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Museu Paulista: do teatro da memória ao museu laboratório: em torno da Independência do Brasil

Museu Paulista: from the Theater of Memory to Laboratory Museum - Brazil’s Independence

RESUMO

O projeto museológico de Afonso Taunay do Museu Paulista, pertencente à Universidade de São Paulo desde 1963, consagrou a expografia desse museu histórico à Independência do Brasil em 1922. Indicamos as formas de elaboração de um contrato cívico entre o museu e essa data nacional. Com o ingresso de Ulpiano Bezerra de Meneses na diretoria do Museu em 1989, a instituição passou por uma guinada, com a criação de diretrizes que reorientariam o caráter museal da instituição, a partir da reavaliação crítica de seu acervo (material e visual), e do próprio edifício-monumento que sedia o Museu Paulista. Este artigo aponta algumas balizas de mudança na compreensão da instituição, a partir da qualificação das fases institucionais anteriores a Bezerra de Meneses. Pode-se ainda indicar que os pressupostos norteadores de Ulpiano de Meneses - no esforço de converter o Museu de “teatro da memória” para “laboratório da História” - desdobram-se no projeto de restauro e reinauguração do Museu do Ipiranga, em 2022, e nas reformulações dos modos de abordar a noção na obra-prima Independência ou morte!, de Pedro Américo.

PALAVRAS-CHAVE:
Museu Paulista; Independência do Brasil; Cultura visual; Políticas de memória.

ABSTRACT

Afonso Taunay’s museological project for the Museu Paulista, belonging to the University of São Paulo since 1963, consecrated this historical museum’s exobit design to Brazil’s Independence in 1922, elaborating a civic contract between the museum and this national celebration. When Ulpiano Bezerra de Meneses became director of the Museum in 1989, the institution underwent a change in direction with the creation of guidelines that would reorient its character, based on the critical reassessment of its collection (material and visual), and of the monument-building itself which houses the museum. This article points out some changes in the understanding of the institution, based on the qualification of its phases prior to Bezerra de Meneses. Besides, Ulpiano de Meneses’ guiding assumptions-in his effort to convert the Museum from a “theatre of memory” into a “laboratory of history”-unfold in the restauration and reinauguration of the museum in 2022, and in the reformulations of ways to approach the masterpiece “Independência ou Morte!” by Pedro Américo.

KEYWORDS:
Museu Paulista; Brazil’s Independence. Visual culture. Memory policies.

O MUSEU PAULISTA COMO LÓCUS DA INDEPENDÊNCIA E O 7 DE SETEMBRO COMO CONTRATO CÍVICO DA NAÇÃO

O Museu Paulista está inscrito na cidade de São Paulo e na memória nacional desde sua abertura em 1895. Ele desempenha um papel de motor cívico encarregado sobretudo de dinamizar o 7 de setembro - data associada à Proclamação da Independência do Brasil -, como força cultural num jogo de disputas políticas datado da década de 1820. Palco de representações acerca do passado, esse museu histórico procurou tornar-se, a partir da gestão de Ulpiano Bezerra de Meneses, na década de 1990, menos “teatro da memória” e mais um lugar de memória no qual o trabalho reflexivo e crítico o caracteriza como um laboratório da história.3 3 Meneses (1994). Este artigo busca problematizar as linhas de força presentes no projeto museológico concebido por Ulpiano Bezerra de Meneses nos anos de sua direção (1989-1993). Bem consolidado, este projeto é retomado em 2022, quando o museu reabre novamente as suas portas para o bicentenário da Independência, após uma profunda reformulação estrutural do edifício e de suas exposições.

Ao longo do século XIX e início do XX, a política de comemoração dos centenários enalteceu as datas e os heróis oficiais do ideário nacional, atrelando-se às dinâmicas coloniais, que enfeixavam as nações e os mundos coloniais. Nessa política, a celebração do centenário da Independência do Brasil em 1922 constituiu uma agenda nacional importante. No Rio de Janeiro, então capital federal, o Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio organizou a Exposição Internacional de 1922, que envolveu mudanças urbanas de caráter permanente na cidade, como a destruição do Morro do Castelo para a instalação de seus pavilhões. Data daí a fundação do Museu Histórico Nacional, sob a direção de Gustavo Barroso. Nesse museu, a história do Brasil era contada de maneira evocativa a partir dos eventos da antiga corte do Rio de Janeiro.4 4 Para a organização do Museu Histórico Nacional, Gustavo Barroso contou com o apoio do presidente da República, Epitácio Pessoa, para recolher objetos artísticos e históricos referentes ao passado nacional. O primeiro diretor do museu destacou, sobretudo, os feitos militares do período imperial, com ênfase para a celebração dos supostos heróis da guerra contra o Paraguai, como o Duque de Caxias e Osório. Cf. Magalhães (2006).

Por sua vez, na cidade de São Paulo e à frente do Museu Paulista, Afonso d’Escragnolle Taunay (1876-1958) ideou e desenvolveu um projeto comemorativo do centenário como principal missão em sua longa gestão desse museu (1917-1945).5 5 Cf. Brefe (2005). Discípulo de Capistrano de Abreu (1853-1927),6 6 Capistrano de Abreu é reconhecido por muitos como precursor da historiografia moderna no Brasil e convertido em um símbolo nacional (GONTIJO, 2007). Taunay era um historiador identificado com os estudos da história, norteados pelos pressupostos da Escola Metódica, que pautavam sua noção de evidenciação histórica na memória nacional.7 7 Cf. Anhezini (2011). Ao ocupar a direção do Museu, Taunay promoveu uma guinada rumo à sua noção de história, em detrimento do paradigma da história natural que pautara a gestão anterior de Hermann von Ihering (1895-1916).

Construído a partir de 1885 e dado por finalizado em 1890, esse edifício-monumento8 8 Quando construído, o edifício-monumento, dado por finalizado em 1890, não foi pensado para sediar o Museu Paulista, o que só ocorreu em 1893, quando foram promulgadas as leis que designavam o edifício do monumento como local no qual seria instituído o Museu Paulista, regulamentado em 1894 (NERY, 2016, p. 61). Vide também Alves (2001). seria a princípio uma versão monarquista da Independência. Esse espaço de memória9 9 Cf. Assmann (2011). atravessou um processo de ressignificação republicana, convertendo-se em museu em 1893. Ele aludiu cada vez mais à noção de progresso, sobretudo de São Paulo, que ali, sob a batuta de Taunay, passou a projetar o imaginário político e histórico paulista para o país. Desde seu projeto, o edifício-monumento deveria fixar geográfica, histórica e simbolicamente o lugar da proclamação do Grito do Ipiranga por d. Pedro em 1822.10 10 Cf. Oliveira (1997). Essa concepção visual, histórica e política transparece no Salão Nobre do Museu com a instalação do quadro histórico Independência ou morte! (1888), encomendado ao academicamente laureado pintor paraibano Pedro Américo de Figueiredo e Mello (1843-1905).11 11 Cf. Oliveira e Mattos (1999). Vide também Lima Junior e Nery (2019). A tela (Figura 1) fabrica uma versão idealizada do gesto fundacional do nascimento da nação em 1822,12 12 A pintura pode ser vista em todos os detalhes em https://bit.ly/3O2fsJ6. em solo paulista.13 13 Vale destacar que os projetos historiográfico, cenográfico (arquitetura e decoração) e expográfico/iconográfico de Taunay estabeleciam um contraponto às historiografias regionais (como a carioca e a pernambucana), entrando na batalha de narrativas identitárias ao forjar uma memória do passado que situava São Paulo como epicentro da formação do país (por meio do bandeirantismo) e da Independência. Desse modo, os movimentos contestatórios ocorridos na época da Colônia recordados na escadaria, como a Conjuração Mineira (1792) e a Revolução Pernambucana (1817), eram encadeados de modo que o último elo fosse o “7 de setembro de 1822”, com a independência proclamada em São Paulo (OLIVEIRA, 1999).

O caráter memorial do edifício do hoje Museu do Ipiranga, relacionado à independência e à história de São Paulo, foi reiterado por Hermann von Ihering a partir da encomenda de retratos de “vultos brasileiros”, como o de D. Pedro I, de José Bonifácio e de Domingos Jorge Velho, confiados ao pintor Benedito Calixto pela diretoria do museu.14 14 Cf. Marins (2007), Dias (2013) e Pitta (2014). Estamos nos referindo aos seguintes retratos pintados pelo artista Benedito Calixto e pertencentes ao acervo do Museu Paulista da USP: Retrato de Pedro I, 1902, o.s.t.,140 x 100 cm; Retrato de José Bonifácio de Andrada, 1903, o.s.t., 141 x 100 cm; Domingos Jorge Velho e o locotenente Antonio Fernandes de Abreu, 1903, o.s.t., 140 x 99 cm. Celebrava-se em imagens a figura de “grandes homens”, criando uma narrativa visual linear e evolutiva que procurava atrelar a história do Brasil à de São Paulo. Ela recobria dos tempos de colônia até a independência. Essa concepção de história pautou o projeto decorativo elaborado por Taunay para o centenário da Independência de 1822, em 1922.

O projeto historiográfico e museológico de Taunay estreitou as relações entre a colina do Ipiranga, onde se situa o museu, e a tela de Pedro Américo, por meio da elaboração e execução expositiva que saúda os bandeirantes do passado (sujeitos da ação histórica colonizadora e empreendedora do progresso paulista).15 15 Cf. Marins (2007). Vide, por exemplo, as pinturas: “Ciclo da caça ao índio”, de Henrique Bernadelli; “Ciclo dos criadores de gado”, de João Baptista da Costa; “Posse da Amazônia”, de Fernandes Machado e “Ciclo do Ouro”, de Rodolpho Amoedo. Todas essas pinturas, além das esculturas também analisadas por Marins, foram produzidas sob encomenda de Afonso Taunay especialmente para a escadaria do Museu durante os festejos de 1922. Isso reforçou um sentido único da história na cenografia elaborada pelo historiador para o museu,16 16 Cf. Chiarelli (1998). por meio, por exemplo, de uma política de encomendas de pinturas históricas e retratos a artistas distinguidos pela Escola Nacional de Belas Artes do Rio Janeiro e outros, brasileiros e estrangeiros, do circuito paulista.17 17 Cf. Lima Junior (2015). Taunay interveio de perto na produção dessas obras e dirigiu a cenografia do museu para que fosse vista pelo espectador como a própria história transcorrendo sob seus olhos.18 18 Cf. Mattos (1999). Uma das primeiras iniciativas de Taunay, em 1917, foi a organização do arquivo do museu, que foi incrementado, ao longo de sua gestão, com documentos relativos ao passado paulista. Ele chegou a lançar mão de fac-símiles de mapas acervados na Europa e fotografias de materiais informativos do que chamou de iconografia de São Paulo Antiga. Cf. Brefe, op. cit. Ou seja, a ordenação simbólica dos sujeitos da ação histórica que desembocaria na independência da nação, que se desejava, estaria evidenciada na eloquência expositiva do museu. O esmero do diretor em supervisionar as obras dos artistas, oferecendo-lhes materiais históricos a partir de suas próprias investigações em bibliotecas e arquivos brasileiros, demonstra seu empenho na fabricação das imagens para a instituição, que deveriam ser compreendidas como verdadeiros documentos históricos, já que neles se baseavam.19 19 Cf. Lima e Carvalho (1993), Christo (2002), Brefe, op. cit., Marins (2007a) e Lima Junior, op. cit. Segundo Taunay, não cabia qualquer grau interpretativo do assunto histórico nos artefatos visuais, por parte dos pintores e escultores contratados, que pudesse vir a macular a mensagem visual, creditada em sua função pedagógica e de cunho moralizante.

