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Trade-off Custo-Qualidade na Provisão de Saneamento Básico no Brasil Os autores agradecem o apoio da CAPES e do CNPq.

Resumo

Este estudo investigou a hipótese de existência de um trade-off custo-qualidade na provisão de serviços de saneamento básico (abastecimento de água) nos municípios brasileiros, que poderia ser acentuado por provedores privados e atenuado por provedores híbridos. Para isso, foram realizadas estimações em painel com dados municipais de 2008 a 2019. Como proxies para a qualidade não contratável, foram considerados indicadores de morbidade hospitalar devido a doenças associadas ao saneamento. Já como provisão híbrida, foram consideradas as sociedades de economia mista e as empresas públicas. Os resultados sinalizaram a existência do trade-off custo-qualidade, com os provedores híbridos o atenuando, mas não sendo acentuado pelos provedores privados; ou seja, a privatização não potencializa o problema. Além disso, os resultados sugeriram que o trade-off está associado a provedores regionais. Portanto, as evidências encontradas indicaram a importância de mecanismos, como a supervisão regulatória efetiva, que lidem com a resposta negativa da qualidade (saúde) a choques de custos independentemente da governança, dado que o trade-off custo-qualidade é observado em provedores públicos e híbridos.

Palavras-chave:
Custo; Qualidade; Trade-off ; Saneamento básico; Saúde; Dados em painel; Privatização; Governança; Municípios

Abstract

This article investigated the hypothesis of the existence of a cost-quality trade-off in the provision of basic sanitation services (water supply) in Brazilian municipalities, which can be accentuated by private providers and mitigated by hybrid providers. For this, panel estimates were obtained with municipal data from 2008 to 2015. Hospital morbidity indicators were considered as proxies for non-contractable quality. Mixed capital companies and public companies were considered as of hybrid provision. The results signaled the existence of a cost-quality trade-off, with hybrid providers attenuating it, but not being accentuated by private providers; that is, privatization does not exacerbate the problem. The results also suggested that the trade-off is associated with regional providers. Therefore, the evidence found indicates the importance of mechanisms, such as effective regulatory oversight, that deal with the negative quality (health) response to cost reductions regardless of governance, given that the cost-quality trade-off is observed in public and hybrid providers.

Keywords:
Governance; Cost; Quality; Trade-off; Sanitation; Health; Panel data

1. Introdução

Evidências da literatura sinalizam que a privatização de serviços públicos tende a gerar reduções de custos, inclusive nos serviços de saneamento básico1 1 O saneamento básico abrange os serviços de abastecimento de água, esgotamento sanitário, manejo de resíduos sólidos e drenagem urbana (Brasil 2007). Devido à disponibilidade, este estudo utiliza dados do abastecimento de água oriundos do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS). Este assume que há atendimento se a pessoa for conectada a sistemas/redes de distribuição (SNIS 2019). Assim, sempre que aqui for mencionado o termo abastecimento de água é considerado o serviço ofertado por rede (geral), que é a forma mais adequada de acesso à água potável e a mais associada a decisões de provedores (Estache et al. 2002; Santos et al. 2021). (Megginson e Netter 2001Megginson, W. L. e J. M. Netter. 2001. “From state to market: a survey of empirical studies on privatization”. Journal of Economic Literature , 39 (2).). Estas reforçam argumentos de que provedores privados têm incentivos mais fortes à eficiência produtiva. Contudo, Bardhan (2016Bardhan, P. 2016. “State and development: The need for a reappraisal of the current literature”. Journal of Economic Literature, 54 (3): 862-892.) ressalva que a privatização não necessariamente é a melhor opção em serviços que atendem a múltiplas funções estatais e suas agendas multidimensionais.

Os serviços de saneamento básico podem cumprir múltiplos objetivos estatais devido às externalidades ambientais e na saúde, com impactos em outras dimensões do desenvolvimento econômico (Cvjetanovic 1986Cvjetanovic, B. 1986. “Health effects and impact of water supply and sanitation”. World Health Statistics Quarterly, 39 (1).; Heller 1997Heller, L. 1997. Saneamento e saúde. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde.). Como os contratos são incompletos e a regulação não prevê todas as eventualidades da operação, o que é potencializado por atributos dos serviços (Jouravlev 2000Jouravlev, A. S. 2000. “Water utility regulation: issues and options for Latin America and the Caribbean”. Economic Commission for Latin America and the Caribbean.), é difícil compatibilizar as eficiências produtiva, alocativa e distributiva, tanto que, a partir dos anos 2000, ocorreram reestatizações em alguns países em que quedas de custos não foram seguidas por ganhos de qualidade e acesso (Hefetz e Warne 2004Hefetz, A. e M. Warner. 2004. “Privatization and its reverse: Explaining the dynamics of the government contracting process”. Journal of Public Administration Research and Theory, 14 (2): 171-190.; Hailu e Tsukada 2012Hailu D., R. G. Osorio e R. Tsukada. 2012. “Privatization and renationalization: What went wrong in Bolivia’s water sector?”. World Development, 40 (12): 2564-2577.; Tan 2012Tan, J. 2012. “The pitfalls of water privatization: failure and reform in Malaysia”. World Development, 40 (12): 2552-2563.; Kishimoto e Petitjean 2017Kishimoto, S., O. Petitjean e L. Steinfort. 2017. Reclaiming Public Services. How cities and citizens are turning back privatization. Amsterdam and Paris: Transnational Institute.; Demuth et al. 2018Demuth, J., H. W. Friederiszick e S. Reinhold. 2018. “Reverse privatization as a reaction to the competitive environment: Evidence from solid waste collection in Germany”. ESMT Working Paper, 18 (2).; McDonald 2018McDonald, D. A. 2018. “Remunicipalization: The future of water services?”. Geoforum, 91.). No Brasil, contudo, as evidências são favoráveis às privatizações no setor (Scriptore et al. 2015Scriptore, J. S., C. R. Azzoni e N. Menezes Filho. 2015. “Saneamento básico e indicadores educacionais no Brasil”. Working Paper Series, nº 2015-28, FEA-USP.; Saiani e Azevedo 2018Saiani, C. C. S. e P. F. Azevedo. 2018. “Is privatization of sanitation services good for health?”. Utilities Policy, 52.).

Para ilustrar seu argumento, Bardhan (2006) utiliza o trabalho de Hart et al. (1997Hart, O., A. Shleifer e R. W. Vishny. 1997. “The proper scope of government: theory and an application to prisons”. Quarterly Journal of Economics, 112 (4). ). Neste, sinteticamente, é proposto (e aplicado) um modelo de contratação do tipo de provedor (público ou privado) para serviços públicos. O modelo é embasado no argumento de que ações redutoras de custos podem diminuir a qualidade não contratável e melhorias na qualidade aumentam os custos. Além disso, os provedores públicos não teriam incentivos ótimos a ganhos de qualidade.

Assim, a decisão pela privatização de serviços públicos pode envolver um trade-off entre custo e qualidade não contratável. A existência e magnitude do problema dependem de alguns fatores, em especial atributos setoriais específicos. Há trabalhos que apontam a amenização do trade-off em governanças híbridas de provisão que consigam compatibilizar incentivos públicos e privados motivando os provedores, como na presença de regulação efetiva, controle social e participação pública no monitoramento do desempenho, assim como na composição do capital e na gestão (Ménard 2004Ménard, C. 2004. “The economics of hybrid organizations”. Journal of Institutional and Theoretical Economics, 3 (160).; Makadok e Coff 2009Makadok, R. e R. Coff. 2009. “Both market and hierarchy: an incentive-systems theory of hybrid governance forms”. Academy of Management Review, 34 (2).; Cabral et al. 2010Cabral, S., S. G. Lazzarini e P. F. Azevedo. 2010. “Private operation with public supervision: evidence of hybrid modes of governance in prisons”. Public Choice, 145 (1-2).; Saiani e Azevedo 2018Saiani, C. C. S. e P. F. Azevedo. 2018. “Is privatization of sanitation services good for health?”. Utilities Policy, 52.).

Para Hart et al. (1997Hart, O., A. Shleifer e R. W. Vishny. 1997. “The proper scope of government: theory and an application to prisons”. Quarterly Journal of Economics, 112 (4). ) e Ménard e Saussier (2000Ménard, C. e S. Saussier, S. 2000. “Contractual choice and performance: the case of water supply in France”. Revue d’Économie Industrielle, 92.), atributos dos serviços de saneamento os expõem ao trade-off. Considerando tal argumento e as poucas evidências na literatura para o caso brasileiro,2 2 O único trabalho encontrado que se fundamenta em Hart et al. (1997) para avaliações no saneamento brasileiro é Saiani e Azevedo (2018). Este utiliza proxies para a qualidade não contratável e estratégias de identificação similares - baseadas em Galiani et al. (2005) -, assim como os municípios como unidades de análise, mas avalia diferenças médias entre provedores públicos e tipos de privados, enquanto o presente estudo analisa explicitamente o trade-off custo-qualidade e compara governanças de provisão que vão além da discussão público versus privado. o objetivo deste estudo é avaliar se há o trade-off custo-qualidade na provisão de saneamento no Brasil (tomando o abastecimento de água como referência) e, se sim, se este trade-off varia conforme a governança da provisão. É averiguado, ainda, se os resultados são heterogêneos entre: a) provisões regionais e locais; e b) provedores de capital aberto e fechado. Para tanto, são realizadas regressões para um painel de municípios com dados de 2008 a 2019.

O saneamento nos municípios brasileiros, em especial o abastecimento de água, é provido por uma variedade de provedores distintos em termos de naturezas jurídicas - administração direta, autarquia, sociedade de economia mista e empresa privada ou pública - e abrangências de atuação - local e regional (SNIS 2019). Assim, há a oportunidade empírica rara de, em um mesmo contexto macroinstitucional e setorial, comparar diferentes governanças de provisão.

Neste estudo, é proposta a seguinte classificação: i) provisão privada - empresas privadas; ii) provisão pública - entidades da administração direta e autarquias; e iii) provisão híbrida - sociedades de economia mista e empresas públicas, que têm fins lucrativos e são regidas por legislações comerciais, ao mesmo tempo em que não estão livres de ingerências políticas e da influência de motivações públicas. Além disso, os provedores híbridos são de capital aberto ou fechado, aspecto também explorado neste estudo para averiguar possíveis efeitos heterogêneos.

Para garantir maior robustez aos resultados, a estratégia de identificação leva em conta algumas sugestões da literatura. Como o trade-off custo-qualidade é defendido para a qualidade não contratável, a primeira sugestão é o uso de indicadores de saúde como proxies, que, para a avaliação proposta, são mais adequados que indicadores operacionais de qualidade de fontes oficiais - alguns são inseridos como covariadas. Outra sugestão é o uso da morbidade hospitalar (internações) por faixas etárias e doenças específicas (Briscoe et al. 1986Briscoe, J., R. G. Feachem e M. M. Rahaman. 1986. Evaluating Health Impact: Water Supply, Sanitation and Hygiene Education. Ottawa: International Development Research Centre.; Helller 1997; Galiani et al. 2005Galiani, S., P. Gertler e E. Schargrodsky. 2005. “Water for life: the impact of the privatization of water services on child mortality”. Journal of Political Economy, 113 (1).). Destaca-se, ainda, a inserção de importantes covariadas, inclusive que também podem influenciar a governança da provisão e a saúde, lidando com um possível viés de seleção.

