation: Building a Critical Engagement with Logistics”. Environment and Planning D: Society and Space, v. 36, n. 4, 2018, pp. 217-29.; Schouten et al., 2019Schouten, Peer et al. “States of Circulation: Logistics off the Beaten Path”. Environment and Planning D: Society and Space , v. 37, n. 5, 2019, pp. 779-93.), que foge da representação apolítica desse campo. Sob esse olhar, as infraestruturas não são apenas coisas materiais, mas redes afetivas e técnicas entre pessoas (Rodrigues; Amorim, 2022Rodrigues, Fernando de Jesus; Amorim, Adson. “Mobilidades marginais na ‘era das facções’: entre trabalho, família e crime”. Antropolítica , v. 54, n. 2, 2022.; Simone, 2021Simone, AbdouMaliq: “People as Infrastructure”. Urban Geography, v. 42, n. 9, 2021, pp. 1.341-8.) e capitais. Defendemos que a circulação de mercadorias, muitas vezes vista como unificada e coerente, é menos contínua e mais turbulenta e friccionada (Tsing, 2005Tsing, Anna. Friction: An Ethnography of Global Connection. Princeton: Princeton University Press, 2005.; 2015Tsing, Anna. The Mushroom at the End of the World: On the Possibility of Life in Capitalist Ruins. Princeton: Princeton University Press , 2015.) do que geralmente se supõe.

Com uma perspectiva etnográfica, partimos de métodos que captam relações e rotinas dos atores. Dessa forma, a partir de registros de campo, entrevistas e coleta de material secundário sobre o comércio de drogas (como notícias, dados institucionais, operações policiais e processos judiciais públicos), propomos compreender as mobilidades da cocaína a partir da ideia fundamental de “jornadas” (Knowles, 2017Knowles, Caroline. Nas trilhas de um chinelo: uma jornada pelas vias secundárias da globalização. São Paulo: Annablume, 2017.; Feltran, 2022Feltran, Gabriel (org.). Stolen Cars: A Journey through São Paulo’s Urban Conflict. Oxford: Wiley, 2022.; Feltran; Fromm, 2020Feltran, Gabriel; Fromm, Deborah. “Ladrões e caçadores: sobre um carro roubado em São Paulo”. Antropolítica, n. 50, 2020, pp. 128-49.).

Argumentamos que essa ideia traz o foco analítico para as viagens entrelaçadas de objetos, pessoas, lugares e informações em movimento, permitindo-nos fazer conexões entre diferentes escalas, ritmos e percursos, sejam eles locais, nacionais e transnacionais. Assim, as viagens do cloridrato e da pasta base são típicas e diferentes entre si, embora existam conexões entre elas. A tipicidade dos trajetos foi construída com base em registros de micromovimentos que se repetiram em trabalhos de campo, feitos de forma colaborativa por diferentes pesquisadores. Alguns registros condensam mais tipicidades do que outros e serviram de base para compor metodologicamente as duas trajetórias: a do cloridrato e a da pasta base. No interior de cada uma, existem várias possibilidades de navegação dos atores pelas microtrilhas ou “cabriteiras”,1 1 Termo utilizado pelos interlocutores para se referir às estradas alternativas, onde há menos barreiras e fiscalizações. além das barreiras que também compõem as jornadas.

Nesse sentido, a noção de “tacking” (Amit; Knowles, 2017Amit, Vered; Knowles, Caroline. “Improvising and Navigating Mobilities: Tacking in Everyday Life”. Theory, Culture & Society, v. 34, n. 7-8, 2017, pp. 165-79.) nos ajuda a refletir sobre a improvisação cotidiana e circunstancial dos transportadores. Também nos ajuda a entender como as pessoas navegam no dia a dia, com inventividade e senso de ritmo para lidar com o inesperado. Trata-se de improvisação situacional diante das barreiras e dos problemas cotidianos que os atores enfrentam em um mundo que muda rapidamente. No mesmo sentido, a noção de “navegação social” (Vigh, 2010Vigh, Henrik. “Youth Mobilisation as Social Navigation. Reflections on the Concept of Dubriagem”. Cadernos de Estudos Africanos, n. 18-9, 2010, pp. 139-64.) também nos parece rentável para compreender os movimentos dos transportadores pelas jornadas da cocaína. Ela diz respeito ao modo como os atores experienciam, imaginam e antecipam o movimento, em como se movem em contextos incertos e em ambientes que mudam rapidamente.

Essas noções se mostram ainda mais úteis quando falamos de transporte de mercadorias ilícitas. Se o movimento das lícitas está associado ao marketing e à disputa para torná-las públicas e visíveis, na mobilidade das ilícitas é necessário manter o sigilo, a confiança e a proteção. Como há sempre a possibilidade de repressão, é importante que os caminhos se diversifiquem. E a diversificação requer habilidades para navegar tanto por infraestruturas marginais - que em muitos momentos inexistem ou são fabricadas precariamente - quanto por barreiras levantadas por atores estatais. Ocultam-se mercadorias em matas, garagens e armazéns; evitam-se barreiras, controles e sistemas de vigilância; alteram-se senhas, chips, telefones, endereços, roupas e aparências; navega-se por estradas, trilhas, caminhos.

