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Resumos

O objetivo deste artigo é contribuir para a reflexão sobre a formação do professor de educação infantil na atualidade. Para tanto parte-se de uma revisão da bibliografia, que tem alertado para as interfaces do neoliberalismo e do pós-modernismo com as políticas educacionais e, em especial, as políticas de formação de professores. São analisados, enquanto norteadores da implementação do ideário neoliberal no campo da formação de professores da educação infantil, os documentos produzidos pelo MEC como Referências tanto para a formação de professores como para delimitar conhecimentos a serem trabalhados na educação de 0 a 6. Conclui-se que as tendências deste processo são o aligeiramento da formação de professores, a gradativa perda de controle dos mesmos sobre seu exercício profissional e a transformação das salas de educação infantil em laboratórios de implementação dos ideários pedagógicos, afinados com o neoliberalismo e o pós-modernismo.

Educação infantil; formação de professores; neoliberalismo; pós- modernismo; políticas educacionais


The objective of this article is to contribute at the present time for the reflection about the teacher's infant education formation. Therefore, it is done a revision of the bibliography that has been alerting for the interfaces of the neo-liberalism and the post-modernism with the educational politics and, especially, the politics of teacher's formation. The documents produced by MEC, as guiding for the implementation of the neo-liberal ideal in the field of the teacher's infant education formation, are analyzed, as References as for the teacher's formation as to define knowledge to be worked in the education from 0 to 6. At the end, we conclude that the tendencies of this process are the haste the teacher's formation, the gradual loss of control of the same ones on its professional exercise and the transformation of the classrooms of infant education in labs of implementation of the pedagogic ideals intimated to the neo-liberalism and the post-modernism.

Childhood education; teacher training; neo-liberalism; educational politics


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ALESSANDRA ARCE** Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação, área de concentração em Educação Escolar, da Unesp/FCL de Araraquara, bolsista do CNPq. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação, área de concentração em Educação Escolar, da Unesp/FCL de Araraquara, bolsista do CNPq. E-mail: learce@zipmail.com.br

RESUMO: O objetivo deste artigo é contribuir para a reflexão sobre a formação do professor de educação infantil na atualidade. Para tanto parte-se de uma revisão da bibliografia, que tem alertado para as interfaces do neoliberalismo e do pós-modernismo com as políticas educacionais e, em especial, as políticas de formação de professores. São analisados, enquanto norteadores da implementação do ideário neoliberal no campo da formação de professores da educação infantil, os documentos produzidos pelo MEC como Referências tanto para a formação de professores como para delimitar conhecimentos a serem trabalhados na educação de 0 a 6. Conclui-se que as tendências deste processo são o aligeiramento da formação de professores, a gradativa perda de controle dos mesmos sobre seu exercício profissional e a transformação das salas de educação infantil em laboratórios de implementação dos ideários pedagógicos, afinados com o neoliberalismo e o pós-modernismo.

Palavras-chave: Educação infantil, formação de professores, neoliberalismo, pós- modernismo, políticas educacionais.

Este artigo analisa a influência de postulados neoliberais e pós-modernos nas políticas contemporâneas no campo da formação de professores, procurando apontar os resultados desastrosos que podem advir dessa influência, em termos de descaracterização do professor como profissional. Essa análise volta-se especificamente para a formação do professor de Educação Infantil, focalizando dois documentos recentemente lançados pelo MEC. O primeiro deles intitula-se "Referencial Pedagógico-Curricular para a Formação de Professores da Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental – documento preliminar"1 Notas (MEC, 1997) e o segundo, já na versão final, intitula-se "Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil" (MEC,1998b).

Para que possamos compreender os desmembramentos educacionais das chamadas políticas neoliberais, necessitamos entendê-las em sua complexidade. Segundo Gentili (1996), dois economistas precisam ser revisitados por serem considerados os mais respeitados representantes da inteligência neoliberal: Friedrich A. Hayek e Milton Friedman, cujos primeiros textos datam do período referente à Segunda Guerra Mundial, momento este em que tínhamos o início da cristalização, na sociedade ocidental, do modelo keynesiano alicerçado no Estado de Bem-Estar Social. Este modelo foi combatido pelos primeiros neoliberais por fomentar um estado intervencionista e coletivista, prédica da social-democracia, vista por estes autores como um sério risco para a liberdade individual, constituindo-se em caminho frutífero para regimes totalitários.

Segundo Anderson (1995), os textos que deram origem às questões postas pelo neoliberalismo em oposição ao Estado de Bem-Estar aparecem na obra O caminho da servidão, escrita em 1941 por Hayek. Nessa obra, o autor teria, segundo Wainwright (1998), elaborado uma teoria para justificar sua luta contra o modelo econômico vigente, teoria esta que não limitou-se à economia e cujo argumento central residia na incapacidade do ser humano de conhecer tudo e todos, bem como na valorização da particularização no ato de conhecer. Assim, para Hayek, o conhecimento seria um atributo individual e, segundo Wainwright (1998, p. 51), "ele o via quase que como uma característica física, como se mente e corpo fossem uma coisa só e o conhecimento do indivíduo fosse o que ele experimentaria de maneira atomística e única". Derivando este conceito para a economia, Hayek importava-se em estudá-la particularizada, em analisar sucessos particulares de empreendedores isolados, pois o individualismo provindo de seu conceito de como o conhecimento é adquirido pelo homem é a sua bandeira.

Hayek afirma existir um fato indiscutível que ninguém pode esperar alterar e que, por si só, é a base suficiente para as conclusões dos filósofos individualistas: as limitações constitucionais do conhecimento e dos interesses do homem, o fato de que ele não pode saber mais do que uma ínfima parte do todo da sociedade e que, portanto, tudo o que pode participar de seus motivos são os efeitos imediatos que suas ações terão na esfera que ele conhece. Todas as possíveis diferenças nas atitudes morais dos homens resultam em pouca coisa, no que diz respeito ao seu significado para a organização social, comparadas com o fato de que tudo que a mente do homem pode eficazmente compreender são os fatos do limitado círculo do qual ele é o centro. (Wainwright, 1998, p. 51-52)

Dentro deste corpo de argumentações, segundo o qual o indivíduo é incapaz de abarcar a totalidade, o Estado, enquanto órgão que procura totalizar ações, está fadado ao fracasso e, para que atenda melhor os anseios dos indivíduos, sem privá-los da liberdade, deve ser mínimo, reduzido, deixando que micropoderes localizados exerçam sua função de forma a garantir que cada indivíduo tenha o máximo de liberdade para perseguir seus interesses. Portanto, segundo Wainwright (p. 47), para Hayek o mercado e a economia devem seguir este modelo, pois o livre mercado, assim como o indivíduo e seu direito à liberdade, são produtos espontâneos da civilização. Tal fato deveria ser defendido como a bandeira moral do neoliberalismo, pois caso ocorra a desigualdade, esta não seria considerada como algo não natural, então seu oposto, também se dá de maneira natural, pois em uma sociedade os indivíduos são diferentes, o que os impossibilita de atingirem fins coletivamente. Sempre teremos os mais fracos que ficarão para trás, podendo talvez com uma jogada de sorte mudar o rumo de suas vidas: "As desigualdades, ao que se presume, são simplesmente os resultados causais da atividade individual, que poderiam ser revertidos em seu modelo, por uma nova jogada de sorte" (idem). Segundo Frigotto (1995, p. 83), para Hayek, é a igualdade social, imposta pelo Estado totalitário, que leva à servidão, sendo saudável que em uma sociedade alicerçada no individualismo exacerbado tenhamos a desigualdade, que é um processo natural. Podemos afirmar que, para Hayek, o tema "luta de classes", a partir do exposto, se torna vazio, sem nenhum significado, tendo apenas indivíduos que devem ser respeitados quanto às suas diferenças e que tentam viver dignamente dentro dos limites que suas capacidades permitem.

Todos estes pontos até aqui esboçados chocavam-se frontalmente com o modelo pós-guerra dos anos de 1940 e não obtiveram eco em sua época; somente após três décadas, as idéias que defendiam o capital baseado na liberdade do indivíduo foram ouvidas e frutificaram, fato este auxiliado pela decadência do Estado de Bem-Estar Social e pelas contínuas e graves crises econômicas (Gentili, 1996). Iniciadas em 1973, estas crises apresentavam a fórmula que mais tarde seria a ideal para a introdução das medidas neoliberais: longa e profunda recessão, seguida de baixas taxas de crescimento e altas taxas de inflação, cujas raízes, segundo Hayek, estavam "localizadas no poder excessivo e nefasto dos sindicatos e, de maneira mais geral, do movimento operário, que havia corroído as bases de acumulação capitalistas com pressão parasitária para que o Estado aumentasse cada vez mais os gastos sociais" (Anderson, 1995, p. 10).

