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Somos todes youtubers? Indústria 4.0 e precarização do trabalho docente em tempos de pandemia

Are we all youtubers? Industry 4.0 and precariousness of teaching work in times of pandemic

Resumo:

Sob a justificativa de que são necessárias ao isolamento social nem à preservação da saúde pública, as plataformas digitais nestes tempos de pandemia de covid-19 se tornaram parte do cotidiano profissional de diversas áreas do trabalho, incluindo a da educação. A era informacional da Indústria 4.0 se intensificou abruptamente à vida universitária. Examinamos alguns dos nefastos impactos do Ensino Emergencial Remoto para a docência em Serviço Social: que formação para qual projeto societário? Somos todes youtubers?

Palavras-chave:
Covid-19; Indústria 4.0; Plataforma digital; Ensino Remoto Emergencial; Serviço Social

Abstract:

Under the justification that they are necessary for social isolation and the preservation of public health, digital platforms in these times of the covid-19 pandemic have become part of the professional routine in various areas of work, including education. The information age of Industry 4.0 abruptly intensified into university life. We examine some of the disastrous impacts of Remote Emergency Education on Social Work teaching: which training for which society project? Are we all youtubers?

Keywords:
Covid-19; Industry 4.0; Digital platform; Emergency Remote Education; Social Work

Introdução: das desigualdades ao comércio digital milionário em tempos de pandemia

Desde o início de 2020, a grande maioria dos países do globo terrestre foi assombrada pela pandemia da covid-19. Sem vacinas e sem acenar com exatidão sobre como conter de forma definitiva a propagação do vírus, o isolamento social passou a ser a principal política de Estado como saída para a crise de saúde pública, sem considerar que o confinamento “expressa e perpetua uma profunda desigualdade social, racial e de sexo em diferentes formações sociais” (Falquet; Cisne; Gonçalves, 2021FALQUET, J.; CISNE, M.; GONÇALVES, R. Pandemia global e o “novo” pacto da brancura heteropatriarcal e capitalista. In: NOGUEIRA, C. M. et al. (org.). Trabalho, movimentos e políticas sociais: diálogos com o Serviço Social. São Paulo: Rosivan Diagramação & Artes Gráficas, 2021. p. 223-241., p. 224). A pandemia aprofundou e tornou ainda mais visível a disparidade social entre países e no interior deles, sobretudo naqueles de economia dependente. Tanto nos países de capitalismo avançado como dependente, a regra foi a mesma: a exposição dos/as trabalhadores/as ao vírus sob o argumento de que são serviços essenciais. Imigrantes de Nova York ou de Paris, precarizados/as de Bogotá ou de São Paulo percorrem cotidianamente longos quilômetros em motos e bicicletas para levar comidas e tudo o que mais estiver ao alcance de um clique de aplicativo de celular. Nas cidades brasileiras, uma multidão de jovens, sobretudo negros/as, nunca pôde sair das ruas para continuar carregando, literalmente, nas costas os pequenos confortos a quem tem o privilégio do confinamento.

No país tropical e bonito por natureza, o trabalho das empregadas domésticas também foi inserido nos serviços essenciais. Os estados do Pará e de Pernambuco saíram à frente para garantir uma gentileza à cara gente branca. Apressaram-se em formalizar a inserção do emprego doméstico ou, melhor, a própria empregada doméstica como um serviço essencial. Diante das críticas que se seguiram, os demais estados nem precisaram se expor. O emprego doméstico seguiu seu curso sem que se questionasse a exposição das trabalhadoras, tanto no contato com as famílias empregadoras como no trajeto em transportes superlotados até seus locais de trabalho. Não por acaso, a primeira vítima da covid-19 no Brasil, no estado do Rio de Janeiro, foi a dona Cleonice Gonçalves,1 1 Como Lélia Gonzalez (2020), acreditamos que trabalhadores/as negros/as têm nome e sobrenome, não deixando margem aos apelidos pejorativos que alicerçam o racismo. uma empregada doméstica negra, contagiada pela patroa branca que havia voltado da Itália (à época epicentro da pandemia) e não se preocupou em se isolar nem em manter a trabalhadora fora de riscos. Também não é obra do acaso a morte da criança negra, Miguel, de cinco anos, que acompanhava sua mãe ao emprego porque sua escola estava fechada. A mãe, a senhora Mirtes Renata Santana, “trabalhadora doméstica, assim como milhares de outras trabalhadoras, que não foram dispensadas de seus serviços em meio à pandemia do coronavírus para não perderem o emprego ou terem seus salários diminuídos, teve de trabalhar e se expor ao vírus” (Parks; Cacau, 2021PARKS, L.; CACAU, C. Entrevista com Mirtes Renata Santana. In: PARKS, L.; ASSIS, O.; CACAU, C. (org.). Mulheres negras e marxismo. São Paulo: Iskra, 2021. p. 167-177., p. 167); e não teve o direito ao isolamento para se dedicar ao filho. Era obrigada a cuidar dos cachorros, enquanto a impaciente madame deixava o garoto sozinho em elevador que o conduziria ao acidente fatal.

No pós-abolição, à medida que o Estado brasileiro não implementou políticas de inserção dos/as trabalhadores/as ex-escravizados/as ao mercado de trabalho, as mulheres negras se viram obrigadas a voltarem à (ou nunca saírem da) casa-grande. Agora ocupam o conhecido “quarto de empregada”, um espaço insalubre situado na área de serviço dos apartamentos (mesmo os minúsculos) ou nos fundos das residências (Ávila; Ferreira, 2020ÁVILA, M. B.; FERREIRA, V. Trabalho doméstico remunerado: contradições estruturantes e emergentes nas relações sociais no Brasil. Psicologia & Sociedade, Belo Horizonte, v. 32, p. 1-13, 2020., p. 3). Aumentou a pressão de empregadores/as para que as trabalhadoras domésticas permaneçam nos domicílios em que prestam serviços, garantindo às famílias empregadoras o confinamento social como forma de proteção ao contágio da covid-19. Sob a ideologia da cordialidade, as relações violentas entre casa-grande e senzala continuam intactas.