O nexo central dessa forma expositiva observada no percurso feito pelo espectador desde o saguão de entrada20 20 Para esse percurso definido por Taunay, cf. o guia redigido pelo autor (1937). até o Salão de Honra, localizado no andar superior do edifício, centra-se, contudo, na obra de grandes proporções de Pedro Américo. Ela reitera eternamente o gesto fundacional da nação, pondo em segundo plano, quando não silenciando e apagando, toda e qualquer outra representação desse ato.21 21 Data de mais de quarenta anos antes do de Américo o quadro Proclamação da Independência, pintado pelo francês François-René Moreau, hoje pertencente ao Museu Imperial de Petrópolis. Parte da argúcia de Taunay consistiu em consagrar o quadro enquanto o próprio ato da independência no mesmo local onde uma versão construída historicamente da independência afirma o evento da proclamação. Dessa forma, o quadro encarna esse fato histórico.22 22 Cf. Coli (1998).

Por meio desses expedientes intelectuais para a elaboração e consagração da iconografia da independência,23 23 Cf. Schiavinatto (2021). Taunay incrementou desde 1922TAUNAY, Afonso d’Escragnolle. Grandes vultos da Independência brasileira. São Paulo: Cayeiras, 1922. a difusão dessa iconografia em meios impressos, como no caso da publicação da série de retratos encomendada para o Museu Paulista, em seu livro Grandes vultos da Independência do Brasil,24 24 Taunay (1922). ou na incorporação assídua da tela Independência ou morte! nos livros didáticos da área de história. Assim, ele estabeleceu uma memória imagética disciplinar do evento na educação cívica no país. Essas práticas museológicas fundadas em estudos históricos acabaram por elaborar uma espécie de contrato cívico incontornável entre o museu e o 7 de Setembro, entendido na qualidade do evento de origem da nação, ao ser o fato histórico nacional por excelência.

Figura 1
Pedro Américo, Independência ou morte!, 1888, Óleo sobre tela, 415 cm × 760 cm. Museu Paulista da Universidade de São Paulo.

MUSEU-LABORATÓRIO: PROJETO COGNITIVO E AFETIVO DO MUSEU HISTÓRICO

O processo de aproximação e associação do Museu Paulista, o mais antigo museu do Estado de São Paulo, com a Universidade de São Paulo (USP), transcorreu de várias maneiras entre as décadas de 1930 e 1960. Em 1963, ele foi definitivamente incorporado aos quadros da Universidade. Na década de 1980, o Museu viveu uma guinada na sua estrutura, que se inseriu em uma política universitária maior relativa aos museus estatutários da USP (Museu de Zoologia, Museu de Arte Contemporânea, Museu Paulista, Museu de Arqueologia e Etnologia). No Museu Paulista em 1989, houve uma mudança significativa com a transladação de dois terços de seu acervo para o Museu de Zoologia e ao Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE).25 25 Cf. Fleming e Florenzano (2011). Essa mudança implicou um remanejamento de parte de seu corpo técnico profissional para o MAE e as formas de extroversão das coleções. Apesar dessa política universitária de reordenação do parque museológico, o Museu Paulista manteve seu acervo histórico.

Essas mudanças acadêmicas e políticas redefiniram a identidade e a missão do Museu do Ipiranga,26 26 Dentre as iniciativas para a reabertura em 2022 está a adoção do nome pelo qual o museu é popularmente conhecido: “Museu do Ipiranga”, em referência ao bairro em que está localizado, na zona sul da cidade de São Paulo. redefinindo-o decisivamente enquanto museu histórico. Nessa guinada, o professor Ulpiano Bezerra de Meneses desempenhou um papel de liderança intelectual na elaboração de um novo projeto institucional museológico para esse equipamento cultural universitário,27 27 Ao assumir esse cargo de direção, Ulpiano Meneses de Bezerra trazia na bagagem anos de atuação em museus e na área do patrimônio. Na sua formação internacional, especializado em arqueologia, ele pesquisou regularmente em museus e colaborou efetivamente na organização do MAE-USP (1963-1968), sendo seu diretor entre 1968 e 1978. Somado a isso, integrou conselhos de órgãos públicos atuantes no campo de pesquisa e do patrimônio, como a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) (1977-1979), o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat, 1971-1987, 1996-2004, 2006-2007), e o Conselho do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) a partir de 2005; integrou os comitês brasileiros do Icom (International Council of Museums) e do Icomos (International Council of Monuments and Sites), ambos ligados à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Sua atuação acadêmica e institucional inscreveu-se em importantes linhas de força da década de 1980, que contextualizam esse processo de redefinição do Museu Paulista. Cf. Heymann e Lacerda (2011). sobretudo ao responder pela sua direção entre 1989 e 1993. Esse novo projeto procurou efetivar uma ruptura na concepção de museu histórico elaborada na gestão de Taunay, que, em geral, prevalecia no desenho institucional e museológico desse lugar de memória. O novo projeto descontextualizou o Museu do Ipiranga das premissas de Taunay e o recontextualizou em compromissos fundamentais almejando um museu histórico. Tal empreendimento articulava práticas científicas e culturais então atualizadas com a condição de museu universitário com suas vantagens e responsabilidades. Dessa maneira, essa abordagem reenquadrou o museu como lugar de memória, entendido também como dispositivo público de saber.28 28 Meneses (1990).

Esse novo projeto acadêmico concebia o Museu engatado à pesquisa e ao próprio acervo. Nessa perspectiva, a noção de ciclo curatorial adquiriu um papel de excelência ao unir diversas frentes de trabalho dentro da instituição - do acervo à exposição, passando pela pesquisa. Essa prática curatorial corresponde a um ciclo de atividades concatenadas: a formação e ampliação permanente das coleções, sua conservação física e restauração, seu estudo e documentação, suas formas de extroversão, seja na disponibilização estudada do acervo, seja no seu conhecimento que gera um repertório responsável de pesquisas e o alimenta dentro das três linhas de pesquisa fixados no Plano Diretor do Museu - “Cotidiano e Sociedade”, “Universo do Trabalho” e “História do Imaginário” - e na política editorial do Anais do Museu Paulista.

Essa guinada no interior dos debates sobre patrimônio ligava-se à emergência da memória de sujeitos sociais (especialmente, de homens e mulheres negros e de trabalhadores e trabalhadoras29 29 Sobre a memória do mundo trabalho e de seus sujeitos históricos, vide o documentário Os libertários (1976), dirigido por Lauro Escorel Filho. Disponível em: https://bit.ly/3LXub6v. ) reivindicada principalmente por movimentos sociais. Tratava-se de uma política de memória marcada por um paradigma de saber interessado na agência dos sujeitos ao invés de um paradigma da ausência deles predominante nos debates acadêmicos nas décadas de 1960 e 1970.30 30 Cf. Paoli, Sáder e Telles (1983) e Chalhoub e Silva (2009). Esses debates políticos e sociais ecoavam e se inseriam em parte no processo de politização da agenda social dinamizada pelos debates legislativos constitucionais na elaboração e na escrita da Constituição brasileira de 1988. Em artigo de 1992, Ulpiano Bezerra reconheceu a envergadura dessa mudança histórica:

O tema da memória está em voga, hoje mais que nunca. Fala-se de memória de mulher, do negro, do oprimido, das greves do ABC, memória da Constituinte e do partido, memória da cidade, do bairro, da empresa, da família. Talvez apenas a memória nacional, tantas vezes acuada (e tantas vezes acuadora) esteja retraída. Multiplicam-se as casas de memória, centros, arquivos, bibliotecas, museus, coleções, publicações especializadas (até mesmo periódicos). Os movimentos de preservação do patrimônio cultural e de outras memórias especificas já contam como força política e tem reconhecimento público. Se o antiquariato, a moda retrô, os revivals mergulham na sociedade de consumo, a memória tem fornecido munição para confronto e reivindicações de toda espécie.31 31 Meneses (1992a, p. 9).

Na esteira de Eclea Bosi (1936-2017), o diretor do Museu compreendeu a memória na dimensão do trabalho. Ela dependeria intrinsecamente dos mecanismos de seleção e descarte, incluindo aí os processos de reificação e fetichização como modos de operacionalização do esquecimento (Bosi 1979BOSI, Ecléa. Memória e sociedade: lembrança de velhos. São Paulo: SP.TA Editor, 1979.). Essa armação conceitual permitia indagar as condições e as formas de dicibilidade da memória e a produção social do silêncio, do silenciamento e das formas de apagamento na história. Nesse contexto complexo que envolvia a substantiva mudança internacional relativa aos significados dos museus, a guinada do Museu Paulista pauta-se pela gestão da memória como uma questão histórica e historiográfica crucial. Nota-se uma política de história relativa à mudança de estado de consciência histórica do Museu sobre si mesmo. De propósito, ela buscava diferenciar-se do projeto histórico e museológico de Taunay e colocava em seu horizonte uma política acerca dos regimes históricos de verdade.32 32 Cf. Hartog (2013). A tradução de Stephen Bann (1994) ajudou a incrementar este debate no Brasil.

Segundo Ulpiano Bezerra de Meneses, o museu histórico difere de um manual de história. Isto é, ele não se dedica a ensinar história ao visitante. Aqui, o museu objetiva versar e mostrar a historicidade das coisas, inclusive no seu caráter contingente. Para tanto, atenta à cultura material no viés da biografia dos artefatos e seus agenciamentos historicamente forjados entre os sujeitos e as coisas no mundo contemporâneo definido por práticas de consumo. Nessa medida, Bezerra de Meneses privilegiou as historicidades do mundo material no qual o museu se inscreve em seu fazer histórico. A materialidade e seus sentidos são um ponto de partida da pesquisa histórica da ação museológica. Dentro dessa proposição, não caberia mais ao museu ser o “teatro da memória”, afeito ao espetáculo que “evoca, celebra e encultura”.33 33 Cf. Meneses (1994). Tais aspectos norteavam o projeto decorativo idealizado por Taunay na década de 1920, que deveria ser, a partir de então, tensionado no redirecionamento do Museu rumo a um “museu laboratório”.

Nesse projeto, a história difere da memória, porque o historiador pauta-se pela atitude crítica e a memória precisa do escrutínio do campo disciplinar da história, inclusive no intuito de se entender os mecanismos cristalizados da memória que afetam, definem e, muitas vezes, emulam o imaginário social e as políticas de memória. O afiado debate intelectual internacional das décadas de 1980 e 1990 acerca das condições de existência do museu no tempo presente, redefiniu o lugar social, histórico, epistêmico, estético do museu.34 34 Cf. Starn (2005). A publicação de Marlene Suano (1986) atentava aos debates postos desse contexto. Data desse momento a “Declaração de Quebec”, assinada em outubro de 1984 no Canadá e que postulava os princípios orientadores de uma Nova Museologia mais atenta, entre outros pressupostos, aos sujeitos sociais como expectadores ativos no interior das instituições museais, entendidas não mais como um depositório de objetos antigos e ligados aos grandes vultos. Cf. Primo (2014). Nesse sentido, vale ressaltar que o Museu Histórico Nacional, criado em 1922, também nos últimos vinte anos passou por um processo de alteração de seus procedimentos e concepções museológicas. Sobre a questão, cf. Magalhães e Bezerra (2014). Esse debate museológico identificava-se com uma guinada no entendimento da definição e do papel social dos museus, arguindo suas genealogias e os modos pelos quais entremeavam as temporalidades históricas (em geral entendido na tríade passado, presente, futuro). Dessa maneira, o debate internacional acerca do sistema museológico também contribuiu para o reposicionamento do sentido histórico do museu em tela, subsidiando projeto museológico uspiano.