O remédio para a cura deste mal passou a ser a receita obrigatória de consultores financeiros neoliberais: por um lado, manter o Estado forte suficiente para acabar com gastos desnecessários, privatizar empresas estatais e liquidar os sindicatos e, por outro, diminuir os gastos e as intervenções estatais nas questões sociais e econômicas; todas estas medidas devem ser administradas de uma só vez, de forma quase que ditatorial, pois a meta principal de tudo isto é a estabilidade monetária, que deve ser alcançada a qualquer preço.

Ressalta-se, no campo das políticas sociais, que o receituário neoliberal incentiva a desativação dos programas sociais públicos e o Estado deve-se ater somente a programas de auxílio à pobreza (Draibe, 1993). Dentro desse preceito, a educação é eleita como chave mágica para a erradicação da pobreza, pois, investindo-se no indivíduo, dando-lhe a instrução, ele poderá ser capaz de buscar seu lugar ao sol. Aliada à educação, a segurança aparece como outro investimento social do Estado, pois, para que as reformas neoliberais ocorram, a ordem é essencial.

(...) duas áreas de ação pública no campo social se justificam, a de segurança e justiça por um lado, e a de educação por outro. Na primeira, trata-se de canalizar a autoridade e os recursos estatais para a garantia de estabilidade e da segurança social; na segunda, e de acordo com o ideário liberal, trata-se de igualar as oportunidades, reconhecendo as diferenças entre os indivíduos, ampliar o campo de oportunidades dos mais desfavorecidos, de modo a que pudessem competir menos desigualmente com os demais. Na sua base, a sociedade se organizaria, assim, sob um dado patamar de eqüidade. (Draibe, op. cit., p. 93)2 2 . Articulado ao conceito de competitividade, temos o conceito de eqüidade, assim definido por Gentili (1996, p. 43): "Vale destacar que 'eqüidade' costuma se contrapor, na terminologia neoliberal, a 'igualdade'. O conceito de eqüidade articula-se assim com um conceito de justiça que reconhece a necessidade de respeitar, e inclusive promover, as diferenças naturais existentes entre as pessoas. Justo é o sistema social onde tais diferenças são respeitadas contra toda pretensão arbitrária (política) por garantir uma suposta igualdade". A competitividade aqui, segundo Coraggio (1996, p. 93-94), é entendida como algo altamente saudável e necessário para que possamos ter maior qualidade e produtividade, permitindo uma redução no tempo e um aumento significativo na qualidade.

Exemplos perfeitos deste tipo de remédio neoliberal pairaram pela primeira vez sobre o mundo no final da década de 1970, nos governos da primeira ministra da Inglaterra, Margaret Thacher, e do Presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan, e em ambos o ideário neoliberal apresentou-se como uma alternativa teórica, econômica, ideológica, ético-política e educativa à crise do capitalismo deste final de século. Algumas categorias foram eleitas para estabelecer as bases teóricas: qualidade total, formação abstrata e polivalente, flexibilidade, participação, autonomia, descentralização, competitividade, eqüidade, eficiência, eficácia e produtividade (Frigotto, 1995). Estas categorias encontram eco no processo de transnacionalização e hegemonia do capital financeiro, que tem levado o setor público a ser responsabilizado pela crise, ineficiência e clientelismo em contraposição à eficiência, qualidade e eqüidade que caracterizariam o mercado e o privado, os quais, portanto, deveriam reger a sociedade.

O Brasil na era Collor pôde vivenciar o início deste tipo de remédio amargo, tendo continuidade na era Fernando Henrique Cardoso (FHC), quando este receituário aparece camuflado com a bandeira da "modernização" e da "globalização", afinal, FHC "trabalha para colocar o Brasil no primeiro mundo", afirmam os partidários do presidente, endossando as autoritárias e desastrosas medidas adotadas em nome da "modernização". Segundo Wainwright (1998, p. 11), "(...) Cardoso lhe dá um impulso tecnocrático promovendo suas políticas como imperativos de um mercado global que somente ele e seus conselheiros são capazes de compreender", fato este que, segundo Oliveira (1995), faz com que o brasileiro não leve a sério os que criticam o neoliberalismo e suas desastrosas conseqüências para nosso país, afinal, o presidente "Doutor" irá nos colocar no primeiro mundo. Oliveira aprofunda esta questão, afirmando que este slogan de "colocar no primeiro mundo" tem ocultado a letalidade com a qual o neoliberalismo entrou no Brasil, pois ele foi capaz de atacar de forma radical as bases da esperança, destruindo organizações populares, erguendo o medo da mudança, da reforma, do experimental, em nome da economia "recuperada" que FHC nos apresentou.

Mas este movimento é muito mais danoso, pois o governo neoliberal de FHC e sua inteligência têm conseguido cooptar para o poder boa parte da classe intelectual brasileira, que vem aderindo de braços abertos. Esses intelectuais fornecem suporte teórico ao neoliberalismo através da absorção das concepções pós-modernas de homem e sociedade, aproveitando-se deste momento, segundo Netto (1995), para retirar todos os rótulos que possam ligá-los aos regimes socialistas ou comunistas "derrotados" pelo capital.

Isto me parece absolutamente verdadeiro; entre nós, mais do que nunca, a traição dos intelectuais – para recorrer a uma velha frase – revela-se patente. A todo instante, vemos figuras desdizendo hoje o que afirmavam ontem, e certamente os veremos desdizer amanhã as suas verdades de agora. O que me assombra, porém, não é este insuspeitado camaleonismo; o que me assombra é o fato de não constatar, entre os intelectuais, nenhum sentimento de indignação ou repulsa diante desse enorme processo de capitulação. Em nome da tolerância, ele é tomado como um dado, e qualquer questionamento é acoimado de "patrulhamento". Penso que é absolutamente necessário, no plano da idéias, distinguir entre tolerância e complacência. Esta última foi sempre um útil aliado das ditaduras, fardadas ou não. (Netto, op. cit., p. 34)

A Universidade tem sido a maior fornecedora de munição para o ideário neoliberal no Brasil, por meio da incorporação do movimento pós-moderno, aderindo a um irracionalismo sem limites que decreta, segundo Frederico (1997), o fim da razão, do sujeito, da história, da verdade, do progresso, ou seja, o fim de todas as bandeiras levantadas pelo movimento iluminista. Fatos estes que, segundo Chauí (1993, p. 22-23), se exprimiriam da seguinte forma:

- A negação de que haja uma esfera da objetividade. Essa é considerada um mito da razão, e em seu lugar surge a figura da subjetividade narcisista desejante;

- negação de que a razão possa propor uma continuidade temporal e captar o sentido imanente da história. O tempo é visto como descontínuo, a história é local e descontínua, desprovida de sentido e necessidade, tecida pela contingência;

- negação de que a razão possa captar núcleos de universalidade no real. A realidade é constituída por diferenças e alteridades, e a universalidade é um mito totalitário da razão;

- negação de que o poder se realize a distância do social, através de instituições que lhe são próprias e fundadas tanto na lógica da dominação quanto na busca da liberdade. Em seu lugar existem micropoderes invisíveis e capilares que disciplinam o social.

À exposição feita por Chauí agrega-se o raciocínio apontado por Frederico (1997) de que os indivíduos passam a desenvolver, com a morte da razão, que o presente é contínuo, sem rupturas, sem lutas, sem slogans, levando a realidade à total fragmentação, impossível de ser apreendida em sua totalidade. Ciência, verdade, progresso, revolução cedem lugar "à valorização do fragmentário, do macroscópico, do singular, do efêmero, do imaginário" (Evangelista, 1997, p. 24).

E, por fim, com a "politização do social", temos o "descentramento político" e a redefinição da política e seus objetivos. Como a história não tem sentido, o cotidiano substitui o futuro como preocupação. O imediato toma o lugar do mediato. A revolução, a luta pelo poder do Estado e seus instrumentos institucionais – como partidos políticos –, a transformação macroscópica e de milhões, é substituída pelas "pequenas lutas", pelas infindáveis transformações "moleculares", sem coordenação. (Idem, p. 26)

Instala-se a era das incertezas, com a exacerbação do particular e a demolição de tudo o que possa se opor a esta nova religião. As idéias aludidas por Hayek a respeito do conhecimento tornam-se reais e são propagadas pelos intelectuais brasileiros sob o rótulo de modernizadoras, sob uma falsa bandeira progressista, acabando por referendar a fragmentação3 3 . Esta fragmentação, segundo Frederico (1995, p. 182), pode ser observada nos seguintes níveis: a) fragmentação no interior da industria para se atingir a produção flexível; b) fragmentação do mercado através da passagem da produção em massa para a produção de artigos "diferenciados", objetivando atender as expectativas de um mercado consumidor segmentado; c)fragmentação da classe operária, pelo mercado de trabalho dual e suas conseqüências nefastas (crise do sindicalismo e das demais formas de associativismo); d) fragmentação do sujeito político, com a substituição da ação classista, pela ação molecular de "minorias", em seu interminável movimento de diferenciação; e) fragmentação do discurso político: a luta contra a exploração econômica transfere-se para a denúncia de injustiças, e a reivindicação jurídica dos "direitos da cidadania" reduzida a façanha de pulverizar o mundo do trabalho num amontoado de cidadãos onde reivindicam consumidores; f) finalmente, pode-se assistir a fragmentação da própria atividade política, com a substituição dos partidos pela ação particularistas dos lobbies, grupos de interesse e corporações profissionais. nos seus mais diversos níveis. Pode-se concluir que tanto no plano econômico como no plano das idéias o neoliberalismo é implacável. "Procura-se colocar como referência a própria "ausência de referência", caracterizando-se a incerteza como a única verdade e fazendo-se uma assepsia das relações sociais presentes na prática social" (Freitas, 1995, p. 120).