Por outro lado, a ideia de “rota”, frequentemente associada a esses caminhos, é um termo utilizado pelas forças de segurança, pela maior parte dos jornalistas (Abreu, 2018Abreu, Allan de. Cocaína: a rota caipira. O narcotráfico no principal corredor de drogas do Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: Record, 2018.; Neves; Guedes; Azeredo, 2021Neves, Márcio; Guedes, Marcos; Azeredo, André. “Guerra na Fronteira: a guerra pelo tráfico na fronteira entre Brasil e Paraguai que matou 109 pessoas de forma violenta em 2020.” R7 Studio, 14/02/2021. Disponível em: <Disponível em: https://estudio.r7.com/guerra-na-fronteira-rota-estrategica-da-droga-no-mundo-12032021 >. Acesso em: 26/03/2023.
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) e por pesquisadores, baseados sobretudo nas perspectivas daquelas forças, nos dados de apreensão e de investigações (Duarte, 2022Duarte, Joana das Flores. “O novo açúcar: a rota da cocaína na perspectiva de gênero.” Revista Estudos Feministas v. 30, n. 1, 2022, pp. 1-13.; Beserra 2022Beserra, Louise Dias. Segurança aduaneira brasileira: o tráfico marítimo de cocaína no Porto de Santos e o seu impacto para a segurança internacional. Dissertação (mestrado em relações internacionais e estudos europeus). Évora: Escola de Ciências Sociais/Universidade de Évora, 2022.). Essas informações também alimentam relatórios de agências de pesquisa e think tanks nacionais e internacionais (por exemplo UNODC Research; CoE Brazil, 2022UNODC Research; CoE Brazil. 2022. Brazil in the Regional and Transatlantic Cocaine Supply Chain: The Impact of Covid-19, Cocaine Insights 4. Vienna: UNODC, 2022. Disponível em: <Disponível em: https://www.UNODC.org/documents/data-and-analysis/cocaine/Cocaine_Insights4_2022.pdf >. Acesso em: 26/06/2023.
https://www.UNODC.org/documents/data-and...
). A construção das “rotas” é feita, portanto, com base nas perspectivas desses atores que buscam vigilância, repressão, apreensão ou, em algumas situações, extorsão.

Argumentamos, entretanto, que “rota” não é um bom termo para compreender as agências e os movimentos dos transportadores, pois não leva em consideração o improviso dos atores que navegam cotidianamente por caminhos e barreiras diversas dentro de cada jornada. Esse termo não pressupõe que os transportadores se movem em um mundo social em constante movimento, em ambientes instáveis e variáveis. Mais que ao seguir “rotas”, os transportadores “navegam” cotidianamente por caminhos, lidando com barreiras e imprevistos. É nesse ponto que a ideia de “rota” limita analiticamente a compreensão do movimento de bens ilegais, como da cocaína, por seus transportadores.

A importância do sentido de produção de movimento entre esses atores, nos fez analisar suas práticas e conhecimentos a partir da ideia de “navegação”. Navegar apreende a produção dinâmica e mutável do movimento dos transportadores através de infraestruturas e redes de pessoas que comportam conhecimentos específicos. É em busca da circulação e conhecimento das barreiras que os transportadores dinamizam os mercados ilegais de cocaína. Dessa forma, reconstruímos trajetórias de objetos e ligações entre pessoas engajadas em seus movimentos para, assim, desenharmos as “jornadas” da cocaína.

JORNADA DA PASTA BASE DE COCAÍNA

Janeiro de 2022, 8 horas da manhã, Cáceres, Mato Grosso. Estávamos na porta de uma ONG dedicada aos “reeducandos”, como os próprios colaboradores chamam as pessoas egressas do sistema penitenciário. Conhecemos Joaquim2 2 Todos os nomes foram alterados para preservar a identidade dos interlocutores. ali, do lado de fora, enquanto aguardávamos a abertura da ONG. Homem pardo, simpático e tímido, estava com a filha adolescente, usava boné de aba arredondada, calças jeans e camiseta.

Anos antes desse encontro, Joaquim começou a transportar pasta base de cocaína da Bolívia para o Brasil, partindo de cidades fronteiriças, como San Vicente, especialmente para cidades do interior de Goiás. No entanto, também fazia entregas mais esporádicas em São Paulo, Rio de Janeiro, Maranhão e Alagoas. Inicialmente, ele foi convidado por grupos do estado de Goiás por ser um nativo com grande conhecimento de pessoas e estradas “cabriteiras” da região. Transportador de grandes quantidades de pasta base - uma função especializada no circuito da cocaína -, ele simula a legalidade de seu movimento em um território legível sob vigilância de policiais estaduais e federais. Um forasteiro não sabe navegar pela região, não conhece os atalhos e os ritmos da vigilância estatal e os rumores entre moradores. Essa habilidade é considerada valiosa pelos maiores operadores do tráfico, antes controlado sobretudo por grupos locais e, hoje, em especial por aliados de facções, que chegaram posteriormente à região. As facções têm pessoas especializadas em preparar a logística e o transporte da cocaína em pontos nodais de receptação e distribuição. Essas pessoas também são encarregadas de procurar transportadores como Joaquim, que conhecem bem a região e suas estradas formais e informais. Um dos fenômenos mais importantes associado à expansão das facções brasileiras (como o PCC e o CV, além da antiga Família do Norte) é o controle dos pontos de intermediação da cocaína na fronteira oeste. As facções se tornaram um dos poucos atores a controlar a conexão entre fronteiras e pontos de distribuição em municípios de todo o interior do Brasil e regiões portuárias. Sem acesso a transportadores como Joaquim - e foi esse acesso que tornou facções como o PCC uma rede presente em toda a cadeia de valor da cocaína -, o acúmulo de riqueza em escala global a partir de redes criminais brasileiras não poderia acontecer. Joaquim foi indicado para o trabalho por ter sido criado na região de fronteira e ter trabalhado durante muito tempo como “praieiro”, como são chamados os ajudantes das fazendas. “Tocando gado”, ele conheceu muitas estradas, além de trabalhadores rurais e pessoas do “mundo do crime”.