A intencional busca pela descontinuidade entre o projeto de Taunay e aquele de Ulpiano Bezerra de Meneses estipulou na pesquisa histórica a pedra de toque, pressupondo o rigor acadêmico como seu critério de qualidade. Esse desejo de refundação identitária do Museu Paulista explicitou-se em vários níveis de significação. Entre eles, na deliberação de zerar a publicação dos Anais do Museu Paulista, criado por Taunay em 1922, arregimentando a identidade histórica do museu sob as categorias História e Cultura Material.35 35 Sobre o debate internacional a respeito do material culture turn, cf. Hicks (2010, p. 25-98). Esse redirecionamento da publicação36 36 O museu ainda contava com a Revista do Museu Paulista, criada pelo primeiro diretor Hermann Von Ihering em 1895 e dedicada, sobretudo, aos estudos das ciências naturais. Sérgio Buarque de Holanda, que esteve à testa da instituição de 1946 a 1956, também criou uma “Nova Série” para essa publicação, redirecionando o seu perfil para um caráter mais antropológico e etnográfico, enquanto os Anais do Museu Paulista, que passaram por uma posterior remodelagem na gestão de Ulpiano Bezerra de Meneses, tiveram apenas duas edições, as de números 13 e 14. Cf. Silva (2020); Meneses (1993a). previa suprir o hiato existente entre o acervo museológico e a pesquisa histórica. Suplantar esse hiato exigia levar em conta a especificidade da instituição, enquanto museu, que tem por premissa o interesse na “materialidade das coisas”.37 37 Meneses (1997, p. 25). Nessa direção, o Museu Paulista passava a se encarar como “solidariamente científico-documental, cultural e educacional que se define por explorar realidades materiais (artefatos, obras humanas materializadas, produtos naturais)”.38 38 Meneses, 1993a, p. 6. Se o acervo histórico do Museu foi antes entendido por Taunay como caução para discursos feitos a priori,39 39 Id., 1992b, p. 5. Conforme Ulpiano Bezerra de Meneses: “objetos revestidos de singularidade só pelo motivo da contaminação que sofreram em contato com figuras ou eventos históricos notáveis” (MENESES, 2010, p. 25). ele passou a partir do projeto de Meneses a ser encarado como fonte de informação que permite compreender “a estruturação, o funcionamento e, sobretudo, a mudança de uma sociedade”.40 40 Em texto de 1983, Ulpiano Meneses já defendia que “os artefatos que constituem […] o principal contigente da cultura material - têm que ser considerados sob duplo aspecto: como produtos e como vetores das relações sociais” (MENESES, 1983, p. 113, grifos do autor). Nesse reordenamento, esse projeto da década de 1980 considerava a cultura material um conjunto de sistemas físicos de produção e reprodução social que permite conhecer de modo satisfatório a estrutura, o funcionamento e as mudanças de uma sociedade.41 41 Meneses (1990, p. 2). Vide também Meneses (1993b).

Compensa nuançar a operacionalização dessa abordagem conceitual em um projeto reflexivo e crítico acerca de parte das pinturas sobre São Paulo Antiga, derivadas das encomendas de Taunay das décadas de 1910 e 1920. A matriz dessas pinturas reside em um conjunto fotográfico feito pelo fotógrafo Militão de Azevedo entre 1860 e 1880. Quando da importante incorporação das fotografias de autoria de Militão de Azevedo ao acervo do Museu Paulista em 1997, esse conjunto fotográfico, primeiro, foi abordado como objeto de pesquisa e, depois, como motivo expositivo. Após o inventário realizado pelo Serviço de Documentação Histórica e Iconográfico (SVDHICO) e de seu estudo histórico sistematizado,42 42 Cf. Lima e Carvalho (1993). fez-se a exposição.

Nessa perspectiva, o projeto político institucional e acadêmico do Museu esquivava-se da situação redutora de entender o museu enquanto um análogo do arquivo ou somente como centro de pesquisa ou enquanto um veículo pedagógico de informação e produtor de eventos.43 43 Meneses (1990). Antes, propunha esse encadeamento de atividades como acima indicados, assentado na noção de ciclo curatorial - uma espécie de moto contínuo que ganha sua melhor compleição visível em uma exposição dentro de uma rotina de trabalho dos processos museológicos.

Essa proposta teórico-metodológica guiou ainda a definição do perfil dos profissionais dessa instituição. Basicamente, ele inclinou-se para um profissional formado em história com bom conhecimento historiográfico e aqueles formados em arquitetura e em museologia, ambos com boa formação em história. Esse novo perfil profissional foi fundamental para que esse projeto museológico ganhasse corpo e fosse implementado a contendo. Tal perfil preza a formação do profissional, o traquejo na pesquisa em acervo, a capacidade de problematização e de escavar os sentidos históricos da materialidade estudada. Por seu turno, o acervo explorado sob a lente da cultura material prima pela sua organicidade, coerência e amplitude. Simultaneamente, ele privilegia quaisquer suportes materiais de informação, desde que ela seja pertinente aos problemas históricos estudados no Plano Diretor do Museu. Essas plataformas materiais de informação comportam-se como eixos de problematização históricos capitais do tempo presente.

IMAGENS (RE)ESCREVEM A HISTÓRIA: A INDEPENDÊNCIA ENTRE O VERNACULAR E AS DISSENÇÕES

Arguto, o projeto do museu laboratório não significou necessariamente negar ou neutralizar a dimensão de mise-en-scène do museu.44 44 Id., 1994. Na virada das décadas de 1980-1990, Ulpiano Bezerra de Meneses reconhecia a problemática indispensável relativa à teatralização da vida social com suas implicações nos processos identitários, atravessados por visibilidades e sensorialidades. Para o autor, essa questão configura instâncias prioritárias do museu nas dinâmicas de suas materialidades.45 45 No caso do Museu Paulista, abrange a sua inscrição na pulsante paisagem urbana no bairro do Ipiranga. Nelas condensam-se e reverberam os processos de conformação de diferentes configurações identitárias, inclusive com suas tensões e confrontações, que vincam o tempo presente. A posição crítica dessa acepção funciona como um parâmetro conceitual, social e político capaz de obliterar uma visão, em geral hegemônica, lastreada na noção naturalizada e essencializada de identidade (por exemplo, o paulista, o caboclo, o herói). Essa noção naturalizada e essencializada de identidade, em geral, municia as manhas e os mecanismos de dominação ideológica, historicamente centrados sobretudo no binômio etnocentrismo e universalismo.

O projeto vídeo animação Poses do 19 (2002), concebido por Vania Carneiro de Carvalho e Solange Ferraz de Lima, parece dialogar diretamente com essas premissas.46 46 Disponível em: https://bit.ly/3Kt0FF7. A partir de 1338 retratos no formato Carte de visite existentes na Coleção Militão Augusto de Azevedo, esse vídeo-ensaio mostra sequências fotográficas que revelam as características de gênero e faixa etária dos diferentes sujeitos sociais da cidade de São Paulo nos oitocentos, realçando os objetos cênicos e os protocolos visuais recorrentes dessa cultura fotográfica oitocentista. O vídeo explora o regime visual das configurações identitárias desses sujeitos sociais em sua diversidade. Como ressaltam as pesquisadoras citadas, os retratos, quando colocados em movimento no vídeo, sofrem uma quase fusão. Nessa sequência animada de retratos, predomina a retórica das poses sobre as figuras individuais.47 47 Cf. Lima e Carvalho (2005).

Na visualidade residia um dos núcleos duros do museu laboratório em meio a virada icônica, em curso nas ciências humanas, que propôs ao campo historiográfico “conferir cidadania plena às formas visuais como acesso e visualização do passado”.48 48 Santiago Júnior (2019, p. 404). Cf. o artigo de Meneses (2003). Aqui, a visualidade molda, interfere e relaciona temporalidades e atua na produção de conhecimento. As imagens são socialmente ativas. No bojo desse debate intelectual e institucional centrado na cultura visual e na museologia, o olhar converteu-se num processo forjado social e historicamente que envolve diferentes sujeitos sociais.49 49 Cf. Schiavinatto e Costa (2016). A visualidade assim nervura o real.50 50 Por meio das exposições idealizadas pelo museu, efetiva-se a alfabetização museológica e visual do espectador.

A exposição “São Paulo nas lentes de Militão”, inaugurada em 1997, é um caso notório para se observar essa operação que engrena a problemática histórica a partir do artefato, da exposição e da visualidade. Na já citada exibição dos retratos realizados pelo fotógrafo Militão, o público visitante era instigado a refletir desde a permanência das poses dos indivíduos, o circuito social desses retratos e seu atrelamento às dinâmicas de reproduções sociais, alcançando até as múltiplas apropriações do objeto fotográfico.51 51 Makino et al. (2003, p. 185-186). Isto coadunava-se com as pesquisas das docentes Vânia Carneiro de Carvalho e Solange Ferraz de Lima no campo do fotográfico, seja a partir da coleção Militão de Azevedo, seja de Carlos Eugenio Marcondes de Moura, incorporadas ao Museu na década de 1990. Tais coleções permitem um adensamento significativo da compreensão das práticas fotográficas52 52 O que significava se atentar tanto por parte do ofício do fotógrafo e sua inserção social quanto sobre as convenções de época possíveis de serem exploradas a partir das poses dos mais variados segmentos da sociedade que foram captados pelas lentes dos fotógrafos em seus estúdios. em São Paulo entre fins do século XIX e inícios do XX.53 53 Para um balanço de suas produções na área da fotografia, cf. Lima e Carvalho (2013). A própria relação historicamente forjada entre o museu e a fotografia é motivo de estudo por Solange Ferraz de Lima (2020). Nesse capítulo, a autora aborda o nascimento dessa relação fundamental e nuclear da cultura museológica a partir do Oitocentos. No bojo dessas pesquisas, é mérito das autoras em diálogo com as diretrizes desse projeto museológico a definição de uma metodologia de acervo, a partir da experiência no Museu Paulista, com descritores fotográficos que foram a partir de então adotados com frequência por instituições museais que trabalham com o suporte fotográfico.54 54 Cf. Filippi, Lima e Carvalho (2002). Nessa medida, os processos museológicos elaborados no museu laboratório propõem métodos que podem ser partilhados, manipulados e rearranjados em outros equipamentos culturais, por seus profissionais técnicos e em outros processos curatoriais.

Tendo por cerne da ação museológica as relações travadas entre a problemática histórica estudada, a exposição e a visualidade, a exposição “Imagens Recriam a História”, de 2007,55 55 Cf. Marins (2007a). com curadoria de Paulo César Garcez Marins e coordenação institucional de Solange Ferraz de Lima, constitui um marco na abordagem dos objetos memoráveis do próprio Museu na constituição e cristalização de uma narrativa histórica comemorativa da nação.56 56 Id., 2007b. Abertamente, essa exposição assumiu o acervo na condição sine qua non de repertório visual.