Instaura-se a incerteza, mas o capital está convicto e cheio de certezas de como e onde deve atacar, e os conceitos aqui explicitados, que envolvem o pós-industrial, pós-moderno, sociedade do conhecimento, alicerçam e decretam o fim da razão e da história em nossa sociedade, apontando a globalização advinda das políticas neoliberais como a única e definitiva saída para todos os problemas sociais e econômicos contemporâneos. A esfera política não deu conta desta superação, mas o mercado dará; assim, toda a regulação de nossa sociedade fica por conta deste e de suas categorias, inclusive as políticas sociais que passam a se constituir não mais em um investimento coletivo, mas sim individual, luta de indivíduos para erradicação de sua condição de pobreza ou de inferioridade, e qualquer posicionamento contrário a esta hegemônica filosofia não passa de um delírio, um suspiro da razão falida.

A educação, encarada como uma política social, não foge a este quadro; atribui-se uma importância vital e indispensável à mesma (como já foi exposto pela análise de Draibe (1993), pois ela é responsável pela formação do homem neoliberal competitivo, capaz de passar pelas provas que o mercado impõe, adaptando-se, sendo tecnicamente flexível, prova maior do investimento do mercado no Capital Humano, no indivíduo. A educação deixa de ser encarada como um direito, tornando-se uma mercadoria escrava dos princípios do mercado, atrelada a um reducionismo economicista de sua função. Dentro da lógica neoliberal do Estado mínimo, a política educacional é norteada por dois eixos centrais: a centralização e a descentralização. A descentralização é caracterizada pela inserção da escola no mercado competitivo, passando a ser vista enquanto empresa educacional, eximindo o Estado da função de mantenedor financeiro do atendimento. Gentili (1996, p. 27-36) compara este tipo de organização à que rege o funcionamento dos fast foods, onde o Estado não pode questionar o direito da livre escolha do cidadão-consumidor à mercadoria educação e onde podemos ter os mais diversos tipos de empresas atuando. A empresa McDonald's é um modelo de fast food usado pelo autor, em que a mercadoria é produzida de forma rápida, com normas e regras de controle de eficiência e produtividade, oferecendo qualidade, limpeza, serviço e preço. Inserir a educação neste mundo dos negócios significa que

as escolas devem definir estratégias competitivas para atuar em tais mercados, conquistando nichos que respondam de forma específica à diversidade existente nas demandas de consumo por educação. Mcdonaldizar a escola supõe pensá-la como uma instituição flexível que deve reagir aos estímulos (os sinais) emitidos por um mercado educacional altamente competitivo. (Gentili, 1996, p. 31)

Seguindo este raciocínio, assim como o hambúrguer mata a fome dos indivíduos de forma rápida, a escola fornece de forma rápida instrumentos e habilidades que permitam a este mesmo indivíduo ser competitivo dentro da sociedade global, cuja chave que dá acesso à mesma é a informação.

Esse tipo de empresa (McDonald's) tem tido um papel fundamental no desenvolvimento daquilo que poderíamos chamar aqui "pedagogia do fast food": sistemas de treinamento rápido com grande poder disciplinador e altamente centralizados em seu planejamento e aplicação. (Idem, p. 34)

Neste ponto surge o caráter centralizador das políticas neoliberais para a educação, pois cabe ao governo e somente a ele definir sistemas nacionais de avaliação, promover reformas educacionais, estabelecer parâmetros de um Currículo Nacional e estabelecer estratégias de formação de professores centralizadas nacionalmente. O Estado assume minimamente os financiamentos e ao seu máximo a definição dos conhecimentos que devem circular entre os indivíduos. Neste momento, é claro, não há espaço para incertezas, para crise ou críticas ao uso da racionalidade técnica que se torna o instrumento perfeito para a realização da reforma neoliberal na educação.

Freitas (op. cit.) acrescenta que, além da transposição da padronagem do mercado para a educação, outras conseqüências (que levarão o professor a perder a visão total de seu trabalho, afundando-se nas particularidades) se farão presentes, por meio das transformações das didáticas e metodologias e da perda das discussões ideológicas, cedendo lugar ao pragmatismo exacerbado.

Com o interesse do capital pela educação algumas conseqüências podem ser hipotetizadas:

a) O ensino básico e o técnico vão estar na mira do capital pela sua importância na preparação do novo trabalhador;

b) a didática e as metodologias de ensino específicas (em especial alfabetização e matemática) vão ser objeto de avaliação sistemática com base nos resultados (aprovação que geram);

c) a "nova escola" que necessitará de uma "nova didática" será cobrada também por um "novo professor" todos alinhados com as necessidades de um "novo trabalhador";

d) tanto na didática como na formação do professor haverá uma ênfase muito grande no "operacional", nos "resultados" – a didática poderá restringir-se, cada vez mais, ao estudo de métodos específicos para ensinar determinados conteúdos considerados prioritários, e a formação do professor poderá ser aligeirada do ponto de vista teórico;

e) os determinantes sociais da educação e o debate ideológico poderão vir a ser considerados secundários – uma "perda de tempo motivada por um excesso de politização da área educacional".

É muito provável que estejamos diante de uma retomada do tecnicismo sob novas bases: uma espécie de neotecnicismo (Freitas, op. cit., p. 127).

Os temores de Freitas tornam-se reais com a delimitação das políticas educacionais ditadas para a América Latina por órgãos como o Banco Mundial, Unesco e Unicef. Estas instituições, em 1990, na famosa Conferência Mundial de Educação para Todos, em Jomtien, delimitaram as diretrizes a serem seguidas para a educação, que tem como seu eixo articulador as "Necessidades Básicas de Aprendizagem" (Neba), entendidas como

Conhecimentos, capacidades, atitudes e valores necessários para que as pessoas sobrevivam, melhorem sua qualidade de vida e sigam aprendendo. (...) incluem tanto as ferramentas essenciais para a aprendizagem (como a leitura e a escrita, a expressão oral, o cálculo, a resolução de problemas) quanto os conteúdos básicos de aprendizagem (conhecimentos teóricos e práticos, valores e atitudes), necessários para que os seres humanos possam sobreviver, desenvolver plenamente suas capacidades, viver e trabalhar com dignidade, participar plenamente do desenvolvimento, melhorar a qualidade de vida, tomar decisões fundamentadas e continuar aprendendo. (Miranda 1997, p. 42, citando documento síntese do encontro, 1990, p. 11 e 157)

As Necessidades Básicas de Aprendizagem têm como ponto central a capacidade que a escola deve desenvolver no indivíduo de "aprender a aprender", onde o processo de aprendizagem passa pela ação e a escolha dos conhecimentos, pela sua utilização direta na vida cotidiana do indivíduo; a funcionalidade e o pragmatismo são fundamentais e expressões como "aprender fazendo", "aprender em serviço" e "aprender praticando" tornam-se essenciais. Portanto, as relações entre aprendizagem e conhecimento, que envolvem abstrações complexas, estão fora das Nebas (Miranda, 1997).

O relatório da Unesco, cunhado de "Jacques Delors – Educação – um tesouro a descobrir", terminado em 1996, reforça o acima exposto, assinalando que à educação cabe a descoberta de talentos e potencialidades criativas, por meio do atendimento das Neba dentro da escola, mas a realização ou utilização das mesmas fica a cargo do indivíduo; à escola cabe somente o despertar, por isso, não há necessidade de prendermos o indivíduo por muito tempo dentro da instituição. Difunde-se, com isso, o conceito de uma educação permanente, na qual o aprender a aprender é fundamental.4 4 . Para uma análise crítica da presença dominante do lema "aprender a aprender" no relatório Jacques Delors, ver Duarte (2000).

