Acessibilidade / Reportar erro

Operários da memória: artistas escultores do início do século XX e o concurso do monumento Glória Imortal aos Fundadores de São Paulo

RESUMO:

O presente artigo discute a construção do monumento Glória imortal aos fundadores de São Paulo (obra de Amadeu Zani, 1925) e, mais especificamente, o concurso público para escolha da maquete, ocorrido em 1910. O foco da análise é o conjunto de projetos apresentados por escultores paulistas, brasileiros e italianos e toda a conflituosa negociação estabelecida entre a comissão executiva e os artistas, observada por um parecer publicado na primeira década do século XX, que traz o exame crítico dos trabalhos pela comissão julgadora. Os documentos possibilitam ainda reconhecer o savoir-faire de artistas que atuavam na produção de obras públicas no período, o modo como manejam a interpretação de episódios históricos e a sua conversão em imagens. A hierarquia entre os diferentes personagens, seja ele membro da comissão julgadora, historiador ou escultor, não é empecilho para que se operem interferências diversas no projeto vencedor, que são determinantes na concepção final da obra. Há nas fontes analisadas um instigante debate acerca da elaboração de narrativas calcadas em eventos históricos por meio de imagens, ou seja, da representação de personagens históricos, de cenários e de figuras alegóricas que merece ser problematizado. A análise da elaboração de um projeto do monumento Glória Imortal se faz adotando uma perspectiva da história social da arte, mirando o diálogo, as trocas e as negociações que permeiam o objeto de estudo, buscando pensar a obra e a produção dessas imagens como fruto de um processo e de um conjunto de práticas sociais.

PALAVRAS-CHAVE:
Escultura; Imagem; Memória; Monumentos escultóricos - São Paulo; Amadeu Zani

ABSTRACT:

In this paper I intend to discuss the construction of the monument to the Imortal Glory to the Founders of São Paulo (a work of Amadeu Zani, 1925). Specifically, I discuss here the 1910 contest that defined the selected scale model. The focus of the analysis presented is the set of projects presented by Paulistas, Brazilians and Italian sculptors and the conflictual negotiations established between the executive commission of the contest and these artists, which may be seen through the dossier published by the executive commission during the first decade of the 20th century. The set of documents allows to recognise not only the "savoir faire" of the artists who worked in the production of public monuments, but also their interpretation of historical events, and how they convert such events to images. The hierarchy of these actors, either members of the commission, historians or artists is not an obstacle to a myriad of interferences to the winner project, which are determinant to the final conception of the monument. Thus, an instigating debate may be found within the analysed documents, involving the narrative of historical events through the use of images, the representation of historical figures, scenarios and allegoric representations, and therefore a debate that deserves to be problematized. I make the analysis of the proposals through the use of a social-historical perspective of art, aiming the dialogs, the exchange, and negotiations related to the subject, seeking to understand of the work and its production as a consequence of a process and a set of social practices.

KEYWORDS:
Sculpture; Image; Memory; Sculptural Monuments - São Paulo; Amadeu Zani

O monumento Glória imortal dos fundadores de São Paulo (1909-1925), obra do escultor italiano Amadeu Zani, foi inaugurado em grande estilo no dia 11 de junho de 1925, no antigo Largo do Palácio, região central da cidade de São Paulo. Hoje, passados quase cem anos, a obra permanece no mesmo endereço e integra o conjunto arquitetônico do Pátio do Colégio (Figura 1).

Figura 1
Monumento Glória imortal aos fundadores de São Paulo.

A obra associa-se hoje ao conjunto jesuítico do Pátio (reconstruído entre 1954 e 1978) e ao seu projeto simbólico, ambos reforçando o local como 'marco zero' da cidade, onde fora levantada uma das primeiras construções da antiga vila na colonização portuguesa: um colégio jesuíta para catequização dos índios. Trata-se, assim, de um espaço no qual se celebra a memória da fundação de São Paulo, embora não haja semelhança entre o estilo artístico desses marcos - o edifício jesuítico é uma recriação das originais linhas maneiristas seiscentistas, enquanto o monumento é de estilo neoclássico - havendo, entretanto, um diálogo simbólico entre as obras, ao celebrarem a memória da Igreja Católica por meio das missões jesuítas.

O que se pretende nesse texto é discutir o processo de idealização do monumento Glória imortal, o primeiro grande monumento celebrativo concebido em São Paulo sob a República, e toda a conflituosa negociação que se estabelece entre uma comissão executiva que tentaria controlar o conteúdo da obra, nos aspectos simbólicos e narrativos, e um conjunto de escultores que se lança no concurso. Trata-se da fase que antecede a própria construção da obra e que é bastante importante também para compreendê-la, mais ainda para caracterizar um certo savoir-faire dos artistas ligados às encomendas de monumentos celebrativos no período. As negociações que se dão no processo de estruturação do projeto estão relacionadas a uma disputa de competências: de um lado o escultor, que traz sua interpretação sobre o episódio em questão, e de outro uma comissão julgadora preocupada em controlar e decretar uma determinada apreensão do tema.

A proposta para construção do monumento Glória imortal surge de um debate entre o engenheiro Adolfo Pinto e o arquiteto Ramos de Azevedo no jornal O Estado de S. Paulo, a respeito da construção de uma obra pública que comemorasse a história paulista1 1 Trata-se de uma convocação feita por Adolfo Pinto a Ramos de Azevedo retomada em reportagem do jornal O Estado de S. Paulo publicada no dia seguinte à inauguração do monumento Glória imortal: "Esse monumento, do qual publicamos uma vista geral e um detalhe, tem a sua história, uma longa história que vale a pena recordar. Ele representa a reparação de uma falta que cometemos para com a nossa tradição, e que o dr. Adolpho Pinto resumiu em meia dúzia de palavras melancólicas depois de se referir ao papel dos paulistas do bandeirismo na dilatação e na colonização do país. 'Causa realmente pasmo ver como deixamos por tanto tempo de comemorar condignamente um fato de tão subida importância como a fundação da cidade de São Paulo e de render homenagem devida a personagens do valor histórico de Nóbrega, de Anchieta, de Tibiriçá.' O dr. Adolpho Pinto não se limitou a denunciar a falta; lançou também a ideia de se fazer justiça aos maiores de nossa história; para isso, em 1909, por esta folha, dirigiu uma carta aberta ao dr. Ramos de Azevedo, concitando-o a auxiliá-lo na obra apenas escarvoada. A mocidade das escolas interessou-se pelo caso. Elementos de valor prontificaram-se a colaborar no monumento. E a ideia vingou." Cf. O Estado de S. Paulo (11 jun. 1925, p. 4). . Até 1909, ano em que este debate ocorre, não havia na cidade um monumento que celebrasse a trajetória dos paulistas, tema já explorado por intelectuais em interpretações que destacavam as especificidades da "raça" bandeirante. O Instituto Histórico e Geográfico Paulista, por exemplo, criado quinze anos antes, já agregava inúmeros estudiosos da história local.

A fundação dos institutos históricos, brasileiro e paulista2 2 O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) foi fundado no Rio de Janeiro em 21 de outubro de 1838. O Instituto Histórico e Geográfico Paulista (IHGSP) teve sua fundação em 1º de novembro de 1894. , a enorme produção de textos sobre a história de São Paulo e do Brasil e a construção de um diálogo entre diversos grupos letrados sobre a história brasileira e paulista são elementos fundamentais na formulação de narrativas que compõem os monumentos públicos celebrativos produzidos em São Paulo na primeira metade do século XX. No caso deste monumento não é diferente, uma vez que essas imagens estão profundamente ligadas ao estabelecimento da história como um campo autorizado de estudo do passado e à sua popularização3 3 Ver Manoel Luis Salgado Guimarães (1988). .

Ocorre que, embora o debate sobre a história paulista já estivesse em plena efervescência na São Paulo da primeira década do século XX (nos jornais ou no Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo), o processo de fixação dessas imagens no espaço público ocorreria apenas algum tempo depois, inclusive porque a produção de monumentos celebrativos relacionava-se a demandas tipicamente urbanas. A proposta do monumento Glória imortal, por exemplo, surge atrelada a uma reforma na região central da cidade, conforme se observa em texto da comissão constituída para promover a obra na Câmara Municipal de São Paulo:

O monumento comemorativo da Fundação de São Paulo, segundo o projeto preferido, deverá ser erigido no antigo Largo do Colégio, que, como se sabe, vai ser aumentado, em consequência do projetado recuo do Palácio do Governo, até ao alinhamento da rua do Carmo. Feito este recuo, o centro do Largo corresponderá mais ou menos ao ponto em que existia o portal da antiga igreja do Colégio, o que quer dizer que o monumento será levantado precisamente no local em que nasceu a cidade4 4 Cf. Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - Ofício à Câmara Municipal (11 out. 1910). .