Desta feita, a exposição privilegiou um conjunto de fotografias, quadros históricos, maquete da cidade de São Paulo de 1841 e objetos de uso cotidiano com a reprodução dessas imagens históricas (por exemplo, selos de correios, vasos de porcelana, bilhetes de loteria etc.).57 57 Ibid. A mostra ainda evidenciou uma série de objetos feitos entre 1890 e 1940, pertencentes ao acervo do Museu, que conforma parte fundamental da iconosfera do imaginário nacional decalcado nesse museu histórico. Ele foi exibido insistindo no compromisso político e histórico dessas peças de feitio e uso vernacular. A exposição enfatizou a produção das obras, enquanto encomendas, e seu programa visual. Ela ressaltou a fabricação da historicidade nessas imagens, inclusive naquelas de caráter vernacular que adentram o cotidiano de modo a parecer inocentes e inócuas. Justamente por isto, esses artefatos visuais vão conformando uma percepção cotidiana da ordem do senso comum sobre determinados assuntos históricos e sobre formas de historiar.

Ao potencializar a recepção na audiência do objeto de feitio cotidiano, essas obras remetem necessariamente ao mundo do trabalho humano. A exposição explicitava que a construção histórica de uma dada compreensão da história não se restringe à obra historiográfica ou ao campo disciplinar da história, mas adentra o mundo do trabalho e o cotidiano dos espectadores de várias formas. Tampouco se restringe à centralidade e ao monopólio do museu de história para recontar a história. Dessa maneira, a exposição e o acervo do Museu desfazem-se de uma acepção elitista de si, por exemplo ao prever que a peça museológica por excelência residiria apenas na tela da pintura histórica. Pode-se dizer que para a curadoria, a noção de repertório imagético, também histórico, instiga a pensar os modos de performar o passado no presente e os modos de ver nos objetos visuais as noções de comemoração aí agenciadas que se articulam a determinadas narrativas históricas.

Segundo essa curadoria, o Museu, entendido como instituição visual, derretia a estrita divisão entre obra de arte e imagem vernacular atentando às formas de produção, circulação e recepção das mesmas imagens em diferentes suportes. Além disso, mostrava o reaproveitamento e os remanejamentos de significados históricos dessas imagens por conta de celebrações políticas articuladas no movimento constitucionalista paulista de 1932 e no 4º centenário da cidade de São Paulo em 1954 (Figuras 2, 3, 4 e 5). Visualmente, questionava-se a fabricação do herói e do fato histórico fundacional, a recriação visual do passado da cidade de São Paulo, a difusão do binômio fato nacional-herói nacional e sua penetração no cotidiano através de uma diversificada cultura material. Essa ação curatorial desvelava a complexidade das formas e das implicações das políticas de memória, prevendo a formação e a presença de um público espectador que apreende sobre as formas de consumo da história e de uma memória histórica.58 58 O material educativo produzido pelo Museu a partir da exposição “Imagens Recriam a História”, pode ser conferido em: https://bit.ly/371hHMo.

Figura 2
Oscar Pereira da Silva (1865-1939). Combate de botocudos em Mogi das Cruzes. c. 1920. 150 × 100 cm. Óleo sobre tela. Museu Paulista da USP.

Figura 3
Vaso comemorativo do IV Centenário da cidade de São Paulo, 1954.

Figura 4
Capa do livro didático História do Brasil, de Joaquim Silva, década de 1990.

Figura 5
Brinde comercial, década de 1960.

A exposição enfocou o objeto visual, indicando as relações estabelecidas com os outros artefatos visuais, sua inserção no interior da coleção do Museu e fora dele. Isto era evidente ao expor a maquete da cidade de São Paulo de 1841 (encomendada por Taunay ao escultor holandês Henrique Bakkenist em 1920 - Figura 6). Pois, a própria maquete pertence ao Museu e refere-se à cidade de São Paulo, na qual o Museu se inscreve como equipamento cultural. Essa compreensão do objeto exige conhecer sua materialidade, sua linguagem visual e matizar as relações por ele suscitadas.

Figura 6
Maquete da cidade de São Paulo em 1841 produzida pelo escultor holandês Henrique Bakkenist em 1920. Museu Paulista da USP. Disponível em: https://bit.ly/3upMYkJ. Acesso em: 24 jan. 2022.

Comprometida com a formação de público, essa exposição caprichou no educativo com a preparação de um material dirigido a professores da rede escolar, explorando a análise das imagens e as formas com as quais agenciavam temporalidades históricas. No todo, a exposição visava ser a evidencia visual do seu título: Imagens recriam a História. Isto é, problematizou como as convenções, as negociações, a produção, a circulação, as funções e os usos dessas imagens escrevem história. A exposição convidava o espectador a perceber que o objeto imagético não é autoexplicativo tampouco um bem dicionarizado. Ao contrário do senso comum, nessa exposição, o objeto surge instável e refeito continuamente em seus sentidos. O estudo dos sentidos do objeto alimenta seu valor iconográfico, museológico e histórico, vitalizando sua atuação nas operações de memória e esquecimento e, consequentemente, no ciclo curatorial. Essa abordagem curatorial articula o artefato visual com as diversas temporalidades históricas (o passado remoto, o passado imediato, o presente, o futuro no horizonte). Numa leitura a contrapelo do passado sob o signo benjaminiano, a exposição reafirmou um entendimento da preservação histórica num museu histórico que não se fia em reiterar uma visão celebrativa de si e do contrato cívico tantas vezes convencionado na liturgia política da nação.

Na linha dessa Exposição de 2007, o Museu Republicano Convenção de Itu,59 59 Instituição anexa ao Museu Paulista, criada em 1923 e situada no interior de São Paulo. inaugurou em 2017 a exposição “Viagens Fluviais: homens e canoas na rota das monções”,60 60 Para maiores detalhes da exposição: https://bit.ly/375Ncop. sob curadoria da docente e pesquisadora do Museu Paulista, Maria Aparecida de Menezes Borrego. Esta exposição recupera a fabricação do tema das monções em São Paulo nas pinturas produzidas sob encomenda de Taunay a artistas como Oscar Pereira da Silva e Aurélio Zimmemann na década de 1920.61 61 Viagens comerciais fluviais realizadas entre os séculos XVIII e início do XIX. Vide Nascimento e Borrego (2021). As obras realizadas baseavam-se nos registros visuais legados pelos artistas estrangeiros Hercules Florence e Aimé-Adrien Taunay, quando integrantes da missão Langsdorff. Além destas obras, a exposição incorporou artefatos (moringas, baús e etc.) associados a monções com destaque para o exemplar do beque de proa de um “canoão” utilizado nessas travessias fluviais. Sobre esse beque de proa, foram apresentados ao público os processos de sua recuperação material, a partir de estudos físicos, de seu tamanho original.

É importante ressaltar que esses processos curatorias aqui arrolados se inserem no projeto museológico desenhado no Plano Diretor desta instituição e implementado a partir da gestão do professor Ulpiano Toledo Bezerra de Meneses. Tal documento foi fundamental por estabelecer definitivamente a atuação do museu no campo da História e Cultura Material, bem como por vincular a aquisição de acervo, seja por compra ou doação, às linhas de pesquisa da instituição (“Cotidiano e Sociedade”, “Universo do Trabalho” e “História do Imaginário”).62 62 Cf. Vieira (2018). Nesse sentido, antes de um depósito de coisas antigas, a entrada dos artefatos no Museu obedece a uma proposta consciente, afinada aos pressupostos que norteiam cada linha de pesquisa, e permite a sua constante problematização. A partir da compra e doação, novas tipologias de objetos bidimensionais e tridimensionais ingressaram recentemente nas coleções, contribuindo para uma maior diversificação social, étnica, de classe, gênero e etc., ainda carente de maior expressividade no Museu,63 63 Id., 2020, p. 41. cujas primeiras coleções estavam relacionadas, em grande parte, à preservação da memória da elite paulistana.

As pesquisas de Maria Aparecida Borrego, centradas nas dinâmicas comerciais de São Paulo nos séculos XVIII e XIX, promovem uma dilatação do escopo temporal da política curatorial do Museu até então focada a partir de 1870, retomando aspectos sociais, políticos, econômicos e culturais do período colonial brasileiro, tendo como ponto de partida a sua cultura material,64 64 Cf. Borrego (2019). inquerido numa perspectiva interdisciplinar.65 65 Cf. Félix e Rizzutto (2019). A exposição enfrentou um tema importante da montagem do mito do bandeirante e do paulista no que tange ao domínio e a expansão territorial do Brasil colonial. Se a sua materialidade expõe a dificuldade do domínio do mundo dos rios, por outro lado, mostra a forte atuação indígena na construção desta materialidade (como no caso do “canoão”) que suporta o empreendimento das monções.66 66 Conforme já apontava Sérgio Buarque de Holanda no livro Monções, publicado em 1954, enquanto ocupava o cargo de diretor do Museu Paulista (1946-1956).

A prospecção do processo de fatura do objeto visual em sua materialidade, usos e significados reaparece na aquisição da obra Independência ou Morte. Povo I”, de Carla Soares, Helena Trindade e Bruno Moreschi (Figura 7) pelo Museu em 2018 dentro da linha História do Imaginário. A partir da proposta mais inclusiva e democrática de arte conceitual do artista-pesquisador Bruno Moreschi, os artistas Carla Soares, Helena Trindade e Bruno Moreschi optam por singularizar a figura do “caipira”, que aparece na tela Independência ou morte!, de Pedro Américo que ocupa um lugar central nesse museu. Os artistas elegem como motivo de sua obra a figura do “caipira”, no canto esquerdo, que conduz seu carro de boi e é tomado de surpresa pelo episódio da independência.67 67 A produção dessa obra inseriu-se na pesquisa de doutoramento de Bruno Moreschi (2019, 2021). Por ocasião do museu fechado, em 2013, Moreschi, junto de pintores populares de São Paulo, replicou em grandes dimensões o quadro de Pedro Américo. Essa réplica foi exposta no vão livre do Sesc Ipiranga. Tal escolha, que sujeitava a tela canônica às intempéries do tempo (chuva, sol, poeira), desestabilizava os próprios preceitos da pintura histórica, que visava ser eterna, e não efêmera; servir “aos esplendores da imortalidade”, como defendeu Pedro Américo (MELLO, 1999, p. 27). Apesar de monumentalizado no notável quadro, Pedro Américo se refere ao “caipira” em seus escritos como um dos “meros acessórios” da composição.68 68 Ibid., p. 26. Em uma atitude crítica em relação a essa posição do pintor de história Pedro Américo, Moreschi, Soares e Trindade conferem protagonismo àquela figura popular retratada como coadjuvante na composição de 1888. Além disso, a despeito das semelhanças com o “caipira” do quadro de Pedro Américo, na obra assinada pelos três artistas, a coloração com aspecto de inacabado e o traçado pouco delineado afastam-se dos preceitos da “ciência do belo” em vigor no século XIX da qual esse pintor acadêmico de história comungava. Essa obra dos artistas contemporâneos tenciona o quadro mais canônico do Museu, não só em seus aspectos formais, mas também de conteúdo. Ela buscar inquietar o observador quanto aos significados históricos da Independência ao extrapolar a narrativa proposta pelo pintor de história Pedro Américo. Os artistas inquerem sobre outras dimensões do “Independência ou Morte!” visualmente suscitadas que vão além do “Grito”, como ato fundador da nação.