Com a expansão do vírus, a classe trabalhadora, na sua interligação de gênero e raça/etnia, ficou mais exposta em razão das precárias condições de moradia, de saúde, de equipamentos sanitários etc. A pandemia encolheu economias e levou milhões de trabalhadores/as à extrema pobreza ou à morte, sobretudo os/as negros/as (Faustino; Gonçalves, 2020FAUSTINO, D.; GONÇALVES, R. A nova pandemia e as velhas relações coloniais, patriarcais e racistas do capitalismo brasileiro. Lutas Sociais, São Paulo, v. 24, n. 45, p. 275-289, 2020.). As pesquisas realizadas, em maio de 2021, “por pesquisadores independentes para mais de 5.500 municípios mostram que 55% dos pacientes negros, hospitalizados com covid-19 em estado grave, morreram em comparação com 34% dos pacientes brancos” (Araújo; Caldwell, 2021ARAÚJO, E. M.; CALDWELL, K. L. Por que a covid-19 é mais mortal para a população negra? In: ASSOCIAÇÃO Brasileira de Saúde Coletiva (org.). População negra e covid-19. Rio de Janeiro: Abrasco, 2021. p. 8-10., p. 19).

Por outro lado, os homens brancos que compõem o seleto Top 10 dos mais abastados do planeta viram suas fortunas aumentarem vertiginosamente. A disparada da utilização do comércio digital beneficiou a Amazon, que viu seu valor de mercado subir a 1,6 trilhão de dólares e o patrimônio de seu proprietário, Jeff Bezos, ter um incremento de 78 bilhões de dólares. Na lista dos que ficaram ainda mais ricos em 2021, estão os fundadores do Google, Larry Page e Sergey Brin, “graças a um salto de 62% nas ações da Alphabet, controladora do Google” (Peterson-Withorn, 2021PETERSON-WITHORN, C. Bilionários de todo o mundo ficaram US$ 1,6 trilhão mais ricos em 2021. Forbes Money, 12 dez. 2021. Disponível em: Disponível em: https://forbes.com.br/forbes-money/2021/12/bilionarios-de-todo-o-mundo-ficaram-us-16-trilhao-mais-ricos-em-2021/ . Acesso em: 17 dez. 2021.
https://forbes.com.br/forbes-money/2021/...
, n. p.). O crescimento no chamado e-commerce é avaliado como um resultado sem retorno de novos hábitos intensificados durante a pandemia. No melhor dos mundos dos abastados, trabalhadores/as são jogados/as à informalidade predatória e chamados/as ao autogerenciamento de si e do trabalho por meio de um clique em aplicativos (Abílio, 2019ABÍLIO, L. C. Da revenda dos produtos da Natura ao motorista Uber: a generalização do trabalho informal - entrevista, 2019. Fórum de debates e entrevistas: saúde do trabalhador e da trabalhadora e Serviço Social. [S. l.: s. n.], 2019. Disponível em: Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=9Qx_VUWMl6w . Acesso em: 5 mar. 2020.
https://www.youtube.com/watch?v=9Qx_VUWM...
).

A internet se tornou a principal ferramenta não apenas para o consumo, mas também para o próprio desenvolvimento de inúmeras atividades laborais, como as do trabalho docente que ocupa um lugar central neste ensaio. Recorremos à ampla pesquisa bibliográfica para abordar as transformações tecnológicas, sobretudo as do trabalho realizado por meio de plataformas digitais. Indagamos sobre o sentido da docência ante o Ensino Remoto Emergencial (ERE). A experiência profissional das autoras, como docentes e pesquisadoras implicadas na Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS/Regional Sul II), possibilitou que participassem dos debates acerca do estágio e do ERE na graduação e na pós-graduação em Serviço Social nestes dois anos de vigência da pandemia da covid-19.

1. Indústria 4.0 e a precariedade do trabalho: quando a pandemia é a hiperconexão2 2 A referência à pandemia como hiperconexão vem de Schwab e Malleret (2020).

Embora a pandemia da covid-19 dê a impressão de que seja a responsável direta pelas intensas (e precárias) mudanças nas relações de trabalho, este fenômeno já estava em curso como parte de um complexo processo de reestruturação produtiva (Souza; Anunciação, 2020SOUZA, E. Â.; ANUNCIAÇÃO, L. Narrativas de sofrimento e trabalho profissional do Serviço Social da Previdência Social em tempos de Indústria 4.0. Serviço Social & Sociedade, São Paulo: Cortez, n. 138, p. 215-241, 2020.). Em meio à calamidade sanitária, experiências digitais foram amplamente disseminadas sob a justificativa de que eram necessárias para o isolamento social como meio de preservar a saúde pública, acelerando investimentos na hiperconexão e no uso de plataformas em diversas áreas do trabalho, incluindo a da educação, como veremos adiante. Do ponto de vista do trabalho, ao mesmo tempo que cresceu o desemprego, aumentaram as atividades executadas on-line.

O capital tem realizado grandes investimentos em Ciência e Tecnologia, o que provoca profundas mudanças estruturais nas sociedades e, sobretudo, no mundo do trabalho. As tecnologias digitais que, nos anos de 1990, ganharam visibilidade a partir das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), agora na segunda década do século XXI são exponenciadas, em especial com o crescimento dos oligopólios empresariais, os quais detêm o domínio global sobre o trabalho e sobre os dados produzidos diariamente em interações na internet, confirmando que “quem domina a tecnologia avançada também domina o mundo” (Morozov, 2018MOROZOV, E. Big Tech: a ascensão dos dados e a morte da política. São Paulo: Ubu, 2018., p. 11). Para a autora, o domínio do mundo digital, sobretudo o das empresas do Vale do Silício (Google, Alphabet, Amazon), está organizado para agir sem regulamentação. Todo clique em serviços ou interações sociais na internet pode ser captado e monetizado, até mesmo sensações como as de humor são apropriadas pelas grandes empresas de Tecnologia da Informação ou Big Data para fins mercantis.