É evidente que, ao idealizar-se um monumento público, existe um desejo inicial sobre a obra por parte daqueles que a imaginaram. A expressão desse desejo concretiza-se no edital, primeiro mediador entre a proposta do grupo idealizador e o escultor, figura que dará forma ao projeto do grupo. O edital do concurso é o documento inicial, o ponto de partida para a realização da obra, e tinha enorme importância para o escultor, uma vez que ali aparecem indicadas as linhas gerais da proposta, as dimensões e conteúdo simbólico esperados no monumento. É importante destacar que, mesmo antes da publicação do edital, já havia um tema escolhido e um grupo de pessoas que discutira o assunto (seja publicamente, seja no âmbito privado)5 5 Os membros da comissão executiva eram figuras influentes no ambiente político da cidade: o ex-prefeito Antônio Prado, o senador Duarte de Azevedo, o engenheiro Ramos de Azevedo, o engenheiro Adolfo Pinto, os advogados César Lacerda Vergueiro e Eduardo Vergueiro de Lorena, representando o Centro Acadêmico XI de Agosto. O parecer sobre os projetos apresentados, entretanto, seria assinado por Adolfo Pinto e os arquitetos Cláudio Rossi e Ricardo Severo. Ver O Estado de S. Paulo (28 maio 1909). . Ainda assim, o contato do escultor com o monumento tem início, na maioria das vezes, a partir da leitura do edital.

O edital para a construção do monumento Glória imortal foi publicado no jornal O Estado de S. Paulo em maio de 1909, convocando escultores brasileiros e estrangeiros a enviarem seus projetos6 6 Edital do Concurso para a construção do Monumento aos fundadores de São Paulo, ver Amadeu Zani 1930, (p. 7). . No documento, argumentava-se a necessidade de construir na cidade uma primeira obra comemorativa da história paulista:

Considerando que a fundação de São Paulo é fato para encher do mais justo e nobre orgulho os filhos desta terra, não só pelas sublimadas virtudes que imortalizaram a memória de seus heróis, como pela decisiva influência que o pequeno mas extraordinário núcleo de energia e operosidade exerceu sobre o descobrimento e a civilização edificada em plena barbaria e a custa de tão intrépidos e abnegados sacrifícios, se vem de há muito desabotoando na esplêndida realidade que devia ser o sonho dos que alicerçaram a obra, bem é de ver que, se alguma coisa há que precise ser justificada perante a justiça da historia, não é certamente esta homenagem à augusta dos próceres da fundação de São Paulo, mas a delonga havida em se lh´a prestar7 7 Cf. ibidem. .

É interessante observar que o edital nos oferece uma primeira pista a respeito do conteúdo simbólico da obra, pois sugeria leituras específicas da historiografia, embora oferecesse liberdade aos artistas no que diz respeito à forma. De acordo com o edital, desejava-se que os projetos traduzissem a "verdade do acontecimento e materializassem digna homenagem às personalidades"8 8 Cf. ibidem. . A versão desejada do acontecimento, a tal verdade, poderia ser encontrada em duas obras, ambas citadas no edital: a Crônica da Companhia de Jesus no Estado do Brasil, de Simão de Vasconcelos, e as Conferências preparatórias do terceiro centenário do venerável José de Anchieta, organizadas por Teodoro Sampaio. Além disso, o edital especificava que devia ser prestada homenagem a Anchieta (especificamente) e a outras figuras históricas (sem definir quais eram elas) que tomaram parte na fundação de São Paulo.

A Crônica da Companhia de Jesus foi escrita pelo padre jesuíta Simão de Vasconcelos no ano de 1663. Natural da cidade do Porto, Simão de Vasconcelos chegou ao Brasil em 1616, aos 19 anos, e entrou para a Companhia de Jesus no Colégio da Bahia, tornando-se padre jesuíta. Ocupou diversos cargos da ordem religiosa no Brasil. Quase todos os seus escritos impressos dedicaram-se ao Brasil e a Companhia de Jesus. Embora publicada no século XVII, a Crônica teve uma reedição brasileira em 1864 e outra, portuguesa, em 18659 9 Adolfo Pinto (membro da comissão executiva do edital) ingressou no Colégio São Luís, dirigido por padres jesuítas, em 1867, e é possível que tenha tido contato com a obra nesse período. O livro foi reeditado em dois volumes na coleção Dimensões do Brasil, da editora Vozes, em 1977. . A obra consiste em um relato produzido por Simão de Vasconcelos narrando o cotidiano da vida dos padres e sua relação com índios e colonos, aspectos da cultura, economia e política das regiões que visitou, além de comentar episódios históricos - como a fundação de São Paulo, a Guerra dos Tamoios, a viagem de Nóbrega e Anchieta para Iperoig - e descrever personagens como João Ramalho, Tibiriçá e Bartira.

O relato do cronista jesuíta sobre a história de São Paulo e o cotidiano de índios e padres no início da colonização está evidentemente comprometido com os valores e interesses políticos da Igreja no período em que foi escrito. Portanto, de um modo geral, o autor do texto exalta a atuação jesuítica, fazendo duras críticas aos colonos portugueses, assumindo posição incerta, ou inconstante, a respeito dos índios: ora afirmando sua ingenuidade e capacidade de aprender os costumes civilizados, ora destacando a selvageria e violência incurável dos nativos.

Narrativas que opõem imagens do índio bom, nobre e civilizado, o "bom selvagem", ao índio mau, violento e adepto à prática do canibalismo, estão presentes desde o início da colonização, em diversos textos de viajantes e missionários, tais como André Thevet, Jean de Léry e Manoel da Nóbrega, bem como na pintura, a partir, por exemplo, de duas famosas telas portuguesas do século XVI: A adoração dos magos (Figura 2), atribuída a Vasco Fernandes, produzida por volta de 1505 para decorar o altar da capela mor da Sé de Viseu; e O inferno (Figura 3), produzida na primeira metade do século XVI, por autor desconhecido. Na primeira obra, o índio aparece como um dos três reis magos que visitam o menino Jesus na noite de seu nascimento e, na segunda, como um demônio com cocar tupinambá.

Figura 2
Vasco Fernandes. A adoração dos magos, 1505, óleo sobre madeira.

Figura 3
Autor desconhecido. O inferno, primeira metade do século XVI, óleo sobre madeira, acervo do Museu Nacional de Arte Antiga. Lisboa, Portugal. Reprodução da autora.

No século XIX, com a institucionalização da história, essa dupla interpretação do índio continua bastante difundida, provocando debates acalorados. John Monteiro menciona contenda a respeito da índole do índio paulista, que envolveu historiadores do porte de Capistrano de Abreu10 10 Uma série de escritores se posicionou sobre o paradoxo Tupi versus Tapuia desde fins do século XIX, uma vez que a polêmica estava relacionada a um projeto mais amplo, de construção da identidade histórica paulista. Para John Manuel Monteiro "este projeto passou, em maior ou menor grau, pela Comissão Geográfica e Geológica, pelo Departamento de Estatística e Arquivo do Estado, pelo Museu Paulista e, sobretudo, pelo Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, órgãos estes estabelecidos, ou pelo menos reformados (no caso do Arquivo do Estado) nas décadas de 1880 e 90". Cf. John Monteiro 2001, (p. 181). . No caso específico de São Paulo, existiria ainda um debate a respeito do lugar que o índio ocupava na formação étnica do paulista, no qual se pode observar leituras opostas em textos fundadores da historiografia paulista, como em Pedro Taques de Almeida Paes Leme (crítico da mestiçagem) e Frei Gaspar da Madre de Deus (defensor da importância do mameluco)11 11 Ver Kátia Maria Abud (1986). . É de se esperar que encontremos ecos dessas narrativas nos monumentos que tratam da história do índio.

Ainda em relação ao texto de Vasconcelos, de acordo com Socorro Vilar: "o estilo jesuítico de narrar a história de Portugal/Companhia de Jesus como instituições 'eleitas' e de transformar os jesuítas em 'chamados escolhidos' tem, no Brasil Colônia, como exemplo sacramentado, a obra de Simão de Vasconcelos."12 12 Cf. Socorro de Fátima P. Vilar 2006, (p. 93).

É importante notar que um texto dessa natureza, escrito no século XVII, tenha regido a narrativa de um monumento construído em inícios do século XX, especialmente quando observamos nos documentos a insistência dos idealizadores no "rigor científico" da obra e na "verdade histórica" do acontecimento, características de um discurso tipicamente oitocentista, devedor de uma história metódica. A escolha do texto de Vasconcelos pelos autores do edital se deu, possivelmente, por tratar-se de narrativa escrita por missionário católico que esteve presente nos primórdios da Vila de Piratininga, configurando-se em testemunha ocular, o que garantia confiabilidade ao relato. A obra cumpriria assim o papel de trazer "a verdade dos documentos históricos", uma vez que a narrativa dos jesuítas pareceria à comissão mais próxima do "real".

O segundo livro indicado pela Comissão é uma publicação de 1910, produzida a partir de conferências públicas realizadas em 1897, ano do terceiro centenário da morte do padre José de Anchieta. Entre os artigos publicados no livro, encontram-se textos de Teodoro Sampaio, Couto de Magalhães, Ruy Barbosa e Capistrano de Abreu. Os artigos enfocam a biografia de Anchieta e a história paulista, novamente enfatizando a atuação jesuítica na Colônia. É importante lembrar que esta publicação faz parte de um conjunto de esforços pela beatificação de Anchieta. O artigo de Teodoro Sampaio, por exemplo, que compõe a coletânea e se intitula São Paulo no tempo de Anchieta, baseia-se em grande medida na obra de Simão de Vasconcelos. Nele, o autor descreve os cenários e personagens da região no século XVI, além de narrar episódios que teriam ocorrido no período de surgimento da cidade de São Paulo, tais como a Primeira Missa ou a Guerra dos Tamoios13 13 Ver Conferências preparatórias do III centenário... (1900). .