O conhecimento de Joaquim sobre o trabalho da polícia e as barreiras é tão detalhado quanto seu repertório de navegação no território. Ele expressa uma habilidade muito especializada para agenciar conhecimento de rotinas minuciosas. Com ela, produz agência criativa, improvisada e reflexiva ao se mover. Ele nos contou como moldava o tempo de sua mobilidade pela temporalidade do policiamento. Ele e seus colegas sabiam dias e horários das trocas de plantões. Esse era o bom momento para passar pela barreira, porque os policiais dificilmente os paravam. Outra estratégia era seguir as viaturas que saíam em patrulha, com o farol desligado, aproveitando a luz dos faróis à frente. Todo esse conhecimento ajudava nas possibilidades situacionais de navegação, nos desvios pelas matas, nos improvisos a partir dos quais se formava o trecho da cocaína. Mas essa não era a única função de Joaquim: ele também avaliava a qualidade da pasta base e julgava se valia a pena embarcar a mercadoria. Na Bolívia, testava a droga, fazendo de certo modo um controle de qualidade. Ele tinha conhecimento de que aquela era uma jornada de pasta, e não de cloridrato, e que atenderia ao mercado interno.

Certa vez, depois de testar a pasta, Joaquim fez o trajeto que viria a repetir muitas vezes. De Asunción, na Bolívia, chegava próximo a Cáceres, passando por povoados bolivianos e “cabriteiras”. Não percorreu o trajeto mais curto, mas navegou as estradas em piores condições, barrentas, desertas, mas que ele conhecia bem. Seu destino era Palmeiras de Goiás, na Grande Goiânia, uma viagem que usualmente durava um dia, mas que, pelas vicinais de terra, mesmo sem ele dormir, durava três dias. O grupo que o contratou tinha uma fazenda como ponto de apoio. O processo era o mesmo de quando entregava pasta base na região de Ribeirão Preto, em São Paulo: Joaquim entrava em contato com o caseiro, descarregava a caminhonete, enterrava a droga no fundo da fazenda e ia embora.

Transportadores como Joaquim navegam diariamente pelas rodovias do país. Um dos pontos de parada e destino da pasta base de cocaína é a cidade de São Paulo, por se tratar do maior centro consumidor de drogas do Brasil e local estratégico para armazenamento e escoamento para outras grandes cidades e estados. No entanto, cidades do interior do estado também são comumente utilizadas, como Ribeirão Preto.

Em muitas dessas situações, tanto no interior quanto na capital, a pasta base é recebida por outro operador, hoje “faccionado”, que propõe uma “fita”3 3 Termo utilizado pelos interlocutores para se referir a alguma atividade ilícita, como furtar um carro ou transportar droga. para alguém que esteja precisando de dinheiro e possa simular uma viagem legal pelo país. Essa pessoa - homens, mas também cada vez mais mulheres - pega um ônibus de uma grande empresa rodoviária, ou de uma pequena agência de turismo e fretamento semilegal ou clandestina, levando na bagagem algumas dezenas de quilos de cocaína. Nas diferentes rodoviárias e paradas, no meio de estradas, em pontos ermos ou em centros e periferias de cidades do Nordeste, a droga é redistribuída por diferentes veículos e redes.

Se Joaquim tivesse transportado a droga até Ribeirão Preto, como já havia feito, era capaz que a continuação da jornada fosse feita por Rebeca. Rebeca embarcou em um ônibus de uma pequena empresa clandestina que havia partido do bairro do Brás, em São Paulo, e cujo destino era Garanhuns, em Pernambuco. Ela carregava na bagagem trinta quilos de pasta acomodados em uma mala, sem o conhecimento dos motoristas e dos passageiros. A própria rede “familiar” da jovem, parte vivendo em São Paulo e parte em Alagoas, foi que lhe ofereceu a oportunidade de fazer algum dinheiro.

O ônibus fez o trajeto rotineiro por rodovias de São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Alagoas e Pernambuco. Passou por postos policiais sem ser abordado. Rebeca desceu antes do destino final, em Delmiro Gouveia, sertão de Alagoas. Lá, ela tomou uma van para Arapiraca e, de lá, outra para a rodoviária de Maceió, onde entregou a mercadoria a Carlos, dono de postos de combustível na região. A cocaína foi acomodada no fundo falso de um Ford Fusion.

No caminho até Palmeira dos Índios, Carlos entremeou trechos de estradas federais e estaduais para evitar as barreiras da Polícia Rodoviária Federal (PRF). Ainda na Zona da Mata, ele foi parado por uma barreira móvel da polícia militar. Como nos contou Jorge, um interlocutor considerado nas redes policiais, o cabo Vargas fez sinal para que Carlos parasse no acostamento. Ao se aproximar, já sentindo o nervosismo do motorista, Vargas lhe pediu a carteira de motorista e o documento do carro. Em seguida, informou-lhe que precisaria revistar o veículo. Fez uma revista rigorosa e encontrou os tabletes de cocaína no fundo falso.

Chamado pelo colega, o sargento Maldonado se preocupou em saber se havia armas no veículo. Não encontrando, chamou o condutor para uma conversa, fechou o porta-malas e liberou Carlos para seguir viagem. Carlos agradeceu humildemente ao sargento e lhe disse que aparecesse em um de seus postos de combustível em Maceió, onde seria bem-vindo. O Ford Fusion seguiu seu caminho e os tabletes se converteram em pequenas porções de cocaína - as “petecas” - que seriam distribuídas em biqueiras e pontos de venda da região, chegando até o interior de Pernambuco. Uma semana depois, o sargento pediu que sua guarnição se dirigisse ao posto informado por Carlos. Quinze minutos após a chegada dos policiais e uma conversa tensa, Carlos entregou maços de dinheiro ao comando da guarnição.