Esse processo de expansão das TICs ocorre num momento em que as democracias sofrem sérios riscos. Aliás, é parte do mecanismo, pois a venda dos dados captados pelos algoritmos pode servir a interesses políticos, incluindo a definição de governos. Alphabet e Facebook, por exemplo, têm o poder de “ajudar” a definir atores políticos para o aparelho de Estado, segundo os interesses do capital (Morozov, 2018MOROZOV, E. Big Tech: a ascensão dos dados e a morte da política. São Paulo: Ubu, 2018.). Esse fenômeno envolve a apropriação de informações, curtidas e cliques por meio dos quais é possível criar um perfil de usuárias/os e de suas preferências, resultando em mais informações armazenadas em nuvem e em aplicativos que acumulam dados que, por sua vez, são minerados e vendidos para fins estranhos aos fornecidos a princípio, gerando enormes lucros e, consequentemente, poder a quem os detém.

Paulo Galo (2021GALO, P. Precarização e rebeldia na garupa de uma moto. Outras Palavras, 23 abr. 2021. Disponível em: Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=YGDcChhxVLI&t=56s . Acesso em: 2 jun. 2021.
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, n. p.), trabalhador dos serviços de entrega por meio de aplicativo (app), em entrevista concedida ao jornal Outras Palavras, afirmou que estamos em uma “lógica de exploração muito sofisticada”. O cadastro em um aplicativo é fonte para conhecer o grau de subsunção ao capital e para definir o momento exato da substituição da força de trabalho ou, ainda, saber “até quantas horas diárias de trabalho é possível aguentar”. Na prática, o que ocorre é um controle do capital sobre os/as trabalhadores/as, mas dando a ilusão de que eles/as gerenciam sua jornada de trabalho, apesar das perdas da proteção social e do trabalho.

Esse processo denominado uberização impõe uma lógica de trabalho por app que resulta numa forma de escravidão contemporânea: “Eu fui atrás de emprego de motoboy, não tinha emprego de motoboy; eu tive que me cadastrar em um emprego de aplicativo” (Galo, 2021GALO, P. Precarização e rebeldia na garupa de uma moto. Outras Palavras, 23 abr. 2021. Disponível em: Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=YGDcChhxVLI&t=56s . Acesso em: 2 jun. 2021.
https://www.youtube.com/watch?v=YGDcChhx...
, n, p.). Para as empresas contratantes, os serviços que ofertam são apenas a realização da conexão entre elas e os/as usuários/as. Os/as trabalhadores/as cadastrados/as caracterizam-se apenas como “parceiros/as”, eximindo-as de qualquer responsabilidade. Os gastos advindos do exercício da função são arcados pelos/as trabalhadores/as (Manzano; Krein, 2020MANZANO, M.; KREIN, A. A pandemia e o trabalho de motoristas e entregadores por aplicativos no Brasil. Cesit - Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho, 2020. Disponível em: Disponível em: https://www.cesit.net.br/wp-content/uploads/2020/07/MANZANO-M-KREIN-A.-2020_A-pandemia-e-os-motoristas-e-entregadores-por-aplicativo.pdf . Acesso em: 15 nov. 2021.
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).

As tecnologias digitais causaram rupturas à terceira revolução industrial, sendo a velocidade em que as descobertas são feitas a maior diferença no conjunto de mudanças desencadeadas neste processo ininterrupto. Tais inovações, além do desemprego generalizado, ocorrem sem que haja preocupação alguma com o ecossistema. Seguem em ritmo acelerado e na mesma velocidade em que produzem uma quantidade exorbitante de lixo e de destruição ambiental (Schwab, 2016SCHWAB, K. A quarta Revolução Industrial. São Paulo: Edipro, 2016.; Wallace, 2020WALLACE, R. Pandemia e agronegócio: doenças infecciosas, capitalismo e ciência. São Paulo: Elefante, 2020.).

Os ideais comunitários que os algoritmos prometiam, como exemplificado pela experiência californiana do Vale do Silício, não passaram de utopia. O sistema de cooperativismo via compartilhamento (de habitação, viagens, refeições que poderiam ser degustadas por estranhos etc.) resultou em corporações gigantescas, como Uber, Airbnb, Lyft, TaskRabbit, iFood, Uber Eats, que estão entre as empresas mais lucrativas e poderosas do mundo (Slee, 2017SLEE, T. Uberização: a nova onda do trabalho precarizado. São Paulo: Elefante, 2017.). Uma das consequências mais imediatas deste capitalismo de plataforma é o controle de dados pelas gigantes do mundo digital (Slee, 2017SLEE, T. Uberização: a nova onda do trabalho precarizado. São Paulo: Elefante, 2017.; Zuboff, 2018ZUBOFF, S. Big other: capitalismo de vigilância e perspectiva para uma civilização de informação. In: BRUNO, F. et al. (org.). Tecnopolíticas da vigilância: perspectivas da margem. São Paulo: Boitempo, 2018. p. 17-68.; Fernandes, 2019FERNANDES, V. C. R. A distopia empírica do capitalismo digitalizado: novas formas de controle, reordenamento econômico, político e social no marco da Indústria 4.0. In: SOUZA, E. A.; SILVA, M. L. O. Trabalho, questão social e Serviço Social: a autofagia do capital. São Paulo: Cortez, 2019. p. 61-73.), que utilizam as informações coletadas como lhes convêm, colocando em risco a democracia e promovendo conteúdos falsos e virais, em especial de ódio que, “infelizmente, vende bem mais que a solidariedade” (Morozov, 2018MOROZOV, E. Big Tech: a ascensão dos dados e a morte da política. São Paulo: Ubu, 2018., p. 12).