Antecipada e sinteticamente, os resultados obtidos não refutam a existência do trade-off custo-qualidade na provisão do saneamento no Brasil nas governanças pública e híbrida, assim como sua atenuação na última modalidade, sendo mais evidente em provisões regionalizadas. Ademais, contrariamente à literatura base, sugerem ausência do trade-off na provisão privada.

Portanto, além dos efeitos na saúde, que por si só são importantes para o desenvolvimento econômico, este estudo contribui com evidências adicionais ao debate sobre o saneamento no Brasil, que tem uma série de problemas, muitos associados ao desempenho dos provedores.3 3 Por exemplo: a) falta de água em alguns locais e desperdícios em outros (perdas) - o que é grave em cenários cada vez mais recorrentes de crises hídricas; b) baixa incidência de tratamento de esgoto; e c) déficits de acesso concentrados na população mais pobre e em locais menos desenvolvidos (ANA 2010, 2019; Santos et al. 2021). A privatização e a regionalização da gestão, aspectos aqui abordados, são incentivados pelo Novo Marco Legal do Saneamento de 2020 (Brasil 2020______. 2020. “Lei Federal Nº 14.026. Novo Marco Legal do Saneamento Básico”.) como soluções para os problemas do setor. Assim, o estudo garante indícios que podem subsidiar as ações nesse sentido e reduzir eventuais resistências, dado que o tradicional argumento relativo à piora da qualidade não é corroborado.

Ademais, o estudo endereça novas evidências ao debate sobre diferenças de desempenho de distintas governanças de provisão de serviços públicos, no qual discrepâncias de incentivos são exploradas em setores nos quais atributos específicos e problemas informacionais tornam o quadro regulatório um desafio (Savedoff e Spiller 1999Savedoff, W. e P. Spiller. 1999. Spilled water, institutional commitment in the provision of water services. Inter-American Development Bank.; Jouravlev 2000Jouravlev, A. S. 2000. “Water utility regulation: issues and options for Latin America and the Caribbean”. Economic Commission for Latin America and the Caribbean.). O presente estudo contribui, ainda, para a discussão da privatização ser ou não uma boa opção, mesmo com maior eficiência produtiva, em serviços que atendem a múltiplas funções estatais (Bardhan 2016Bardhan, P. 2016. “State and development: The need for a reappraisal of the current literature”. Journal of Economic Literature, 54 (3): 862-892.).

Além dessa introdução e das considerações finais, este estudo possui mais três seções. Na segunda, o referencial teórico, os atributos econômicos dos serviços de saneamento e um breve histórico das políticas federais para o setor no Brasil são apresentados para justificar a aqui proposta classificação das governanças da provisão. Na terceira, são discutidos as estratégias empíricas e os dados. Finalmente, na quarta seção, são analisados os resultados de interesse.

2. Background teórico, histórico e institucional

2.1. Trade-off custo-qualidade e características do saneamento

Hart et al. (1997Hart, O., A. Shleifer e R. W. Vishny. 1997. “The proper scope of government: theory and an application to prisons”. Quarterly Journal of Economics, 112 (4). ) apresentam um modelo de contratação pública para sinalizar em quais condições serviços públicos devem ter provisão pública ou privada considerando seus atributos e a maximização do bem-estar. Na privada, firma-se um contrato entre o titular público e um provedor privado; na pública, há contratos de trabalho entre o titular e os funcionários públicos. Assume-se incompletude dos contratos nos dois casos. Assim, sempre existem parâmetros não perfeitamente contratáveis, importando a quem são atribuídos os direitos residuais de controle; i.e., o poder de decidir sobre ocorrências não previstas (Grossman e Hart 1986Grossman, S. J. e O. D. Hart. 1986. “The costs and benefits of ownership: a theory of vertical and lateral integration”. Journal of Political Economy , 94 (4).; Hart 1988).

O modelo pressupõe que: i) ações redutoras de custos podem diminuir a qualidade não contratável; ii) ganhos de qualidade demandam aumentos de custos; iii) gestores privados, para maximizar seus lucros, possuem mais incentivos a cortes de custo; iv) empregados públicos têm menos incentivos a reduções de custo por não se beneficiarem diretamente; e v) provedores privados e públicos possuem incentivos subótimos a ganhos de qualidade. Ainda, funcionários públicos podem sofrer ingerência política e, assim, atuarem orientados por motivações político-eleitorais dos governantes. Ademais, os provedores privados podem não conseguir repactuação contratual para aumentos de custo (Shleifer e Vishny 1994Shleifer, A., e R. W. Vishny. 1994. “Politicians and firms”. Quarterly Journal of Economics , 109 (4).; Hart et al. 1997Hart, O., A. Shleifer e R. W. Vishny. 1997. “The proper scope of government: theory and an application to prisons”. Quarterly Journal of Economics, 112 (4). ; Shleifer 1998Shleifer, A. 1998. “State versus private ownership”. Journal of Economic Perspectives , 12 (4).).

Para este estudo, a principal implicação do modelo é que a provisão privada tende a gerar maior eficiência produtiva (redução de custos), mas com potencial piora da qualidade. Porém, a pública não necessariamente garante melhor qualidade. Assim, a decisão pela governança da provisão deve considerar o possível trade-off custo-qualidade, que ocorre e varia em magnitude em função de atributos setoriais específicos. Para Hart et al. (1997Hart, O., A. Shleifer e R. W. Vishny. 1997. “The proper scope of government: theory and an application to prisons”. Quarterly Journal of Economics, 112 (4). ) e Ménard e Saussier (2000Ménard, C. e S. Saussier, S. 2000. “Contractual choice and performance: the case of water supply in France”. Revue d’Économie Industrielle, 92.), os serviços de saneamento básico possuem atributos econômicos que os expõem ao trade-off.

Isto porque, no geral, são monopólios naturais que necessitam de altos investimentos com retornos de longo prazo e possuem economias de escala, aglomeração e escopo, além de baixa contestabilidade do mercado. Logo, a competição é economicamente inviável e o consumidor não escolhe entre ofertantes distintos; i.e., não há mecanismos de arbitragem de mercado que garantam qualidade e modicidade de preço/tarifa (Savedoff e Spiller 1999Savedoff, W. e P. Spiller. 1999. Spilled water, institutional commitment in the provision of water services. Inter-American Development Bank.; Jouravlev 2000Jouravlev, A. S. 2000. “Water utility regulation: issues and options for Latin America and the Caribbean”. Economic Commission for Latin America and the Caribbean.).

Fundamentando-se na discussão de “saída, voz e lealdade” de Hirschman (1973Hirschman, A. O. 1973. Saída, Voz e Lealdade - Reações ao Declínio de Firmas, Organizações e Estados”. São Paulo: Perspectiva.), pode-se argumentar que é custoso ao consumidor buscar fontes alternativas de acesso ao saneamento (“saída”), o que influenciaria o comportamento do provedor. A “saída” se daria com migração ou investimentos em fontes de acesso alternativas e, no geral, individualizadas - como poços, que demandam investimentos para garantir a frequência do consumo e a potabilidade da água. Assim, a maioria dos usuários depende do provedor existente (“lealdade”, mas não por opção), o qual pode tentar influenciar (“voz”) exercendo controle social (Silva et al. 2017Silva, F. R., A. C. Cançado, W. Rodrigues e W. L. Batista. 2017. “Controle social: a dinâmica da Teoria da Saída, Voz e Lealdade no contexto da administração pública”. Emancipação, 17 (1): 108-125.), direto ou via órgãos públicos responsáveis pelo monitorando da provisão e cumprimento da regulação.

A regulação ganha ainda mais importância devido à deterioração de algumas dimensões da qualidade ser de difícil percepção pelos usuários, pois são observadas apenas de forma difusa como externalidades ambientais e na saúde (Rocha et al. 2017Rocha, M. S. B., E. H. C. Mattos e C. C. S. Saiani. 2017. “Descentralização e provisão de serviços públicos: evidências a partir da criação dos municípios brasileiros no setor de saneamento básico”. Pesquisa e Planejamento Econômico, 47 (1).; Saiani e Azevedo 2018Saiani, C. C. S. e P. F. Azevedo. 2018. “Is privatization of sanitation services good for health?”. Utilities Policy, 52.) - estas influenciam o desenvolvimento econômico (Cvjetanovic 1986Cvjetanovic, B. 1986. “Health effects and impact of water supply and sanitation”. World Health Statistics Quarterly, 39 (1).; Heller 1997Heller, L. 1997. Saneamento e saúde. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde.), o que por si só já ressalta a importância da regulação. Porém, o setor apresenta outros problemas informacionais que prejudicam a efetividade regulatória, embora existam alternativas (Savedoff e Spiller 1999Savedoff, W. e P. Spiller. 1999. Spilled water, institutional commitment in the provision of water services. Inter-American Development Bank.; Jouravlev 2000Jouravlev, A. S. 2000. “Water utility regulation: issues and options for Latin America and the Caribbean”. Economic Commission for Latin America and the Caribbean.). Problemas regulatórios, como os persistentes no Brasil (subseção 2.2), em um setor com os supracitados atributos econômicos, desestimulam a realização de investimentos.

Vale destacar, ainda, que os serviços de saneamento em geral, inclusive o abastecimento de água, possuem baixo dinamismo tecnológico e ativos específicos, de modo que é pequena a probabilidade de reduções de custos decorrerem da adoção de tecnologias superiores ou de usos alternativos dos ativos. Porém, são possíveis economias na atividade gerencial que podem gerar piora da qualidade. Por exemplo, o aumento de funções a empregados para reduzir custos tem o risco de sobrecarga, elevando a probabilidade de erros; já a redução de gastos com materiais químicos pode prejudicar o tratamento da água (Hart et al. 1997Hart, O., A. Shleifer e R. W. Vishny. 1997. “The proper scope of government: theory and an application to prisons”. Quarterly Journal of Economics, 112 (4). ; Ménard e Saussier 2000Ménard, C. e S. Saussier, S. 2000. “Contractual choice and performance: the case of water supply in France”. Revue d’Économie Industrielle, 92.).

Na literatura, há a defesa de que governanças que compatibilizam interesses públicos e privados, chamadas de híbridas (Williamson 1999Williamson, O. E. 1999. “Public and private bureaucracies: a transaction cost economics perspective”. Journal of Law, Economics, and Organization, 15 (1).), amenizam o trade-off custo-qualidade. No geral, as evidências são favoráveis à provisão híbrida de serviços públicos, sendo analisados variados hibridismos, como: regulação, controle social, monitoramento e composição do capital e gestão (Ménard 2004Ménard, C. 2004. “The economics of hybrid organizations”. Journal of Institutional and Theoretical Economics, 3 (160).; Makadok e Coff 2009Makadok, R. e R. Coff. 2009. “Both market and hierarchy: an incentive-systems theory of hybrid governance forms”. Academy of Management Review, 34 (2).; Cabral et al. 2010Cabral, S., S. G. Lazzarini e P. F. Azevedo. 2010. “Private operation with public supervision: evidence of hybrid modes of governance in prisons”. Public Choice, 145 (1-2).; Saiani e Azevedo 2018Saiani, C. C. S. e P. F. Azevedo. 2018. “Is privatization of sanitation services good for health?”. Utilities Policy, 52.).