Havia, do ponto de vista dos idealizadores do monumento, uma leitura específica a respeito da história paulista e da história dos indígenas, escolhida desde o momento da produção do edital. Trata-se de uma perspectiva que toma como protagonistas os padres jesuítas e que não produz uma opinião precisa sobre os índios, mas que oscila entre imagens de selvageria/violência e de ingenuidade/bondade. Veremos mais adiante como os escultores iriam apropriar-se dessas ideias.

Do ponto de vista material, o monumento seria financiado por meio de diferentes fontes, contando com verbas do município, do governo estadual e de subscrição pública14 14 A arrecadação de fundos por subscrição pública era estratégia comum, uma vez que mobilizava a população desde o momento da idealização do monumento, fazendo-a sentir-se proprietária da obra e pertencente à memória ali celebrada. . Em 1910 a Comissão enviaria documento à Câmara Municipal de São Paulo solicitando auxílio de 100 contos de réis para construção da obra. Algum tempo depois, em 22 de abril de 1911, seria promulgada a Lei nº.1414 que liberava 80 contos de réis para a Comissão Executiva do Monumento. Entretanto, embora estivesse sob a responsabilidade de um grupo privado e utilizasse verba pública, o projeto não sofreu fiscalização direta do Estado no que diz respeito à concepção da obra. Nota-se aí que os contornos entre o público e o privado parecem confusos, possivelmente em razão da própria influência que o grupo idealizador exercia na esfera pública. Esta apropriação do público pelo privado na gestão da memória na cidade percorre boa parte das trajetórias de monumentos celebrativos paulistas e produz uma marca importante nesse tipo de obra: trata-se da elaboração de discursos de identidade, produzidos para um coletivo (dos paulistanos, dos brasileiros), que atende a interesses de pequenos grupos com grande influência na gestão urbana. Esta parece ser uma motivação importante para a construção dos monumentos celebrativos, uma vez que o idealizador se torna uma espécie de porta-voz da história local, intitulando-se herdeiro dos personagens do passado, título que lhe confere enorme prestígio.

A partir da proposta do edital, seis projetos concorreram ao prêmio e apresentaram interpretações diversas do episódio da fundação de São Paulo. Além de Amadeu Zani, vencedor do concurso, também apresentaram projetos os escultores Eduardo de Sá, autor do Monumento a Floriano Peixoto, inaugurado no Rio de Janeiro em 1910; José Otávio Corrêa Lima, antigo aluno da Escola Nacional de Belas Artes; Egisto Bertozzi; Nicolina Vaz de Assis, também antiga aluna da Escola Nacional de Belas Artes; e a dupla Lorenzo Petrucci e Benedito Calixto, um deles escultor e o outro famoso pintor paulista. O exame crítico dos projetos que não foram escolhidos, dos discursos e imagens rejeitados, feito pela comissão julgadora, revela de modo mais agudo tratar-se de escolhas ligadas aos interesses do grupo promotor da obra. É no parecer sobre os projetos apresentados, escrito e publicado pela Comissão, que se faz possível observar de forma mais detalhada o tipo de leitura construída por cada artista e o modo como os idealizadores as julgaram e interpretaram. O relator nos dá dicas importantes sobre os critérios e, especialmente, acerca dos fatores determinantes na escolha do projeto vencedor.

A respeito da maquete apresentada por Lorenzo Petrucci15 15 Nascido em Lucca, Toscana, é autor do monumento a Fausto Cardoso (1912) e do obelisco a Inácio Barbosa (1917), ambos em Aracaju. e Benedito Calixto, a Comissão apontou dois problemas: a obra não era fiel à verdade dos fatos, por um lado, e não conseguia dar unidade aos diversos episódios e figuras que colocava em cena, por outro. A maquete trazia uma alegoria da cidade de São Paulo, figura feminina enrolada em uma bandeira a carregar um cetro e uma coroa, além de árvores tombadas, medalhões, efígies, figuras de índios e portugueses: Anchieta, Caiuby, Tibiriçá e um baixo relevo de Martim Afonso de Souza. Os artistas trouxeram também uma alegoria representando a fusão das 'raças' latina e americana e outra alusiva ao rio Tietê.

O problema da inexatidão na representação dos fatos estava em uma referência feita pelos artistas a um episódio em que Anchieta abençoava um bloco de granito utilizado na construção da povoação que surgia. O padre aparecia de pé na maquete e a cena da bênção era reconstituída pelo escultor. Essa figura é criticada no texto da Comissão, com o seguinte comentário:

Ora, de tal episódio não faz menção a crônica [da Companhia de Jesus], ao contrário, o que ela conta é simplesmente que, chegados os padres aos campos de Piratininga, escolheram o sítio para o seu colégio, no qual disseram a primeira missa aos 25 de janeiro (...) e, quanto ao primeiro edifício que levantaram e em que começaram a viver, não passou, conforme o descreveu em carta o próprio Anchieta, de humilde casinha de palha, com uma esteira de canas servindo de porta. De resto, quando mesmo tivesse ocorrido o episódio da benção da primeira pedra, ainda é de considerar que certamente não teria cabido a Anchieta, então um noviço, o lugar de honra, que mais regularmente devia competir ao chefe da missão recém chegada, o padre Manoel de Paiva16 16 Cf. Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - livreto do concurso do Monumento à glória imortal dos fundadores de São Paulo (1910, p. 15). .

Há um debate historiográfico que se coloca entre os idealizadores da obra e os escultores. O episódio histórico celebrado é interpretado à luz da bibliografia indicada e parece ser só a partir dela a garantia de verdade dos fatos, tanto que Adolfo Pinto critica a má leitura da Crônica da Companhia de Jesus pela dupla Petrucci e Calixto. A escolha da cena da bênção fora construída pelos artistas a partir de outras imagens e memórias. É certo que existe uma tradição na representação de atos de fundação por meio da Primeira Missa, tema diversas vezes explorado pela pintura, a partir da interpretação fundadora de Victor Meirelles17 17 Tema explorado por Jorge Coli ao analisar A Primeira Missa no Brasil, de Victor Meirelles. Ver Jorge Coli (2005). . Entretanto, no projeto de Petrucci e Calixto, os padres terminam por abençoar um bloco de granito, pedra fundamental da Vila de Piratininga.

A inserção de Anchieta nesse contexto, embora noviço, ocorre por representar uma espécie de patrono espiritual da cidade (a campanha de beatificação do missionário, no final do século XIX, ajudava a construir essa memória), dado ratificado no livro Conferências preparatórias, indicado pela Comissão; bem como em razão da importância que o personagem tinha para o pintor, especialmente porque Benedito Calixto, que já fizera um retrato do jesuíta para o acervo do Museu Paulista, era um artista interessado na história paulista, membro do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, artista cuidadoso com a celebração desta memória regional.

Portanto, a dupla propôs deliberadamente uma leitura do episódio que não se coadunava com a bibliografia sugerida, tendo sido rejeitada no parecer. Havia pouco espaço para invenções que saíssem do roteiro na fabricação de imagens da fundação de São Paulo pautado pelo edital. Exigia-se dos escultores rigor científico na interpretação da história paulista e fidelidade aos textos propostos.

Sobre o projeto de Nicolina de Assis18 18 Nicolina Vaz de Assis Pinto do Couto (Campinas, 1874 - Rio de Janeiro, 1941) é autora, em São Paulo, da fonte monumental situada na Praça Júlio de Mesquita e do túmulo do Gal. Couto de Magalhães, localizado no Cemitério da Consolação. (Figura 5), o parecer indica que a escultora não seguiu a proposta do edital, uma vez que não referiu os fatos e personagens históricos que deveriam ser celebrados na obra, produzindo um monumento que comemorava a evolução da cidade, não a sua fundação, com destaque para o desenvolvimento da música e das artes, homenageando figuras como Carlos Gomes e Almeida Junior.

Figura 4
Maquete L. Petrucci e B. Calixto.

Figura 5
Maquete de Nicolina Vaz de Assis.

Além de ser a única mulher presente neste concurso, Nicolina apresenta outra originalidade, desta vez na forma da maquete. Em seu projeto há espaço para lucubrações, por meio de diversas alegorias e de quatro portadas curvilíneas decoradas por cariátides que representariam os quatro séculos da história paulista: XVI a XIX. A artista permitira-se sair do roteiro, tanto na narrativa quanto na forma, fugindo de um modelo que parece ser predominante naquele momento. Há ainda uma mulher representando a cidade de São Paulo, passando a mão na cabeça de um de seus filhos e indicando o futuro, e uma mulher alada que joga flores sobre o grupo. A Comissão aponta a ausência dos textos indicados para leitura e justifica a rejeição ao projeto que, para o júri, parece ter investido muito na concepção artística e pouco na filiação histórica. Ainda na leitura do júri, mais do que um problema de filiação histórica, já que a artista não faz qualquer referência ao conteúdo da bibliografia indicada, faltou-lhe celebrar o evento em questão (a fundação de São Paulo) e o papel dos missionários católicos no feito, principal vocação do monumento imaginado por Adolfo Pinto. O texto da Comissão aponta a liberdade que se permitiu a artista na criação das formas, mas criticou a falta de foco no episódio tratado, mostrando a importância que o grupo atribuía ao controle da narrativa do monumento:

A illustre esculptora brasileira, dando largas á sua inspiração, cuidou menos de compôr um monumento destinado a commemorar a fundação de S. Paulo do que de esboçar obra mais vasta e complexa, nada mais nem menos do que um monumento á evolução histórica da cidade até a época atual19 19 Cf. Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - livreto do concurso do Monumento à glória imortal dos fundadores de São Paulo (1910, p. 10). .