A conexão em nuvem impõe o aprofundamento do neoliberalismo, pois exige do Estado um ajuste fiscal permanente e uma constante remoção de legislações protetoras conquistadas por meio de lutas históricas dos/as trabalhadores/as (Souza, 2021SOUZA, E. Â. A pandemia de covid-19 e o teletrabalho na Previdência Social (PS). Caderno CRH, Salvador, v. 34, p. 1-17, 2021.). Trata-se de uma ambição disruptiva do capitalismo de plataforma (Morozov, 2018MOROZOV, E. Big Tech: a ascensão dos dados e a morte da política. São Paulo: Ubu, 2018.), que resulta em capitalismo de vigilância (Zuboff, 2018ZUBOFF, S. Big other: capitalismo de vigilância e perspectiva para uma civilização de informação. In: BRUNO, F. et al. (org.). Tecnopolíticas da vigilância: perspectivas da margem. São Paulo: Boitempo, 2018. p. 17-68.). Ambas as modalidades exportam mundialmente seus negócios, desafiando as regras e as democracias de vários países aonde chegam, o que desafia a classe trabalhadora do mundo todo a enfrentar a precarização das relações de trabalho, com pagamentos por vouchers, trabalho part-time, perda de direitos etc. O agravamento é ainda maior nos países de capitalismo dependente, em que a classe trabalhadora não teve a experiência de um sistema de proteção social alinhado ao Estado de Bem-Estar Social e onde as relações precárias de trabalho sempre foram determinantes para rebaixar o custo do trabalho (Souza; Silva, 2019SOUZA, E. Â.; SILVA, M. L. O. Trabalho, questão social e Serviço Social: a autofagia do capital. São Paulo: Cortez, 2019.). Todavia, a ampliação do trabalho morto e de maquinário digital comprime no mundo todo as diferenças entre trabalhadores/as, que agora são submetidos/as à mesma e nova era da escravidão digital (Antunes, 2018ANTUNES, R. O privilégio da servidão: o novo proletariado de serviços na era digital. São Paulo: Boitempo, 2018.). Centralizar uma enorme quantidade de pessoas em busca de trabalho é uma de suas características. São os/as trabalhadores/as just in time, isto é, só recebem remuneração por atividade cumprida, como enfatizou Ludmila Abílio (2019ABÍLIO, L. C. Da revenda dos produtos da Natura ao motorista Uber: a generalização do trabalho informal - entrevista, 2019. Fórum de debates e entrevistas: saúde do trabalhador e da trabalhadora e Serviço Social. [S. l.: s. n.], 2019. Disponível em: Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=9Qx_VUWMl6w . Acesso em: 5 mar. 2020.
https://www.youtube.com/watch?v=9Qx_VUWM...
).

Esses mecanismos provenientes da Indústria 4.0 foram acelerados durante a pandemia de covid-19, que revelou uma crise do capital sem precedentes. Para Schwab e Malleret (2020SCHWAB, K.; MALLERET, T. Covid-19: the great reset. [S. l.]: Forum Publishing, 2020.), nem a crise econômica dos anos de 1930 e tampouco a crise de 2008 impactaram a economia e o emprego tão abruptamente como a que está em curso. As crises anteriores tiveram, em média, um tempo de dez anos para que fossem sentidas geralmente na queda do PIB e nas taxas de desemprego. Nestes dois anos de pandemia, os impactos foram imediatos, resultando no colapso econômico com efeitos drásticos sobre os empregos, sendo mais ou menos piores de acordo com as ações dos governos para lidarem com a crise3 3 O que implica a criação de políticas públicas de transferência de renda às populações mais afetadas e também o fortalecimento da política de saúde pública, Sistema Único de Saúde (SUS) e promoção de campanhas (e fornecimento) de vacinação em massa, com vista à preservação da vida e um retorno a alguma “normalidade”. (Schwab; Malleret, 2020SCHWAB, K.; MALLERET, T. Covid-19: the great reset. [S. l.]: Forum Publishing, 2020.).

2. Plataformas digitais e intensificação do trabalho docente: somos todes youtubers?

Adeptos/as da Indústria 4.0 reconhecem que trabalhadores/as sem qualificação não terão espaço com as mudanças no mundo do trabalho, portanto inúmeros postos desaparecerão. Porém, consideram que cada posto de trabalho fechado será substituído por uma nova função. Um prognóstico que esbarra na realidade concreta de desempregados (cerca de 14,4 milhões), desalentados (em torno de 5 milhões) e das contratações precárias de trabalho no Brasil nestes anos de pandemia. O vírus mais deletério, que pavimentou o caminho da devastação social e sanitária, foi “o vírus do neoliberalismo” (Santana; Antunes, 2021SANTANA, M.; ANTUNES, R. A pandemia da uberização e a revolta dos precários. Le Monde Diplomatique - Brasil, 30 abr. 2021. Disponível em: Disponível em: https://diplomatique.org.br/a-pandemia-da-uberizacao-e-a-revolta-dos-precarios/ . Acesso em: 17 dez. 2021.
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, n. p.). A classe trabalhadora experimentou efeitos ainda piores da precarização do trabalho a partir do golpe de 2016, com a introdução no cenário político e econômico do projeto destrutivo da PEC do fim do mundo, que congelou por 20 anos os investimentos em políticas públicas. O saldo foi “explosão do desemprego, precarização, informalidade e trabalho cada vez mais intermitente. Tudo isso, em uma sociedade já bastante desigual, produziu uma ambiência mais do que favorável para o avanço destrutivo do vírus” (Santana; Antunes, 2021SANTANA, M.; ANTUNES, R. A pandemia da uberização e a revolta dos precários. Le Monde Diplomatique - Brasil, 30 abr. 2021. Disponível em: Disponível em: https://diplomatique.org.br/a-pandemia-da-uberizacao-e-a-revolta-dos-precarios/ . Acesso em: 17 dez. 2021.
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, n. p.).