2.2. Provisão de serviços de saneamento no Brasil

A estrutura institucional do saneamento no Brasil está imbricada ao histórico das políticas públicas federais para o setor. Até os anos 1930, o governo federal limitava-se a incentivar que empresas privadas estrangeiras assumissem os serviços nas grandes cidades. Nos anos 1940, a titularidade deles foi atribuída aos municípios. Porém, no geral, as receitas municipais não eram suficientes para cobrir custos operacionais e investimentos necessários. Consequentemente, não houve expansão significativa das coberturas dos serviços nos anos 1940 e 1950 (Barat 1998Barat, J. 1998. “O financiamento da infraestrutura urbana: os impasses, as perspectivas institucionais, as perspectivas financeiras”. Infra-Estrutura: Perspectivas de Reorganização. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.).

Na década de 1960, pressionado pela urbanização, o governo federal elevou sua atuação com a criação do Sistema Financeiro de Saneamento (SFS), que contava com recursos federais, principalmente do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), e estaduais de Fundos de Água e Esgoto. O SFS era gerido pelo Banco Nacional de Habitação (BNH), que emprestava recursos aos estados. Estes financiavam os municípios; no entanto, somente quando criavam autarquias ou sociedades de economia mista para prover os serviços (MPO e IPEA 1995MPO e IPEA. 1995. Diagnóstico do setor de saneamento: estudo econômico e financeiro. Série Modernização do Setor Saneamento nº 7. Brasília: Ministério do Planejamento e Orçamento e Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.).

No início dos anos 1970, foi lançada a ainda maior política federal para o setor no Brasil, o Plano Nacional de Saneamento (PLANASA). Neste, foi consolidado o modelo centralizado de financiamento. O acesso a recursos do SFS era permitido apenas para companhias estaduais de saneamento básico (CESBs), criadas como sociedades de economia mista, exceto a autarquia do Acre. A meta era a gestão regionalizada (estadual), almejando que as CESBs viabilizassem subsídios cruzados para investir em todos os municípios. Para induzir a regionalização, a priori, os municípios recebiam investimentos apenas se concedessem serviços às CESBs. Quase dois terços concederam a provisão da água, que era priorizada (MPO e IPEA 1995MPO e IPEA. 1995. Diagnóstico do setor de saneamento: estudo econômico e financeiro. Série Modernização do Setor Saneamento nº 7. Brasília: Ministério do Planejamento e Orçamento e Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.; Turolla 2002Turolla, F. A. 2002. “Política de saneamento básico: avanços recentes e opções futuras de políticas públicas”. Textos para Discussão, nº 992, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.).

Devido a fatores conjunturais e do próprio setor, o PLANASA foi extinto em 1992. Após isso, as políticas federais foram por um longo período pontuais e desarticuladas (Turolla 2002Turolla, F. A. 2002. “Política de saneamento básico: avanços recentes e opções futuras de políticas públicas”. Textos para Discussão, nº 992, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.). Ademais, a promulgação da Lei de Concessões e a inclusão dos serviços públicos no Programa Nacional de Desestatização (PND), ambas em 1995, somadas à queda do financiamento público decorrente da redução de recursos disponíveis do FGTS e do contingenciamento de crédito para cumprir metas de superávit, geraram estímulos à privatização (Brasil 1995Brasil. 1995. “Lei Federal nº 8.987. Lei De Concessões”.; Saiani 2012Saiani, C. C. S. 2012. “Competição política faz bem à saúde? Evidências dos determinantes e dos efeitos da privatização dos serviços de saneamento básico no Brasil”. Tese de Doutorado, Escola de Economia de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas.).

Alguns municípios fizeram concessões privadas e a CESB do Tocantins foi privatizada. Contudo, o avanço da iniciativa privada foi baixo. Conflitos de interesses entre agentes locais, regionais e privados atrasaram uma lei específica do setor, persistindo indefinições regulatórias. O problema foi parcialmente resolvido só em 2007, com a Lei nº 11.445, a Lei do Saneamento (Brasil 2007______. 2007. “Lei Federal n° 11.445. Lei Do Saneamento Básico”.), mas uma importante indefinição permaneceu para futura decisão da justiça: a titularidade. A Constituição de 1988 a atribuiu aos municípios, mas também responsabilizou estados por ações de interesse comum, como o saneamento, em agrupamentos de municípios (Brasil 1988). Este fato gerou conflitos entre estados e municípios de regiões metropolitanas.

Tais conflitos e o marco regulatório inadequado desestimularam privatizações (Tupper e Resende 2004Tupper, H. C. e M. Resende. 2004. “Efficiency and regulatory issues in the Brazilian water and sewage sector: an empirical study”. Utilities Policy , 12.; Barroso 2002Barroso, L. R. 2002. “Saneamento básico: competências constitucionais da União, Estados e Municípios. Interesse Público, 4 (14).). Ademais, a Lei do Saneamento incentivou concessões às CESBs ao permitir o uso de convênios de cooperação e contratos de programa, instrumentos da Lei de Consórcios Públicos (Brasil 2005______. 2005. “Lei Federal nº 11.107. Lei De Consórcios Públicos e Gestão Associada”.), que possibilitaram delegações a CESBs sem licitações (Costa 2009Costa, E. C. 2009. “Convênio de cooperação e contrato de programa - posicionamento acerca da necessidade de autorização legislativa para sua pactuação”. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, 70 (1).; Souto e Freitas 2012Souto, M. J. V. e R. V. Freitas. 2010. “Prestação de serviços de saneamento básico: contratos de programa”. Em Gestão do Saneamento Básico - Abastecimento de água e esgotamento sanitário, editado por A. Philippi Júnior e A. C. G. Galvão Júnior. Barueri: Manole.) - e a um custo político possivelmente menor ao da privatização.

A Lei também previu o Plano Nacional de Saneamento Básico (PLANSAB), aprovado em 2013 (Brasil 2007______. 2007. “Lei Federal n° 11.445. Lei Do Saneamento Básico”., 2013______. 2013. “Decreto nº 8.141. Dispõe sobre o Plano Nacional de Saneamento Básico”.), que definiu metas de universalização das coberturas. Mas, com a crise econômica brasileira a partir de 2014 (Manni et al. 2017Manni, S. R., N. Menezes Filho e B. K. Komatsu. 2017. “Crise e mercado de trabalho: uma comparação entre recessões”. Policy Paper nº 23, Insper.; Oreiro 2017Oreiro, J. L. 2017. “A grande recessão brasileira: diagnóstico e uma agenda política”. Estudos Avançados, 31 (89).), os municípios e provedores, no geral, não foram capazes de expandir investimentos. Assim, passou-se a discutir mudanças institucionais para lidar com indefinições regulatórias e outros entraves que inibiam as concessões privadas, compreendidas por muitos como a solução para os problemas no setor.

Tal discussão culminou, em 2020, na promulgação do Novo Marco Legal do Saneamento - Lei nº 14.026 (Brasil 2020______. 2020. “Lei Federal Nº 14.026. Novo Marco Legal do Saneamento Básico”.). Este lidou com a questão da titularidade, reforçou as metas de universalização e proibiu novos casos de concessões sem licitações, estimulando a competição pelo mercado. Ademais, obrigou os provedores atuais e potenciais a fazerem os investimentos necessários à universalização, o que é possível que ocorra na maioria dos municípios somente com privatização, devido às finanças internas e a necessidade de provar capacidade de investir.4 4 No momento em que este estudo é finalizado (agosto de 2022), já ocorreram novas privatizações e outras estão em andamento. Algumas podem ser consultadas no site do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, mas não são aqui contempladas, pois o período analisado é anterior em função da disponibilidade de dados.

Justifica-se, assim, o saneamento no país ser ofertado por uma diversidade de provedores, que se diferenciam quanto aos serviços ofertados, às abrangências de atuação (local, regional e microrregional) e às naturezas jurídicas - autarquia, departamento, serviço autônomo, empresa pública, empresa privada e sociedade de economia mista (SNIS 2019). Aqui, a opção é a divisão dos provedores de abastecimento de água segundo as naturezas jurídicas e, assim, as motivações intrínsecas predominantes: a) provisão pública; b) provisão privada; e c) provisão híbrida.

A pública agrega as administrações diretas e autarquias, ambas com privilégios tributários e sem fins lucrativos (Di Pietro 2018Di Pietro, M. S. Z. 2018. Direito Administrativo. 31ª ed. Rio de Janeiro: Forense.). Ademais, podem ter “soft budget constraints” (Bardhan 2016Bardhan, P. 2016. “State and development: The need for a reappraisal of the current literature”. Journal of Economic Literature, 54 (3): 862-892., 884), por ser comum contarem com recursos de outras fontes públicas municipais (SNIS 2019). A privada contempla as empresas privadas. A híbrida agrega as sociedades de economia mista e as empresas públicas, no geral, classificadas como provedores públicos - exceto as economias mistas com controle privado, usualmente rotuladas como privadas (Saiani 2012Saiani, C. C. S. 2012. “Competição política faz bem à saúde? Evidências dos determinantes e dos efeitos da privatização dos serviços de saneamento básico no Brasil”. Tese de Doutorado, Escola de Economia de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas.). Existem provedores híbridos de capital fechado e aberto - CESBs dos estados de Minas Gerais (COPASA), Paraná (SANEPAR), Santa Catarina (CASAN) e São Paulo (SABESP).

A partir de argumentos de Cretella Júnior (1987Cretella Júnior, J. 1987. “Esquemas privatísticos no direito administrativo”. Informação Legal, 24 (96).), Tácito (1995Tácito, C. 1995. “O retorno do pêndulo: serviço público e empresa privada. O exemplo brasileiro”. Revista de Direito Administrativo, 202.) e Pethechust e Blanchet (2015Pethechust, E. e L. A. Blanchet. 2015. “O regime de execução das empresas estatais: entre serviço público e exploração de atividade econômica”. Revista de Direito Administrativo & Constitucional, 15 (59).), entre outros, pode-se questionar a classificação das sociedades de economia mista como provedores públicos, por serem esquemas privatísticos calcados na lógica econômica, com fins lucrativos e regidos por legislações comerciais. Porém, não é plausível ignorar que elas também possam ser motivadas por interesses públicos. Por exemplo, por terem suas diretorias indicadas por governantes ou compostas por representantes públicos. Por isso, defende-se neste estudo que é uma forma de provisão híbrida, na qual há a convivência de interesses públicos e privados.