Figura 7
Carla Soares, Helena Trindade e Bruno Moreschi. Independência ou morte - o povo 1 (2014). Óleo sobre tecido, 150 cm × 100 cm. Museu Paulista da USP.

O Museu do Ipiranga para 2022: projeto do museu laboratório no bicentenário da Independência

A reabertura do Museu está prevista para o 7 de setembro de 2022, data oficial das comemorações dos duzentos anos da Independência. Ele foi fechado ao público em 2013 devido a questões de fragilidade arquitetônica. Desde então, o Museu passa por uma ampla reformulação estrutural do edifício-monumento com a imensa ampliação das áreas expositivas69 69 Para as informações a respeito da reformulação do Museu Paulista, estamos nos baseando na entrevista gentilmente concedida aos autores pela docente Vania Carneiro de Carvalho, que pode ser conferida nas plataformas digitais da Sociedade de Estudos dos Oitocentos (SEO). Cf. Conversando sobre o Novo Museu do Ipiranga. Disponível em: https://bit.ly/3O2wIhg. (Figuras 8 e 9). A coordenadora geral das exposições do novo Museu do Ipiranga, Vânia Carneiro de Carvalho, destacou que foi fundamental para a reordenação do Museu, o processo de escuta do educativo desta instituição, liderado por Denise Peixoto e Isabela Ribeiro de Arruda. A escuta privilegiou uma ação junto a grupos de agentes de turismo, professores, adolescentes, moradores da região, trabalhadores das obras, pessoas da associação do bairro, comunidades LGBTQI+ e etc., no esforço de intervir, de maneira dialogada e reflexiva com o observador70 70 Esse diálogo com o objetivo de construção coletiva de informações sobre o acervo do museu foi possível também a partir da parceria com o “Wiki Movimento Brasil” para a realização de aplicativos junto da Wikipédia, promovida desde o fechamento do museu em 2013. Essas iniciativas contribuíram, igualmente, para qualificar e difundir o acervo. Para maiores informações: https://bit.ly/37cIMMm. nas exposições. Essa iniciativa permitiu identificar a polifonia de expectativas e formas de apropriação do Museu, bem como refletir sobre pontos de tensão a serem explorados nas mostras. Somado a isso, na nova remodelação, o edifício centenário foi readequado às demandas contemporâneas de acessibilidade (física, visual, auditiva e cognitiva) para atender um público amplo dentro de uma política mais inclusiva.71 71 Para melhor adequar os espaços expositivos às demandas de acessibilidade, recursos como tela de multimídia, planta tátil e objetos cenográficos integram de maneira significativa a expografia.

Figura 8
Prospecto do edifício do museu após a reforma com acesso ao interior pelo Parque da Independência. Disponível em: https://bit.ly/3uz7gsp. Acesso em: 27 jan. 2022.

Figura 9
A fachada no museu antes da realização das obras que preveem o acesso de entrada não mais pelas escadarias, mas pelas aberturas realizadas na esplanada, como se viu na Figura 8. Disponível em: https://bit.ly/3O3970i. Acesso em: 27 jan. 2022.

O projeto do escritório H+F Arquitetos, de São Paulo, vencedor do concurso de restauro do Museu, especificamente transformou todo o espaço físico em espaço expositivo,72 72 Vale observar que esse projeto vencedor permitiu uma maior integração entre o edifício do museu e os jardins, posicionando o ponto de entrada abaixo da esplanada, em frente ao espelho de água criado no centenário da Independência em 1922. do subsolo às salas adjacentes no topo do prédio. Esses espaços eram até então utilizados para reservas técnicas, salas administrativas, laboratórios etc.73 73 Esses e outros setores, como a biblioteca, o serviço de documentação textual e iconografia, foram realocados em casas alugadas nas imediações do bairro do Ipiranga. Esse desmembramento que ocorreu a partir de 2013 permitiu o esvaziamento do museu para sua reforma. Desse modo, a decoração do “eixo monumental” (compreendendo o saguão de entrada, a escadaria e o Salão de Honra - Figura 10) idealizado por Afonso Taunay para o Centenário da Independência em 1922TAUNAY, Afonso d’Escragnolle. Grandes vultos da Independência brasileira. São Paulo: Cayeiras, 1922., convive, a partir de agora, com uma área significativamente ampliada (43 ambientes) e preparada, especialmente, para abrigar exposições de longa e curta duração a serem inauguradas a partir de setembro de 2022.74 74 São elas: a esplanada do museu, o andar térreo, o Salão de Honra, o andar (torres) até então ocupado por áreas técnicas, o mezanino e o mirante. Nesse projeto, cabe adiantar ao leitor, a área circunscrita ao núcleo museológico definido na direção de Taunay, com seus compromissos histórico e monumental comentados, fica notório no novo projeto arquitetônico. Ele circunscreve um determinado contrato cívico em torno da independência como um programa museológico do passado que se torna uma herança e uma história no presente. A nova configuração do Museu enfatiza as várias independências na fundação do Brasil.75 75 Cf. Mello (2004). Isto é, enfoca sua vida coletiva, marcada pela diversidade, numa chave de um povo multiétnico e com tramas históricas diversas.

Figura 10
Salão de honra do Museu Paulista da USP. Essa foto corresponde à expografia anterior ao novo projeto pensado agora para 2022. Disponível em: https://bit.ly/3xfryZv. Acesso em: 27 jan. 2022.

Esse projeto para 2022, reconhece Vânia Carneiro de Carvalho, se alinha às diretrizes traçadas por Ulpiano Bezerra de Meneses implementadas durante os anos de sua gestão. Notadamente, no que se refere ao compromisso do museu histórico, assumidamente universitário, com a produção do conhecimento travada entre a história e a cultura material. O projeto então preza pelo ciclo curatorial “solidário”,76 76 Dentro dessa concepção, o museu não é derivado de um processo hierarquizado de produção do conhecimento, em efeito dominó em que o docente produz e repassa para o educativo fazer a difusão. Antes, todos os setores (educativo, documental, catalogação, expositivo e museológico) trabalham de maneira articulada, o que resulta em uma curadoria muito integrada. em que o acervo e a pesquisa são concebidos como “motor propulsor” da instituição. Assim, as problemáticas curatoriais levadas a cabo pelos docentes inserem-se nas linhas mestras idealizadas por Bezerra de Meneses (“Cotidiano & Sociedade”, do “Universo do Trabalho”, e da “História do Imaginário”). Em sintonia com essas linhas, no interior do Museu do Ipiranga vão estar dispostas onze acessíveis exposições de longa duração (de três a cinco anos). Essas exposições estão organizadas em dois eixos principais:

  • - “Para entender a sociedade”;

  • - “Para entender o Museu”.

No primeiro, as exposições (em um total de seis) são organizadas em torno das pesquisas realizadas pelos docentes do próprio Museu em diálogo com as pesquisas institucionais, comentadas anteriormente.77 77 Esse eixo contará ainda com projetos culturais de interlocuções com as exposições na forma de “multimídias de contrapontos”. A intenção é que projetos premiados por um edital do museu possam fazer proposições, dos mais variados formatos, que desestabilizem os discursos institucionais. Dessa maneira, o museu assume uma vontade de interlocução contínua com a sociedade. Já o eixo “Para entender o Museu” abarca a história do edifício, da instituição e da disciplina (Cultura Material) dentro do Museu. Isso implica dar subsídios para o visitante a partir de questionamentos como: o que são estudos de Cultura Material? Como se faz estudos nessa área? Por que um museu é o lugar propício para fazer isso? E por fim: o que significa ter acervo no Museu? Essas questões suscitam de imediato a reflexão sobre o acervo, entendido como documento e política de memória, e da impossibilidade de existir um museu de história sem ele. Nesta perspectiva, espera-se, a frequência ao Museu Paulista torna-se um modo de indagar o próprio estatuto e a natureza do museu histórico.

Essas problemáticas visam instrumentalizar o visitante para o eixo “Para entender a sociedade”. Na ordem da intencionalidade desse projeto do museu-laboratório em 2022, insere-se no museu histórico a necessidade de subsidiar o visitante com expedientes para refletir sobre como se processa o ciclo curatorial, organizado em suas quatro etapas: coletar, catalogar, conservar e comunicar. Todas elas problematizadas a partir das próprias coleções e exposições do Museu. Essa escolha política e museológica debate visualmente: o que é uma reserva técnica, quais os desafios para se expor objetos, inclusive de materiais delicados, como se dá a política de aquisições (colaborativas ou não). No todo, aqui arrolado, percebe-se mais uma vez o desenho das premissas de Bezerra de Meneses para quem o museu é também vetor de consciência histórica e fomenta o conhecimento.

Esta noção de museu-laboratório permite criar e desenvolver uma política de desconstrução de alguns mitos reiterados sobre esta cultura museológica. Por exemplo, um rol de visitantes acredita que o Museu, sobretudo em função de seu caráter monumental, teria sido a própria moradia dos monarcas d. Pedro I e d. Pedro II. Logo, o erro histórico (entendido como a fabricação histórica do falso) interessa a esse projeto museológico. Pois, a sua reconfiguração exige uma reflexão continuada a respeito produção social da autoconsciência dos sentidos do museu histórico. Nesse eixo (Para entender a sociedade), há uma declarada intenção de conferir ao espectador noções sobre as especificidades do próprio museu de história e da importância de seus acervos enquanto documentos históricos.

Em consonância com esses postulados, está o tratamento conferido à pintura Independência ou morte!, de Pedro Américo. Como antes mencionado, obra fundante do acervo e exposta no Salão de Honra. Segundo a pesquisadora Michelli Scapol Monteiro, no novo empreendimento curatorial de 2022, almeja-se descontextualizar e recontextualizar a grandeza do quadro ao recontar o seu processo de fabricação artística e histórica. Esta proposta implica explorar as escolhas visuais realizadas pelo artista. Entre elas, as negociações (por vezes tensas) desse com o comitente da obra, as filiações historiográficas sobre a independência que embasaram a narrativa visual e etc.78 78 Inclui-se ainda a possibilidade de explorar os diversos aspectos materiais da própria pintura, como a alteração de sua coloração, os “arrependimentos” do artista que ficaram invisibilizados pelas camadas de tintas, e só foram possíveis graças ao restauro, que contou, para além dos profissionais da área de conservação do museu, liderado por Yara Petrella, também com os da área de física da USP, capitaneados pela Márcia Rizzutto. Cf. https://bit.ly/3xhEmi3. Nessa operação histórica e crítica, é possível problematizar ao visitante como a composição desse quadro, tão sedimentado no imaginário cívico como a imagem oficial da Independência, é uma representação. Ela foi feita de acordo com os ditames da pintura de história em voga quando Pedro Américo a produziu - 66 anos depois da Independência, ocorrida em 1822,79 79 Agradecemos a Michelli Scapol Monteiro pelas informações gentilmente fornecidas em entrevista realizada em 17 de julho de 2021. A pesquisadora, em seu pós-doutoramento, realizado no Museu Paulista com apoio da Fapesp, supervisionada pelo prof. Paulo César Garcez Marins, persegue a trajetória social do quadro Independência ou morte!, e atua na curadoria da exposição do Salão de Honra do Museu. A entrevista está disponibilizada no canal da Sociedade Brasileira de Estudos do Oitocentos (SEO): https://www.youtube.com/watch?v=FG4V4xVv8GI. não se tratando, portanto, de um “flagrante” do real. Visualmente, na exposição, as intervenções por meio das multimídias buscam desestabilizar esse caráter oficial da pintura, na medida em que uma parede transparente, disposta no meio do Salão de Honra, fará projeções dos estudos preparatórios efetuados pelo artista. Esta escolha curatorial dimensiona ao espectador esse caráter de fatura da imagem em diversas etapas, antes do quadro atingir sua versão final. Nessa perspectiva curatorial, é possível problematizar os propósitos conscientes do artista quanto às escolhas para a cena da Independência

Outro efeito de real do projeto arquitetônico escolhido consiste em afastar historicamente o novo Museu do Ipiranga do monumento-museu de Taunay e sua vontade política projetiva de São Paulo para o Brasil, circunscrevendo-o e apostando em várias curadorias que problematizam as experiências sociais e políticas das várias independências.80 80 Para a reabertura, o museu contará com a exposição de curta duração “Memórias da Independência”, que dialogará diretamente com o eixo monumental idealizado por Taunay na década de 1920, e apresenta elementos que permitem ampliar os debates em torno da emancipação política brasileira gestados em outras localidades para além de São Paulo, como Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Sul etc.