A crise sanitária, portanto, escancarou a precarização que já existia e a aprofundou, inclusive acelerando processos que impuseram novas formas de trabalho sem que houvesse tempo para compreensão, capacitação, adaptação às ferramentas de inovações tecnológicas. Desde o início da pandemia, milhões de trabalhadores/as passaram a desenvolver suas atividades laborais remotamente. Considerando as problematizações ao longo deste artigo, é preciso ultrapassar o léxico e a retórica de que as novas formas organizacionais garantem melhores condições à classe trabalhadora. Ao contrário, o que ocorre é uma verdadeira corrosão da legislação protetora do trabalho, ampliando as formas mais arcaicas de exploração capitalista de classe (Antunes, 2018ANTUNES, R. O privilégio da servidão: o novo proletariado de serviços na era digital. São Paulo: Boitempo, 2018.). Como ideologia capaz de alcançar com a máxima rapidez seus objetivos, o capital impõe uma narrativa que disfarça sua natureza destrutiva, que atinge o meio ambiente, as relações de trabalho e a própria humanidade (Antunes, 2020ANTUNES, R. Coronavírus: o trabalho sob fogo cruzado. São Paulo: Boitempo, 2020.). E escamotear “o que efetivamente significam, tem sido um ingrediente central para o dito sucesso das plataformas e aplicativos” (Antunes; Filgueiras, 2020ANTUNES, R.; FILGUEIRAS, V. Plataformas digitais, uberização do trabalho e regulação no capitalismo contemporâneo. Contracampo, Niterói, v. 39, n. 1, p. 27-43, 2020., p. 29).

Neste movimento de esconder para atingir objetivos distantes dos interesses da classe trabalhadora, o trabalho realizado por meio das plataformas digitais se expandiu velozmente, inclusive na educação. Apesar da imprecisão conceitual, para os objetivos deste artigo empregaremos o termo Ensino Emergencial Remoto (ERE), que alguns/algumas consideram como teletrabalho e outros/as, como home office, para examinar o impacto dessa modalidade na formação em Serviço Social.

Desde o início da pandemia, cerca de dez milhões de trabalhadores/as passaram a desenvolver suas atividades laborais remotamente. Esse fenômeno, que inclui o teletrabalho e o home office, transferiu para o interior das casas as atividades antes realizadas fora do espaço doméstico. Cabe enfatizar que tanto o teletrabalho como o home office têm sido utilizados como equivalentes, embora a legislação trabalhista atribua sentidos diferentes a cada um.

O primeiro tem como característica principal o fato de que sua execução só se realiza por meio de conectividade ou rede de comunicação. Definição que não é unívoca, mas diz respeito a um “universo de organização do trabalho, referindo-se à atual tendência das atividades laborais serem realizadas com uso de meios telemáticos sem necessidade de deslocamento do trabalhador ao local onde os resultados devem ser apresentados” (Rocha; Amador, 2018ROCHA, C. T. M.; AMADOR, F. S. O teletrabalho: conceituação e questões para análise. Cadernos EBAPE.BR, Rio de Janeiro, v. 16, n. 1, p. 152-162, 2018., p. 153).

Diferentemente do teletrabalho, o home office implica a execução das tarefas no espaço doméstico, isto é, na casa do/a trabalhador/a. Do ponto de vista da legislação, o home office é uma extensão das atividades executadas na instituição empregadora, em princípio não alterando a jornada de trabalho, o salário nem a proteção social. O teletrabalho, por sua vez, é ideologicamente apresentado como a possibilidade de o/a contratado/a gerir seu tempo de trabalho da melhor forma que lhe convir, negociando com a empresa empregadora prazos, jornada de trabalho, salário etc.

Na área da educação, as transformações tecnológicas também correspondem às novas exigências do capital: redução da carga horária, dos conteúdos, do tempo de graduação etc. para atender ao mercado de trabalho. Reduz-se o tempo de formação nos cursos, mas se expandem os panfletos e as teorias pós-modernas, alheios às análises de totalidade. Embora essas mudanças estivessem em curso, a pandemia da covid-19 tem sido utilizada para justificar a ruptura com o ensino presencial, revelando um giro de imposições para o trabalho na educação e um desgaste na relação de ensino-aprendizagem. De um dia para o outro, a comunidade acadêmica de diversas áreas de conhecimento e com as mais variadas inserções (da educação infantil ao ensino superior; de instituições privadas e públicas) teve de aderir às plataformas digitais para garantir a formação.

Tarefa nada fácil, em especial num país marcado pelo abismo da desigualdade social em sua imbricação com as relações de gênero, de raça/etnia e de regionalidade. Um estudo sobre a docência em tempos de pandemia - com formulários respondidos por 15.654 professores/as das redes públicas da educação básica de todos os estados da federação - revelou que 89% desse contingente não tinha familiaridade alguma com as plataformas digitais e que havia uma disparidade entre as regiões no que concerne à disponibilização dos recursos tecnológicos: o Sul e o Sudeste dispondo de mais suporte das redes de ensino para a realização de aulas remotas (Oliveira; Pereira Júnior, 2020OLIVEIRA, D. A.; PEREIRA JÚNIOR, E. A. Trabalho docente em tempos de pandemia: mais um retrato da desigualdade educacional brasileira. Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 14, n. 30, p. 719-735, 2020., p. 730). É preciso ainda considerar a disparidade no interior das regiões impulsionada pela desigualdade de classes, que empurra as famílias trabalhadoras para as periferias precarizadas e desprovidas de infraestrutura adequada, inclusive ao acesso à internet.