As híbridas de capital aberto, relativamente às de capital fechado, têm vantagens quanto à captação de recursos, menos custosos no mercado de capital do que no financeiro. Além disso, podem atingir maior eficiência produtiva devido a gestões qualificadas que atendam exigências legais e expectativas de acionistas (Iudícibus e Marion 2010Iudícibus, S. e J. C. Marion. 2010. Contabilidade Comercial: Atualizado Conforme a Lei nº 11.638/07 e Lei nº 11.941/09”. 11ª ed. São Paulo: Atlas .; Assaf Neto 2012Assaf Neto, A. 2012. Estruturas e Análise de Balanços - Um Enfoque Econômico-Financeiro. 10ª ed. São Paulo: Atlas.). As informações tendem a ser mais transparentes, facilitando o monitoramento por acionistas, atuais e potenciais - incentivos privados -, e por usuários e reguladores (Jouravlev 2000Jouravlev, A. S. 2000. “Water utility regulation: issues and options for Latin America and the Caribbean”. Economic Commission for Latin America and the Caribbean.) - incentivos públicos.

Assim, considerando a literatura revisada, é plausível cogitar que a provisão pública teria menores incentivos à redução de custos, o que pode não se refletir em melhor qualidade, mesmo sendo mais sujeita à ingerência de governantes motivados por votos e apoio político. A privada teria mais incentivos a ganhos de custos, que podem piorar a qualidade. A híbrida pode sofrer ingerências políticas a favor da qualidade, mas tem incentivos privados para redução de custos, e pode diferir em magnitudes dos incentivos públicos e privados conforme a abertura ou não do capital. Tais possibilidades fundamentam as regressões discutidas a partir da próxima seção.

Antes disso, é interessante ilustrar a distribuição dos provedores de abastecimento de água segundo a classificação aqui adotada, o que é realizado pela Tabela 1 e Figura 1. Estas utilizam dados do SNIS referentes a 2019 - o último ano considerado nos exercícios empíricos a seguir. O SNIS é a principal base de dados sobre o saneamento no país. Apesar de amostral, é bastante representativo. Em 2019, existiam dados para 84,7% dos municípios e 90% da população.

Tabela 1
Brasil (amostra do SNIS utilizada): distribuições dos provedores de abastecimento de água, dos municípios atendidos e das populações com acesso segundo as governanças da provisão (2019)

Figura 1
Mapa do Brasil por municípios (amostra SNIS): distribuição territorial dos provedores de abastecimento de água, segundo as governanças da provisão (2019)

A provisão privada é a menos representativa, e a híbrida é a mais, refletindo o histórico das políticas federais; ou seja, sucessivos incentivos a concessões às CESB e persistência de entraves ao avanço da iniciativa privada. Isto porque a provisão híbrida agrega a maioria das CESBs, além de empresas públicas, mas há uma estadual em cada uma das outras provisões: a do Tocantins é privada e a do Acre é pública. Ademais, há provisão privada em vários estados, embora seja maior no Mato Grosso e Tocantins. As provisões híbrida e pública estão presentes em todo o território nacional. Portanto, nenhuma modalidade de governança está restrita a uma região. Vale apontar, ainda, que no Norte há maior incidência de municípios sem informações.

3. Estratégias empíricas e dados

Para cumprir o objetivo proposto, são realizadas regressões para um painel de municípios com dados anuais disponíveis de 2008 e 2019.5 5 Período definido para maximizar as observações oriundas do SNIS. Após 2019, o Produto Interno Bruto (PIB) municipal ainda não está disponível. Este é uma importante covariada, por isso optou-se por não a omitir. Utiliza-se o método de efeitos fixos - estimador within (regressões por Mínimos Quadrados Ordinários com as variáveis em desvios em relação às suas médias) -, com erros-padrão robustos e testes de Hausman para averiguar a melhor adequação deste método frente ao de efeitos aleatórios - regressões por Mínimos Quadrados Generalizados (Greene 1997Greene, W. H. 1997. Econometric Analysis. 3ª ed. New Jersey: Prentice Hall.; Baltagi 2001Baltagi, B. H. 2001. Econometric Analysis of Panel Data. Chichester: John Wiley & Sons.). Os modelos estimados baseiam-se na equação (1).

Q i t d f = β 0 + β 1 C i t + β 2 C i t P r i v i t + β 3 C i t H i b i t + β 4 X i t + β 5 T t + β 6 T t U F i + u i + ε i t (1)

sendo: Qitdf as variáveis dependentes do município i no ano t; β 0 a constante; β 1, β 2 e β 3 os coeficientes associados à proxy para o custo C it e às interações desta com dummies de provisão privada (C it Priv it ) e híbrida (C it Hib it ); β 4 os coeficientes associados às covariadas X it ; β 5 os coeficientes das dummies anuais T t (2008 como default); β 6 T t UF i interações entre as dummies anuais e as dummies de estados da federação; u i os efeitos fixos; e εit o erro.

Conforme o modelo de Hart et al (1997Hart, O., A. Shleifer e R. W. Vishny. 1997. “The proper scope of government: theory and an application to prisons”. Quarterly Journal of Economics, 112 (4). ), há dimensões de qualidade não contratáveis. O contratante pode adicionar cláusulas contratuais que visem impedir a deterioração da qualidade (ou pode existir regulações nesse sentido); contudo, argumenta-se que há sempre aspectos para os quais não é possível antecipar parâmetros ou os monitorar adequadamente. É nessa dimensão não-contratável que pode ocorrer o trade-off custo-qualidade. Assim, em testes da hipótese, o principal atributo da variável dependente indicativa da qualidade é que esta não seja observável diretamente, o que não é trivial, pois se a variável pode ser analisada, ela tende a ser contratável. Assim, não são ideais parâmetros operacionais da provisão disponibilizados em fontes oficiais.

Para os serviços de saneamento, inclusive os de abastecimento de água, a literatura sugere como proxies indicadores epidemiológicos locacionais; i.e., medidas relativas à saúde (Galiani et al. 2005Galiani, S., P. Gertler e E. Schargrodsky. 2005. “Water for life: the impact of the privatization of water services on child mortality”. Journal of Political Economy, 113 (1).; Saiani e Azevedo 2018Saiani, C. C. S. e P. F. Azevedo. 2018. “Is privatization of sanitation services good for health?”. Utilities Policy, 52.). Isto porque a qualidade dos serviços de saneamento afeta a saúde (Cvjetanovic 1986Cvjetanovic, B. 1986. “Health effects and impact of water supply and sanitation”. World Health Statistics Quarterly, 39 (1).; Esrey et al. 1990Esrey, S. A., J. B. Potash, L. Roberts e C. Shiff. 1990. “Health benefits from improvements in water supply and sanitation: survey and analysis of the literature on selected diseases”. Wash Technical Report, 66.; Heller 1997Heller, L. 1997. Saneamento e saúde. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde.) e os reguladores e contratantes, em geral, não utilizam indicadores epidemiológicos para averiguar o desempenho dos provedores.

Outra vantagem do uso de indicadores epidemiológicos é lidar com a possibilidade de causalidade reversa entre custo e qualidade. Além de serem medidas não operacionais externas, Rocha et al. (2017Rocha, M. S. B., E. H. C. Mattos e C. C. S. Saiani. 2017. “Descentralização e provisão de serviços públicos: evidências a partir da criação dos municípios brasileiros no setor de saneamento básico”. Pesquisa e Planejamento Econômico, 47 (1).) mostram, com dados municipais, como neste estudo, que os provedores no país tendem a não reagir, com maiores investimentos, a indicadores de saúde ruins. Ademais, mesmo se tais indicadores incentivassem mudanças operacionais dos provedores, a efetividade dos efeitos na provisão dos serviços de saneamento demanda tempo (Savedoff e Spiller 1999Savedoff, W. e P. Spiller. 1999. Spilled water, institutional commitment in the provision of water services. Inter-American Development Bank.).

Assim, as variáveis dependentes (Qitdf) correspondem à morbidade hospitalar (internações por 100 habitantes)6 6 Por 100 habitantes para sugerir a probabilidade de adoecimento, mas com as ressalvas de não existirem dados sobre número de vezes que uma pessoa foi internada e de casos sem internações (FUNASA 2002). por grupos de doenças (d) e faixas etárias (f). Os dados são do Sistema de Informações Hospitalares (SIH) do Sistema Único de Saúde (SUS), coletados via DATASUS. Uma limitação é existirem dados apenas de internações públicas (unidades hospitalares públicas ou conveniadas ao SUS). Contudo, elas são parcela significativa do total (Pires et al. 2016Pires, J. M., M. Martins e I. C. Leite. 2016. “O arranjo público privado e a mortalidade hospitalar por fontes de pagamento”. Revista de Saúde Pública , 50.).

Outra limitação é a chance de erros de diagnóstico e no preenchimento dos prontuários, além do incentivo adverso no reembolso aos hospitais - preferência por diagnósticos com maiores remunerações. Considerando esses problemas, para garantir maior confiabilidade, são sugeridas análises com grupos de doenças com sintomas mais similares (Veras e Martins 1994Veras, C. M. T. e M. S. Martins. 1994. “A confiabilidade dos dados nos formulários de autorização de internação hospitalar (AIH)”. Cadernos de Saúde Pública , 10.; Mathias e Soboll 1998Mathias, T. A. F. e M. L. M. S. Soboll. 1998. “Confiabilidade de diagnósticos nos formulários de autorização de internação hospitalar”. Revista de Saúde Pública, 32 (6).; Laurenti et al. 2004Laurenti, R., M. H. P. Mello-Jorge e S. L. D. Gotlieb. 2004. “A confiabilidade dos dados de mortalidade e morbidade por doenças crônicas não-transmissíveis”. Ciência & Saúde Coletiva, 9 (4).; Bittencourt et al. 2006Bittencourt, S. A., L. A. B. Camacho e M. C. Leal. 2006. “O sistema de Informação Hospitalar e sua aplicação na saúde coletiva”. Cadernos de Saúde Pública, 22 (1).), como é feito neste estudo.

Ressalva-se que, quando a variável dependente tem erro, é esperado um viés “para baixo” nos coeficientes. Assim, é possível não atribuir significância a um coeficiente que possui, mas não o contrário. As demais propriedades das estimações persistem (Hausman 2001Hausman, J. “Mismeasured variables in econometric analysis: problems from the right and problems from the left”. Journal of Economic Perspectives, 15 (4). ). Destaca-se, ainda, que melhoras no abastecimento de água são associadas a impactos de longo prazo na saúde superiores a ações de natureza biomédica; porém, também é reconhecida a dificuldade de mensurar impactos de curto prazo, pois o serviço afeta a saúde, mas interagindo em uma complexa cadeia causal (Briscoe 1985Briscoe, J. 1985. “Evaluating water supply and other health programs: short-run versus long-run mortality effects”. Public Health, 99 (3)., 1987; Esrey et al. 1990Esrey, S. A., J. B. Potash, L. Roberts e C. Shiff. 1990. “Health benefits from improvements in water supply and sanitation: survey and analysis of the literature on selected diseases”. Wash Technical Report, 66.; Cvjetanovic 1986Cvjetanovic, B. 1986. “Health effects and impact of water supply and sanitation”. World Health Statistics Quarterly, 39 (1).; Heller 1997Heller, L. 1997. Saneamento e saúde. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde.).