Quatro novos pilares se erguem para a educação, fundamentados no prazer, no utilitarismo e no individualismo, encarados como investimento em Capital Humano competitivo no mercado de trabalho, tornando verdade a afirmação de Freitas (1995) de que a utilização dos preceitos neoliberais para a educação traria à tona a necessidade de uma "nova didática" baseada em novos princípios:

– Aprender a conhecer, combinando uma cultura geral, suficientemente vasta, com a possibilidade de trabalhar em profundidade um pequeno número de matérias.

– Aprender a fazer, a fim de adquirir não somente uma qualificação profissional, mas, de uma maneira mais ampla, competências que tornem a pessoa apta a enfrentar numerosas situações e a trabalhar em equipes.

– Aprender a viver juntos, desenvolvendo a compreensão do outro e a percepção das interdependências – realizar projetos comuns e preparar-se para gerir conflitos – no respeito pelos valores do pluralismo, da compreensão mútua e da paz.

– Aprender a ser, para melhor desenvolver a sua personalidade e estar a altura de agir com cada vez maior capacidade de autonomia, de discernimento e de responsabilidade pessoal. Para isso, não neglicenciar na educação nenhuma das potencialidades de cada indivíduo: memória, raciocínio, sentido estético, capacidades físicas, aptidão para comunicar-se (Unesco, 1998, p. 101-102).

Os quatro pilares aqui apresentados aparecem impregnados de subjetividade, enfatizando as diferenças individuais como saudáveis e necessárias, sendo a chave para o indivíduo achar seu lugar em nossa sociedade; retira-se da aprendizagem o conteúdo que fica reduzido a informações, instrumentalização das ações posteriores, emergindo um saber imediato e utilitário, além da inclusão do princípio básico da flexibilidade, capaz de torná-lo um sujeito adaptável ao mercado. Mas, apesar destes pilares dedicarem-se ao indivíduo e toda a sua vida, onde eles e as Neba devem ser trabalhados com afinco? Na educação básica, que deve ser oferecida a todos e garantida pelo poder público, o qual deve buscar a minimização dos custos por meio de parcerias com a comunidade, como garantia do principio de eqüidade e qualidade. Após concluída a educação básica, o indivíduo está pronto para prosseguir sua educação no trabalho. Para tanto, alguns investimentos são necessários na educação básica e o Banco Mundial, agência financiadora, delimita quais devem ser estes investimentos:

– proporcionar livros didáticos, vistos como a expressão operativa do currículo e contando com eles como compensadores dos baixos níveis de formação docente. Recomenda aos países que deixem a produção e distribuição dos livros didáticos em mãos do setor privado, que capacitem os professores na sua utilização, além de elaborar guias didáticos para estes últimos; e

– melhorar o conhecimento dos professores (privilegiando a capacitação em serviço sobre a forma inicial e estimulando as modalidades a distância). (Torres, 1996, p. 135, ao comentar e apresentar diretrizes do BM, 1995).

O livro didático e os manuais passam a ser indispensáveis no currículo, que deve ter os mesmos como apoio e fonte de conhecimento para os professores. Professores estes que não necessitam de longos programas inicias de formação. Aprender fazendo, em serviço, é suficiente para sua formação, sendo que, para tanto, a educação à distância por meio de rádio ou TV é fundamental e eficaz. Manipular manuais e livros e dominar algumas habilidades técnicas, além de ser capaz de refletir sobre a sua a ação, são suficientes, pois este profissional, como os demais, também deve ser flexível e, se possível, ater-se a outras ocupações no mercado de trabalho, não reduzindo-se somente a ser professor. Afinal, com o desenvolvimento tecnológico a figura do professor não é tão indispensável, "o sendo apenas para os que não dominam os processos de reflexão e de aprendizagem" (Unesco, 1998, p. 156). Dentro desse contexto, o professor não necessita ser um intelectual com uma base teórica e prática fortemente fundamentada em princípios filosóficos, históricos, metodológicos; os seus atributos pessoais passam a ser valorizados em detrimento da formação profissional.

Retira-se definitivamente do professor o conhecimento, acaba-se com a dicotomia existente entre teoria e prática, eliminando a teoria no momento em que esta se reduz a meras informações; o professor passa a ser o balconista da pedagogia fast food, que serve uma informação limpa, eficiente e com qualidade, na medida em que, com seu exemplo, desenvolve no aluno (cliente) o gosto por captar informações utilitárias e pragmáticas.

No Brasil, o reflexo das políticas neoliberais para a formação de professores segue as categorias até aqui apresentadas. A nova LDB,5 5 . Para uma análise crítica da nova LDB, ver Saviani (1997). apesar de afirmar que a formação do professor para a educação básica deve ser feita no ensino superior, não localiza esta modalidade de formação somente nas universidades, mas também em institutos superiores de educação, que deverão se dedicar somente à capacitação docente, sendo baseados somente no ensino, sem pesquisa e extensão, além de oportunizarem que profissionais de outras áreas possam, por meio de uma complementação, tornarem-se professores. Dentro desse quadro, o documento "Referencial Pedagógico-Curricular para a Formação de Professores da Educação Infantil e Séries Inicias do Ensino Fundamental – versão preliminar" (MEC, 1997) procura definir um currículo mínimo para a formação destes profissionais, omitindo se o mesmo destina-se à formação em nível de segundo ou terceiro grau.

O referido documento articula-se em 4 partes: a primeira traz um panorama da atual formação de professores no Brasil; a segunda discute as concepções sobre a natureza do trabalho pedagógico; a terceira propõe objetivos e principais conhecimentos para o professor e a quarta parte apresenta critérios para uma organização curricular.

Logo nas considerações preliminares, podemos identificar o alicerce do aprender a aprender aplicado à formação do professor, seguido dos quatro pilares propostos pela Unesco, e a preocupação pragmática e utilitária com o conteúdo a ser ensinado, quando o documento afirma que a escola deve tomar para si a articulação coerente do "o que", do "como" e do "para que" se ensina, regida por conteúdos escolhidos conforme sua utilidade imediata para o aluno e provindos somente de problemas da prática, excluindo totalmente as questões teóricas que envolvem questionar os "porquês" e a própria função da educação e do professor em nossa sociedade, devendo ser o mesmo formado dentro deste princípio, fato este que fica claro no seguinte item dos pressupostos do referencial:

A formação dos professores deve ser pautada na perspectiva de um processo de desenvolvimento profissional permanente. A perspectiva de formação permanente inclui formação inicial e continuada concebidas de forma articulada. A formação inicial corresponde ao período de aprendizado dos futuros professores nas escolas de habilitação, devendo responder a questões da prática da educação infantil e do ensino fundamental de crianças, jovens e adultos e estar articulada com as práticas de formação continuada. (MEC, 1997, p. 7)

A tônica do documento segue este raciocínio inicial, utilizando-se de pesquisas sobre a situação atual da formação de professores no Brasil para justificar, por meio do argumento da existência da dicotomia entre teoria e prática na formação de professores, a proposta de formação dos profissionais da educação infantil calcada nos princípios neoliberais para a educação. Contra os problemas relacionados a seguir, o documento irá articular a sua proposta de formação:

– Falta de integração entre conteúdos de educação geral e conteúdos profissionalizantes e destes entre si, levando à separação entre disciplinas teóricas e práticas;

– falta de interligação entre as disciplinas e as respectivas cargas horárias;

– desestruturação dos estágios supervisionados, levando a reforçar a dicotomia teoria-prática;

– ausência da ação/reflexão/ação como princípio educativo e formador do professor;

– reforço da idéia de um professor técnico, mero transmissor de conhecimentos cristalizados;

– desarticulação entre formação inicial e a formação continuada, entre o processo formativo e as condições de trabalho na escola, em virtude de não se colocar como centro do currículo as demandas da prática. (Idem, p. 24).

Tomando-se por base o exposto, o documento defende, na segunda parte, como eixo metodológico para a formação de professores, o princípio ação-relexão-ação, utilizando-se de discussões do meio acadêmico com base em teorias estrangeiras, frutos de reflexões de outras realidades sociais, o que acaba por reforçar o conceito do aprender fazendo, à medida que reconhece um conhecimento na ação que orienta boa parte das atividades do professor, sendo o mesmo "decorrente de 'crenças', muitas vezes implícitas, fundadas em teorias cientificas ou espontâneas, da experiência prática do exercício profissional e se expressa em um saber fazer" (idem, p. 25).