Um estudo comparativo sobre o ensino virtual em instituições de ensino superior de três países (Espanha, Itália e Equador) impactados pela covid-19 demonstrou que a maioria dos/as professores/as avaliou negativamente o ensino remoto (Tejedor et al., 2021TEJEDOR, S. et al. Los docentes universitários frente al cambio a la educación virtual impuesta por el coronavirus. Sociedade e Estado, Brasília, v. 36, n. 3, p. 915-943, 2021.), sobretudo por causa da intensificação do trabalho. No ensino superior brasileiro, a situação se agrava diante do avanço da extrema-direita “fundamentalista, miliciana e militarizada que incide de forma voraz na educação superior pública” (Farage, 2021FARAGE, E. Educação superior em tempos de retrocessos e os impactos na formação profissional do Serviço Social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo: Cortez, n. 140, p. 48-65, 2021., p. 49). No governo ultraneoliberal de Jair Bolsonaro, predomina um discurso ideológico que desconsidera a ciência (Souza et al., 2021SOUZA, E. Â. et al. A pandemia do novo coronavírus: covid-19 e a relação trabalho e saúde na educação. Universidade e Sociedade, Brasília, n. 67, p. 62-79, 2021.) e ataca a educação, em especial as universidades públicas que sofrem sucessivos cortes de verbas. É nesse contexto de agravamento da crise econômica, política e sanitária que a pandemia se tornou justificativa para impor o “ensino remoto emergencial, como uma estratégia para buscar a ‘naturalização’ da educação mediada pela tecnologia” (Farage, 2021FARAGE, E. Educação superior em tempos de retrocessos e os impactos na formação profissional do Serviço Social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo: Cortez, n. 140, p. 48-65, 2021., p. 53), e a comunidade acadêmica pouco ou nada participou dos processos decisórios.

Sob pressão, as instituições educacionais se renderam às determinações do Ministério da Educação e aderiram ao ERE. Para Bernardo et al. (2020BERNARDO, K. A. S. et al. As configurações do trabalho remoto da categoria docente no contexto da pandemia covid-19. Revista Novos Rumos Sociológicos, Pelotas, v. 8, n. 14, p. 8-39, 2020., p. 10), a “mudança do trabalho presencial para o trabalho realizado no espaço doméstico levou a processos de mais intensificação, a dificuldades de separação da vida privada da profissional, na medida em que todo o tempo passou a ser tempo de trabalho”. Tratou-se de uma migração forçada que, desde o início, esbarrou nas profundas desigualdades (regionais, de gênero, de raça/etnia, de classe) existentes na sociedade brasileira, com reflexos nas universidades. Com um debate concentrado nos aspectos materiais, isto é, ter mais ou nenhuma acessibilidade à internet; dispor ou não de equipamentos (computadores, tablets, webcams, celulares); ter ambientes adequados de estudos etc., pouco se falou sobre os aspectos pedagógicos do ensino, que envolvem uma interação subjetiva ao menos entre professores/as e estudantes. O que se viu foi uma corrida sem igual para a tentativa de adaptação ao trabalho remoto e às novas formas de construir conhecimento. A procura por ferramentas informacionais (da internet de banda larga ao computador com mais capacidade de armazenamento) veio acompanhada da busca por cursos para os manuseios das plataformas (Zoom, Meet, Teams etc.), fazendo das aulas ministradas verdadeiros espetáculos com conteúdos apropriados às plataformas abertas. Essa nova modalidade de ensino vem transformando os/as próprios/as docentes em youtubers,4 4 A este respeito, consultar Veiga (2021). as novas celebridades da vida remota, em que uma boa aula é mensurada pela quantidade de likes.

3. Serviço Social e o Ensino Remoto Emergencial: que formação para qual projeto societário?

Desde o início da pandemia, a Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS), o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS), os Conselhos Regionais de Serviço Social (CRESS) e a Executiva Nacional dos Estudantes de Serviço Social (ENESSO), em sintonia com o projeto ético-político da profissão, reafirmaram o compromisso com a classe trabalhadora e com a luta contra os ataques do capital, que banaliza a educação e despreza a vida, em especial a de trabalhadores/as negros/as, indígenas, LGBTs etc. Inúmeras ações, debates, notas e relatórios das entidades representativas do Serviço Social nortearam (e norteiam) a categoria sobre os desafios colocados à formação e ao exercício profissional durante o isolamento necessário para conter a propagação da covid-19. As entidades compreenderam a importância de exigir políticas que possibilitassem que os/as trabalhadores/as ficassem em casa e, portanto, defenderam o trabalho remoto como uma forma de salvar as vidas que o capitalismo considera descartáveis. Na área educacional, defenderam a suspensão do calendário de aulas presenciais (da graduação e da pós-graduação) e das atividades de estágio supervisionado em Serviço Social (sem interrupção do Termo de Estágio nem das bolsas) enquanto durar a pandemia e não houver vacinas para todos/as. Porém, perceberam a necessidade de resistir ao ensino remoto que, como vimos, transforma a educação em mercadoria, precariza as relações de trabalho e, logo, de ensino-aprendizagem.

Com as determinações do Ministério da Educação, as instituições de ensino em seus variados níveis de formação tiveram de aderir ao ERE. Mais de um ano depois, interessa-nos compreender o impacto dessa modalidade de ensino na formação em Serviço Social. Para tanto, examinaremos dois documentos publicados em 2021 sobre o ERE. O primeiro resulta de um esforço da ABEPSS para sistematizar a avaliação que os cursos (de graduação e de pós-graduação) fizeram do ERE. O segundo é fruto de pesquisa realizada pela ENESSO com estudantes de Serviço Social de todo o país, versando sobre a formação e o estágio durante a pandemia.

No documento da ABEPSS, A formação em Serviço Social e o ensino remoto emergencial, publicado em maio de 2021, encontram-se preocupações com as fragilidades pedagógicas, pautadas por improviso, precarização e intensificação do trabalho docente. As informações foram obtidas por meio de formulário no Google Forms, encaminhado às coordenações dos cursos de graduação e de pós-graduação de instituições públicas e privadas de todos os estados do país. Dos 193 formulários enviados à graduação, foram recebidas 49 respostas de instituições públicas e 38 das privadas. Todas as coordenações dos 36 cursos de pós-graduação existentes no país responderam ao questionário.