Devido a tais fatores, a escolha das medidas de saúde considerou sugestões da literatura. A primeira é a superioridade da morbidade frente à mortalidade em função da confiabilidade dos dados, facilidade de determinação e capacidade de resposta ao setor (Briscoe et al. 1986Briscoe, J., R. G. Feachem e M. M. Rahaman. 1986. Evaluating Health Impact: Water Supply, Sanitation and Hygiene Education. Ottawa: International Development Research Centre.)7 7 Apesar de ser obrigatório o registro, há subnotificação de óbitos - sepultamentos clandestinos, em especial de populações mais pobres e rurais (Mello-Jorge 1983; Szwarcwald et al. 2002; Costa et al. 2005; Libânio et al. 2005). . Outra é o uso de dados segundo os municípios de residência e não os de internação. Ademais, a avaliação é feita por causas específicas e mais diretamente associadas ao saneamento básico - o que atende à sugestão de diagnósticos mais agregados com sintomas similares para garantir maior confiabilidade dos dados. Os grupos de doenças relacionadas ao saneamento ambiental inadequado (DRSAI) considerados são: i) diarreicas; ii) outras feco-orais; e iii) outras DRSAI.

O Quadro 1 mostra as doenças em cada grupo. As diarreicas são defendidas como as mais sensíveis ao abastecimento de água. Por isso, são as mais adequadas para avaliações de efeitos de curto prazo. Isto porque, embora a diarreia seja um sintoma de várias doenças, a transmissão dos agentes patogênicos se dá pela via feco-oral, sem hospedeiros intermediários. No geral, os ciclos de contágio envolvem a defecção dos patogênicos por uma pessoa e a infecção de outras pela ingestão de água e alimentos ou contato oral a mãos e objetos contaminados. Ademais, o abastecimento de água adequado é uma importante ação de controle (Esrey et al. 1985Esrey, S. A., R. G. Feachem e J. M. Hughes. 1985. “Interventions for the control of diarrheal diseases among young children: improving water supplies and excreta disposal facilities”. Bulletin of the World Health Organization, 63 (4)., 1990).

Quadro 1
Doenças relacionadas ao saneamento inadequado (DRSAI), segundo categorias e grupos

Adicionalmente, é considerado um quarto grupo de enfermidades, aqui denominado como demais doenças. Este é composto por todas as doenças que geram internações, exceto aquelas relacionadas ao saneamento (Quadro 1) e as internações devido a causas externas (acidentes e agressões).8 8 Especificamente, todas as internações dos grupos de doenças entre os capítulos I e XVIII e do XXI da 10ª revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-10), excetuando-se as DRSAI que constam no Quadro 1. As estimações com as demais doenças são testes de placebo (ou de falsificação).

As estimações também consideram morbidades por faixas etárias (por 100 habitantes das respectivas): a) menos de 5 anos; b) 5 a 14 anos; c) 15 a 59 anos; e d) mais de 60 anos. As crianças com até 5 anos, em função de hábitos (persistem mais tempo no chão e levam mãos e objetos à boca) e ao desenvolvimento fisiológico, são mais vulneráveis às DRSAI. Outro grupo vulnerável, dada a possível saúde mais debilitada, é o dos idosos (Briscoe et al. 1986Briscoe, J., R. G. Feachem e M. M. Rahaman. 1986. Evaluating Health Impact: Water Supply, Sanitation and Hygiene Education. Ottawa: International Development Research Centre.; Esrey et al. 1990Esrey, S. A., J. B. Potash, L. Roberts e C. Shiff. 1990. “Health benefits from improvements in water supply and sanitation: survey and analysis of the literature on selected diseases”. Wash Technical Report, 66.; Victora et al. 1994Victora, C. G., P. R. Grassi, P. R. e A. M. Schmidt. 1994. “Situação de saúde da criança em área da região sul do Brasil, 1980-1992: tendências temporais e distribuição espacial”. Revista de Saúde Pública , 6 (28).). Como a saúde é afetada por atributos variantes com a idade, as estimações por faixas etárias consideram pessoas mais similares em atributos não observados.

A estratégia de identificação baseada em testes por causas e idades específicas é sugerida pela literatura para avaliações de efeitos de serviços de saneamento na saúde, inclusive para comparações entre governanças de provisão (Galiani et al. 2005Galiani, S., P. Gertler e E. Schargrodsky. 2005. “Water for life: the impact of the privatization of water services on child mortality”. Journal of Political Economy, 113 (1).; Saiani e Azevedo 2018Saiani, C. C. S. e P. F. Azevedo. 2018. “Is privatization of sanitation services good for health?”. Utilities Policy, 52.). A premissa é que se o efeito de interesse for significativo nas DRSAI mais direta e imediatamente impactadas pelo saneamento (diarreicas) e nas faixas etárias mais vulneráveis (crianças de até 5 anos e idosos) e não houver coeficiente significativo similar nas doenças não associadas ao saneamento, há maior robustez na sugestão de causalidade do efeito, pois este não decorreria de atributos não observados distintos entre os municípios que influenciam a saúde em geral.

O Quadro 2 expõe as variáveis explicativas. O custo corresponde à despesa de exploração (DEX) por população atendida pelo serviço de abastecimento de água9 9 Os sistemas municipais de abastecimento de água têm diferentes tamanhos, por isso a divisão pela população atendida. Para valores em R$ de 2019, usa-se o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do IBGE. - desconsiderando as despesas financeiras. Esta é a proxy para o custo operacional. Se for o mesmo provedor, não é possível diferenciar custos com abastecimento de água e esgotamento sanitário.10 10 Ressalva-se que há casos de mais de um provedor em um município, mesmo apenas no abastecimento de água. Para estes municípios, é considerado aquele que atende ao maior número de usuários. A alternativa seria a agregação das variáveis dos provedores, o que geraria complicações em relação a qual governança considerar para o município se os provedores são de modalidades diferentes, o que é comum. Assim, adota-se um procedimento perfeitamente replicável e com preferência pelos provedores mais relevantes em termos de atendimento. Assim, a partir de dados do SNIS, é inserida uma dummy para controlar se o provedor atende o município com água e esgoto ou apenas água. Para a corroborar a hipótese do trade-off custo-qualidade, o coeficiente estimado associado ao custo deve ser significativo e com sinal positivo (β 1 > 0).

As interações entre o custo e as dummies governança da provisão (privada ou híbrida) permitem testar as hipóteses de acentuação do trade-off na provisão privada e de atenuação na provisão híbrida. Se o trade-off for constatado (β 1 > 0 e significativo), caso o coeficiente da interação entre a proxy para o custo e a dummy governança (β 2 ou β 3) seja: a) significativo e positivo, há acentuação do problema; e b) significativo e negativo, ocorre atenuação quando, em módulo, a magnitude do coeficiente é inferior à do coeficiente do custo e há ausência do problema quando, em módulo, a magnitude do coeficiente for superior ao do custo; e c) não significativo, o trade-off não é estatisticamente diferente na provisão em pauta e na pública.

Fundamentando-se na literatura, as covariadas (Quadro 2) são possíveis determinantes do desempenho operacional-financeiro (custo) dos provedores, da qualidade do abastecimento de água, da governança da provisão e da saúde. Assim, em conjunto com os efeitos fixos e o teste de placebo, busca-se lidar com potenciais vieses, como de variáveis omitidas e de seleção.11 11 Para mais detalhes sobre como covariadas que também afetam o status do tratamento (no caso, a governança da provisão) e efeitos fixos lidam com o viés de seleção, conferir, entre outros, Angrist e Pischke (2009).

Pelo lado do desempenho e da governança das provisões, as covariadas analfabetismo, densidade, urbanização, idosos, PIB e população controlam o desenvolvimento municipal - que influencia a conscientização ambiental e sobre saúde e, assim, a demanda por abastecimento de água adequado - bem como as capacidades de arrecadação e investimento dos provedores e as economias de escala e de aglomeração dos serviços (Shafik e Bandyopadhyay 1992Shafik, N. e S. Bandyopadhyay. 1992. “Economic growth and environmental quality: time series and cross-country evidence”. Working Papers Series, nº 904, World Bank.; Ménard e Saussier 2000Ménard, C. e S. Saussier, S. 2000. “Contractual choice and performance: the case of water supply in France”. Revue d’Économie Industrielle, 92.; Picazo-Tadeo et al. 2010Picazo-Tadeo, A. J., F. González-Gómez, J. G. Wanden-Berghe e A. Ruiz-Villaverde. 2010. “Do ideological and political motives really matter in the public choice of local services management? Evidence from urban water services in Spain”. Public Choice , 151 (1).; Saiani 2012Saiani, C. C. S. 2012. “Competição política faz bem à saúde? Evidências dos determinantes e dos efeitos da privatização dos serviços de saneamento básico no Brasil”. Tese de Doutorado, Escola de Economia de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas.; Sousa et al. 2012Sousa, M. C. S., P. L. C. P. Araújo e M. E. Tannuri-Pianto. 2012. “Residual and technical tax efficiency scores for Brazilian municipalities: a two-stage approach”. Estudos Econômicos, 42 (1).; Santos et al. 2021Santos, P. L., E. B. Vieira, C. C. S. Saiani e C. R. L. Piorski. 2021. “Conscientização e serviços ambientalmente adequados: evidências para acesso a saneamento no Brasil”. Revista Iberoamericana de Economía Ecológica, 34 (1).).

Quadro 2
Descrições das variáveis explicativas

Pelo lado da saúde, as covariadas controlam fatores que afetam a incidência de doenças, inclusive as DRSAI. Quanto maior a renda (PIB), maior o acesso a alimentos, medicamentos e serviços de saúde. “Densidade” e “urbanização” controlam a concentração populacional, que contribui à proliferação de doenças transmissíveis, além da possível distribuição desigual de serviços e infraestruturas de saúde entre áreas urbanas e rurais (Wennemo 1993Wennemo, I. 1993. “Infant mortality, public policy and inequality - a comparison of 18 industrialized countries”. Sociology of Health & Illness, 15 (4).; Wang 2003Wang, L. 2003. “Determinants of child mortality in LDCs: empirical findings from demographic and health surveys”. Health Policy, 65 (3) ).