JORNADA DO CLORIDRATO DE COCAÍNA

Eu vim com intenção de almoçar em Miranda, no Mato Grosso do Sul. Lá tem um restaurantezinho que vende peixe fresco. Já tinham me falado que é muito bom. Chegando lá, havia uma barreira policial em torno das 11 horas da manhã. Eu não sei por quê, mas algo me disse naquele momento que já era. Quando eu vi a cena assim, eu senti alguma coisa errada. Não era pra mim, foi estranho. Quando cheguei na barreira, os policiais saíram correndo e mandaram eu parar, falaram: “A casa caiu, você está preso”. Como se já tivesse sido indicado por alguém do tráfico, não sei. Eu acho que até foi… Quando não é pra ser… Foi quando aconteceu… (Transcrição de entrevista, Cáceres, Mato Grosso, janeiro de 2022)

Seu Pedro é um homem negro, alto, de meia-idade. De família pobre, melhorou a vida trabalhando. Com dez anos, já ajudava como servente de pedreiro. Antes de se tornar caminhoneiro, também dirigiu ônibus e foi instrutor de autoescola. Ainda usava tornozeleira eletrônica por baixo da calça naquela manhã quente, em Cáceres, quando o conhecemos na mesma ONG em que conhecemos Joaquim. Ele nos contou como foi preso em 2012, por transporte de cloridrato de cocaína. No “mocó”4 4 Mocós são os esconderijos, mais ou menos profissionais, que abrigam as drogas nos veículos, por exemplo, pneus, assoalho, carroceria etc. da carroceria de seu caminhão estavam 286 quilos carregados na Bolívia.

Seu Pedro seguiu as instruções de um parceiro que o convidou para o negócio, com a promessa de que seria uma jornada tranquila. Antes, ele se certificou do trajeto e das pessoas a quem ia se reportar no caminho. Foi de Cáceres até Corumbá, onde carregou a sua carreta graneleira com aparelhos da marca brasileira Tramontina; de lá, levou a carga até Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia. Caminhões que vão carregados para a Bolívia, como o de seu Pedro, têm dificuldade de voltar para o Brasil com alguma mercadoria. O frete do cloridrato de cocaína, apesar de ilegal, é uma opção que promete uma vultosa rentabilidade.

A fronteira do Brasil com a Bolívia possui dinâmicas particulares. Diferentemente de Cáceres, onde predomina o transporte de pasta base, em Corumbá predomina a importação de cloridrato de cocaína. Seu Pedro cresceu em Cáceres e tinha experiência com as rodovias e fronteiras brasileiras. Era, portanto, um operador importante na jornada do cloridrato pelas rodovias do Brasil. Por elas, a mobilidade das mercadorias ilegais é simulada como legal em carregamentos cotidianos que ligam os quatro cantos do país.

Assim, seu Pedro saiu de Corumbá com a lona alta (cerca de 2,20 metros de altura), passou na aduana para liberar a carga e seguiu para Santa Cruz de la Sierra. Depois de descarregar o caminhão, ligou para um número combinado e avisou que o caminhão estava liberado. Levou o caminhão para um galpão e lá, sem sua presença, o cloridrato foi escondido. Ele nos disse que não sabia exatamente onde era o “mocó”, o tipo e a quantidade de droga que estava transportando e para quem a estava transportando. Esperou três dias até seus interlocutores lhe informarem que podia pegar o caminhão, carregado apenas com a cocaína “mocozada”, e seguir viagem. Seu Pedro foi contratado para transportar - sua única função e elo na cadeia. Ele não sabia se estava lidando com grupos locais ou facções, isso porque a escala mercantil do atacado de cloridrato é alta, tornando difícil e desvantajoso para os atores terem conhecimento de todos os elos da cadeia. No atacado, as pessoas de uma facção não têm necessariamente interesse em afirmar publicamente esse vínculo, pois a bandeira faccional pode se tornar um empecilho aos negócios. Na biqueira, por outro lado, o nome da facção ajuda a legitimar o poder no território.

Seu Pedro atravessou a fronteira para o Brasil sem problemas e, em Corumbá, carregou o caminhão com 33 mil quilos de feijão preto que seriam descarregados em São José dos Campos, em São Paulo, e depois seguiria viagem até Praia Grande, na Baixada Santista. Mas ele não chegou ao seu destino. Menos de duzentos quilômetros da fronteira da Bolívia com o Brasil, antes de chegar em Miranda, local em que havia se programado para almoçar, seu Pedro foi abordado pela PRF. Às 11 horas da manhã, policiais pararam seu caminhão, já muito certos de que fariam a apreensão da droga, pois, antes de qualquer inquirição ou revista, já avisaram que “a casa tinha caído”. Os policiais já sabiam que havia cocaína no caminhão e constantemente perguntavam onde ela estava escondida. Seu Pedro de fato não sabia responder. Acompanhou o processo de dentro da prisão: a princípio foram apreendidos 286 quilos de cloridrato de cocaína, mas no resumo total do processo constavam 276 quilos.

A polícia passou um bom tempo procurando a droga no caminhão. Os tijolos de cloridrato estavam na base da quinta roda, onde a carreta é engatada e há algumas peças de encaixe. Por trás de um desses encaixes, um policial conseguiu enfiar um espeto e ver que havia cocaína ali. O cloridrato de cocaína que seu Pedro transportava ia para o Porto de Santos e de lá seguiria provavelmente para a Europa ou África.