As teorias que têm focalizado o professor como ser reflexivo, baseadas nos estudos de Nóvoa (1997), Shön (1997), Zeichner (1997) e Perrenoud (1993), alicerçam este movimento, reforçando a valorização do conhecimento produzido no cotidiano do professor, o conhecimento advindo de sua prática. Cabe investigar até que ponto a entrada destas teorias no Brasil e sua utilização não as filiam às produções neoliberais e pós-modernas, o que acabaria por torná-las um modismo, camuflado de progressista, mas que traria para a formação de professores a exacerbação do pragmatismo e do utilitarismo. De qualquer forma, essas teorias precisam ser melhor investigadas quanto às suas filiações filosóficas e ideológicas. A ênfase que tais teorias dão às histórias de vida dos professores parece concordar com os conceitos pós-modernos de conhecimento particularizado, em detrimento da totalidade. Tais conceitos, apresentados pelos autores citados, são utilizados como fundamentos de porque adotar o eixo ação-reflexão-ação que alicerça o argumento que leva à formação do professor a ser aligeirada.

A terceira parte imbuída do eixo acima mencionado define que um currículo para a formação de professores não deve deixar de levar em conta as funções atualmente definidas para o professor:

– Garantir a aprendizagem de todos os alunos nas diferentes áreas de conhecimento.

– Conceber, realizar, analisar e avaliar as situações didáticas e intervir no processo de ensino aprendizagem dos alunos.

– Gerir os trabalhos da classe.

– Participar da elaboração do projeto pedagógico da escola e dos conselhos escolares.

– Participar da integração das escolas com a família e a comunidade.

– Participar da comunidade educativa e profissional. (MEC, 1997, p. 45).

Não é função deste professor do ano 2000 transmitir, ensinar nada aos alunos, apenas garantir que aprendam para que continuem esse processo de aprender a aprender fora da escola. A função do professor acaba reduzindo-se a de um técnico, um prático capaz de escolher o melhor caminho para que o processo de ensino aprendizagem ocorra, além de constituir-se como mero participante das decisões escolares e da vida escolar; em nenhum momento ele é chamado a teorizar, apenas a agir e refletir a respeito de sua prática. Este fato é previsível, pois estamos falando da formação do profissional que deverá trabalhar as Neba e, para tanto, ele não necessita teorizar muito, apenas percorrer um caminho que seja mais eficaz e, de preferência, construído no aprender fazendo.

Além de explicitar os preceitos neoliberais, o documento reforça a presença da psicologia do desenvolvimento como principal alicerce para o processo de ensino aprendizagem, em detrimento dos demais fundamentos da educação, como a filosofia, que, por sua vez, é reduzida ao caráter pragmático do ensino, na medida em que o documento define, como objetivo principal da filosofia da educação, levar o professor a pensar no que vale a pena ensinar, para que? e para quem? Ou a Antropologia e a Sociologia limitadas a fornecer ao futuro professor as dimensões culturais, sociais e políticas do processo de aprendizagem. Não podemos deixar de mencionar a ausência da disciplina história da educação, fato este que talvez possa ser justificado pelo apregoado fim da história, das categorias como universalização e objetivação, ou por seu caráter "excessivamente teórico" para alguém que se pretende prático-reflexivo. Kuhlmann (1998, p. 6) alerta de forma muito clara para os perigos deste tipo de pensamento ao afirmar que

Quando se descarta a história porque seria teórica, transfere-se para a teoria a crítica à academia, às instituições e às pesquisas que se isolam das demandas sociais, produzindo idéias vazias que não levam a nada. Assim, essa crítica também estimula a demanda por soluções fáceis, por receituários robotizadores para práticas irrefletidas. No lugar de alertar para os cuidados a se ter quando se está no campo teórico, para que o processo de abstração seja conseqüente, nota-se muitas vezes uma concepção que infantiliza as professoras e professores; que lhes quer ensinar, por exemplo, apenas os exercícios de desenho que farão com as crianças, no lugar das técnicas artísticas e do cultivo do gosto estético. Enquanto se defende que as crianças tenham favorecida sua autonomia e se motivem para a fruição dos bens culturais, que aprendem a gostar de ler e de conhecer, ignora-se que os educadores também precisam desfrutar dessas condições, além é claro, das condições dignas de trabalho e de salário. É impossível controlar os imprevistos das situações reais, a que as propostas que rejeitam a teoria fazem supor. Daí, a formação dos educadores exigir a capacitação teórica que permita a partir da reflexão e do pensamento crítico, trazer das abstrações um alimento para a prática cotidiana.

Ao definir os critérios para a formação inicial dos professores, o documento não deixa de lado que esta formação possa se dar em serviço, e que os conhecimentos a receber devam garantir o ensino de conteúdos do plano do saber, do saber fazer e do fazer. A metodologia a ser utilizada na formação de professores deve ser a mesma que ele irá aplicar posteriormente (MEC, 1997, p. 48, 49 e 50); portanto, os mesmos princípios aplicados ao ensino básico devem estar presentes na formação de professores. Consequentemente, este professor que deverá ensinar o aluno a "aprender a aprender" deverá também "aprender a aprender" durante a sua formação, por isso a categoria de prático-reflexivo ser usada com tanta propriedade.

O documento, por constituir-se em uma proposta preliminar de parâmetros curriculares nacionais para a formação de professores de educação infantil e ensino fundamental, simplesmente trata a formação dos mesmos, adotando o princípio das Neba (conhecimentos e necessidades mínimas que o professor deve receber para realizar o seu aprender fazendo ou aprender a aprender) para professores, pois não apresenta uma proposta de formação que atenda às especificidades de cada uma das modalidades apresentadas. Provavelmente, o futuro professor deverá adquiri-las com a formação em serviço ou será refletindo sobre a sua prática?

O material analisado incorpora os preceitos neoliberais, oferecendo ao professor um novo status como técnico da aprendizagem, o de ser um profissional reflexivo, que não poderá, com a formação proposta, refletir a respeito de nada mais do que sua própria prática, pois o mesmo não possuirá o mínimo necessário de teoria para ir além disso.

Não acreditamos que o professor possa ser formado apenas refletindo sobre a sua ação; acreditar neste discurso e apoiá-lo é decretar o fim de nossa profissão, é aceitar que nos tornamos cada vez mais dispensáveis diante do aparato tecnológico que hoje possuímos para transmissão de informação. Também não acreditamos que a formação inicial do professor possa se dar em serviço, não vemos nenhum outro profissional ser formado assim. Por que nós deveríamos admitir que para ser professor qualquer tipo de formação possa ser feita? Por isso, reafirmamos que a formação de professores não pode se eximir de uma bagagem filosófica, histórica, social e política, além de uma sólida formação didático-metodológica, visando formar um profissional capaz de teorizar sobre as relações entre educação e sociedade e, aí sim, como parte dessa análise teórica, refletir sobre a sua prática, propor mudanças significativas na educação e contribuir para que os alunos tenham acesso à cultura resultante do processo de acumulação sócio-histórica pelo qual a humanidade tem passado.

Os desdobramentos da política de formação de professores contida no documento do MEC aqui analisado são desastrosos, pois suas diretrizes neoliberais levarão à perda total de controle dos professores sobre seu exercício profissional e, com este conceito de formação em serviço (tanto a inicial como a continuada) baseada na ação-reflexão-ação, veremos instaurar-se como ocorreu na Argentina, segundo Davini (1997, p. 146), "uma política de incentivos pela obtenção de certificados, no sentido de uma trajetória profissional individualista e meritocrática, com maior controle das agências do governo sobre a prática do trabalho docente".

Com as investidas cruéis e esmagadoras aos sindicatos e as altas taxas de desemprego, a massa de trabalhadores da educação, com a sua formação "prática", cederá facilmente às investidas do capital e o prestígio profissional, que segundo Nóvoa (1991, p. 128) foi adquirido pelos docentes a partir do século XIX, graças às associações e sindicatos, tenderá ao desaparecimento, a diminuir cada vez mais até sua extinção total. Ascende um novo modelo sofisticado de explorar o trabalhador nesta sociedade moderna e global.

Em tal contexto, a recessão não é um instrumento econômico, mas principalmente um instrumento político disciplinador da classe trabalhadora. A recessão desmobiliza a classe trabalhadora e sua representação sindical, facilitando a introdução de novos padrões de acumulação que estão sendo gestados. O que está em jogo é a introdução de um novo e mais sofisticado modelo de exploração da classe trabalhadora, baseado em novas formas de organização e produção e em novas tecnologias, entre as quais destaca-se a informática. (Freitas, 1995, p. 120)

Instaura-se na vida do professor uma forma de disciplinar seu comportamento profissional e o binômio "saber-poder" (Davini, op. cit., p. 149) toma amplitude no poder do Estado e no medo dos docentes de perderem sua possível fonte de trabalho. Sem discussões filosóficas e ideológicas, o professor-prático cede às pressões e afunda-se na ação-reflexão-ação de um cotidiano alienado e alienante.