O “analfabetismo” controla a educação como determinante do acesso ao serviço (Rezende et al. 2007Rezende, S., S. Wajnman, J. A. M. Carvalho e L. Heller. 2007. “Integrando oferta e demanda de serviços de saneamento: análise hierárquica do panorama urbano brasileiro no ano 2000”. Engenharia Sanitária e Ambiental, 12 (1).). Ademais, quanto maior a educação, maior a adoção de ações preventivas de saúde (higiene, por exemplo), o que reduz a difusão de doenças (Caldwell 1990Caldwell, J. C. 1990. “Cultural and social factors influencing mortality levels in developing countries”. Artigo dos anais da American Academy of Political and Social Science.; Esrey et al. 1990Esrey, S. A., J. B. Potash, L. Roberts e C. Shiff. 1990. “Health benefits from improvements in water supply and sanitation: survey and analysis of the literature on selected diseases”. Wash Technical Report, 66.). A variável “idosos” controla eventual preocupação do provedor com a saúde dos usuários12 12 Na ausência de outros dados para todos os municípios e anos, são consideradas as variáveis analfabetismo e idosos com informações da RAIS. Estas podem ser mal dimensionadas, mas são as proxies possíveis. .12

Vários trabalhos avaliam as relações entre os gastos públicos em funções específicas e a saúde (Wennemo 1993Wennemo, I. 1993. “Infant mortality, public policy and inequality - a comparison of 18 industrialized countries”. Sociology of Health & Illness, 15 (4).; Wang 2003Wang, L. 2003. “Determinants of child mortality in LDCs: empirical findings from demographic and health surveys”. Health Policy, 65 (3) ). Estes gastos são agregados nas variáveis meritórios e bem-estar (Oxley e Martin 1991Oxley, H. e J. P. Martin. 1991. “Controlling government spending and deficit: trends in the 1980s and prospects for the 1990s”. OECD Economic Studies, 17.)13 13 Variáveis fiscais como médias dos quatro anos anteriores para reduzir a influência de ciclos político-eleitorais e pela possibilidade de os efeitos na saúde não serem imediatos, além de diminuir potencial endogeneidade. .13 Os gastos com pessoal são os mais rígidos, podendo reduzir a capacidade de investir e de realizar gastos sociais (Giuberti 2005Giuberti, A. C. 2005. “Efeitos da lei de responsabilidade fiscal sobre os gastos dos municípios brasileiros”. Tese de Doutorado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo.). A variável dependência, por sua vez, controla a capacidade de geração de receitas tributárias próprias (Macedo e Corbari 2009Macedo, J. J. e E. C. Corbari. 2009. “Efeitos da Lei de Responsabilidade Fiscal no endividamento dos municípios brasileiros: uma análise de dados em painéis”. Revista Contabilidade & Finanças, 20 (51).).

A “imunização” é uma importante ação preventiva. Diretamente, reduz a proliferação de doenças, inclusive algumas DRSAI; indiretamente, ao reduzir estes casos, faz com que menos pessoas tenham os sistemas imunológicos prejudicados, diminuindo a incidência de doenças em geral (Wang 2003Wang, L. 2003. “Determinants of child mortality in LDCs: empirical findings from demographic and health surveys”. Health Policy, 65 (3) ). As variáveis de leitos são proxies para a disponibilidade de serviços de saúde no município, o que afeta diretamente o número de internações (Wennemo 1993Wennemo, I. 1993. “Infant mortality, public policy and inequality - a comparison of 18 industrialized countries”. Sociology of Health & Illness, 15 (4).). A divisão em dois tipos tenta captar a participação de cada forma de gestão dos serviços de saúde, pública (SUS) ou privada, o que pode refletir nos tratamentos e internações (Souza et al. 2010Souza, I. V., M. Nishijima e F. Rocha. 2010. “Eficiência do setor hospitalar nos municípios paulistas”. Economia Aplicada, 14 (1).).

A dummy surtos é construída a partir das notificações de doenças com transmissão hídrica e alimentar (DTHA) do SINAN. São classificados como surtos quando duas ou mais pessoas têm doenças ou sinais e sintomas similares após ingerirem alimentos ou água da mesma origem. Para doenças de alta gravidade, como cólera e botulismo, um caso já é reportado como surto. Alterações no padrão das doenças diarreicas agudas também correspondem a surtos. Os casos são reportados pela vigilância sanitária. Aqui, são considerados somente surtos por transmissão hídrica por serem mais associadas ao abastecimento de água. Assim, a dummy surtos, que é variante nos municípios e tempo, busca controlar eventuais respostas do custo não decorrentes de decisões dos provedores e sim de exigências legais. Por exemplo, é possível que ao detectar um surto, instituições de saúde pública acionem o provedor para seu controle, o que pode elevar custos. Nessas situações, pode existir causalidade reversa, reforçando o controle pela dummy.

Para interpretar, com maior robustez, os possíveis resultados como efeitos em dimensões não contratáveis, são feitas estimações adicionais inserindo aspectos observáveis da qualidade (variáveis cloro, turbidez e coliformes) definidos pela Portaria nº 2.914 do Ministério da Saúde (Brasil 2011), e o acesso ao abastecimento de água. Tais controles são importantes, ainda, pela cobertura afetar a saúde (Heller 1997Heller, L. 1997. Saneamento e saúde. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde.) e existir indícios de efeitos dos mesmos indicadores de qualidade na saúde em Teixeira (2011Teixeira, L. I. 2011. “Evidências empíricas das políticas de saneamento básico sobre indicadores de saúde para municípios brasileiros”. Dissertação de Mestrado, Escola de Economia de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas.), que também sugere os indicadores de conformidade para controlar os tamanhos das amostras fora dos padrões. As variáveis de acesso e qualidade são inseridas em especificações alternativas por estarem disponíveis para uma amostra menor.

As dummies anuais (T t ) controlam os efeitos fixos temporais. As interações entre os anos e estados controlam possíveis tendências diferentes entre estados (por exemplo, devido a efeitos de ações de saúde estaduais). Os efeitos fixos (u i ), além de lidarem com um potencial viés de seleção por atributos não observados diferentes entre os municípios e fixos no tempo (Angrist e Pischke 2009Angrist, J. D. e J. S. Pischke. 2009. Mostly Harmless Econometrics: An Empiricist’s Companion. Princeton: Princeton University Press.), controlam atributos, como culturais e de relevo, que afetam a saúde (Caldwell 1990Caldwell, J. C. 1990. “Cultural and social factors influencing mortality levels in developing countries”. Artigo dos anais da American Academy of Political and Social Science.) e o custo da provisão, assim como atributos dos provedores que determinam seus desempenhos.

Em relação à abrangência, cabe relembrar que a distribuição dos provedores segundo a governança (Tabela 1) é herança do histórico das políticas federais, em especial dos incentivos às concessões para as CESBs e da persistência de indefinições regulatórias que restringiram o avanço privado. Isso gerou uma predominância de provedores regionais (CESBs), seguidos por locais públicos (municipais) e, em quantidade bem menor, por privados (locais e um regional). Conforme a Tabela 2, com dados da amostra do SNIS de 2019, as provisões pública e privada possuem maiores participações de locais; já a provisão híbrida é predominantemente regional.

Assim, cabe avaliar se um eventual efeito distinto da provisão híbrida não decorre de vantagens da governança na compatibilização de interesses públicos e privados, mas sim de ganhos da regionalização - escala, subsídios cruzados e repartição de custos entre municípios (Okun 1977Okun, D. A. 1997. Regionalization of water management: a revolution in England and Wales. London: Applied Science Publishers.; Heller 2012Heller, P. G. B. 2012. “Modelos de prestação dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário: uma avaliação comparativa do desempenho do conjunto de municípios brasileiros”. Tese de Doutorado, Programa de Pós-Graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Universidade Federal de Minas Gerais.). Para isso, são realizadas regressões para subamostras de municípios segundo as abrangências de atuação (regional e local). Estimações adicionais também são feitas apenas com provedores do abastecimento de água (excluindo os que também ofertam serviços de esgotamento) para avaliar se os resultados não decorrem de economias de escopo - embora já seja controlada a dummy água e esgoto. A Tabela 2 expõe a amostra para esse caso.

Os dados do SNIS são autodeclarados pelos provedores, sem instrumentos de auditoria, validação (Freitas et al. 2018Freitas, R. M. S., J. J. Smiderle, S. A. Dias, R. M. Souza e C. Zidde. 2018. “Medindo o saneamento: potencialidades e limitações de dados brasileiros”. CERI, FGV.) e obrigatoriedade. A principal consequência é que há municípios que “entram e saem” da amostra ao longo dos anos, sendo possível que a decisão por informar não seja aleatória. Seguindo Rocha et al. (2017Rocha, M. S. B., E. H. C. Mattos e C. C. S. Saiani. 2017. “Descentralização e provisão de serviços públicos: evidências a partir da criação dos municípios brasileiros no setor de saneamento básico”. Pesquisa e Planejamento Econômico, 47 (1).), para avaliar se a variabilidade no tempo da amostra enviesa os resultados, são feitas regressões para um painel balanceado. Se os resultados forem similares aos encontrados com o painel desbalanceado, é uma evidência favorável à interpretação de que a variação dos informantes não os enviesa. Por fim, também são avaliados possíveis efeitos heterogêneos das provisões híbridas de capital aberto e fechado. Todas as estimações adicionais consideram apenas a morbidade diarreica de crianças de até 5 anos, por ser o principal indicador, segundo a literatura revisada, para análises de efeitos do saneamento.

Tabela 2
Brasil (amostra do SNIS utilizada): distribuições dos municípios atendidos por abastecimento de água, segundo as abrangências de atuação, a oferta de esgotamento e as governanças (2019)

4. Análises dos resultados

A seguir, a Tabela 3 expõe estatísticas descritivas para todas as variáveis utilizadas nas estimações. As outras tabelas apresentam os resultados de interesse14 14 Os resultados relativos às demais variáveis não são reportados, mas podem ser solicitados aos autores. . Na especificação I, são inseridas as covariadas e dummies temporais. A II controla também as variáveis de qualidade observada, existência de surtos e quais serviços são providos. A III adiciona o acesso a água. A IV é semelhante à II, mas com interações entre anos e estados. Os testes de Hausman sinalizam, em todos os casos, a melhor adequação dos efeitos fixos em comparação aos efeitos aleatórios.

A Tabela 4 reporta os resultados para a morbidade por grupos de doenças da população total. Os coeficientes positivos e significativos do custo sugerem a existência do trade-off custo-qualidade. Os coeficientes significativos e negativos da interação do custo com a dummy híbrido apontam que esta provisão atenua o trade-off. Já os coeficientes da interação custo com dummy privado são significativos, negativos e maiores, em módulo, do que os coeficientes do custo. Assim, a provisão privada conseguiria reduzir custos e aumentar qualidade. Os coeficientes destas variáveis para as demais doenças (não DRSAI) não apresentam significância estatística.

Portanto, os resultados da Tabela 4 sinalizam a existência do trade-off custo-qualidade na média, com atenuação na provisão híbrida (ou seja, maior na provisão pública), mas ausência do problema na provisão privada, que conseguiria reduzir custos e aumentar qualidade. Esta interpretação pode ser questionada pela possibilidade de um efeito inverso; ou seja, redução da qualidade com aumento de custos. Contra este argumento, há outras evidências da literatura favoráveis às privatizações no setor brasileiro (Scriptore et al. 2015Scriptore, J. S., C. R. Azzoni e N. Menezes Filho. 2015. “Saneamento básico e indicadores educacionais no Brasil”. Working Paper Series, nº 2015-28, FEA-USP.; Saiani e Azevedo 2018Saiani, C. C. S. e P. F. Azevedo. 2018. “Is privatization of sanitation services good for health?”. Utilities Policy, 52.).