Sintético ao apreciar o projeto de Egisto Bertozzi20 20 Autor dos bustos retratando José Caballero, na Santa Casa de Misericórdia de Santos, e o Conde Pereira Carneiro, no bairro da Glória, Rio de Janeiro. (Figura 6), tanto quanto parece ter sido o projeto do escultor, o parecer destaca o desenho da obra, que não agradou à Comissão, embora as imagens criadas pelo autor, entre elas uma figura feminina representando a cidade de São Paulo, posicionada no topo de uma coluna, simbolizando o esforço heroico da fundação da cidade, recebera elogios. Na base desta mesma coluna haveria baixos relevos narrando a fundação da cidade, entre outros episódios, além de figuras alegóricas representando a agricultura e a indústria.

Figura 6
Maquete de Egisto Bertozzi.

De acordo com o parecer, "o efeito estético da composição não corresponde à sua psicologia, devido a seu aspecto demasiado austero e pesado"21 21 Cf. Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - livreto do concurso do Monumento à glória imortal dos fundadores de São Paulo (1910, p. 11). . Haveria, para a Comissão, um descompasso entre a imagem e seu conteúdo simbólico. Único caso entre as maquetes enviadas para o concurso, aqui o projeto teria sido reprovado em razão do desenho da obra.

O projeto de Eduardo de Sá (Figura 7), ao contrário daquele produzido por Bertozzi, agradou no desenho "artisticamente concebido", embora a celebração do episódio não tenha sido satisfatória. Ou seja, para a Comissão, a obra caberia inteiramente como monumento em homenagem a Anchieta, mas não aos fundadores de São Paulo. A criação da narrativa, a representação de fatos e dos personagens era fundamental para uma leitura acertada do episódio. É provável que a centralidade adquirida por Anchieta no episódio, indicada também no projeto de Petrucci e Calixto, esteja relacionada à leitura das Conferências preparatórias, obra indicada no edital que atribui ao personagem grande importância na história da fundação e desenvolvimento da cidade de São Paulo.

Figura 7
Maquete de Eduardo Sá.

Eduardo Sá havia de fato centralizado a homenagem na figura de Anchieta, posicionando-o no topo da coluna trazendo na mão esquerda uma cruz e um rosário, para abençoar a cidade. Entretanto, havia também no monumento os bustos de Tibiriçá e Martim Afonso de Souza. O artista escolhera ainda algumas imagens singulares, como os peixes típicos de Piratininga, decorando a base da coluna, e um bravio jaguar, representando as dificuldades enfrentadas pelos fundadores.

O trabalho de Correia Lima22 22 José Otávio Correia Lima (São Marcos, 1878 - Rio de Janeiro, 1974), foi formado pela Escola Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, instituição do qual foi professor e diretor. Foi o autor do Monumento ao Almirante Barroso (1909), no Rio de Janeiro. cumpriu a prerrogativa de acertar na leitura do episódio (Figura 8). O escultor tratou de criar alegorias e cenas históricas em consonância com o episódio de fundação da cidade. Entretanto, o parecer provoca novamente um debate historiográfico, ao cobrar da narrativa mais "individuação histórica", ou seja, faltara ao projeto marcar uma personalidade paulista, evidenciar paisagens e personagens típicos da Vila de Piratininga. De acordo com o texto da Comissão:

Figura 8
Projeto de Correia Lima.

Não há ali nenhum traço característico, não é evocado nenhum episódio do acontecimento histórico que o monumento é destinado a comemorar - a fundação de São Paulo. A cena da catequese e os grupos selvagens figurados são elementos obrigados em todos os pontos do novo mundo, colonizados sob os auspícios da Cruz. Assim, o projeto em vista tanto se presta a comemorar a fundação de São Paulo como a de São Vicente, Vitória23 23 Cf. Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - livreto do concurso do Monumento à glória imortal dos fundadores de São Paulo (1910, p. 17). .

No entanto, nota-se que o artista preocupou-se em trazer elementos da história de São Paulo, produzindo imagens bastante diversificadas e singulares em sua maquete, tais como: Anchieta a catequizar uma mulher e um menino; um índio repousando no chão segurando uma enxada, símbolo do trabalho agrícola; um adolescente saindo de um pé de café, representando o progresso, a estender um facho que iluminaria a moderna cidade de São Paulo; um grupo de índios em guerra, a defender a nascente Vila de Piratininga; um bandeirante saindo de dentro de uma floresta; uma alegoria da cidade de São Paulo no topo da coluna a contemplar seu desenvolvimento histórico. Percebe-se um conjunto diversificado de ideias, desde alusão ao trabalho, à modernidade, ao bandeirante, e de construções alegóricas. O parecer questionaria a inclusão da figura do bandeirante entre os personagens homenageados, uma vez que não correspondia ao período histórico comemorado, isto é, a fundação de São Paulo.

No que diz respeito à presença dos brancos na colonização de São Paulo, é interessante notar que, embora João Ramalho não fosse propriamente um bandeirante (a primeira expedição oficial ocorreria algumas décadas após a fundação de São Paulo), sua reabilitação pela historiografia é ilustrativa da inclusão do personagem na narrativa de fundação da cidade.. O próprio Simão de Vasconcelos cita a família de João Ramalho quando trata do início da povoação, mas critica fortemente o português e seus filhos mamelucos:

Aquele famoso João Ramalho, homem rico na terra, mas infame nos vícios, amancebado público, por quase quarenta anos, e de ordinário por essa causa excomungado [...], andava ele com a caterva de seus filhos, muitos em número, e todos de má casta, mamelucos ilegítimos, e desalmados, com arcos, flechas e gritarias, fazendo gente, e desinquietando a vila contra os padres, espalhando de alguns deles crimes péssimos, e indignos de seculares, quanto mais de pessoas religiosas; e destes mesmos foram acusados por eles até o mesmo Padre Nóbrega, porque todos injuriassem de um golpe no dia de seus maiores vivas24 24 Cf. Simão de Vasconcelos 1977, (p. 241). .

Contrastando esse perfil, desenhado por Simão Vasconcelos, o português João Ramalho seria transformado, em meados do século XX, no "patriarca paulista". A tensão a respeito da imagem do bandeirante marca o processo de transição na atribuição de sentido ao personagem na história paulista - e a maquete de Correia Lima deixa isso evidente. A reabilitação do bandeirante já estava a pleno vapor desde meados do século XIX, mas seria patente nos monumentos públicos apenas duas décadas depois, quando o personagem teria papel principal nas comemorações de fundação da cidade. Naquele momento, e para aquele grupo idealizador, não se imaginava celebrá-lo, mas concentrar a homenagem nos missionários jesuítas, pelo que é importante constatar que as narrativas sugeridas para compor os monumentos públicos reproduziam disputas características do ambiente historiográfico paulista25 25 O monumento à fundação de São Paulo, por exemplo, inaugurado em 1961, contraria radicalmente o texto de Simão de Vasconcelos ao unir personagens como o Padre Manoel da Nóbrega, o bandeirante João Ramalho e o índio Tibiriçá, em uma espécie de "família paulista". De acordo com Ferretti e Capelato "quem iniciou a contestação a João Ramalho no período colonial foi o cronista jesuíta Simão de Vasconcelos que na sua 'Crônica da Companhia de Jesus' de 1663 além de acusar o personagem de tramar o assassinato do jesuíta Leonardo Nunes, referia-se a ele como 'um homem por graves crimes infame e atualmente excomungado', além de polígamo e assassino. Este autor, seguindo a tradição de animosidade que os jesuítas nutriram durante toda a colônia em relação aos paulistas, foi responsável pela mais negativa das representações de João Ramalho e serviu de sustentação para toda a corrente 'anti-ramalhista'". Cf. Danilo Ferretti & Maria Helena Rolim Capelato 1999, (p. 9). .

Voltando ao projeto de Correia Lima, parece evidente que o próprio artista já havia incorporado a imagem do bandeirante reabilitado, evidenciando que, também para ele, se tratava de um personagem importante para historiadores e artistas que se dedicavam a construir o mito de origem paulista. Entretanto, o texto no qual se pautava a maquete, escrito por Simão de Vasconcelos, era anterior a esse processo e colocava em evidência as disputas e conflitos de interesse entre jesuítas e desbravadores na gestão da Capitania, especialmente em relação ao índio.

Já o projeto vencedor, de Amadeu Zani, demonstra que , na escolha da obra, a fusão entre o roteiro exigido pela comissão e as leituras e memórias do próprio artista foram a equação determinante. O monumento terminaria por ser um resultado desse diálogo, dessa negociação. A Comissão parece estar aberta, sobretudo, para ousadia e originalidade dos artistas no desenho da obra, em seu caráter artístico, enquanto espera, ao mesmo tempo, ter o controle sobre a narrativa, sobre seu conteúdo do Monumento. Curiosamente, os projetos apresentados são mais rigorosos na reprodução de um modelo formal - a coluna - do que na construção do episódio, que varia bastante de um artista para o outro. Isso está possivelmente relacionado a uma maior desenvoltura que possuíam com o vocabulário artístico do que com o vocabulário da história paulista.