Felizmente, no Brasil encontramos focos de resistência às políticas neoliberais aplicadas à educação e à formação de professores. Como exemplo podemos citar a Associação Nacional para a Formação de Professores (Anfope) que, em seu documento para o Plano Nacional de Educação, aponta diretrizes contrárias às expostas no documento do MEC analisado. Essa proposta se diferencia da exposta pelo MEC por não admitir que a formação inicial do professor seja feita em serviço e limitada ao saber-fazer, quando reforça que o professor deve possuir uma formação teórica sólida que proporcionaria ao mesmo condições de refletir e assumir um compromisso social.

a) sólida formação teórica e interdisciplinar sobre o fenômeno educacional e seus fundamentos históricos, políticos, filosóficos e sociais que permita a apropriação de seu processo de trabalho, com condições de exercer a análise crítica da sociedade brasileira e da realidade educacional; este é um dos princípios que permitirá ao profissional da educação a compreensão da totalidade do processo de trabalho docente e a luta contra as tentativas de aligeiramento da formação via propostas neotecnicistas que pretendem transformá-lo num prático formado apenas nas disciplinas específicas, tal como se apresenta a proposta de Institutos Superiores de Educação. (Anfope, 1997, p. 2)

Mas como fica a educação infantil dentro deste quadro? Para a educação infantil e seus profissionais, a proposta de formação de professores defendida pelo MEC é extremamente nociva, pois acabará por reforçar algo que acompanhamos há anos no atendimento a crianças menores de 6 anos: a formação inicial realizada sem o mínimo de condições e conhecimentos necessários ao trabalho docente. Desta maneira, torna-se fácil o escamoteamento de um atendimento ruim, que acaba por empurrar a educação de crianças menores de 6 anos para o amadorismo, a improvisação, o vale tudo; obrigando seu profissional a se afastar cada vez mais da condição de professor que ensina, que deve possuir competência (que supere a improvisação, o amadorismo e a mediocridade), precisão técnica, rigor filosófico e disciplina metodológica, criatividade e criticidade na forma de entender e trabalhar o conhecimento conforme o contexto em que foi produzido. Alia-se ao exposto o reforço da formação emergencial em serviço, tão típica para os profissionais de educação infantil e que aparece reforçada nos discursos oficiais devido à baixa taxa de escolarização que os mesmos possuem: "com 1º grau: incompleto – 34.344, completo – 19.515 = total – 53.859; com magistério incompleto: 11.225" (Gatti, 1997, p. 21), o que justificaria, devido aos gastos que seriam muitos, não investir na capacitação deste pessoal dentro de cursos regulares no nível médio ou no ensino superior.

Os dados acima têm sido usados também como justificativa para que a educação infantil seja o "laboratório" do aligeiramento na formação profissional, por meio de programas de qualificação que unem supletivo de primeiro grau com formação técnica, laboratório que vem sendo utilizado pelo MEC desde finais de década de 1960, por meio da implantação de cursos emergencias realizados em serviço. Em nossa dissertação de mestrado (Arce, 1997), analisamos este movimento, com base em documentos que o MEC produziu para o professor durante as décadas de 1970 e 1980, e as conclusões a que chegamos não foram animadoras, pois pudemos perceber que estes docentes a todo momento tem reforçada a imagem de profissional através da mulher "naturalmente" educadora nata, passiva, paciente, amorosa que sabe agir com bom-senso, é guiada pelo coração, em detrimento da formação profissional. A não valorização salarial, a inferioridade perante os demais docentes, a vinculação do seu trabalho com o doméstico, o privado e a deficiência na formação aparecem como resultado. Poderíamos afirmar que todo o temor exposto neste texto, quanto ao destino da formação de professores, se faz real na educação infantil há muito tempo e tem sido fonte de lutas contrárias que buscam a valorização deste profissional e sua formação adequada. Cabe salientar que o documento de formação de professores aqui analisado, ao incentivar a formação inicial em serviço, desrespeita as diretrizes propostas pela Coordenadoria de Educação Infantil (1994), as quais afirmam que a formação inicial deve acontecer em nível médio e superior, proporcionando condições teóricas e práticas para este profissional atuar na área. Atrelado a este documento, um outro produzido por este mesmo órgão (Coedi, 1994) reafirma que os programas emergenciais de formação devem ser extintos, pois a formação entendida como um direito não é dissociada da profissionalização. Corremos o risco de ver destruírem-se anos de luta pela melhoria do atendimento na educação infantil, luta esta compartilhada com os movimentos sociais que foram de grande importância para a expansão deste tipo de atendimento em nosso país.

Assim como o Referencial para a formação de professores se apresenta como um retrocesso para a educação infantil, o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, tanto em sua versão preliminar (MEC, 1998a) quanto em sua versão definitiva (MEC, 1998b), o complementa, constituindo-se dentro do cenário neoliberal uma proposta na linha das Neba para a educação infantil e instrumental para este professor que possuirá sua formação inicial em serviço. Mais uma vez, vemos este profissional ser agraciado pelo MEC com um conjunto de receitas e instruções para a realização de seu trabalho, fato este que acaba por ocultar uma discriminação do professor de educação infantil que, devido ao seu histórico de má formação em nosso país, não necessita de investimentos que passem de manuais para direcionar seu trabalho. O referido documento, como muito bem apontou o Parecer sobre a versão preliminar do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, do GT 07 da Anped (1998), reforça o cunho psicologizante/cognitivista do atendimento infantil, não aproveita a produção existente na área, terminando por não privilegiar as especificidades deste atendimento, fato este claro pelo seu caráter manualístico.

Ainda em sua versão preliminar, o referencial trazia em relação à formação do professor um discurso num primeiro momento contraditório, pois afirmava que o profissional, para atuar com a educação infantil, deveria ser polivalente e ter uma sólida formação inicial (MEC, 1998a, p. 49), mas logo em seguida dava seqüência lógica ao discurso, afirmando que frente à precariedade desta formação no Brasil cabe a cada rede de ensino ou instituição se encarregar desta formação, ou seja, o governo não assume esta formação; compactuando com o analisado no documento anterior, abre-se caminho para o status de professor reflexivo também neste nível. Enfim, o profissional deve tornar-se, ele também, um aprendiz, refletindo constantemente sobre a sua prática e buscando informações necessárias para o trabalho que desenvolve (MEC, 1998a, p. 50). Portanto, diante do exposto, este documento, como ele mesmo se intitula, não poderia deixar de ser uma forma de instrumentalizar (MEC, 1998a, p. 51) estes profissionais. Ao contrário do que aponta Cerizara (1998, p. 12) em texto apresentado na 21ª reunião da Anped (texto este que procurou sintetizar os conhecimentos produzidos a partir dos pareceres emitidos para o RCNEI), de que os pareceristas do RCNEI não veriam nenhuma articulação deste com uma política de recursos humanos, acreditamos que o mesmo é fruto de tal política pois, afinal, diante da atual situação da educação infantil, que foi praticamente cortada do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) e seus profissionais excluídos do piso salarial, vemos o MEC apresentar um documento que em muito nos lembra a estrutura de documentos anteriores e corremos o risco de retornarmos ao trabalho voluntário como muito bem aponta Didonet (1998, p. 54):

(...) outra conseqüência malvada é a fratura feita na categoria magistério. Os professores do ensino fundamental passam a receber pelo menos 340,00 reais por mês, enquanto os de Educação infantil permanecem nos níveis ínfimos. O que foi posto como elemento de fortalecimento do magistério – melhor remuneração – funcionará como enfraquecimento da categoria, divisão e competição interna e (...) evasão da educação infantil.

Gostaria de salientar que a discussão provocada pelo RCNEI, em sua versão preliminar, foi de grande importância para a área. A leitura dos pareceres solicitados pelo MEC durante o processo de análise da versão preliminar do documento trouxe à tona questões aparentemente escondidas no documento, mas que significam retrocessos em relação ao conhecimento atingido até hoje a respeito da educação de crianças menores de 6 anos. Temos uma via dupla: ignoram-se as conquistas intelectuais na área e retornamos à falta de recursos específicos para o funcionamento adequado deste nível de educação. O recente livro organizado por Faria & Palhares (1999) traz aos educadores alguns dos pareceres e a importante síntese dos mesmos produzida por Cerizara (1998), além do trabalho de Faria (1999), o qual gostaria de destacar por discutir a importância arquitetônica dos prédios destinados à educação de crianças menores de 6 anos, comprovando que a mesma não pode ocorrer em locais sem a mínima infra-estrutura, necessitando, portanto, de investimentos para sua instalação e funcionamento. Estes textos devem ser estudados e debatidos, pois hoje temos em mãos a versão final do documento (MEC, 1998b) e o mesmo continua com sérios problemas, é mantido o cunho cognitivista fruto de seu caráter psicologizante, e as palavras de crítica dos pareceristas se encontram muito vivas e ainda por serem atendidas. Um exemplo deste fato são as palavras de Kuhlmann (1998, p. 3) a respeito da psicologização:

(...) o conteúdo mesmo da proposta é que provoca consternação. Embora arrolando extensa bibliografia, desconsidera boa parte do que nela está escrito e os avanços produzidos na área nas últimas décadas. Sem assinalar reflexões teóricas fundamentais, a proposta de referencial segue a via fácil dos modismos e dos jargões e frases de efeito sem significado. A Pedagogia, campo de conhecimento para se alicerçar uma orientação curricular, cede lugar a um psicologismo simplista, de cunho cognitivista.