Tabela 3
Estatísticas descritivas - médias e desvios-padrão (DP) - das variáveis explicativas e dependentes das estimações (2008 a 2019)
Tabela 4
Resultados: morbidade da população total, segundo grupos de DRSAI e demais doenças
Tabela 5
Resultados: morbidade por doenças diarreicas, segundo faixas etárias
Tabela 6
Resultados: morbidade por outras doenças feco-orais, segundo faixas etárias
Tabela 7
Resultados: morbidade por outras DRSAI, segundo faixas etárias
Tabela 8
Resultados: morbidade por demais doenças (não DRSAI), segundo faixas etárias
Tabela 9
Resultados: morbidade para menores de 5 anos, segundo grupo de doenças (especificação II)
Tabela 10
Resultados: morbidade para doenças diarreicas para menores de 5 anos, especificações para testes de robustez

As Tabelas 5 a 8 expõem os resultados por faixas etárias. Nas doenças diarreicas (Tabela 5), em todas as faixas etárias, ao menos em uma especificação o custo é associado a coeficiente positivo e significativo, não sendo possível, assim, refutar a hipótese de existência do trade-off custo-qualidade na provisão de abastecimento de água no Brasil, inclusive por este padrão ser observado nas crianças até 5 anos (especificação II) e, de forma mais evidente, nos idosos (especificações I, II e III). Portanto, nas faixas etárias mais vulneráveis a intervenções no saneamento básico, conforme a literatura de saúde. Ademais, não são observados coeficientes significativos nas mesmas faixas etárias e especificações das demais doenças (Tabela 8); i.e., naquelas doenças não diretamente associadas ao abastecimento de água. Ademais, nas feco-orais (Tabela 6), há coeficientes positivos e significativos nas especificações I, II e III de 15 a 59 anos. Pela literatura, tais doenças sofreriam menos efeitos imediatos do saneamento.

Um coeficiente negativo e significativo (e superior ao do custo, em módulo) da interação entre custo e a dummy privado é obtido na grande maioria das especificações para a morbidade hospitalar por doenças diarreicas, independentemente da faixa etária (Tabela 5), assim como em alguns casos por doenças feco-orais (Tabela 6) e outras DRSAI (Tabela 7), mas em nenhuma estimação por doenças não relacionadas diretamente ao abastecimento de água (Tabela 8). Tais resultados reforçam o argumento de inexistência do trade-off custo-qualidade entre os privados.

A atenuação do trade-off custo-qualidade na provisão híbrida é menos robusta, embora sejam observados coeficientes significativos e negativos da interação entre o custo e a dummy híbrido em especificações da morbidade diarreica nas crianças até 5 anos e, principalmente, nos idosos (Tabela 5). Portanto, nas doenças mais associadas ao abastecimento de água e em faixas etárias mais vulneráveis. Há, ainda, alguns coeficientes negativos e significativos, em outras faixas etárias, nas doenças feco-orais e nas outras DRSAI (Tabelas 6 e 7). Além disso, todos os coeficientes nas doenças não associadas ao saneamento (Tabela 8) são não significativos. Em conjunto, tais resultados não permitem refutar integralmente a atenuação na provisão híbrida.

Alguns aspectos e resultados adicionais devem ser considerados em relação à provisão híbrida. Primeiramente, que estes provedores são predominantemente de abrangência regional (Tabela 2) - ou seja, ofertam os serviços em mais de um município. Assim, a Tabela 9 apresenta os resultados de estimações distintas para provedores regionais e locais para a morbidade de crianças de até 5 anos. O trade-off custo-qualidade (coeficiente positivo e significativo do custo) é sugerido nas doenças diarreicas e em outras DRSAI nas estimações dos provedores regionais, mas não naquelas para provedores locais. Uma possível justificativa é que os provedores locais afetam menos a qualidade em resposta a aumentos de custos por serem mais descentralizados, garantindo maior proximidade entre usuários e provedores, menores assimetrias informacionais e, assim, provavelmente maior controle social (Tiebout 1956Tiebout, C. 1956. “A pure theory of local expenditures”. Journal of Political Economy , 64 (5)..; Oates 1972Oates, W. E. 1972. Fiscal Federalism. New York: Harcourt Brace Jovanovich., 1999______. 1999. “An essay on fiscal federalism”. Journal of Economic Literature, 37 (3).). Nos regionais, a atenuação do trade-off nos híbridos e sua ausência nos privados também são sinalizadas.

A Tabela 10 mostra os resultados das estimações que investigam a robustez dos resultados para: i) o painel balanceado; ii) municípios com provedores apenas de água; e iii) substituição da interação do custo com a dummy híbrida por interações do custo com dummies híbridos de capital aberto e fechado. As especificações apresentadas são as II e IV para doenças diarreicas considerando apenas crianças menores do que 5 anos - principal indicador, segundo a literatura, para análises de efeitos de serviços de saneamento básico, como o abastecimento de água.

No painel balanceado, o trade-off custo-qualidade é sinalizado pela especificação IV - coeficiente positivo e significativo do custo; consequentemente, a ausência deste problema na provisão privada também é sugerida pela mesma especificação - coeficiente significativo, negativo e maior, em módulo, ao do custo associado à interação entre este e a dummy privado. Na especificação II, o coeficiente desta interação também é negativo e significativo. Já para a provisão híbrida, o coeficiente não é significativo nas duas especificações. Assim, a variação no tempo da amostra do SNIS não enviesa os coeficientes do custo e da provisão privada.

Em relação às estimações apenas para provedores de água (para avaliar se os possíveis resultados não são afetados por economias de escopo), a especificação II sinaliza evidências favoráveis ao trade-off (coeficiente positivo e significativo do custo), à atenuação do problema na provisão híbrida (coeficiente negativo e significativo da interação custo e dummy híbrido) e à sua ausência na provisão privada. O coeficiente significativo, negativo e maior, em módulo, ao do custo da interação custo e dummy privado também é observado na especificação IV.

Finalmente, a especificação II das estimações que abrem provedores híbridos em capital aberto e fechado sinaliza que a provável atenuação do trade-off custo-qualidade na provisão híbrida advém daqueles com capital fechado (coeficiente negativo e significativo da interação custo e dummy híbrido de capital aberto). Ou seja, nos provedores híbridos que talvez tenham menores incentivos privados, revertendo a lógica aqui constatada no caso da provisão privada.

Portanto, o conjunto de resultados aqui obtidos não permitem rejeitar a hipótese de que o saneamento básico brasileiro, tomando como referência os serviços de abastecimento de água, está exposto ao trade-off entre custo-qualidade não contratável. Tais evidências são consistentes com argumentos da literatura baseados nos atributos econômicos dos serviços (Hart et al. 1997Hart, O., A. Shleifer e R. W. Vishny. 1997. “The proper scope of government: theory and an application to prisons”. Quarterly Journal of Economics, 112 (4). ; Ménard e Saussier 2000Ménard, C. e S. Saussier, S. 2000. “Contractual choice and performance: the case of water supply in France”. Revue d’Économie Industrielle, 92.). Além disso, os resultados encontrados não corroboram a hipótese de acentuação do trade-off na provisão privada - inclusive existindo, possivelmente, uma reversão (menor custo e maior qualidade) nessa governança - e não refutam integralmente a hipótese de atenuação do problema na provisão híbrida - alguns resultados sugerem essa possibilidade. A atenuação do trade-off custo-qualidade seria nos provedores híbridos de capital fechado.

É relevante apontar que os resultados parecem ser concentrados nos provedores regionais - o que, implicitamente, também sugere vantagens na provisão local, em especial pela aparente inexistência do trade-off. Ademais, é notável que os resultados são sensíveis à interação entre anos e estados, embora existam alguns casos de significância com este controle, destacando-se nas diarreicas até 5 anos. Uma possível explicação para as interações tornarem coeficientes não significativos é também captarem, em algum grau, decisões de provedores regionais. Por exemplo, a decisão de uma CESB de aumentar o custo em todos os municípios que atende seria captada pelas interações; i.e., seria um efeito estadual, pois não atendem fora de seus estados.

Por fim, os principais resultados são robustos a especificações distintas, nas quais são consideradas parâmetros de qualidade contratável, acesso à água e existência de surtos de doenças com transmissão hídrica. Ademais, são robustos ao considerar somente provedores regionais ou aqueles que fornecem apenas água. Destaca-se, ainda, que se mantêm ao levar em conta um painel balanceado, retirando possíveis vieses de entrada e saída de municípios da amostra. Já a aderência dos resultados à estratégia de identificação utilizada na literatura, que prevê efeitos em determinados grupos de doenças e faixas etárias, ao contrário de causas não associadas a saneamento, afasta a possibilidade de os coeficientes estimados serem genéricos, ou seja, relacionados a quaisquer motivos de morbidade, e lidam com viés de variável omitida.

5. Considerações finais

Diferenças de desempenho entre provisões públicas e privadas de serviços públicos são objetos de amplo debate na política e na literatura econômica. No campo político, é comum os defensores da privatização argumentarem que os incentivos privados tornam os serviços mais baratos aos contribuintes. Por outro lado, aqueles que se opõem à privatização advogam que a minimização de custos, necessária para atingir o lucro máximo, pode comprometer a qualidade; e os gastos necessários à manutenção da qualidade, somados aos lucros, encarecem os serviços.

Já na literatura econômica, a maioria dos trabalhos empíricos enfatiza o clássico debate “público versus privado”. Assim, este estudo trouxe contribuições importantes ao confrontar, para o saneamento básico brasileiro, não apenas as tradicionais governanças pública e privada, mas também uma provisão híbrida. No caso, os provedores de abastecimento de água com as naturezas jurídicas de sociedades de economia mista e de empresas públicas, defendendo que nestas há coexistência de interesses públicos e privados. Assim, foi averiguado se há trade-off entre custo e qualidade na provisão de serviços de saneamento nos municípios brasileiros e, se sim, se varia segundo a governança da provisão (pública, privada ou híbrida) e se os resultados são heterogêneos entre provisões regionalizadas e descentralizadas (locais). Para atingir este objetivo, foram feitas regressões para um painel de municípios com dados de 2008 a 2019 e tomando como referência os serviços de abastecimento água devido à disponibilidade de dados.

Sob a premissa de contratos incompletos, o trade-off custo-qualidade é advogado para a qualidade não perfeitamente contratável. Dados para parâmetros não contratáveis de qualidade não são triviais. Por isso, seguindo a literatura, foram utilizados como proxies indicadores de morbidade hospitalar (internações). Para garantir maior robustez aos resultados, compondo a estratégia de identificação, foram adotadas mais sugestões da literatura: estimações por causas (doenças) e faixas etárias específicas, inclusive com um teste de falsificação (placebo) para averiguar a possibilidade de atributos não observados distintos entre os municípios afetarem os resultados, e controles por medidas observáveis de qualidade e atributos que também podem determinar a governança da provisão e a saúde para lidar com potencial viés de seleção. Além disso, foram feitas estimações por abrangência de atuação para avaliar efeitos da regionalização e investigações de efeitos heterogêneos em provedores híbridos de capital aberto e fechado.