No geral, o Museu Paulista, reabre as suas portas em setembro de 2022, no propósito da premissa de “um laboratório do fazer histórico por meio de suas coleções e exposições”,81 81 Cf. Carvalho, Marins e Lima (2021). mas também diante de um horizonte de expectativas próprio de seu tempo, o que introduz incertezas e fissuras nesse processo. Em seus últimos trinta anos, o Museu Paulista, enquanto museu laboratório, busca ser um espaço ativo de reflexão sobre os agenciamentos entre as temporalidades, em diálogo, e tensionadas com as formas de elaboração cotidianas da consciência histórica. Antes de aplainar ou pacificar as narrativas dissonantes, como fez Taunay para 1922, agora no Bicentenário, esse projeto espera asseverar a noção de cidadania de maneira ampla, enquanto exercício da diversidade e experiências partilhadas. Com o Museu requalificado para 2022, não é possível deixar de se pensar nos impactos futuros em relação às formas de (re)elaboração de um contrato cívico entre a instituição e a Independência. Propositalmente, ele complexifica os imaginários, os sujeitos e os processos históricos, indo além do marco do “7 de setembro de 1822” - tão arraigado às margens (nada plácidas) do Ipiranga.

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    » https://doi.org/10.1590/1982-02672020v28e21
  • 3
    Meneses (1994MENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. Do teatro da memória ao laboratório da História: a exposição museológica e o conhecimento histórico. Anais do Museu Paulista , São Paulo, v. 2, n. 1, p. 9-42, 1994. DOI: 10.1590/S0101-47141994000100002.
    https://doi.org/10.1590/S0101-4714199400...
    ).
  • 4
    Para a organização do Museu Histórico Nacional, Gustavo Barroso contou com o apoio do presidente da República, Epitácio Pessoa, para recolher objetos artísticos e históricos referentes ao passado nacional. O primeiro diretor do museu destacou, sobretudo, os feitos militares do período imperial, com ênfase para a celebração dos supostos heróis da guerra contra o Paraguai, como o Duque de Caxias e Osório. Cf. Magalhães (2006MAGALHÃES, Aline Montenegro. Culto da saudade na casa do Brasil: Gustavo Barroso e o Museu Histórico Nacional (1922-1959). Fortaleza: Museu do Ceará, 2006.).
  • 5
    Cf. Brefe (2005BREFE, Ana Claudia Fonseca. O Museu Paulista: Affonso de Taunay e a memória nacional (1917-1945). São Paulo: Editora Unesp , 2005.).
  • 6
    Capistrano de Abreu é reconhecido por muitos como precursor da historiografia moderna no Brasil e convertido em um símbolo nacional (GONTIJO, 2007GONTIJO, Rebeca. O “cruzado da inteligência”: Capistrano de Abreu, memória e biografia. Anos 90, Porto Alegre, v. 14, n. 26, p. 41-76, 2007.).
  • 7
    Cf. Anhezini (2011ANHEZINI, Karina. Um metódico à brasileira: a história da historiografia de Afonso de Taunay (1911-1939). São Paulo: Editora Unesp, 2011.).
  • 8
    Quando construído, o edifício-monumento, dado por finalizado em 1890, não foi pensado para sediar o Museu Paulista, o que só ocorreu em 1893, quando foram promulgadas as leis que designavam o edifício do monumento como local no qual seria instituído o Museu Paulista, regulamentado em 1894 (NERY, 2016NERY, Pedro. Acervo em movimento: uma coleção de arte para São Paulo. In: PICCOLI, Valéria; PITTA, Fernanda (dir.). Coleções em diálogo: Museu Paulista e Pinacoteca do Estado. São Paulo: Pinacoteca do Estado de São Paulo. Catálogo de exposição, 2016. p. 59-80., p. 61). Vide também Alves (2001ALVES, Ana Maria de Alencar. O Ipiranga apropriado: ciência, política e poder: o Museu Paulista (1893-1922). São Paulo: Humanitas, 2001.).
  • 9
    Cf. Assmann (2011ASSMANN, Aleida. Espaços da recordação: formas e transformações da memória cultural.Campinas: Editora da Unicamp, 2011.).
  • 10
    Cf. Oliveira (1997OLIVEIRA, Cecília Helena de Salles. Delimitação do lugar do grito: propostas e contradições. In: WITTER, José Sebastião (dir.). Museu Paulista: um monumento no Ipiranga: história de um edifício centenário e de sua recuperação. São Paulo: Fiesp , 1997. p. 213-225.).
  • 11
    Cf. Oliveira e Mattos (1999OLIVEIRA, Cecília Helena de Salles; MATTOS, Claudia Valladão de. O Brado do Ipiranga . São Paulo: Edusp , 1999.). Vide também Lima Junior e Nery (2019LIMA JUNIOR, Carlos; NERY, Pedro. From the “Paulista peasant” to the “Independence men”: interpretations under dispute over the national past in the Hall of Honor of Museu Paulista. Anais do Museu Paulista , São Paulo, v. 27, p. 1-47, 2019. DOI: 10.1590/1982-02672019v27e22d2.
    https://doi.org/10.1590/1982-02672019v27...
    ).
  • 12
    A pintura pode ser vista em todos os detalhes em https://bit.ly/3O2fsJ6.
  • 13
    Vale destacar que os projetos historiográfico, cenográfico (arquitetura e decoração) e expográfico/iconográfico de Taunay estabeleciam um contraponto às historiografias regionais (como a carioca e a pernambucana), entrando na batalha de narrativas identitárias ao forjar uma memória do passado que situava São Paulo como epicentro da formação do país (por meio do bandeirantismo) e da Independência. Desse modo, os movimentos contestatórios ocorridos na época da Colônia recordados na escadaria, como a Conjuração Mineira (1792) e a Revolução Pernambucana (1817), eram encadeados de modo que o último elo fosse o “7 de setembro de 1822”, com a independência proclamada em São Paulo (OLIVEIRA, 1999OLIVEIRA, Cecília Helena de Salles. O espetáculo do Ypiranga: mediações entre memória e história. 1999. Tese (Livre Docência) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 1999.).
  • 14
    Cf. Marins (2007), Dias (2013DIAS, Elaine. Os retratos de d. Pedro I e d. João VI no acervo do Museu Paulista. In: VALLE, Arthur; DAZZI, Camila; PORTELLA, Isabel. Oitocentos: intercâmbios culturais entre Brasil e Portugal. Rio de Janeiro: Seropédica, 2013. t. III. p. 177- 188.) e Pitta (2014PITTA, Fernanda Mendonça. Os pincéis escrevem a história no “Teatro da memória”: o trabalho artístico, intelectual e político de Benedito Calixto nas encomendas de retratos históricos do Museu Paulista (1900-1906). São Paulo: Pró-Reitoria de Pesquisa e Extensão da Universidade de São Paulo (USP), 2014. Relatório de Pós-Doutorado.). Estamos nos referindo aos seguintes retratos pintados pelo artista Benedito Calixto e pertencentes ao acervo do Museu Paulista da USP: Retrato de Pedro I, 1902, o.s.t.,140 x 100 cm; Retrato de José Bonifácio de Andrada, 1903, o.s.t., 141 x 100 cm; Domingos Jorge Velho e o locotenente Antonio Fernandes de Abreu, 1903, o.s.t., 140 x 99 cm.
  • 15
    Cf. Marins (2007). Vide, por exemplo, as pinturas: “Ciclo da caça ao índio”, de Henrique Bernadelli; “Ciclo dos criadores de gado”, de João Baptista da Costa; “Posse da Amazônia”, de Fernandes Machado e “Ciclo do Ouro”, de Rodolpho Amoedo. Todas essas pinturas, além das esculturas também analisadas por Marins, foram produzidas sob encomenda de Afonso Taunay especialmente para a escadaria do Museu durante os festejos de 1922.
  • 16
    Cf. Chiarelli (1998CHIARELLI, Tadeu. Anotações sobre arte e história no Museu Paulista. In: FABRIS, Annateresa (org.). Arte & política: algumas possibilidades de leitura. Belo Horizonte: C/ Arte, 1998. p. 21-46.).
  • 17
    Cf. Lima Junior (2015LIMA JUNIOR, Carlos. Um artista às margens do Ipiranga: Oscar Pereira da Silva, o Museu Paulista e a reelaboração do passado nacional. 2015. Dissertação (Mestrado em Estudos Brasileiros) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2015.).
  • 18
    Cf. Mattos (1999MATTOS, Claudia Valladão de. Da palavra à imagem: sobre o programa decorativo de Affonso Taunay para o Museu Paulista. Anais do Museu Paulista , São Paulo, v. 6, n. 1, p. 123-145, 1999. DOI: 10.1590/S0101-47141999000100006.
    https://doi.org/10.1590/S0101-4714199900...
    ). Uma das primeiras iniciativas de Taunay, em 1917, foi a organização do arquivo do museu, que foi incrementado, ao longo de sua gestão, com documentos relativos ao passado paulista. Ele chegou a lançar mão de fac-símiles de mapas acervados na Europa e fotografias de materiais informativos do que chamou de iconografia de São Paulo Antiga. Cf. Brefe, op. cit.
  • 19
    Cf. Lima e Carvalho (1993LIMA, Solange Ferraz de; CARVALHO, Vânia Carneiro de. São Paulo Antigo, uma encomenda da modernidade: as fotografias de Militão nas pinturas do Museu Paulista. Anais do Museu Paulista , São Paulo, v. 1, 1993. DOI: 10.1590/S0101-47141993000100012.
    https://doi.org/10.1590/S0101-4714199300...
    ), Christo (2002CHRISTO, Maraliz de Castro Vieira. Bandeirantes na contramão da história: um estudo iconográfico. Projeto História, São Paulo, v. 23, p. 307-335, 2002. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/34G3Y6F . Acesso em: 9 abr. 2022.
    https://bit.ly/34G3Y6F...
    ), Brefe, op. cit., Marins (2007aMARINS, Paulo César Garcez. Imagens recriam a história. São Paulo: Museu Paulista da USP, 2007a.) e Lima Junior, op. cit.
  • 20
    Para esse percurso definido por Taunay, cf. o guia redigido pelo autor (1937TAUNAY, Affonso d’Escragnolle. Guia da secção histórica do Museu Paulista. São Paulo: Imprensa Official do Estado, 1937.).
  • 21
    Data de mais de quarenta anos antes do de Américo o quadro Proclamação da Independência, pintado pelo francês François-René Moreau, hoje pertencente ao Museu Imperial de Petrópolis.
  • 22
    Cf. Coli (1998COLI, Jorge. A pintura e o olhar sobre si: Victor Meirelles e a invenção de uma história visual no século XIX Brasileiro. In: FreItas, Marcos Cezar (org.). Historiografia brasileira em perspectiva. São Paulo: Contexto, 1998. p. 375-404. ).
  • 23
    Cf. Schiavinatto (2021SCHIAVINATTO, Iara Lis. Between decontextualization and recontextualization: on the presence of Hercule Florence at the Museu Paulista by Afonso Taunay. In: BORREGO, Maria Aparecida de Menezes (dir.). Museu Paulista and Hercule Florence, São Paulo: Museu Paulista da USP , 2021. p. 525-548. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3jmcWzt . Acesso em: 24 jan. 2022.
    https://bit.ly/3jmcWzt...
    ).
  • 24