Se o cloridrato de cocaína tivesse chegado ao Porto de Santos, as estratégias utilizadas para driblar as fiscalizações e embarcá-lo nos navios seriam muitas. Em alguns casos, a droga é colocada em contêineres, fora da área do Porto Organizado, por exemplo, em galpões no Recinto Especial para Despacho Aduaneiro de Exportação (Redex).5 5 Segundo interlocutores, as cargas que passam pelo Redex são menos fiscalizadas porque são cargas de grandes exportadores, com “canal verde”, isto é, o desembaraço da mercadoria é automático, dispensa exame documental e verificação física do produto pela Receita Federal. A cocaína ainda pode ser colocada em contêineres no trajeto entre esses espaços e o porto: os transportadores pegam a carga no Redex, param em algum esconderijo para colocar a droga e seguem para o porto. Também há situações em que o cloridrato é colocado no interior da área portuária, por exemplo, nos terminais de operação, com a ajuda de funcionários das empresas privadas.

Os atores “do crime” geralmente utilizam o termo “estufagem” ou “prenhagem” para se referir ao embarque da droga. Já as forças de segurança costumar categorizar o modus operandi dos “atores criminais” nos portos. Há, por exemplo, o “rip-on/rip-off”, em que os tijolos de cloridrato são colocados em malas dentro dos contêineres, em geral perto da porta; desse modo, ele é transportado com mercadorias lícitas, mas não é camuflado no interior delas. Na categoria “ocultação”, mercadorias lícitas são alteradas para ocultar a droga; nesse caso pode haver envolvimento dos exportadores ou de pessoas “cooptadas” que, em algum momento do manuseio ou transporte, ocultam a droga dentro das cargas lícitas, por exemplo, em sacolas de açúcar. Com essas estratégias é possível embarcar mais quantidade de cloridrato (às vezes toneladas) do que com outras que descreveremos a seguir (em geral algumas centenas de quilos).

Algumas estratégias utilizam a própria estrutura do contêiner para embarcar a droga, como o motor do contêiner “reefer” (contêiner refrigerado) ou a parede de isolamento térmico. Na estratégia conhecida como “sea chest” ou “caixa de mar”, as drogas são escondidas por “mergulhadores” em compartimentos no casco dos navios. Também há o “içamento” ou “pescaria”, quando tripulantes “içam” a droga de pequenas embarcações no mar. Somam-se a essas estratégias o transporte de menor quantidade de droga por meio de “mulas”, isto é, pessoas que carregam a droga no próprio corpo ou em malas nos navios de carga ou passageiros. O cloridrato também pode ser transportado em veículos, como dentro de carros novos ou até em tratores. Essa estratégia não utiliza contêineres e a cocaína passa por terminais específicos, dedicados à operação logística de veículos. Os navios usados nesse tipo de estratégia, os navios “Ro-Ro”, ou roll-on/roll-off, são supercargueiros de “carga rolante”, utilizados para o transporte de veículos de pequeno a grande porte.

Cada uma dessas estratégias requer diferentes agências de trabalhadores portuários. Eles podem participar do tráfico apenas fornecendo informações privilegiadas. Há também trocas de “mercadorias políticas” (Misse, 1997Misse, Michel. “Crime urbano, sociabilidade violenta e ordem legítima: comentários sobre as hipóteses de Machado da Silva”. Mimeo. Rio de Janeiro, 1997. Disponível em: <Disponível em: https://www2.mppa.mp.br/sistemas/gcsubsites/upload/60/crime_urbano.pdf >. Acesso em: 26/03/2023.
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) com funcionários públicos ou privados, por exemplo, aqueles que operam o escâner. Como apurou Allan de Abreu (2018Abreu, Allan de. Cocaína: a rota caipira. O narcotráfico no principal corredor de drogas do Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: Record, 2018., p. 447) em interceptações telefônicas, “o pátio, o segurança, o raio X, tudo é pago, tá ligado, amigo?”.

A importância do Porto de Santos no mercado transnacional da cocaína se expressa nas suas taxas de apreensão, as maiores do país. Mas elas dizem mais sobre o trabalho das forças policiais do que do mercado de fato. O porto é importante não apenas porque cruza uma “rota” principal, como dizem algumas matérias jornalísticas, mas também porque é ponto de atravessamento do cloridrato em uma jornada típica pelo Brasil em direção a outros continentes, uma jornada na qual os transportadores realizam múltiplas navegações.

O Porto de Santos é infraestrutura fundamental na cadeia global da cocaína, um ponto de atravessamento ou sufocamento da mercadoria, um “chokepoint” em que se concentram recursos, objetos, informações e corpos. Os portos, assim como as fronteiras terrestres, são zonas de paradoxo operacional com dinâmicas simultâneas de constrição e trânsito (Carse et al., 2020Carse, Ashley et al. “Chokepoints: Anthropologies of the Constricted Contemporary”. Ethnos, v. 88, n. 2, 2020, pp. 193-203.), aproveitadas pelos atores criminais para fazer circular mercadorias ilícitas. A infraestrutura portuária não é apenas material, mas operada por pessoas. E o controle da logística dessa cadeia da cocaína depende de redes de proteção, conhecimento de trilhas, infraestruturas, barreiras policiais e checkpoints (Schouten; Matthysen; Muller, 2021Schouten, Peer; Matthysen, Ken; Muller, Tomas. Checkpoint Economy: The Political Economy of Checkpoints in South Sudan, Ten Years after Independence. Summary Report. Antuérpia/Copenhague: Ipis/Diis, 2021.; Jeganathan, 2004). O PCC tem se expandido nas últimas décadas visando controlar essa cadeia mercantil e, evidentemente, todos os pontos nevrálgicos da logística são importantes. Tal controle não acontece de forma rápida, demanda tempo, negociações, e gera conflitos.