A comissão havia apontado quatro critérios fundamentais para julgamento dos projetos, descritos na seguinte ordem: evocar os principais episódios históricos; homenagear os mais notáveis protagonistas; constituir obra de arte de real merecimento técnico; recomendar-se aspecto magnificente de sua estrutura. Nota-se aí que os requisitos relativos aos aspectos históricos são bastante pontuais e objetivos, uma vez que havia obras de referência, espécies de guias das narrativas, embora exista evidente espaço para interpretação desses textos, como observamos a partir dos projetos apresentados. Por outro lado, o critério relativo ao caráter artístico, ao desenho da obra, limita-se a sugerir qualidade técnica (a partir de quais parâmetros?) e aspecto monumental.

Essa diferença no peso atribuído à forma e ao conteúdo aparece de maneira bastante clara no texto que elege a maquete criada pelo escultor Amadeu Zani (Figura 9) vencedora do concurso. De modo conciso, a maquete recebe ótimo parecer do ponto de vista artístico, com ênfase em seu aspecto majestoso e destaque para a escolha de uma coluna, porque era "encontrada na arquitetura de todos os povos"26 26 Cf. Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - livreto do concurso do Monumento à glória imortal dos fundadores de São Paulo (1910, p. 5). . Terminaria aqui a apreciação do desenho da obra e em seguida seria iniciado um longo debate sobre seu conteúdo simbólico.

Figura 9
Maquete de Amadeu Zani.

Do ponto de vista da narrativa, o projeto segue rigidamente a proposta do edital, construindo um percurso a partir de cenas históricas, de "grandes personagens" e de alegorias. O parecer enaltece os altos-relevos criados pelo escultor em razão da acertada escolha dos episódios: a primeira missa, a catequese, a defesa da cidade pelo índio Tibiriçá e a negociação de paz travada por Nóbrega e Anchieta junto aos Tamoios. Cenas essas descritas nos textos das obras indicadas pelo edital.

A escolha dos três personagens fundadores da cidade - Anchieta, Nóbrega e Tibiriçá - também recebe o aval da Comissão. Além desses três, Zani sugeria homenagem a outros personagens através de medalhões com efígies, tais como Martim Afonso de Souza (como primeiro donatário da terra), padre Manuel de Paiva (como chefe dos missionários do Colégio de Piratininga), padre Leonardo Nunes (como "primeiro pai e fundador em espírito" da nova Colônia, de acordo com o autor Simão de Vasconcellos) e Vicente Rodrigues (como superior da missão no momento do ataque à Vila). No topo da enorme coluna, o escultor ainda havia posicionado uma alegoria, figura feminina representando São Paulo a coroar seus três fundadores: Anchieta, Tibiriçá e Nóbrega.

Havia ainda a referência à construção dos primeiros edifícios por trabalhadores indígenas por meio de um grupo de figuras em atitude de trabalho. A alusão ao paulista como um povo laborioso aparece em outros projetos, uma vez que já se configurava como pilar de um poderoso discurso de identidade regional, no esteio da ideologia da paulistanidade27 27 Luis Fernando Cerri discute a construção da ideologia da paulistanidade pela oligarquia paulista no século XIX. Para o autor: "a paulistanidade é a ideologia produzida pela oligarquia paulista que consiste na criação de uma identidade de ordem regional, valorizando a condição de pertencente ao Estado (numa operação de homogeneização, nível das ideias, de seus habitantes), ao mesmo tempo em que institui uma série de valores e características como próprias da condição de paulista e, para sacramentar essa construção, oferece uma explicação para essa situação por meio do recurso à História Regional, que aponta o bandeirante como ancestral, civilizador, patriarca do paulista". Cf. Luis Fernando Cerri (1998). , sendo possível observar ecos desse discurso em diversos projetos apresentados no concurso. Zani apresentou o projeto mais completo, no que diz respeito à citação da bibliografia sugerida, ou seja, ao roteiro proposto pela Comissão. Passou por personagens menos conhecidos da história paulista, citados por Vasconcelos, mas soube também dar destaque às figuras de Anchieta e Manoel da Nóbrega. O escultor parece ter compreendido a lição essencial que se devia transmitir por meio do monumento, concentrando-se na apologia ao trabalho missionário dos jesuítas e no caráter religioso de fundação da cidade.

Se lançarmos um olhar geral sobre os projetos apresentados, é possível notar diferentes percursos e projetos de identidade propostos pelos escultores. Existe uma predominância em destacar a vocação religiosa do monumento, incentivada no edital e materializada na comemoração da figura de Anchieta. Entretanto, os escultores parecem diversificar os personagens comemorados na tentativa de acertar os desejos da Comissão.

Pode-se observar que, dos seis projetos apresentados, quatro deles seguem a orientação e homenageiam personagens históricos. Ora, no primeiro parágrafo do edital lê-se que a comissão executiva pretendia construir "um monumento em condições dignas não só de perpetuar a memória do fausto acontecimento [a fundação de São Paulo] como prestar homenagem a Anchieta e outras figuras históricas que nele tomaram parte". Portanto, o edital incentivava a escolha de personagens históricos para compor a narrativa e apontava o padre José de Anchieta como protagonista da saga paulista.

Efetivamente, os quatros artistas que optaram por incluir personagens históricos - Amadeu Zani, Corrêa Lima, Eduardo de Sá e Petrucci & Calixto - posicionaram Anchieta em lugar de destaque. Além do jesuíta, outras figuras recorrentes nos projetos são: Tibiriçá, chefe tupiniquim presente em todos eles, Martim Afonso de Sousa, primeiro donatário da capitania de São Vicente, e o Padre Manoel da Nóbrega, padre jesuíta que teria escolhido o lugar para a fundação da Vila de Piratininga.

Algumas décadas depois, quando se comemoraria o IV centenário da cidade (em 1954), a escolha de Anchieta seria controversa, uma vez que outros personagens entravam em cena e disputavam espaço como fundadores de São Paulo. Nesse momento, entretanto, essa questão parece não ter sido explorada, a não ser quando houve a escolha do bandeirante para compor uma das maquetes.

A inclusão da figura do bandeirante por Correia Lima e o parecer da Comissão a esse respeito provam a importância do direcionamento simbólico dos promotores da obra, bastante diferente, por exemplo, do modo como Affonso d´Escragnolle Taunay conduziria o tema na decoração do Museu Paulista a partir de 1917, uma vez que deu grande ênfase ao papel do bandeirante na história de São Paulo e instruiu os artistas no modo como deveriam representá-lo por meio de imagens28 28 A elaboração intelectual em torno da figura do bandeirante incluiu um programa iconográfico observável nas encomendas de pinturas históricas feitas pelo Museu Paulista entre 1903 e 1922, período em que a instituição se dedicou à construção de um acervo que dava visualidade à narrativa dos paulistas como definidores dos contornos geográficos do Brasil. Paulo César Garcez Marins (2007) examina a questão por meio de duas obras do gênero histórico pertencentes ao acervo do Museu, uma executada por Benedito Calixto (em 1903, antes da gestão Taunay) e outra por Henrique Bernardelli (em 1923). O autor demonstra a filiação de retratos de bandeirantes paulistas com a retratística monárquica europeia, especificamente com a obra de Hyancinthe Rigaud, evidenciando a função da pintura histórica no processo de "enobrecimento" desse personagem. Maraliz de Castro Vieira Christo (2002) discute o projeto de ornamentação interna do Museu Paulista na gestão Taunay por meio do processo de elaboração de pinturas históricas encomendadas pelo então diretor da instituição. Por meio da correspondência estabelecida entre Affonso d'Escragnolle Taunay e os artistas Henrique Bernardelli e Rodolfo Amoêdo, a autora examina leituras divergentes na representação do bandeirante paulista e a tensão daí resultante. Sobre o tema, ver ainda Claudia Valladão de Mattos (1998; 1999) e Ana Cláudia Fonseca Brefe (2005). .

Propondo outra possibilidade, a dupla Petrucci & Calixto escolheu reforçar a ligação da história paulista com a história do Brasil e de Portugal, projetando a Vila de Piratininga a uma trajetória em maior escala, ao incluir entre as figuras homenageadas nomes como D. João III e D. Manuel, reis de Portugal, e Tomé de Sousa, governador-geral do Brasil à época da fundação de São Paulo.

Há predominância na ideia de fundação religiosa de São Paulo, sendo protagonistas o branco jesuíta e o "bom índio paulista", na figura de Tibiriçá, em detrimento da narrativa heroica do bandeirante ou de uma fusão de povos e raças, a mestiçagem. Veremos ainda que a relação do 'branco' com o 'índio' na proposta do Monumento se realizaria a partir dos conceitos de civilização versus barbárie, enfatizando-se a ideia de um processo civilizador pelas missões jesuítas. O edital aponta este caminho e os projetos, em sua maioria, seguem o roteiro.