Os resultados sugeriram, com relativa robustez, que a provisão do abastecimento de água nos municípios brasileiros tende a apresentar, na média, o trade-off custo-qualidade. Frente a argumentos da literatura revisados no presente estudo, este trade-off provavelmente decorre da ausência de competição (arbitragem de mercado) e do baixo dinamismo tecnológico do setor; ou seja, das poucas possibilidades de inovações redutoras de custos, de tal forma que isso fica restrito a economias em ações gerenciais, que podem deteriorar a qualidade do serviço.

Observou-se, ainda, que a provisão privada não acentua o trade-off custo-qualidade. Na verdade, os resultados sugerem que provedores privados conseguiriam reduzir custos e elevar a qualidade (ausência do problema). Já a provisão classificada como híbrida pode o atenuar. Assim, em provedores de abastecimento de água organizados como sociedades de economia mista ou empresas públicas, a aparente coexistência de incentivos públicos e privados culmina em resultados relativamente superiores em termos da resposta da qualidade a choques de custo.

Porém, ao contrário da lógica dos provedores privados, a atenuação nos híbridos ocorreria naqueles com capital fechado e, consequentemente, que têm relativamente menos incentivos privados. Ademais, o trade-off foi significativo apenas entre os provedores regionais. Logo, os locais (municipais) não se beneficiam de vantagens da regionalização (ganhos de escala), mas a provisão mais descentralizada parece gerar maior controle social (redução de assimetrias informacionais) sob a qualidade do serviço e maior dificuldade para ações redutoras de custos.

Portanto, o presente estudo sugere que a concessão de serviços de saneamento básico a provedores privados não aumenta, em relação aos provedores públicos, o risco de deterioração da qualidade em caso de redução de custos. No entanto, mediante o Novo Marco Legal do Saneamento, que tende a favorecer o avanço das privatizações em detrimento das delegações estaduais, é possível que, via redução de provedores híbridos e públicos, o problema seja indiretamente amenizado - dado os prováveis efeitos benéficos da privatização na saúde.

Uma preocupação é o processo de regionalização também incentivado pelo Novo Marco Legal, pois nos provedores locais o trade-off custo-qualidade pode ser rejeitado pelos resultados deste estudo. Assim, pode ser relevante definir parâmetros (de cobertura e de qualidade) a nível municipal, mesmo em provisões regionais, para o controle também ser localmente exercido.

Vale apontar que a nova legislação, promulgada em 2020, atribuiu à reformulada Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) a responsabilidade por definir diretrizes aos reguladores subnacionais. Por todo o exposto no presente estudo, o trade-off custo-qualidade deveria ser considerado nessas diretrizes, pois quaisquer regulações de custos tenderão a ter reflexos na qualidade. As evidências sinalizam, ainda, que a supervisão regulatória não deve se restringir às provisões privadas e híbridas, pois as públicas também apresentam o trade-off.

Em termos gerais, o estudo endereça evidências adicionais ao debate sobre diferenças de desempenho de governanças distintas de provisão de serviços públicos, em especial para setores em que discrepâncias de incentivos ganham maior relevância devido a seus atributos específicos e aos problemas informacionais que tornam o quadro regulatório um desafio. Desafio até para existirem informações municipais e anuais em fontes oficiais, o que inviabilizou a consideração de tal aspecto neste estudo. Além disso, o estudo também contribui à discussão da privatização ser ou não a melhor opção, mesmo com maior eficiência produtiva, em serviços que atendem a múltiplas funções estatais. Somadas a outras existentes na literatura, as evidências aqui obtidas foram favoráveis às privatizações, no sentido de que também podem resultar em ganhos sociais.

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  • 1
    O saneamento básico abrange os serviços de abastecimento de água, esgotamento sanitário, manejo de resíduos sólidos e drenagem urbana (Brasil 2007______. 2007. “Lei Federal n° 11.445. Lei Do Saneamento Básico”.). Devido à disponibilidade, este estudo utiliza dados do abastecimento de água oriundos do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS). Este assume que há atendimento se a pessoa for conectada a sistemas/redes de distribuição (SNIS 2019). Assim, sempre que aqui for mencionado o termo abastecimento de água é considerado o serviço ofertado por rede (geral), que é a forma mais adequada de acesso à água potável e a mais associada a decisões de provedores (Estache et al. 2002Estache, A., V. Foster e Q. Wodon. 2002. “Accounting for poverty in infrastructure reform: learning from Latin America’s experience”. World Bank Institute Development Studies.; Santos et al. 2021Santos, P. L., E. B. Vieira, C. C. S. Saiani e C. R. L. Piorski. 2021. “Conscientização e serviços ambientalmente adequados: evidências para acesso a saneamento no Brasil”. Revista Iberoamericana de Economía Ecológica, 34 (1).).
  • 2
    O único trabalho encontrado que se fundamenta em Hart et al. (1997Hart, O., A. Shleifer e R. W. Vishny. 1997. “The proper scope of government: theory and an application to prisons”. Quarterly Journal of Economics, 112 (4). ) para avaliações no saneamento brasileiro é Saiani e Azevedo (2018Saiani, C. C. S. e P. F. Azevedo. 2018. “Is privatization of sanitation services good for health?”. Utilities Policy, 52.). Este utiliza proxies para a qualidade não contratável e estratégias de identificação similares - baseadas em Galiani et al. (2005Galiani, S., P. Gertler e E. Schargrodsky. 2005. “Water for life: the impact of the privatization of water services on child mortality”. Journal of Political Economy, 113 (1).) -, assim como os municípios como unidades de análise, mas avalia diferenças médias entre provedores públicos e tipos de privados, enquanto o presente estudo analisa explicitamente o trade-off custo-qualidade e compara governanças de provisão que vão além da discussão público versus privado.
  • 3
    Por exemplo: a) falta de água em alguns locais e desperdícios em outros (perdas) - o que é grave em cenários cada vez mais recorrentes de crises hídricas; b) baixa incidência de tratamento de esgoto; e c) déficits de acesso concentrados na população mais pobre e em locais menos desenvolvidos (ANA 2010Ana. 2010. Atlas Brasil: abastecimento urbano de água. Brasília: Agência Nacional de Águas., 2019______. 2019. Conjuntura recursos hídricos Brasil 2019. Brasília: Agência Nacional de Águas.; Santos et al. 2021Santos, P. L., E. B. Vieira, C. C. S. Saiani e C. R. L. Piorski. 2021. “Conscientização e serviços ambientalmente adequados: evidências para acesso a saneamento no Brasil”. Revista Iberoamericana de Economía Ecológica, 34 (1).).
  • 4
    No momento em que este estudo é finalizado (agosto de 2022), já ocorreram novas privatizações e outras estão em andamento. Algumas podem ser consultadas no site do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, mas não são aqui contempladas, pois o período analisado é anterior em função da disponibilidade de dados.
  • 5
    Período definido para maximizar as observações oriundas do SNIS. Após 2019, o Produto Interno Bruto (PIB) municipal ainda não está disponível. Este é uma importante covariada, por isso optou-se por não a omitir.
  • 6
    Por 100 habitantes para sugerir a probabilidade de adoecimento, mas com as ressalvas de não existirem dados sobre número de vezes que uma pessoa foi internada e de casos sem internações (FUNASA 2002Funasa. 2002. Textos de Epidemiologia para Vigilância Ambiental em Saúde. Brasília: Fundação Nacional de Saúde, Ministério da Saúde.).
  • 7
    Apesar de ser obrigatório o registro, há subnotificação de óbitos - sepultamentos clandestinos, em especial de populações mais pobres e rurais (Mello-Jorge 1983Mello-Jorge, M. H. P. 1983. “Sub-Registro dos eventos vitais”. Revista de Saúde Pública , 17 (2).; Szwarcwald et al. 2002Szwarcwald, C. L., M. C. Leal, C. L. T. Andrade e P. R. B. Souza Júnior. 2002. “Estimação da mortalidade infantil no Brasil: o que dizem as informações sobre óbitos e nascimentos do Ministério da Saúde?”. Cadernos de Saúde Pública , 18 (6).; Costa et al. 2005Costa, S. S., L. Heller, C. C. S. Brandão e E. A. Colosimo. 2005. “Indicadores epidemiológicos aplicáveis a estudos sobre a associação entre saneamento e saúde de base municipal”. Engenharia Sanitária Ambiental, 10 (2).; Libânio et al. 2005Libânio, P. A. C., C. A. L. Chernicharo e N. O. Nascimento. 2005. “A dimensão da qualidade de água: avaliação da relação entre indicadores sociais, de disponibilidade hídrica, de saneamento e de saúde pública”. Engenharia Sanitária Ambiental , 10 (3).).
  • 8
    Especificamente, todas as internações dos grupos de doenças entre os capítulos I e XVIII e do XXI da 10ª revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-10), excetuando-se as DRSAI que constam no Quadro 1.
  • 9
    Os sistemas municipais de abastecimento de água têm diferentes tamanhos, por isso a divisão pela população atendida. Para valores em R$ de 2019, usa-se o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do IBGE.
  • 10
    Ressalva-se que há casos de mais de um provedor em um município, mesmo apenas no abastecimento de água. Para estes municípios, é considerado aquele que atende ao maior número de usuários. A alternativa seria a agregação das variáveis dos provedores, o que geraria complicações em relação a qual governança considerar para o município se os provedores são de modalidades diferentes, o que é comum. Assim, adota-se um procedimento perfeitamente replicável e com preferência pelos provedores mais relevantes em termos de atendimento.
  • 11
    Para mais detalhes sobre como covariadas que também afetam o status do tratamento (no caso, a governança da provisão) e efeitos fixos lidam com o viés de seleção, conferir, entre outros, Angrist e Pischke (2009Angrist, J. D. e J. S. Pischke. 2009. Mostly Harmless Econometrics: An Empiricist’s Companion. Princeton: Princeton University Press.).
  • 12
    Na ausência de outros dados para todos os municípios e anos, são consideradas as variáveis analfabetismo e idosos com informações da RAIS. Estas podem ser mal dimensionadas, mas são as proxies possíveis.
  • 13
    Variáveis fiscais como médias dos quatro anos anteriores para reduzir a influência de ciclos político-eleitorais e pela possibilidade de os efeitos na saúde não serem imediatos, além de diminuir potencial endogeneidade.
  • 14
    Os resultados relativos às demais variáveis não são reportados, mas podem ser solicitados aos autores.
  • Os autores agradecem o apoio da CAPES e do CNPq.
  • JEL Classification

    H41, L9, C33.
Editor Responsável: Dante Mendes Aldrighi

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    16 Set 2021
  • Aceito
    18 Out 2022
Departamento de Economia; Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo (FEA-USP) Av. Prof. Luciano Gualberto, 908 - FEA 01 - Cid. Universitária, CEP: 05508-010 - São Paulo/SP - Brasil, Tel.: (55 11) 3091-5803/5947 - São Paulo - SP - Brazil
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