    Taunay (1922TAUNAY, Afonso d’Escragnolle. Grandes vultos da Independência brasileira. São Paulo: Cayeiras, 1922.).
  • 25
    Cf. Fleming e Florenzano (2011FLEMING, Maria Isabel D’Agostino; FLORENZANO, Maria Beatriz Borba. Trajetória e perspectivas do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP (1964-2011). Estudos Avançados, São Paulo, v. 25, n. 73, 217-228, 2011. DOI: 10.1590/S0103-40142011000300024.
    https://doi.org/10.1590/S0103-4014201100...
    ).
  • 26
    Dentre as iniciativas para a reabertura em 2022 está a adoção do nome pelo qual o museu é popularmente conhecido: “Museu do Ipiranga”, em referência ao bairro em que está localizado, na zona sul da cidade de São Paulo.
  • 27
    Ao assumir esse cargo de direção, Ulpiano Meneses de Bezerra trazia na bagagem anos de atuação em museus e na área do patrimônio. Na sua formação internacional, especializado em arqueologia, ele pesquisou regularmente em museus e colaborou efetivamente na organização do MAE-USP (1963-1968), sendo seu diretor entre 1968 e 1978. Somado a isso, integrou conselhos de órgãos públicos atuantes no campo de pesquisa e do patrimônio, como a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) (1977-1979), o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat, 1971-1987, 1996-2004, 2006-2007), e o Conselho do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) a partir de 2005; integrou os comitês brasileiros do Icom (International Council of Museums) e do Icomos (International Council of Monuments and Sites), ambos ligados à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Sua atuação acadêmica e institucional inscreveu-se em importantes linhas de força da década de 1980, que contextualizam esse processo de redefinição do Museu Paulista. Cf. Heymann e Lacerda (2011HEYMANN, Luciana Quillet; LACERDA, Aline Lopes de. Entrevista com Ulpiano Toledo Bezerra de Meneses. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 24, n. 48, 2011.).
  • 28
    Meneses (1990MENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. Plano Diretor 1990-1995. São Paulo, Museu Paulista da USP, 1999.).
  • 29
    Sobre a memória do mundo trabalho e de seus sujeitos históricos, vide o documentário Os libertários (1976), dirigido por Lauro Escorel Filho. Disponível em: https://bit.ly/3LXub6v.
  • 30
    Cf. Paoli, Sáder e Telles (1983PAOLI, Maria Célia; SÁDER, Eder; TELLES, Vera da Silva. Pensando a classe operária: os trabalhadores sujeitos ao imaginário acadêmico (notas de uma pesquisa). Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 6, p. 129-149, 1983.) e Chalhoub e Silva (2009CHALHOUB, Sidney; SILVA, Fernando Teixeira da. Sujeitos no imaginário acadêmico: escravos e trabalhadores na historiografia brasileira desde os anos 1980. Cadernos AEL, Campinas, n. 26, 2009.).
  • 31
    Meneses (1992aMENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. A história, cativa da memória? Para um mapeamento da memória no campo das ciências sociais. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros , São Paulo, v. 34, p. 9-23, 1992a. DOI: 10.11606/issn.2316-901X.v0i34p9-23.
    https://doi.org/10.11606/issn.2316-901X....
    , p. 9).
  • 32
    Cf. Hartog (2013HARTOG, François. Regimes de historicidade: presentismo e experiências do tempo. Belo Horizonte: Autêntica, 2013.). A tradução de Stephen Bann (1994BANN, Stephen. As invenções da história: ensaios sobre a representação do passado. Bauru: Editora Unesp, 1994.) ajudou a incrementar este debate no Brasil.
  • 33
    Cf. Meneses (1994MENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. Do teatro da memória ao laboratório da História: a exposição museológica e o conhecimento histórico. Anais do Museu Paulista , São Paulo, v. 2, n. 1, p. 9-42, 1994. DOI: 10.1590/S0101-47141994000100002.
    https://doi.org/10.1590/S0101-4714199400...
    ).
  • 34
    Cf. Starn (2005STARN, Randolph. A historian’s brief guide to the new museum studies. The American Historical Review, v. 110, n. 1, p. 68-98, 2005.). A publicação de Marlene Suano (1986SUANO, Marlene. O que é museu. São Paulo: Brasiliense, 1986.) atentava aos debates postos desse contexto. Data desse momento a “Declaração de Quebec”, assinada em outubro de 1984 no Canadá e que postulava os princípios orientadores de uma Nova Museologia mais atenta, entre outros pressupostos, aos sujeitos sociais como expectadores ativos no interior das instituições museais, entendidas não mais como um depositório de objetos antigos e ligados aos grandes vultos. Cf. Primo (2014PRIMO, Judite. O social como objeto da museologia. Cadernos de Museologia, Lisboa, v. 47, n. 3, 2014. DOI: 10.36572/csm.2014.vol.47.01.
    https://doi.org/10.36572/csm.2014.vol.47...
    ). Nesse sentido, vale ressaltar que o Museu Histórico Nacional, criado em 1922, também nos últimos vinte anos passou por um processo de alteração de seus procedimentos e concepções museológicas. Sobre a questão, cf. Magalhães e Bezerra (2014MAGALHÃES, Aline Montenegro; BEZERRA, Rafael Zamorano. 90 anos do Museu Histórico Nacional em debate (1922-2012). Rio de Janeiro: Museu Histórico Nacional, 2014.).
  • 35
    Sobre o debate internacional a respeito do material culture turn, cf. Hicks (2010HICKS, Dan. The material-cultural turn: event and effect. In: HICKS, Dan; BEAUDRY, Mary (ed.). The Oxford handbook of material culture studies. Oxford: Oxford University, 2010. p. 25-98. , p. 25-98).
  • 36
    O museu ainda contava com a Revista do Museu Paulista, criada pelo primeiro diretor Hermann Von Ihering em 1895 e dedicada, sobretudo, aos estudos das ciências naturais. Sérgio Buarque de Holanda, que esteve à testa da instituição de 1946 a 1956, também criou uma “Nova Série” para essa publicação, redirecionando o seu perfil para um caráter mais antropológico e etnográfico, enquanto os Anais do Museu Paulista, que passaram por uma posterior remodelagem na gestão de Ulpiano Bezerra de Meneses, tiveram apenas duas edições, as de números 13 e 14. Cf. Silva (2020SILVA, Tathianni Cristini da. O Museu Paulista de Mário Neme (1960-1973). Anais do Museu Paulista , São Paulo, v. 28, p. 1-30, 2020. DOI: 10.1590/1982-02672020v28e22.
    https://doi.org/10.1590/1982-02672020v28...
    ); Meneses (1993aMENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. Apresentação da nova série. Anais do Museu Paulista , São Paulo, v. 1, p. 5-6, 1993a. DOI: 10.1590/S0101-47141993000100001.
    https://doi.org/10.1590/S0101-4714199300...
    ).
  • 37
    Meneses (1997MENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. O museu e o problema do conhecimento. In: ANAIS DO I SEMINÁRIO SOBRE MUSEUS-CASA, n. 1, agosto de 1995, Rio de Janeiro. Anais […]. Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 1997. p. 17-48., p. 25).
  • 38
    Meneses, 1993aMENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. Apresentação da nova série. Anais do Museu Paulista , São Paulo, v. 1, p. 5-6, 1993a. DOI: 10.1590/S0101-47141993000100001.
    https://doi.org/10.1590/S0101-4714199300...
    , p. 6.
  • 39
    Id., 1992bMENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. Para que serve um museu histórico? In: Como explorar um museu histórico. São Paulo: Museu Paulista da USP , 1992b. p. 3-6. , p. 5. Conforme Ulpiano Bezerra de Meneses: “objetos revestidos de singularidade só pelo motivo da contaminação que sofreram em contato com figuras ou eventos históricos notáveis” (MENESES, 2010MENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. O museu e a questão do conhecimento. In: GUIMARÃES, Manoel Luiz Salgado; RAMOS, Francisco Régis Lopes (org.). Futuro do pretérito: escrita da história e história do museu. Fortaleza: Instituto Frei Tito de Alencar, 2010. p. 13-33., p. 25).
  • 40
    Em texto de 1983, Ulpiano Meneses já defendia que “os artefatos que constituem […] o principal contigente da cultura material - têm que ser considerados sob duplo aspecto: como produtos e como vetores das relações sociais” (MENESES, 1983MENESES, Ulpiano Bezerra de. A cultura material no estudo das sociedades antigas. Revista Brasileira de História, São Paulo, n. 115, 1983. DOI: 10.11606/issn.2316-9141.v0i115p103-117.
    https://doi.org/10.11606/issn.2316-9141....
    , p. 113, grifos do autor).
  • 41
    Meneses (1990MENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. Plano Diretor 1990-1995. São Paulo, Museu Paulista da USP, 1999., p. 2). Vide também Meneses (1993bMENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. A problemática da identidade cultural nos museus: de objetivo (de ação) a objeto (de conhecimento). Anais do Museu Paulista , São Paulo, v. 1, p. 207-222, 1993b. DOI: 10.1590/S0101-47141993000100014.
    https://doi.org/10.1590/S0101-4714199300...
    ).
  • 42
    Cf. Lima e Carvalho (1993LIMA, Solange Ferraz de; CARVALHO, Vânia Carneiro de. São Paulo Antigo, uma encomenda da modernidade: as fotografias de Militão nas pinturas do Museu Paulista. Anais do Museu Paulista , São Paulo, v. 1, 1993. DOI: 10.1590/S0101-47141993000100012.
    https://doi.org/10.1590/S0101-4714199300...
    ).
  • 43
    Meneses (1990MENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. Plano Diretor 1990-1995. São Paulo, Museu Paulista da USP, 1999.).
  • 44
    Id., 1994.
  • 45
    No caso do Museu Paulista, abrange a sua inscrição na pulsante paisagem urbana no bairro do Ipiranga.
  • 46
    Disponível em: https://bit.ly/3Kt0FF7.
  • 47
    Cf. Lima e Carvalho (2005LIMA, Solange Ferraz de; CARVALHO, Vânia Carneiro de. Cultura visual e curadoria em museus de História. Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre, v. 31, n. 2, p. 53-77, 2005.).
  • 48
    Santiago Júnior (2019SANTIAGO JÚNIOR, Francisco das Chagas Fernandes. A virada e a imagem: história teórica do pictorial/iconic/visual turn e suas implicações para as humanidades. Anais do Museu Paulista , São Paulo, v. 27, p. 1-51, 2019. DOI: 10.1590/1982-02672019v27e08.
    https://doi.org/10.1590/1982-02672019v27...