A atuação da Comissão executiva do Monumento também deixava ver quais eram os temas que desejava explorar. Isso ficou claro em uma modificação sugerida no projeto vencedor: deveriam ser incluídas novas figuras homenageadas, para além daquelas escolhidas por Amadeu Zani, tais como Luiz da Gram, Mem de Sá e D. João III. Quando os pareceristas sugeriram uma homenagem ao papa Julio III, ficou evidente o investimento no papel da Igreja na história de São Paulo por meio da narrativa do monumento Glória imortal. Desde o momento de fundação da cidade (a primeira missa), até as principais figuras homenageadas (dois padres jesuítas, escolhidos como responsáveis pela fundação da cidade, e um chefe indígena colaborador dos missionários), a celebração do papado no monumento significava a coroação do trabalho da Igreja na Colônia. É assim que o texto descreve a importância da fé no empreendimento colonial:

Pelo que diz respeito ao nosso país, as palavras citadas têm plena confirmação desde o fato de seu descobrimento. Quando Álvares Cabral, a caminho das Índias, topou com o Brasil, o seu ato de posse foi a consagração da nova terra ao Senhor, nela plantando o sagrado símbolo cristão e dando-lhe o nome de Terra de Santa Cruz. Descoberto e evangelizado o país, a História no-lo diz - foi ainda a unidade da fé que salvou a grande unidade política29 29 Cf. Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - livreto do concurso do Monumento à glória imortal dos fundadores de São Paulo (1910, p. 28). .

Houve também uma objeção importante à instalação de um grupo de figuras no topo da coluna: a figura feminina representando a cidade de São Paulo e coroando os vultos de Tibiriçá, Anchieta e Nóbrega. Para a Comissão, havia "um sacrifício da história e um sacrifício da arte"30 30 Cf. ibid. (p. 31). . Sacrifício da arte, porque a posição de quatro figuras a uma altura de vinte metros não traria boa perspectiva, mas, sim, um "embaralhamento" do conjunto, uma vez que o espectador teria dificuldade em identificar os personagens e a cena criada pelo escultor. O sacrifício da história ocorreria porque a cena representada - o momento da chegada dos missionários e seu acolhimento por Tibiriçá - "não é verdadeira". Anchieta fazia parte da caravana, mas não era o chefe da missão, por isso seria equivocada a imagem de Tibiriçá indicando a Anchieta o local apropriado para estabelecer as missões. Nóbrega, por outro lado, não fazia parte do grupo que fundou o Colégio, por isso não poderia ser representado nesta cena. A solução dos pareceristas foi a manutenção da figura alegórica e a supressão dos três personagens coroados por ela.

Na análise dos projetos e do parecer é nítida a importância do grupo idealizador no direcionamento simbólico do Monumento. Embora as alterações no desenho sejam pontuais, há um longo debate historiográfico que se coloca a partir dos projetos e a preocupação da Comissão com a fidelidade da narrativa da obra à bibliografia escolhida, em especial ao texto de Simão de Vasconcelos, citado inúmeras vezes ao longo do parecer. A escolha de leituras de apologia às missões jesuíticas ilustra o tipo de narrativa que se pretendia construir, além de deixar evidente a elaboração de um mito fundador baseado na conversão religiosa. Daí a enorme importância reservada à catequese (a Anchieta, o professor) e ao índio. O índio reabilitado, "civilizado", constituía-se em símbolo máximo do sucesso da missão jesuítica.

Além disso, a atuação do principal idealizador da obra, Adolfo Pinto, a serviço da Igreja Católica, também merece atenção, uma vez que nos ajuda a compreender o enfoque que deu ao monumento Glória imortal e à história paulista. A formação religiosa o influenciou profundamente, tendo sido o secretário geral do Primeiro Congresso Católico Diocesano e um dos criadores e colaboradores do diário católico São Paulo. Assumiu o cargo de secretário geral da comissão para os festejos do cinquentenário do dogma da Imaculada Conceição, mandando construir um monumento em homenagem à Virgem Maria na praça da basílica de Aparecida. Foi secretário da Comissão Executiva para a Construção da Catedral da Sé, em São Paulo. De seus cinco filhos, dois seguiram a carreira religiosa.

A estreita relação de Adolfo Pinto com a história paulista e com a Igreja Católica fornece pistas sobre a construção da proposta do monumento Glória imortal. Certo é que existia um claro desejo em promover a atuação da Igreja na história de São Paulo e, com ela, a atuação de alguns aliados políticos, como o arcebispo Duarte Silva31 31 Ver Sérgio Miceli (2014) que analisa as articulações da Igreja Católica no período em A elite eclesiástica brasileira . A participação de Adolfo Pinto na construção do Monumento, por exemplo, é relatada por ele no livro Minha vida. Em seção do texto intitulada "O católico", Adolfo Pinto referia-se, em 1929, ao monumento como um "público tributo de veneração e reconhecimento à Igreja Católica e seus dignos ministros - os ínclitos missionários que em 1554 aqui fundaram o centro catequético que foi o óvulo germinal desta notável metrópole"32 32 Cf. Adolfo Pinto 1969, (p. 114). .

Ainda nessa perspectiva, a população negra não era abarcada pela bibliografia referencial e nem foi trazida nos projetos. A mestiçagem entre brancos e índios e a ideia da "família paulista" (explorada na iconografia por meio das figuras de João Ramalho e de Bartira) também não aparecem em momento algum.

Algumas alegorias se repetem nos projetos, como a figura feminina que representa a cidade de São Paulo a "coroar" sua história, em geral posicionada no alto de uma coluna. Observa-se aí o vocabulário comum do período, já que a utilização de figuras femininas de inspiração clássica era recurso estilístico muito empregado nos monumentos da segunda metade do século XIX e início do século XX, e típico de uma arte acadêmica de estilo neoclássico33 33 Ver Maurice Agulhon (1989). .

Outra alegoria recorrente nos projetos é a do trabalho. A caracterização do paulista como um povo laborioso, discurso muito em voga no início do século, possivelmente contribuiu nessa constância. Três maquetes optam por referenciar o trabalho e o esforço da colonização de São Paulo. Amadeu Zani incluiu um grupo de figuras a "desbravar o solo, abrir alicerces e carregar materiais"; Corrêa Lima optou por um índio com uma enxada nas mãos, representando o trabalho agrícola; Egisto Bertozzi apresentou baixo relevo simbolizando o trabalho agrícola e industrial. Alguns anos mais tarde, a figura do bandeirante iria incorporar a força e capacidade de trabalho do povo paulista.

O escultor Corrêa Lima, além da alegoria ao trabalho, fez uma referência ao progresso de São Paulo, representado por uma figura de adolescente saindo de um pé de café. O monumento extrapola as referências ao passado e projeta uma imagem do presente e do futuro. No caso acima, não se trata de noção encontrada, especificamente, nos livros sugeridos pelo edital, mas em um tipo de discurso que se dissemina gradativamente a partir do sucesso econômico da capital paulista, endossado pela historiografia, e que passaria a ser constante nos textos de jornal, em discursos políticos, na literatura e nos livros escolares.

Mônica Pimenta Velloso problematiza este discurso, que foi produzido, por exemplo, por intelectuais como Menotti Del Picchia e publicado em periódicos como o Correio Paulistano. Para Velloso, Del Picchia proporia o "patriotismo-prático", segundo o qual "Amar o Brasil é trabalhar"34 34 Cf. Mônica Pimenta Velloso (1993). . Nessa perspectiva, São Paulo representaria o Brasil como o centro do trabalho, das atividades práticas, utilitárias e inteligentes. A esse respeito, lembra Luís Fernando Cerri:

Data também desse período [os anos de 1920] a mistificação de que São Paulo é o Estado mais rico porque o seu povo é o que mais se dedica ao trabalho. O movimento verde-amarelo, expressão de um modernismo com posições mais conservadoras, será um dos movimentos intelectuais dedicado a propagar a seriedade, o trabalho, o pragmatismo, a responsabilidade, como características naturais do caráter regional paulista35 35 Cf. Luis Fernando Cerri (1998). .

A construção de um discurso de louvação ao paulista como povo trabalhador ocorre por meio de um processo. Aqui pudemos observar discursos laudatórios muito anteriores ao modernismo, uma vez que datam da década de 1910, o que aponta para o remoto alcance dessas ideias. Também não foram narrativas construídas apenas por intelectuais orgânicos da elite paulista, mas igualmente por artistas com pouca ou nenhuma inserção no debate historiográfico (exceção feita a Benedito Calixto que se torna um estudioso da história paulista), vários deles ou estrangeiros ou vindos do Rio de Janeiro.

Outro recurso visual comum utilizado pelos escultores e que vale ser mencionado é a alusão a cenas da história de São Paulo, normalmente representadas por meio de altos relevos. Quatro artistas empregaram este recurso (Zani, Correia Lima, Bertozzi e Nicolina de Assis). Das cenas mais utilizadas, identificam-se: a catequese, seguindo a linha sugerida no edital; a defesa da cidade de São Paulo pelo cacique Tibiriçá; a primeira missa. Trata-se de episódios fundadores da história paulista, representados à exaustão na pintura e na escultura, dos quais são exemplos: O Evangelho nas selvas (Figura 10), de Benedito Calixto, e a Fundação de São Paulo (Figura 11), de Antônio Parreiras.

Figura 10
Benedito Calixto. O evangelho nas selvas, 1893, óleo sobre tela, 59cm x 70,4.cm.

Figura 11
Antônio Parreiras. Fundação de São Paulo, 1913, óleo sobre tela, 200cm x 300cm.