Outros portos também têm se tornado importantes na diversificação da jornada do cloridrato pelo Brasil, como os do Nordeste. Esse deslocamento está relacionado com a expansão de infraestruturas e novos pontos estratégicos para grupos interessados em atuar nos mercados ilegais. Assim, as facções brasileiras estão cada vez mais presentes em portos e aeroportos, reconfigurando a circulação das mercadorias e as cadeias globais de valor.

AS DIFERENÇAS ENTRE AS JORNADAS DA COCAÍNA

A partir das jornadas descritas, trazemos contribuições sobre o papel específico do Brasil como entreposto logístico na cadeia global de suprimento de cloridrato de cocaína e suas dinâmicas locais enquanto mercado consumidor, sobretudo de pasta base. Joaquim, Pedro, Rebeca e Cláudio são alguns dos transportadores que circulam todos os dias pelo Brasil e que possibilitam a construção cotidiana das jornadas.

As diferenças entre as jornadas estão intimamente ligadas à produção, ao grau de pureza do produto (Le Monde, 2021Le Monde. “Comment la cocaïne arrive-t-elle jusque dans la poche des consommateurs?” 2021. Disponível em: <Disponível em: https://www.lemonde.fr/societe/visuel/2021/10/29/comment-la-cocaine-arrive-jusque-dans-la-poche-des-consommateurs_6100312_3224.html#7 >. Acesso em: 26/03/2023.
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; UNODC Research, 2021UNODC Research. Cocaine - a spectrum of products, Cocaine Insights 2, Vienna: UNODC, 2021.),6 6 Embora essas referências mencionem diferenças de pureza entre pasta base e cloridrato, elas geralmente tratam toda a cocaína em pó como sendo cloridrato de cocaína. No entanto, como observamos em campo e nas entrevistas com interlocutores, o cloridrato de cocaína que vai para a exportação pelos portos brasileiros possui alto grau de pureza e é refinado em laboratórios nos países produtores. Com relação à cocaína em pó que é mais consumida no Brasil, ela é transformada a partir da pasta base no Brasil, com processos e produtos diversos, e com menor pureza que o cloridrato de cocaína exportado. à circulação por infraestruturas diferentes e ao mercado onde a droga será consumida. Sendo assim, toda a cadeia de produção, distribuição e consumo da pasta base e do cloridrato são distintas. Tanto os interlocutores que atuam no transporte da droga, quanto aqueles que trabalham nas forças de segurança, afirmam que o produto mais puro - o cloridrato - é direcionado a portos e aeroportos rumo ao mercado internacional, principalmente ao continente europeu, enquanto a pasta base, de menor refino, não vai para o mercado internacional e predomina no mercado interno brasileiro. O cloridrato é produto do refino da pasta base. O processo de refino demanda expertise, locais espaçosos, isolados, além de produtos químicos específicos. É feito em geral em grandes fazendas nos países produtores, onde há maior circulação de ar e o risco de explosão é menor. Dito de outra forma, as condições para a produção do cloridrato não são encontradas em centros urbanos brasileiros. Os laboratórios de refino existentes nas grandes cidades do Brasil são usados para processar a pasta e transformá-la em crack ou cocaína vendida no mercado interno, de qualidade inferior, com diferentes tipos de mistura. Segundo Joaquim, por exemplo, “a pasta base você faz tudo com ela… Da pasta base eles fazem a cocaína, eles fazem tudo… Faz merla, faz oxi… Eu já vi outras drogas”.

As embalagens do cloridrato e da pasta base também são distintas. O tijolo de cloridrato é transportado geralmente em embalagens mais elaboradas, cujo intuito é proteger, reduzir o aroma e não comportar impressões digitais. O cloridrato também pode passar por uma fôrma no laboratório para ter uma marcação própria, como um selo de qualidade, e evitar mudanças no trajeto até o seu destino final. Em muitas situações, a embalagem do cloridrato contém adesivos para indicar o laboratório em que foi produzido e seu fornecedor.

A circulação do cloridrato de cocaína destinado ao Norte global gera um valor agregado notadamente maior do que a pasta base, pois seu grau de pureza e concentração são maiores. Quanto maior o valor agregado da cocaína em relação ao seu volume, tanto melhor para as exportações, uma vez que sua principal forma de envio é camuflada em contêineres de mercadorias legais.

Ainda que em menor escala e menor valor agregado, a jornada da pasta base também chama a atenção por ser muito lucrativa e presente no cotidiano das pessoas, sobretudo nas regiões fronteiriças e interioranas do Brasil. Mas a circulação da droga não se limita a esses territórios, evidentemente. A jornada conforma uma rede de territórios e pessoas, em escala regional, nacional e transnacional, sobretudo entre Brasil e Bolívia.

Nas duas jornadas típicas, as diferenças no agenciamento dos transportadores estão relacionadas a diferenças no uso das infraestruturas e nas redes de proteção, e isso tem relação direta com os tipos de fronteiras. Aqui levamos em consideração as dinâmicas locais de cada fronteira, suas temporalidades, seus espaços, movimentos transnacionais e transfronteiriços (Albuquerque; Paiva, 2015Albuquerque, José Lindomar; Paiva, Luiz Fábio S. “Entre nações e legislações: algumas práticas de ‘legalidade’ e ‘ilegalidade’ na tríplice fronteira amazônica (Brasil, Colômbia, Peru)". Revista Ambivalências, v. 3, n. 5, 2015, pp. 115-48.) e suas complexidades especiais (Rabossi, 2015Rabossi, Fernando. “Tempo e movimento em um mercado de fronteira: Ciudad del Este, Paraguai”. Sociologia & Antropologia. Rio de Janeiro, n. 5, 2015, pp. 405-34.; Renoldi, 2015Renoldi, Brígida. “Estados posibles: travesías, ilegalismos y controles en la Triple Frontera”. Etnografica, v. 19, n. 3, 2015, pp. 417-40.).