Este problema apontado pelo autor é facilmente identificado no documento, quando após realizar sua leitura nos voltamos à sua extensa bibliografia que, na sua grande maioria, não é utilizada no texto. Destacamos que ao longo do documento não existem referências às autorias das idéias ali expressas. Exemplificamos este fato com o alicerce do pedagógico no documento que se apresenta pela utilização do chamado "construtivismo" como forma mais avançada de pensar e proceder, construtivismo este de definição eclética, uma verdadeira medusa com mil cabeças decrépitas, destituídas de seus fundamentos teóricos, assépticas, unidas à revelia de suas distintas visões de homem e sociedade e imposta de forma hegemônica:

A concepção de construção de conhecimentos pelas crianças em situações de interação social foi pesquisada com diferentes enfoques e abordagens por vários autores, dentre eles: Jean Piaget, Lev S. Vygotsky e Henri Wallon. Nas últimas décadas, esses conhecimentos que apresentam tanto convergências como divergências, têm influenciado marcadamente o campo da educação. Sob o nome de "construtivismo" reúnem-se as idéias que preconizam tanto a ação do sujeito, como o papel significativo da interação social no processo de aprendizagem e desenvolvimento da criança. Brasil (1998, p. 22)

Quando apontamos o construtivismo do RCNEI como uma medusa de mil cabeças decrépitas, estamos procurando chamar a atenção para o reducionismo gritante, que se faz presente, no documento das teorias de Piaget, Vigotski e Wallon. Vemos Vigotski sendo utilizado como aquele que fala das interações sociais, como práticas subjetivas entre indivíduos, Piaget como o que trata do desenvolvimento cognitivo e Wallon como o responsável pelo lado afetivo, pelo desenvolvimento do "eu" da criança. Este tipo de vulgarização destes teóricos e suas obras já vem sendo denunciado. Em relação aos trabalhos de Vigotski e à escola soviética, gostaríamos de destacar o trabalho realizado por Duarte (1996 e 2000) de crítica a este ecletismo, quando procura apresentar a não vinculação da teoria de Vigotski com o interacionismo e o construtivismo, fato este que tem caracterizado o psicólogo russo como aquele que traria o social para o construtivismo e para a escola, operando-se assim um exacerbado reducionismo de seus conceitos de social e interação, reduzidos a meras deduções provenientes do senso-comum.6 6 . "Além disso, parece-nos que freqüentemente essa questão é mal interpretada, pois se afirma que trazer Vigotski para o interacionismo-construtivista seria trazer o social para esta corrente. O senso comum pedagógico expresso na matéria publicada pela revista Nova Escola (Lagoa, 1994) já traduz isso dizendo que Vigotski seria uma "pitada de social no construtivismo". Uma leitura atenta de Vigotski revela que, apesar de tratar da questão da intersubjetividade, ele nunca reduziu o social a isso. Até porque a interação entre subjetividades era para Vigotski sempre uma interação historicamente situada, mediatizada por produtos sociais, desde os objetos até os conhecimentos historicamente produzidos, acumulados e transmitidos (Duarte, 1996, p. 87).

A gravidade deste ecletismo revela-se também na ausência de autores, cujos preceitos teóricos aparecem no texto como integrantes do construtivismo. Um exemplo deste fato está na página 23 do documento, no item "Aprendizagem Significativa e Conhecimento Prévio", onde em nenhum momento vemos citar-se ou fazer-se referência à teoria de Ausubel que, sabemos, explora amplamente o conceito de aprendizagem significativa. Podemos afirmar ainda que as orientações e a própria definição de construtivismo provêm dos estudos de Coll (1994, p. 136-137 e 1996, p. 390-391), que define o "construtivismo" como a integração das teorias de vários autores (Vigotski, Piaget, Ausubel e outros), que apesar de divergentes podem ser unidas a partir do princípio de que todos acreditam na construção do conhecimento e na "finalidade última da intervenção pedagógica de contribuir para que o aluno desenvolva a capacidade de realizar aprendizagens significativas por si mesmo numa ampla gama de situações e circunstâncias, que o aluno 'aprenda a aprender'" (Coll, 1994, p. 137). Apesar de não concordarmos com a posição assumida por Coll, o fato é que o documento do MEC não explicita a autoria dessas idéias, o que impede o professor de ir aos autores das mesmas. Um outro exemplo que podemos dar refere-se ao trato em relação aos conteúdos e sua divisão em: atitudinais, procedimentais e conceituais; que também é amplamente discutida por Coll (1998). Aliás, estes textos de Coll alicerçaram os documentos das reformas espanholas, que como muito bem apontou Haddad (1998) foram reproduzidos no texto preliminar sem serem citados, e assim permanecem nesta versão definitiva. Cabem aqui alguns questionamentos: como um documento eclético e incoerente teoricamente pode contribuir para a real melhoria da qualidade do atendimento na educação infantil, área esta já marcada pelo ecletismo que, na maior parte das vezes, levou ao amadorismo e utilização do senso comum para guiar o trabalho pedagógico?7 7 . Esta questão que envolve a caracterização do construtivismo no Brasil vem sendo objeto de estudos mais aprofundados em projeto de pesquisa integrado, coordenado pelo Prof. Dr. Newton Duarte e financiado pelo CNPq, intitulado: "Construtivismo: Suas muitas faces, interfaces e filiações", no qual atuaremos como membro da equipe de pesquisa até sua conclusão, em julho de 2000.

A esta questão gostaria de agregar uma outra que já foi apresentada nos diversos pareceres e em especial no de Palhares & Martinez (1999), que se refere à descontinuidade que marca o documento em relação às políticas para a educação infantil implementadas pela gestão anterior da Coordenadoria de Educação Infantil (Coedi), substituída pela atual que produziu o documento. Por que insistir em desconsiderar preceitos que foram produzidos juntamente com a comunidade acadêmica e docente? A letalidade deste fato é caracterizada pela subutilização da produção da área no documento e em especial da produção da gestão anterior da Coedi. Podemos exemplificar este fato em relação à referência que o documento faz em sua página 43 às constatações apresentadas no livro Propostas pedagógicas e currículo em educação infantil, produzido pelo Coedi em 1996 (cujo objetivo era o de mapear e desenvolver uma metodologia de análise para as diversas propostas pedagógicas/curriculares em vigor nas secretarias de educação dos estados e municípios das capitais do Brasil):

A partir do diagnóstico realizado pela COEDI/DPE/SEF/MEC das propostas pedagógicas e dos currículos de educação infantil de vários estados e municípios brasileiros em 1996, pode-se observar alguns dados importantes que contribuem para a reflexão sobre a organização curricular e seus componentes. Essa análise aponta para o fato de que a maioria das propostas concebe a criança como um ser social, psicológico e histórico, tem no construtivismo sua maior referência teórica, aponta o universo cultural da criança como ponto de partida para o trabalho e defende uma educação democrática e transformadora da realidade, que objetiva a formação de cidadãos críticos. Ao mesmo tempo, constata-se um grande desencontro entre os fundamentos teóricos adotados e as orientações metodológicas. Não são explicitadas as formas que possibilitam a articulação entre o universo cultural das crianças, o desenvolvimento infantil e as áreas do conhecimento. Com objetivo de tornar visível uma possível forma de articulação, a estrutura do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil relaciona objetivos gerais e específicos, conteúdos e orientações didáticas numa perspectiva de operacionalização do processo educativo. (MEC, 1998b, p. 43)

Ocorre que o referido documento da Coedi de 1996 não chega exatamente a esta conclusão a respeito dos pontos negativos ou fracassos das propostas veiculadas pelas secretarias de educação estaduais e municipais. O documento não aceita o construtivismo como hegemônico e como solução única para os problemas, bastando apenas que a ele se adequassem de forma mais apropriada objetivos, conteúdos e orientações didáticas. O documento abre espaço para um debate que não se esgotou na área educacional ao intitular um de seus itens como: "Construtivismo: é essa a solução?". O RCNEI, numa posição claramente autoritária, dá este debate por encerrado, definindo e especificando o construtivismo de fundamentação eclética como o que há de mais avançado em termos educacionais. Fica-nos evidente que as críticas do documento de 1996 cabem ao RCNEI, como podemos verificar na seguinte citação:

O construtivismo é a referência teórica utilizada com maior freqüência nos documentos analisados. É como se fosse uma palavra mágica que resolveria todas as questões pedagógicas ou uma chave valiosa que abriria as portas da credibilidade de qualquer projeto. O suposto valor no mercado educacional dado a essa palavra parece ser o maior responsável pelo seu uso indiscriminado e por suas inúmeras utilizações. Desta forma, o que se verificou no discurso foi a utilização bastante generalizada do construtivismo piagetiano, com múltiplas interpretações:

• Construtivismo enquanto concepção de aprendizagem e desenvolvimento;

• Construtivismo enquanto concepção de alfabetização;

• Construtivismo enquanto método.