Ao examinar as maquetes apresentadas no concurso, nota-se recursos comuns entre os artistas escultores para além da bibliografia sugerida, quando reconhecem, por exemplo, a importância em destacar o caráter laborioso do povo paulista ou em incluir uma representação alegórica da cidade em meio à narrativa histórica. Os projetos têm também em comum algumas características formais, como o investimento na verticalidade e na estrutura tripartida: base, coluna e topo (com exceção da obra de Nicolina de Assis que, embora seja vertical e possua colunas, difere das demais em razão das arcadas). As maquetes também investem em escadarias ou sopés e em bases decoradas por estátuas ou relevos. No topo das colunas, coroando essas obras, os escultores optaram por posicionar estátuas, sejam alegóricas (como é o caso de Amadeu Zani), sejam figurativas (como é o caso de Eduardo de Sá). Há, novamente, um vocabulário comum, desta vez referindo-se à forma desses monumentos.

Ora, da análise das propostas de monumento e do parecer produzido pela Comissão, podemos tirar uma conclusão inicial. No monumento Glória imortal a vontade de memória era considerada sua característica mais importante, em detrimento da construção formal, de seu desenho. Ao analisar o parecer da Comissão, nota-se que é cobrada certa lógica de texto escrito dos projetos apresentados, uma vez que o escultor deveria seguir o roteiro detalhado na bibliografia e trabalhar de forma satisfatória cada um dos temas, tomando o cuidado de não cometer imprecisões históricas.

Levava-se em consideração o desempenho técnico do escultor na elaboração da obra de arte e o aspecto majestoso da estrutura, este último fundamental na definição da própria natureza do monumento. Identificam-se, inclusive, algumas críticas ao desenho da obra, mas o parecer dedica-se especialmente a apreciar os projetos em relação à sua "verdade histórica". Nos comentários sobre cada um dos projetos, os critérios ficam muito claros e, além disso, fica evidente o valor da fonte histórica na construção da narrativa.

O discurso da Comissão insiste na separação entre a forma e o conteúdo da obra. Essa separação parece revelar também uma divisão de competências. A preocupação com a beleza das formas - majestade e leveza na estrutura, criatividade e rigor na escolha das figuras e alegorias - seria de responsabilidade do escultor, de seu domínio, seu métier. Por outro lado, a construção de uma interpretação do episódio narrado - personagens e cenários históricos - pertencia aos idealizadores, aos mentores da obra. Essa divisão limitava a autonomia do escultor e fazia dele uma espécie de operário da memória, invariavelmente pressionado pelas instruções de intelectuais envolvidos no projeto.

Nota-se que essa relação aparece posteriormente em outros monumentos paulistanos, particularmente no Monumento à fundação de São Paulo (1963) e no Monumento a Anchieta (1954), que permitem documentar um longo debate acerca da elaboração de narrativas históricas por meio de imagens e da construção de uma memória visual a respeito de episódios da história de São Paulo. Deixa claro, ainda, que o processo de produção de monumentos celebrativos, embora sejam esses portadores de discursos harmônicos, é campo de leituras heterogêneas, de conflitos de interesse, e que a obra é produto da negociação entre os diferentes interlocutores que atuam nesse processo.