Corumbá e Puerto Quijarro, no lado boliviano, são uma conurbação, com mobilidade intensa de pessoas, mercadorias e veículos nos dois sentidos. O fluxo de caminhões é muito grande, sendo porta de entrada do comércio exterior entre o Brasil e a Bolívia. Assim, a geografia específica, as infraestruturas de rodovias e o alto fluxo de veículos contribuem para que os tijolos de cloridrato adentrem facilmente o Brasil.

Na cidade de Cáceres, distante cerca de cem quilômetros da fronteira com a Bolívia, onde os vilarejos são mais pobres e há pouca infraestrutura urbana, a fiscalização nas estradas tem maior eficácia. Os transportadores também se valem de trilhas, “cabriteiras”, rios e até mesmo terrenos pantanosos, caminhando muitas vezes à noite para conseguir chegar à cidade e escoar a mercadoria ilícita. Pelas especificidades dessa fronteira, o transporte é feito muitas vezes por via aérea, mas em maior escala, com grandes quantidades de pasta base ou cloridrato. Se antes, em Cáceres, havia grupos que controlavam partes das fronteiras e eventualmente disputavam território, o PCC veio se inserir nessa lógica como ator coletivo para disputar pontos de atravessamento que permitam o funcionamento da cadeia internacional do cloridrato.

As navegações nas duas jornadas diferem também pelas topografias social e ecológica das fronteiras. As maneiras como pessoas e infraestruturas se moldam estão relacionadas às suas histórias locais. A dificuldade ou a facilidade de antever as barreiras para a mobilidade aumenta ou diminui a capacidade de navegação dos transportadores. Seu Pedro, de caminhão em uma estrada federal, navega de maneira mais limitada do que Joaquim, que navega de carro por cabriteiras.

Para quem tem interesse nos pontos logísticos de atravessamento mercantil (e não necessariamente no controle político do território), como é o caso das facções que operam nas fronteiras, é importante que os níveis de violência na região se mantenham baixos, para que a fiscalização também se mantenha previsível. Cáceres e Corumbá possuem taxas de homicídios abaixo da média nacional, diferentemente de cidades fronteiriças como Dourados, Ponta Porã ou Tabatinga. Os modos práticos de expansão das facções nas regiões de fronteira ainda é um campo pouco explorado, por isso exige um maior esforço comparativo, que sempre leve em consideração as dinâmicas criminais produzidas em configurações sociais distintas em termos geográficos, culturais, históricos e políticos (Dias; Paiva, 2022Dias, Camila Nunes; Paiva, Luiz Fábio. “Facções prisionais em dois territórios fronteiriços”. Tempo Social, v. 34, n. 2, 2022, pp. 217-38.; Albuquerque; Paiva, 2015Albuquerque, José Lindomar; Paiva, Luiz Fábio S. “Entre nações e legislações: algumas práticas de ‘legalidade’ e ‘ilegalidade’ na tríplice fronteira amazônica (Brasil, Colômbia, Peru)". Revista Ambivalências, v. 3, n. 5, 2015, pp. 115-48.).

Há diferença também nos destinos territoriais das substâncias. O cloridrato se destina tipicamente à exportação. Como entreposto, os brasileiros importam o cloridrato para exportar, especialmente para a Europa. Esse é o foco do controle que tem favorecido a expansão do PCC para a fronteira, ou seja, o controle de pontos de atravessamento fronteiriços internacional e intranacional. Isso marca a guinada da facção para o mercado externo e sua expansão transnacional. Por outro lado, a pasta base fica no mercado interno e sua jornada a partir da fronteira com a Bolívia ocorre pelas fronteiras nacionais e intranacionais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A expansão das facções nas fronteiras brasileiras, sejam elas terrestres, marítimas ou aéreas, mudou a dinâmica do mercado transnacional de drogas. As facções, especialmente o PCC, ampliaram o controle de pontos de atravessamento nas fronteiras e aumentaram a escala de circulação nacional e transnacional da cocaína. Neste artigo, buscamos apresentar modos práticos e rotineiros dessa expansão e circulação, a partir das jornadas do cloridrato e da pasta base percorridas por transportadores que navegam todos os dias pelo Brasil.

Essa expansão é geralmente silenciosa, porque ocorre no mercado por atacado, pouco acessível e mal conhecido. Mas se é uma expansão focada em controlar pontos da cadeia de valor das drogas e diminuir o preço do produto no final, é evidente que todos os pontos nodais da logística são importantes. É essencial ter controle sobre os pontos de atravessamento, ou melhor, dos “chokepoints” ou pontos de “estrangulamento” (Carse et al., 2020Carse, Ashley et al. “Chokepoints: Anthropologies of the Constricted Contemporary”. Ethnos, v. 88, n. 2, 2020, pp. 193-203.) nas fronteiras (internas e externas), barreiras rodoviárias, portos e aeroportos.

Quando falamos das fronteiras do Brasil com a Bolívia, marcadamente Corumbá e toda a região de Cáceres, a expansão das facções somente tem sido possível graças à ampliação das relações entre atores “faccionados” e redes de trabalho e proteção locais, tanto informais como criminais. Essas ligações acabam por desenvolver a habilidade de atores “faccionados” de se aproximar e agenciar pessoas com conhecimentos especializados para navegar caminhos, evitar barreiras, ou simplesmente para serem deixadas como isca para as forças de segurança. Não se trata de lógicas de proteção política e mercantil territorial ou de sociedades secretas prisionais. Nesses casos, trata-se do controle dos movimentos, das barreiras e dos elos que fazem as cadeias de valorização mercantil funcionarem. O que está em questão é o controle dos caminhos e pontos de atravessamento, e sobre quem incidirão a violência e o cárcere na cadeia de valor.