    , p. 404). Cf. o artigo de Meneses (2003MENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. Fontes visuais, cultura visual, história visual: balanço provisório, propostas cautelares. Revista Brasileira de História , São Paulo, v. 23, n. 45, p. 11-36, 2003. DOI: 10.1590/S0102-01882003000100002.
    https://doi.org/10.1590/S0102-0188200300...
    ).
  • 49
    Cf. Schiavinatto e Costa (2016SCHIAVINATTO, Iara Lis; COSTA, Eduardo Augusto (dir.). Cultura visual e história. São Paulo: Alameda, 2016.).
  • 50
    Por meio das exposições idealizadas pelo museu, efetiva-se a alfabetização museológica e visual do espectador.
  • 51
    Makino et al. (2003MAKINO, Miyoko et al. O Serviço de documentação textual e iconografia do Museu Paulista. Anais do Museu Paulista , São Paulo, v. 10, n. 1, p. 259-304, 2003. DOI: 10.1590/S0101-47142003000100014.
    https://doi.org/10.1590/S0101-4714200300...
    , p. 185-186).
  • 52
    O que significava se atentar tanto por parte do ofício do fotógrafo e sua inserção social quanto sobre as convenções de época possíveis de serem exploradas a partir das poses dos mais variados segmentos da sociedade que foram captados pelas lentes dos fotógrafos em seus estúdios.
  • 53
    Para um balanço de suas produções na área da fotografia, cf. Lima e Carvalho (2013LIMA, Solange Ferraz de; CARVALHO, Vania Carneiro de. Fotografias: usos sociais e historiográficos. In: LUCA, Tania Regina de; PINSKY, Carla Bassanezi (org.). O historiador e suas fontes. São Paulo: Contexto , 2013. p. 29-60. ). A própria relação historicamente forjada entre o museu e a fotografia é motivo de estudo por Solange Ferraz de Lima (2020LIMA, Solange Ferraz de. Museus e fotografia. In: SCHIAVINATTO, Iara Lis; MENESES, Patrícia (org.). A imagem como experimento: debates contemporâneos sobre o olhar. Vitória: Milfontes, 2020. p. 21-34. ). Nesse capítulo, a autora aborda o nascimento dessa relação fundamental e nuclear da cultura museológica a partir do Oitocentos.
  • 54
    Cf. Filippi, Lima e Carvalho (2002FILIPPI, Patrícia de; LIMA, Solange Ferraz de; CARVALHO, Vânia Carneiro de. Como tratar coleções de fotografias. São Paulo: Arquivo do Estado de São Paulo, 2002.).
  • 55
    Cf. Marins (2007aMARINS, Paulo César Garcez. Imagens recriam a história. São Paulo: Museu Paulista da USP, 2007a.).
  • 56
    Id., 2007bMARINS, Paulo Cesar Garcez. Nas matas com pose de reis: a representação de bandeirantes e a tradição da retratística monárquica europeia. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, São Paulo, v. 44, p. 77-104, 2007b. DOI: 10.11606/issn.2316-901X.v0i44p77-104.
    https://doi.org/10.11606/issn.2316-901X....
    .
  • 57
    Ibid.
  • 58
    O material educativo produzido pelo Museu a partir da exposição “Imagens Recriam a História”, pode ser conferido em: https://bit.ly/371hHMo.
  • 59
    Instituição anexa ao Museu Paulista, criada em 1923 e situada no interior de São Paulo.
  • 60
    Para maiores detalhes da exposição: https://bit.ly/375Ncop.
  • 61
    Viagens comerciais fluviais realizadas entre os séculos XVIII e início do XIX. Vide Nascimento e Borrego (2021NASCIMENTO, Ana Paula; BORREGO, Maria Aparecida de Menezes (dir.). Museu Paulista and the memories of the narratives of Aimé-Adrien Taunay e Hercule Florence. São Paulo: Museu Paulista da USP , 2021.).
  • 62
    Cf. Vieira (2018VIEIRA, Leonardo da Silva. Apontamentos acerca da política de aquisição de acervo no Museu Paulista (1990-2015). 2018. Dissertação (Mestrado em Museologia) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.).
  • 63
    Id., 2020VIEIRA, Leonardo da Silva. A aquisição de acervo no Museu Paulista (1990-2015). Anais do Museu Paulista , São Paulo, v. 28, p. 1-45, 2020. DOI: 10.1590/1982-02672020v28e21.
    https://doi.org/10.1590/1982-02672020v28...
    , p. 41.
  • 64
    Cf. Borrego (2019BORREGO, Maria Aparecida de Menezes. Perspetivas sobre a representação das monções no Museu Paulista e no Museu Republicano de Itu. Midas, [s. l.], v. 10, 2019.).
  • 65
    Cf. Félix e Rizzutto (2019FÉLIX, Rogério Ricciluca Matiello; RIZZUTTO, Márcia de Almeida. Aplicações da arqueometria no mobiliário de São Paulo do século XVIII: análises indiciárias e contextualização histórica. Anais do Museu Paulista , São Paulo, v. 27, p. 1-44, 2019. DOI: 10.1590/1982-02672019v27e10d1.
    https://doi.org/10.1590/1982-02672019v27...
    ).
  • 66
    Conforme já apontava Sérgio Buarque de Holanda no livro Monções, publicado em 1954, enquanto ocupava o cargo de diretor do Museu Paulista (1946-1956).
  • 67
    A produção dessa obra inseriu-se na pesquisa de doutoramento de Bruno Moreschi (2019MORESCHI, Bruno Seravali. Olhares mediados: aproximações empíricas e emancipadas em museus. 2019. Tese (Doutorado em Artes) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2019., 2021MORESCHI, Bruno Seravali. O Museu Paulista está fechado para obras: revisões críticas e colaborativas da pintura Independência ou Morte, de Pedro Américo, 2021. No prelo.). Por ocasião do museu fechado, em 2013, Moreschi, junto de pintores populares de São Paulo, replicou em grandes dimensões o quadro de Pedro Américo. Essa réplica foi exposta no vão livre do Sesc Ipiranga. Tal escolha, que sujeitava a tela canônica às intempéries do tempo (chuva, sol, poeira), desestabilizava os próprios preceitos da pintura histórica, que visava ser eterna, e não efêmera; servir “aos esplendores da imortalidade”, como defendeu Pedro Américo (MELLO, 1999MELLO, Pedro Américo de Figueiredo. O brado do Ipiranga ou a Proclamação da Independência do Brasil. In: OLIVEIRA, Cecília Helena de Salles; MATTOS, Cláudia Valladão de. O Brado do Ipiranga. São Paulo: Edusp, 1999., p. 27).
  • 68
    Ibid., p. 26.
  • 69
    Para as informações a respeito da reformulação do Museu Paulista, estamos nos baseando na entrevista gentilmente concedida aos autores pela docente Vania Carneiro de Carvalho, que pode ser conferida nas plataformas digitais da Sociedade de Estudos dos Oitocentos (SEO). Cf. Conversando sobre o Novo Museu do Ipiranga. Disponível em: https://bit.ly/3O2wIhg.
  • 70
    Esse diálogo com o objetivo de construção coletiva de informações sobre o acervo do museu foi possível também a partir da parceria com o “Wiki Movimento Brasil” para a realização de aplicativos junto da Wikipédia, promovida desde o fechamento do museu em 2013. Essas iniciativas contribuíram, igualmente, para qualificar e difundir o acervo. Para maiores informações: https://bit.ly/37cIMMm.
  • 71
    Para melhor adequar os espaços expositivos às demandas de acessibilidade, recursos como tela de multimídia, planta tátil e objetos cenográficos integram de maneira significativa a expografia.
  • 72
    Vale observar que esse projeto vencedor permitiu uma maior integração entre o edifício do museu e os jardins, posicionando o ponto de entrada abaixo da esplanada, em frente ao espelho de água criado no centenário da Independência em 1922.
  • 73
    Esses e outros setores, como a biblioteca, o serviço de documentação textual e iconografia, foram realocados em casas alugadas nas imediações do bairro do Ipiranga. Esse desmembramento que ocorreu a partir de 2013 permitiu o esvaziamento do museu para sua reforma.
  • 74
    São elas: a esplanada do museu, o andar térreo, o Salão de Honra, o andar (torres) até então ocupado por áreas técnicas, o mezanino e o mirante.
  • 75
    Cf. Mello (2004MELLO, Evaldo Cabral de. A outra Independência: o federalismo pernambucano de 1817 a 1824. São Paulo: Editora 34, 2004.).
  • 76
    Dentro dessa concepção, o museu não é derivado de um processo hierarquizado de produção do conhecimento, em efeito dominó em que o docente produz e repassa para o educativo fazer a difusão. Antes, todos os setores (educativo, documental, catalogação, expositivo e museológico) trabalham de maneira articulada, o que resulta em uma curadoria muito integrada.
  • 77
    Esse eixo contará ainda com projetos culturais de interlocuções com as exposições na forma de “multimídias de contrapontos”. A intenção é que projetos premiados por um edital do museu possam fazer proposições, dos mais variados formatos, que desestabilizem os discursos institucionais. Dessa maneira, o museu assume uma vontade de interlocução contínua com a sociedade.
  • 78
    Inclui-se ainda a possibilidade de explorar os diversos aspectos materiais da própria pintura, como a alteração de sua coloração, os “arrependimentos” do artista que ficaram invisibilizados pelas camadas de tintas, e só foram possíveis graças ao restauro, que contou, para além dos profissionais da área de conservação do museu, liderado por Yara Petrella, também com os da área de física da USP, capitaneados pela Márcia Rizzutto. Cf. https://bit.ly/3xhEmi3.
  • 79
    Agradecemos a Michelli Scapol Monteiro pelas informações gentilmente fornecidas em entrevista realizada em 17 de julho de 2021. A pesquisadora, em seu pós-doutoramento, realizado no Museu Paulista com apoio da Fapesp, supervisionada pelo prof. Paulo César Garcez Marins, persegue a trajetória social do quadro Independência ou morte!, e atua na curadoria da exposição do Salão de Honra do Museu. A entrevista está disponibilizada no canal da Sociedade Brasileira de Estudos do Oitocentos (SEO): https://www.youtube.com/watch?v=FG4V4xVv8GI.
  • 80
    Para a reabertura, o museu contará com a exposição de curta duração “Memórias da Independência”, que dialogará diretamente com o eixo monumental idealizado por Taunay na década de 1920, e apresenta elementos que permitem ampliar os debates em torno da emancipação política brasileira gestados em outras localidades para além de São Paulo, como Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Sul etc.
  • 81
    Cf. Carvalho, Marins e Lima (2021CARVALHO, Vania Carneiro de; MARINS, Paulo César Garcez; LIMA, Solange Ferraz de. Curadoria em museus de história. Anais do Museu Paulista, São Paulo, v. 29, p. 1-24, 2021. DOI: 10.1590/1982-02672021v29e40.
    https://doi.org/10.1590/1982-02672021v29...
    ).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    04 Jul 2021
  • Aceito
    14 Mar 2022
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