REFERÊNCIAS

  • ABUD, Kátia Maria. O sangue intimorato e as nobilíssimas tradições: a construção de um símbolo paulista: o bandeirante. 1986. Tese (Doutorado em História) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, USP, São Paulo, 1986.
  • AGULHON, Maurice. Marianne au pouvoir. L'imagerie et la symbolique républicaines de 1880 à 1914. Paris: Flammarion, 1989.
  • BREFE, Ana Cláudia Fonseca. O Museu Paulista: Affonso de Taunay e a memória nacional: 1917-1945. São Paulo: Editora Unesp; Museu Paulista, 2005.
  • CERRI, Luis Fernando. Non ducor, duco: a ideologia da paulistanidade e a escola. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 18, n. 36, 1998.
  • CHRISTO, Maraliz de Castro Vieira. Bandeirantes na contramão da história: um estudo iconográfico. Projeto História, São Paulo, n. 24, p. 307-335, 2002.
  • COLI, Jorge. Como estudar a arte brasileira no século XIX? São Paulo: SENAC São Paulo, 2005.
  • CONFERÊNCIAS preparatórias do III centenário do padre José de Anchieta. Paris: Aillaud, 1900.
  • FERRETTI, Danilo J. Zioni; CAPELATO, Maria Helena Rolim. João Ramalho e as origens da nação: os paulistas na comemoração do IV centenário da descoberta do Brasil. Revista Tempo, Niterói, n. 8, p. 67-87, 1999.
  • GUIMARÃES, Manoel Luis Lima Salgado. Nação e civilização nos trópicos: o Instituto Histórico Geográfico Brasileiro e o projeto de uma história nacional. Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, p. 5-27,1988.
  • LÉRY, Jean de. Viagem à terra do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia, 1980.
  • MATTOS, Claudia Valladão de. Da palavra à imagem: sobre o programa decorativo de Affonso Taunay para o Museu Paulista. Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material, São Paulo, v. 6/7, p. 123-145, 1998/1999.
  • MARINS, Paulo César Garcez. Nas matas com pose de reis: a representação de bandeirantes e a tradição da retratística monárquica europeia. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, São Paulo, n. 44, p. 77-104, 2007.
  • MONTEIRO, John Manuel. Tupis, Tapuias e historiadores: estudos de história indígena e do indigenismo. 2001. 233 f. Tese (Livre Docência em Antropologia) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2001.
  • PINTO, Adolfo Augusto. Minha vida. São Paulo: Conselho Estadual de Cultura, 1969.
  • THEVET, André. As singularidades da França Antártica. Belo Horizonte: Itatiaia, 1978.
  • VASCONCELOS, Simão de. Crônica da Companhia de Jesus. Petrópolis: Vozes, 1977.
  • VELLOSO, Mônica Pimenta. A brasilidade verde-amarela: nacionalismo e regionalismo paulista. Revista Estudos Históricos Rio de Janeiro, v. 6, n. 11, p. 89-112, 1993.
  • VILAR, Socorro de Fátima Pacífico. A invenção de uma escrita: Anchieta, os jesuítas e suas histórias. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2006. (Memória das Letras, 21).
  • ZANI, Amadeu. O nosso ambiente artistico: ou casos que não accontecem a todos, nem todos os dias e em qualquer lugar. São Paulo: [s.n.], 1930.
  • 1
    Trata-se de uma convocação feita por Adolfo Pinto a Ramos de Azevedo retomada em reportagem do jornal O Estado de S. Paulo publicada no dia seguinte à inauguração do monumento Glória imortal: "Esse monumento, do qual publicamos uma vista geral e um detalhe, tem a sua história, uma longa história que vale a pena recordar. Ele representa a reparação de uma falta que cometemos para com a nossa tradição, e que o dr. Adolpho Pinto resumiu em meia dúzia de palavras melancólicas depois de se referir ao papel dos paulistas do bandeirismo na dilatação e na colonização do país. 'Causa realmente pasmo ver como deixamos por tanto tempo de comemorar condignamente um fato de tão subida importância como a fundação da cidade de São Paulo e de render homenagem devida a personagens do valor histórico de Nóbrega, de Anchieta, de Tibiriçá.' O dr. Adolpho Pinto não se limitou a denunciar a falta; lançou também a ideia de se fazer justiça aos maiores de nossa história; para isso, em 1909, por esta folha, dirigiu uma carta aberta ao dr. Ramos de Azevedo, concitando-o a auxiliá-lo na obra apenas escarvoada. A mocidade das escolas interessou-se pelo caso. Elementos de valor prontificaram-se a colaborar no monumento. E a ideia vingou." Cf. O Estado de S. Paulo (11 jun. 1925, p. 4).
  • 2
    O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) foi fundado no Rio de Janeiro em 21 de outubro de 1838. O Instituto Histórico e Geográfico Paulista (IHGSP) teve sua fundação em 1º de novembro de 1894.
  • 3
    Ver Manoel Luis Salgado Guimarães (1988)GUIMARÃES, Manoel Luis Lima Salgado. Nação e civilização nos trópicos: o Instituto Histórico Geográfico Brasileiro e o projeto de uma história nacional. Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, p. 5-27,1988..
  • 4
    Cf. Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - Ofício à Câmara Municipal (11 out. 1910).
  • 5
    Os membros da comissão executiva eram figuras influentes no ambiente político da cidade: o ex-prefeito Antônio Prado, o senador Duarte de Azevedo, o engenheiro Ramos de Azevedo, o engenheiro Adolfo Pinto, os advogados César Lacerda Vergueiro e Eduardo Vergueiro de Lorena, representando o Centro Acadêmico XI de Agosto. O parecer sobre os projetos apresentados, entretanto, seria assinado por Adolfo Pinto e os arquitetos Cláudio Rossi e Ricardo Severo. Ver O Estado de S. Paulo (28 maio 1909).
  • 6
    Edital do Concurso para a construção do Monumento aos fundadores de São Paulo, ver Amadeu Zani 1930ZANI, Amadeu. O nosso ambiente artistico: ou casos que não accontecem a todos, nem todos os dias e em qualquer lugar. São Paulo: [s.n.], 1930., (p. 7).
  • 7
    Cf. ibidem.
  • 8
    Cf. ibidem.
  • 9
    Adolfo Pinto (membro da comissão executiva do edital) ingressou no Colégio São Luís, dirigido por padres jesuítas, em 1867, e é possível que tenha tido contato com a obra nesse período. O livro foi reeditado em dois volumes na coleção Dimensões do Brasil, da editora Vozes, em 1977.
  • 10
    Uma série de escritores se posicionou sobre o paradoxo Tupi versus Tapuia desde fins do século XIX, uma vez que a polêmica estava relacionada a um projeto mais amplo, de construção da identidade histórica paulista. Para John Manuel Monteiro "este projeto passou, em maior ou menor grau, pela Comissão Geográfica e Geológica, pelo Departamento de Estatística e Arquivo do Estado, pelo Museu Paulista e, sobretudo, pelo Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, órgãos estes estabelecidos, ou pelo menos reformados (no caso do Arquivo do Estado) nas décadas de 1880 e 90". Cf. John Monteiro 2001MONTEIRO, John Manuel. Tupis, Tapuias e historiadores: estudos de história indígena e do indigenismo. 2001. 233 f. Tese (Livre Docência em Antropologia) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2001., (p. 181).
  • 11
    Ver Kátia Maria Abud (1986)ABUD, Kátia Maria. O sangue intimorato e as nobilíssimas tradições: a construção de um símbolo paulista: o bandeirante. 1986. Tese (Doutorado em História) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, USP, São Paulo, 1986..
  • 12
    Cf. Socorro de Fátima P. Vilar 2006VILAR, Socorro de Fátima Pacífico. A invenção de uma escrita: Anchieta, os jesuítas e suas histórias. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2006. (Memória das Letras, 21)., (p. 93).
  • 13
    Ver Conferências preparatórias do III centenário... (1900)CONFERÊNCIAS preparatórias do III centenário do padre José de Anchieta. Paris: Aillaud, 1900..
  • 14
    A arrecadação de fundos por subscrição pública era estratégia comum, uma vez que mobilizava a população desde o momento da idealização do monumento, fazendo-a sentir-se proprietária da obra e pertencente à memória ali celebrada.
  • 15
    Nascido em Lucca, Toscana, é autor do monumento a Fausto Cardoso (1912) e do obelisco a Inácio Barbosa (1917), ambos em Aracaju.
  • 16
    Cf. Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - livreto do concurso do Monumento à glória imortal dos fundadores de São Paulo (1910, p. 15).
  • 17
    Tema explorado por Jorge Coli ao analisar A Primeira Missa no Brasil, de Victor Meirelles. Ver Jorge Coli (2005)COLI, Jorge. Como estudar a arte brasileira no século XIX? São Paulo: SENAC São Paulo, 2005..
  • 18
    Nicolina Vaz de Assis Pinto do Couto (Campinas, 1874 - Rio de Janeiro, 1941) é autora, em São Paulo, da fonte monumental situada na Praça Júlio de Mesquita e do túmulo do Gal. Couto de Magalhães, localizado no Cemitério da Consolação.
  • 19
    Cf. Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - livreto do concurso do Monumento à glória imortal dos fundadores de São Paulo (1910, p. 10).
  • 20
    Autor dos bustos retratando José Caballero, na Santa Casa de Misericórdia de Santos, e o Conde Pereira Carneiro, no bairro da Glória, Rio de Janeiro.
  • 21
    Cf. Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - livreto do concurso do Monumento à glória imortal dos fundadores de São Paulo (1910, p. 11).
  • 22
    José Otávio Correia Lima (São Marcos, 1878 - Rio de Janeiro, 1974), foi formado pela Escola Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, instituição do qual foi professor e diretor. Foi o autor do Monumento ao Almirante Barroso (1909), no Rio de Janeiro.
  • 23
    Cf. Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - livreto do concurso do Monumento à glória imortal dos fundadores de São Paulo (1910, p. 17).
  • 24
    Cf. Simão de Vasconcelos 1977VASCONCELOS, Simão de. Crônica da Companhia de Jesus. Petrópolis: Vozes, 1977., (p. 241).
  • 25
    O monumento à fundação de São Paulo, por exemplo, inaugurado em 1961, contraria radicalmente o texto de Simão de Vasconcelos ao unir personagens como o Padre Manoel da Nóbrega, o bandeirante João Ramalho e o índio Tibiriçá, em uma espécie de "família paulista". De acordo com Ferretti e Capelato "quem iniciou a contestação a João Ramalho no período colonial foi o cronista jesuíta Simão de Vasconcelos que na sua 'Crônica da Companhia de Jesus' de 1663 além de acusar o personagem de tramar o assassinato do jesuíta Leonardo Nunes, referia-se a ele como 'um homem por graves crimes infame e atualmente excomungado', além de polígamo e assassino. Este autor, seguindo a tradição de animosidade que os jesuítas nutriram durante toda a colônia em relação aos paulistas, foi responsável pela mais negativa das representações de João Ramalho e serviu de sustentação para toda a corrente 'anti-ramalhista'". Cf. Danilo Ferretti & Maria Helena Rolim Capelato 1999FERRETTI, Danilo J. Zioni; CAPELATO, Maria Helena Rolim. João Ramalho e as origens da nação: os paulistas na comemoração do IV centenário da descoberta do Brasil. Revista Tempo, Niterói, n. 8, p. 67-87, 1999., (p. 9).
  • 26
    Cf. Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - livreto do concurso do Monumento à glória imortal dos fundadores de São Paulo (1910, p. 5).
  • 27
    Luis Fernando Cerri discute a construção da ideologia da paulistanidade pela oligarquia paulista no século XIX. Para o autor: "a paulistanidade é a ideologia produzida pela oligarquia paulista que consiste na criação de uma identidade de ordem regional, valorizando a condição de pertencente ao Estado (numa operação de homogeneização, nível das ideias, de seus habitantes), ao mesmo tempo em que institui uma série de valores e características como próprias da condição de paulista e, para sacramentar essa construção, oferece uma explicação para essa situação por meio do recurso à História Regional, que aponta o bandeirante como ancestral, civilizador, patriarca do paulista". Cf. Luis Fernando Cerri (1998)CERRI, Luis Fernando. Non ducor, duco: a ideologia da paulistanidade e a escola. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 18, n. 36, 1998..
  • 28
    A elaboração intelectual em torno da figura do bandeirante incluiu um programa iconográfico observável nas encomendas de pinturas históricas feitas pelo Museu Paulista entre 1903 e 1922, período em que a instituição se dedicou à construção de um acervo que dava visualidade à narrativa dos paulistas como definidores dos contornos geográficos do Brasil. Paulo César Garcez Marins (2007)MARINS, Paulo César Garcez. Nas matas com pose de reis: a representação de bandeirantes e a tradição da retratística monárquica europeia. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, São Paulo, n. 44, p. 77-104, 2007. examina a questão por meio de duas obras do gênero histórico pertencentes ao acervo do Museu, uma executada por Benedito Calixto (em 1903, antes da gestão Taunay) e outra por Henrique Bernardelli (em 1923). O autor demonstra a filiação de retratos de bandeirantes paulistas com a retratística monárquica europeia, especificamente com a obra de Hyancinthe Rigaud, evidenciando a função da pintura histórica no processo de "enobrecimento" desse personagem. Maraliz de Castro Vieira Christo (2002)CHRISTO, Maraliz de Castro Vieira. Bandeirantes na contramão da história: um estudo iconográfico. Projeto História, São Paulo, n. 24, p. 307-335, 2002. discute o projeto de ornamentação interna do Museu Paulista na gestão Taunay por meio do processo de elaboração de pinturas históricas encomendadas pelo então diretor da instituição. Por meio da correspondência estabelecida entre Affonso d'Escragnolle Taunay e os artistas Henrique Bernardelli e Rodolfo Amoêdo, a autora examina leituras divergentes na representação do bandeirante paulista e a tensão daí resultante. Sobre o tema, ver ainda Claudia Valladão de Mattos (1998; 1999)MATTOS, Claudia Valladão de. Da palavra à imagem: sobre o programa decorativo de Affonso Taunay para o Museu Paulista. Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material, São Paulo, v. 6/7, p. 123-145, 1998/1999. e Ana Cláudia Fonseca Brefe (2005)BREFE, Ana Cláudia Fonseca. O Museu Paulista: Affonso de Taunay e a memória nacional: 1917-1945. São Paulo: Editora Unesp; Museu Paulista, 2005..
  • 29
    Cf. Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - livreto do concurso do Monumento à glória imortal dos fundadores de São Paulo (1910, p. 28).
  • 30
    Cf. ibid. (p. 31).
  • 31
    Ver Sérgio Miceli (2014) que analisa as articulações da Igreja Católica no período em A elite eclesiástica brasileira
  • 32
    Cf. Adolfo Pinto 1969PINTO, Adolfo Augusto. Minha vida. São Paulo: Conselho Estadual de Cultura, 1969., (p. 114).
  • 33
    Ver Maurice Agulhon (1989)AGULHON, Maurice. Marianne au pouvoir. L'imagerie et la symbolique républicaines de 1880 à 1914. Paris: Flammarion, 1989..
  • 34
    Cf. Mônica Pimenta Velloso (1993)VELLOSO, Mônica Pimenta. A brasilidade verde-amarela: nacionalismo e regionalismo paulista. Revista Estudos Históricos Rio de Janeiro, v. 6, n. 11, p. 89-112, 1993..
  • 35
    Cf. Luis Fernando Cerri (1998)CERRI, Luis Fernando. Non ducor, duco: a ideologia da paulistanidade e a escola. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 18, n. 36, 1998..

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    17 Abr 2015
  • Aceito
    04 Ago 2015
Museu Paulista, Universidade de São Paulo Rua Brigadeiro Jordão, 149 - Ipiranga, CEP 04210-000, São Paulo - SP/Brasil, Tel.: (55 11) 2065-6641 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: anaismp@usp.br