Os mercados ilegais transnacionais - como os da cocaína - produzem riqueza global e violência letal. Tanto a riqueza quanto a violência se acumulam desigualmente em diferentes pontos de conexão com os mercados legais. Mas é entre os pequenos traficantes e transportadores que se concentram as tramas da violência letal e do encarceramento em massa produzido por polícias e tribunais. Joaquim e seu Pedro, por exemplo, ficaram anos no cárcere.

As posições mais baixas no mercado de trabalho da cocaína - como os pequenos traficantes de rua ou favelas, ou as “mulas” que se arriscam diariamente nas fronteiras, como Rebeca - são operadas geralmente por jovens, negros, pardos e periféricos. Esses atores podem encontrar formas de geração de renda, senso de comunidade e redes de proteção nas facções criminais. Sem ganho monetário, sem esse pertencimento e proteção, dificilmente essas cadeias mercantis permaneceriam operacionais.

Aqui, portanto, levamos em consideração os efeitos desiguais e os locais de expansão das facções - tanto para as regiões de fronteira, para o mercado externo, quanto para o interior do Brasil, com ampliação do controle das intermediações da cocaína. Em outras palavras, os impactos da expansão das facções são diferentes, a depender das dinâmicas de cada região e da segmentação das mercadorias, seja local, nacional ou global. Cada território tem desenvolvimentos históricos e sociais singulares que se entrelaçam com fenômenos mais amplos, como as facções e o circuito nacional e internacional da cocaína.

O que antes era observável apenas nas periferias urbanas, agora é mais claramente observável em espaços como portos e aeroportos, além das fronteiras terrestres nacionais. Quando as facções começaram a regular os elos das cadeias globais de drogas, ocorreu uma acumulação sem precedentes em segmentos vindos “de baixo”, ou seja, das favelas e quebradas. Assim, o que antes era operado sobretudo por elites políticas locais, hoje pode ser operado por facções que buscam o monopólio econômico dessas cadeias.

Os mercados ilegais, inclusive os transnacionais, não funcionam sem mercados de proteção. É preciso que haja políticos cedendo a grupos de interesse econômico, agentes do Estado protegendo a circulação ilegal de drogas em troca de propina, fiscais e trabalhadores portuários envolvidos em atividades ilícitas. Para cada carga de cocaína exportada, há agentes e fiscais sendo pagos por ela - tanto na origem quanto no destino, tanto no Sul quanto no Norte global.

Destacamos que o agenciamento de transportadores está entrelaçado com uma nova escala de atuação das facções. Não podemos afirmar que estas se tornaram atores únicos ou hegemônicos no tráfico internacional, mas suas atuações alteraram a maneira como a droga circula por diferentes pontos, de um lado a outro do país. Isso tem implicações não apenas econômicas, mas também políticas, colocando novas pressões sobre os heterogêneos regimes normativos (Feltran, 2020Feltran, Gabriel. The Entangled City: Crime as Urban Fabric in São Paulo. Manchester: Manchester University Press, 2020.; Pinho; Zambon; Alves, 2022Pinho, Isabela; Zambon, Gregório; Alves, Lucas, “Dismantling a Stolen Car”. In: Feltran, Gabriel S. (org.). Stolen Cars: A Journey through São Paulo’s Urban Conflict . Oxford: Wiley , 2022.) que se equilibram ao regular, nessas diferentes escalas, a distribuição desigual da riqueza e do uso da violência.

Também por isso o Brasil tem se tornado um entreposto logístico cada vez mais importante na cadeia de valor do cloridrato de cocaína. Suas infraestruturas, como o Porto de Santos, são utilizadas para escoar grandes quantidades de droga. Mas essas infraestruturas não funcionam sozinhas: atreladas a elas, há pessoas - cada vez mais ligadas a redes criminais - que se esforçam e navegam diariamente para fazer os objetos circularem pelas jornadas ou captar recursos com essa circulação.

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  • 1
    Termo utilizado pelos interlocutores para se referir às estradas alternativas, onde há menos barreiras e fiscalizações.
  • 2
    Todos os nomes foram alterados para preservar a identidade dos interlocutores.
  • 3
    Termo utilizado pelos interlocutores para se referir a alguma atividade ilícita, como furtar um carro ou transportar droga.
  • 4
    Mocós são os esconderijos, mais ou menos profissionais, que abrigam as drogas nos veículos, por exemplo, pneus, assoalho, carroceria etc.
  • 5
    Segundo interlocutores, as cargas que passam pelo Redex são menos fiscalizadas porque são cargas de grandes exportadores, com “canal verde”, isto é, o desembaraço da mercadoria é automático, dispensa exame documental e verificação física do produto pela Receita Federal.
  • 6
    Embora essas referências mencionem diferenças de pureza entre pasta base e cloridrato, elas geralmente tratam toda a cocaína em pó como sendo cloridrato de cocaína. No entanto, como observamos em campo e nas entrevistas com interlocutores, o cloridrato de cocaína que vai para a exportação pelos portos brasileiros possui alto grau de pureza e é refinado em laboratórios nos países produtores. Com relação à cocaína em pó que é mais consumida no Brasil, ela é transformada a partir da pasta base no Brasil, com processos e produtos diversos, e com menor pureza que o cloridrato de cocaína exportado.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2023

Histórico

  • Recebido
    01 Nov 2022
  • Aceito
    10 Mar 2023
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