A maioria das instituições ressaltou que o ERE foi imposto pelos Conselhos Universitários sem que houvesse espaço para reflexões coletivas, e a rapidez com que o processo foi implementado esbarrou na pouca ou nenhuma familiaridade com as ferramentas digitais. A desigualdade no acesso à internet também foi tema recorrente. O formato estressante e cansativo do ensino remoto dificulta a apreensão das diretrizes curriculares da formação, cujos princípios alicerçam os/as discentes com a “capacitação teórico-metodológica, técnico-operativa e ético-política para sua atuação na direção social que a profissão constrói” (ABEPSS, 2021ABEPSS. A formação em Serviço Social e o ensino remoto emergencial. Brasília: ABEPSS, 2021. Disponível em: Disponível em: https://www.abepss.org.br/arquivos/anexos/20210611_formacao-em-servico-social-e-o-ensino-remoto-emergencial-202106141344485082480.pdf . Acesso em: 10 dez. 2021.
https://www.abepss.org.br/arquivos/anexo...
, p. 42). Afinal, como mensurar a capacidade do/a futuro/a profissional em apreender a totalidade e as particularidades da formação social brasileira, com vista a construir respostas críticas e interventivas às expressões da questão social? Como proceder à leitura crítica da realidade a partir da individualização? Qual é o encanto da descoberta feita por meio da solidão da pesquisa documental ou bibliográfica? Como compartilhar na tela a emoção da leitura? De que forma traduzir o calor do debate acadêmico sem a interação e o convívio presenciais?

O distanciamento social, sobretudo entre docentes e estudantes, abriu uma fissura no que tange a toques, olhares e acolhimentos, não apenas para a exposição de conteúdos, mas, sobretudo, para a apreensão de situações concretas que simplesmente escapam5 5 Por exemplo, em 3 de novembro de 2021, uma aluna do primeiro ano do curso de Serviço Social da Unesp-Franca suicidou-se. Apesar do apoio da universidade à família, pouco se sabia sobre a saúde mental da estudante. Como construir laços afetivos por meio remoto? pelos fios invisíveis das salas de aulas virtuais. Numa área predominantemente feminina, o ERE manifestou problemas relacionados à divisão sexual do trabalho: as mulheres (sobretudo as estudantes) tendo de conciliar as tarefas de ensino-aprendizagem com os cuidados da casa, como preparar o almoço e/ou o jantar durante a aula, cuidar de crianças, organizar a casa etc., impossibilitando a concentração nas atividades acadêmicas.

No documento elaborado pela ENESSO, em setembro de 2021, uma grande preocupação diz respeito à “relação contraditória entre o processo formativo do Estágio e as necessidades de renda e condições materiais de existência, que atualmente se acentuaram” (ENESSO, 2021ENESSO. Relatório nacional de estágio: reflexões a partir do formulário acerca da situação do estágio em Serviço Social durante a pandemia. 30 set. 2021. Disponível em: Disponível em: https://www.abepss.org.br/noticias/wwwabepssorgbrpesquisaenessoestagio-485 . Acesso em: 17 dez. 2021.
https://www.abepss.org.br/noticias/wwwab...
, p. 2). Tais questões não são novidades, mas se aprofundaram neste contexto de crise sanitária, e “multiplicam as dificuldades e os rebatimentos no processo formativo em que se relacionam profissional, docente e estudante” (ENESSO, 2021ENESSO. Relatório nacional de estágio: reflexões a partir do formulário acerca da situação do estágio em Serviço Social durante a pandemia. 30 set. 2021. Disponível em: Disponível em: https://www.abepss.org.br/noticias/wwwabepssorgbrpesquisaenessoestagio-485 . Acesso em: 17 dez. 2021.
https://www.abepss.org.br/noticias/wwwab...
, p. 2). Garantir o estágio durante a pandemia implica resolver a equação entre as condições adequadas de deslocamento, de permanência no local, com equipamentos de proteção apropriados. Somam-se a essas as dificuldades de um diálogo coletivo entre estudantes, supervisores/as de estágio e universidades. A ENESSO (2021ENESSO. Relatório nacional de estágio: reflexões a partir do formulário acerca da situação do estágio em Serviço Social durante a pandemia. 30 set. 2021. Disponível em: Disponível em: https://www.abepss.org.br/noticias/wwwabepssorgbrpesquisaenessoestagio-485 . Acesso em: 17 dez. 2021.
https://www.abepss.org.br/noticias/wwwab...
, p. 3) identificou também uma “diminuição do tempo de estudo pelo aumento do tempo necessário à venda da força de trabalho para suprir as necessidades básicas da família, com a diminuição do valor real do salário e o aumento do desemprego”, transformando as bolsas de estágio em meios de subsistência para o/a estudante e sua família.

São, portanto, enormes os prejuízos à formação, os quais contribuem para o elevado índice de evasão escolar: “96% dos cursos respondentes visualizam uma evasão de até 40% dos/as discentes” (ABEPSS, 2021ABEPSS. A formação em Serviço Social e o ensino remoto emergencial. Brasília: ABEPSS, 2021. Disponível em: Disponível em: https://www.abepss.org.br/arquivos/anexos/20210611_formacao-em-servico-social-e-o-ensino-remoto-emergencial-202106141344485082480.pdf . Acesso em: 10 dez. 2021.
https://www.abepss.org.br/arquivos/anexo...
, p. 48). Essa porcentagem bastante significativa evidencia que:

[...] o ERE exclui grande parcela de discentes, não considera as particularidades sócio-históricas, culturais, territoriais, de acesso à internet de qualidade e desconsidera as particularidades da relação ensino-aprendizado de grande parcela das/dos discentes. Demonstra, pois, que o ERE pode ser um caminho que reforça o histórico elitismo da universidade brasileira, após um período de pequena ampliação de acesso (ABEPSS, 2021ABEPSS. A formação em Serviço Social e o ensino remoto emergencial. Brasília: ABEPSS, 2021. Disponível em: Disponível em: https://www.abepss.org.br/arquivos/anexos/20210611_formacao-em-servico-social-e-o-ensino-remoto-emergencial-202106141344485082480.pdf . Acesso em: 10 dez. 2021.
https://www.abepss.org.br/arquivos/anexo...
, p. 49).

Preocupações semelhantes podem ser encontradas no que diz respeito à pós-graduação. O ERE alterou a organização dos Programas, impactando nos processos seletivos, na dinâmica das aulas, nas orientações de pesquisa, nas políticas de permanência e, sobretudo, no próprio desenvolvimento da pesquisa. Para além dos problemas parecidos com os da graduação, a pandemia provocou alterações profundas no desenvolvimento das pesquisas de mestrado, de doutorado e de pós-doutoramento. Muitos/as discentes tiveram de ampliar prazos; mudar a metodologia, limitando-a à análise documental e/ou bibliográfica; e, muitas vezes, transmutar o objeto de pesquisa diante da impossibilidade das visitas de campo, alterando, portanto, a própria produção de conhecimento.

Diferentemente de um projeto de formação voltado para o mercado, tanto no que diz respeito à graduação como à pós-graduação, o documento evidencia o “quão grave e preocupante é esta realidade e os nefastos prejuízos que ficarão para a profissão nesta quadra histórica” (ABEPSS, 2021ABEPSS. A formação em Serviço Social e o ensino remoto emergencial. Brasília: ABEPSS, 2021. Disponível em: Disponível em: https://www.abepss.org.br/arquivos/anexos/20210611_formacao-em-servico-social-e-o-ensino-remoto-emergencial-202106141344485082480.pdf . Acesso em: 10 dez. 2021.
https://www.abepss.org.br/arquivos/anexo...
, p. 70). São muitos os desafios a serem enfrentados neste período de pandemia, o que exige “ainda mais firmeza e radicalidade na defesa intransigente dos nossos princípios ético-políticos e de uma formação presencial, crítica, gratuita, de qualidade, laica e socialmente referenciada” (ABEPSS, 2021ABEPSS. A formação em Serviço Social e o ensino remoto emergencial. Brasília: ABEPSS, 2021. Disponível em: Disponível em: https://www.abepss.org.br/arquivos/anexos/20210611_formacao-em-servico-social-e-o-ensino-remoto-emergencial-202106141344485082480.pdf . Acesso em: 10 dez. 2021.
https://www.abepss.org.br/arquivos/anexo...
, p. 70).

À guisa de conclusão

A invasão do trabalho a todos os poros da vida social acelerou o processo de trabalho e aumentou a produtividade do trabalho docente e das atividades discentes. São muitos e cada vez mais crescentes as reuniões, as aulas, os debates, as lives, as pesquisas, os artigos etc. As inovações tecnológicas intensificaram a jornada de trabalho, que agora pode ser executada 24 horas por dia, sete dias por semana (Crary, 2016CRARY, J. 24/7: capitalismo tardio e os fins do sono. São Paulo: Ubu, 2016.), por meio dos infindáveis aplicativos que, a despeito de péssima qualidade, aceleram e controlam o tempo de trabalho. Pouco importa o conteúdo. Na velocidade simultânea de aulas, reuniões, orientações, supervisões etc., cobram-se rapidez e criatividade para responder a mensagens pelos diversos aplicativos, acompanhar as redes sociais e, sobretudo, garantir o maior número possível de curtidas: o novo parâmetro de “qualidade” da educação-mercadoria.

Os documentos produzidos pelas entidades representativas da área de Serviço Social apontam os limites pedagógicos colocados pelo ERE e evidenciam as preocupações teórico-político-metodológicas com a formação em Serviço Social, guardiã de um projeto ético-político profissional que não se furta ao enfrentamento da corrosão dos direitos da classe trabalhadora, nem à defesa de uma educação pública, estatal, de qualidade, antirracista, antipatriarcal e anticapitalista.

Referências

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  • 1
    Como Lélia Gonzalez (2020GONZALEZ, L. Por um feminismo-afro-latino-americano: ensaios, intervenções e diálogos. Organizadoras: Flávia Rios e Márcia Lima. Rio de Janeiro: Zahar, 2020.), acreditamos que trabalhadores/as negros/as têm nome e sobrenome, não deixando margem aos apelidos pejorativos que alicerçam o racismo.
  • 2
    A referência à pandemia como hiperconexão vem de Schwab e Malleret (2020SCHWAB, K.; MALLERET, T. Covid-19: the great reset. [S. l.]: Forum Publishing, 2020.).
  • 3
    O que implica a criação de políticas públicas de transferência de renda às populações mais afetadas e também o fortalecimento da política de saúde pública, Sistema Único de Saúde (SUS) e promoção de campanhas (e fornecimento) de vacinação em massa, com vista à preservação da vida e um retorno a alguma “normalidade”.
  • 4
    A este respeito, consultar Veiga (2021VEIGA, E. Impulsionados pela pandemia, professores se tornam também youtubers. Folha de S. Paulo, São Paulo, 16 out. 2021. Disponível em: Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2021/10/impulsionados-pela-pandemia-professores-se-tornam-tambem-youtubers.shtml?origin=folha . Acesso em: 17 dez. 2021.
    https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2...
    ).
  • 5
    Por exemplo, em 3 de novembro de 2021, uma aluna do primeiro ano do curso de Serviço Social da Unesp-Franca suicidou-se. Apesar do apoio da universidade à família, pouco se sabia sobre a saúde mental da estudante. Como construir laços afetivos por meio remoto?

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    May-Sep 2022

Histórico

  • Recebido
    06 Jan 2022
  • Aceito
    08 Fev 2022
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