Nos documentos, outra referência feita também com grande freqüência diz respeito à perspectiva sócio-interacionista ou sócio-histórica de Wallon e Vygotsky. Algumas vezes essas referências se fazem enquanto uma complementação à perspectiva piagetiana, outras vezes enquanto oposição a esta e outras ainda como uma superação desta forma de abordagem. Em alguns casos, constata-se uma confusão de perspectivas, evidenciada na justaposição de enfoques teóricos. (MEC, 1996, p. 41) (Grifo meu)

Esta passagem é clara ao apontar que não existe acordo até mesmo em relação a qual função o construtivismo deve desempenhar na estrutura curricular para a educação infantil. Nota-se que o documento refere-se a uma "confusão de perspectivas" na definição do termo construtivismo de algumas propostas, que ocasionaria a colagem de autores de diversas e distintas correntes de forma indiscriminada. Parece-nos que a definição de construtivismo presente no RCNEI atende a esta "justaposição" e, portanto, não inova, não traz nada de diferente em relação ao que pode ser constatado no dia-a-dia das escolas; esse documento apenas torna esta "confusão" oficial e hegemônica. O documento de 1996 evidencia muito bem que este tipo de proposta não serviu para solucionar, nem ao menos amenizar os problemas encontrados nas escolas, ao contrário, imposto de forma arbitrária a profissionais treinados em serviço, gerou a multiplicação de chavões e a busca desenfreada por receitas que facilitassem a adoção de tais concepções, não compreendidas pelos professores.

O trato inadequado dessa questão leva, algumas vezes, a mudanças no discurso dos educadores, com a incorporação de "chavões", enquanto suas práticas permanecem inalteradas. (...) Desta forma, é possível concluir que não é a adoção de um modismo teórico, tal como vem sendo feito com o construtivismo, que irá solucionar os problemas das relações ensino/aprendizagem na educação infantil. (MEC, 1996, p. 42)

Parece-nos que a área de educação infantil, tanto no que concerne ao meio acadêmico, como no que abrange o cotidiano das escolas, já vem provando o gosto amargo do ecletismo presente no RCNEI e comprovando que o mesmo em nada contribui para a melhoria deste nível de educação. Mas por que insistir em fórmulas fadadas ao fracasso? Esta pergunta poderia ficar sem resposta, mas na verdade a própria questão torna-se nula se deslocarmos nosso olhar para que possamos enxergar o RCNEI como apenas uma pequena ponta de um iceberg enorme, constituído pelo ideário neoliberal para a educação, política e organização de nossa sociedade. Visto a partir deste prisma, este construtivismo eclético que o marca torna-se coerente diante do aligeiramento da formação do professor (já existem cursos formando professores de educação infantil em menos de 2 anos em nível superior), o que gerará a necessidade de grandes manuais, os quais este profissional "crítico-reflexivo" será incapaz de questionar. Por sua vez o aligeiramento na formação do professor alimenta e é alimentado pelo empobrecimento cultural de nosso país, que leva ao esvaziamento do conteúdo escolar, elevando à categoria de conteúdo temas como: mídia e multimídia e a tão propagada diversidade cultural. Diversidade esta que no atual contexto nada mais é do que trabalhar nos futuros homens e mulheres neoliberais o conceito de eqüidade tão caro ao neoliberalismo. Afinal, a igualdade é impossível, segundo Hayek, e tentar tornar todos iguais é uma arbitrariedade; a verdadeira justiça e respeito reside na promoção da eqüidade, ou seja, respeito e promoção das diferenças naturais, em tese não existe mais trabalhador explorado, as classes sociais acabaram, basta agora que a escola deixe de lado estas discussões ideológicas inúteis, juntamente com estes conteúdos universais ultrapassados, e ensine o aluno a aprender a aprender, buscando informações no mundo que o rodeia, reconhecendo diferenças e aprendendo a conviver com elas. Fala-se muito que os meios de comunicação, a Internet, os cd-rooms etc, veiculariam muita informação e em grande velocidade e que caberia à escola apenas ensinar os alunos a buscarem e selecionarem informações e o conhecimento que seja do seu interesse. O que poucos explicam é qual o conhecimento efetivamente transmitido por esses meios. Por exemplo, no caso da TV, qual conhecimento é veiculado por programas como Xuxa, Angélica, Ratinho, H da Band, entre outros, que, de fato, levasse a algum enriquecimento do universo cultural das jovens gerações? Qual tipo de conhecimento vem sendo realmente veiculado pelos cd-rooms? Basta lembrar uma propaganda de uma enciclopédia em cd-room, onde a pergunta feita era se na velha enciclopédia do telespectador havia alguma referência ao jogador de futebol Ronaldinho.

Assim como o Referencial para a formação do professor escamoteia a descaracterização do papel do professor como um intelectual, por meio da "elevação" do mesmo à categoria de prático-reflexivo, o RCNEI escamoteia o esvaziamento do conhecimento na escola, vendendo a falsa idéia de que o respeito a uma pseudo-diversidade cultural e a redução da educação escolar ao aprender a aprender garantiriam ao aluno a capacidade de construir seu próprio conhecimento no contato com os "modernos" meios de circulação de informações. Premissas falsas capazes de esconder a letalidade de uma política ditatorial, pois como podemos falar em respeito real às diferenças enquanto a renda de nosso país concentra-se cada vez mais nas mãos de poucos, levando a grande massa a um empobrecimento violento? Como falar em "aprender a conviver com o outro" trabalhando em equipe se a competição selvagem tem gerado um individualismo exacerbado, nesta etapa do capitalismo em que a recessão (Freitas, 1995) vem se configurando como uma nova forma de explorar o trabalhador, por meio da dissolução de organizações coletivas, pois o "salve-se quem puder impera"?

Enfim observamos, com as análises até aqui esboçadas, que antigos preceitos provindos do liberalismo clássico estão extremamente fortalecidos nas políticas neoliberais para a formação de professores, sendo o principal deles a exacerbação do processo de individualização, que traz danos irreparáveis para o professor, que pode perder seu status profissional; para as crianças que receberão um ensino de baixíssima qualidade capaz de afundá-las na mediocridade; para a educação infantil que retornará no tempo jogando fora todos os avanços e estudos até aqui realizados e, finalmente, para a educação de forma geral que mergulhará num neotecnicismo, onde determinantes sociais e o debate ideológico serão secundários. Temos a nossa frente um kit desastroso constituído pelo neoliberalismo e que vem travestido de modernidade e progresso, através do aprender a aprender e que está sendo vendido para o professor com a garantia de que, comprando, ele ganhará grátis um novo estatuto profissional e mais liberdade para seu trabalho, ao ser considerado como capaz de refletir sobre sua prática e a partir dela produzir conhecimentos. Resistir a este kit é nosso dever moral e profissional, cabe aos intelectuais denunciarem as conseqüências nefastas para a educação que o neoliberalismo e seu discurso têm trazido, auxiliando a classe dos professores a não se tornar escrava dentro de seu próprio ambiente de trabalho: a escola.

Recebido para publicação em 15 de agosto 2000.

1. Neste artigo, limitamo-nos a analisar a versão preliminar deste documento apesar de já possuirmos a versão final, por considerarmos de grande importância as idéias apresentadas no mesmo, que em sua essência não se modificaram na versão final.

BUY THE NEOLIBERAL KIT FOR EARLY CHILDHOOD EDUCATION AND WIN FREE THE TEN STEPS TO BECAME A REFLEXIVE TEACHER

ABSTRACT: The objective of this article is to contribute at the present time for the reflection about the teacher's infant education formation. Therefore, it is done a revision of the bibliography that has been alerting for the interfaces of the neo-liberalism and the post-modernism with the educational politics and, especially, the politics of teacher's formation. The documents produced by MEC, as guiding for the implementation of the neo-liberal ideal in the field of the teacher's infant education formation, are analyzed, as References as for the teacher's formation as to define knowledge to be worked in the education from 0 to 6. At the end, we conclude that the tendencies of this process are the haste the teacher's formation, the gradual loss of control of the same ones on its professional exercise and the transformation of the classrooms of infant education in labs of implementation of the pedagogic ideals intimated to the neo-liberalism and the post-modernism.

Key words: Childhood education, teacher training, neo-liberalism, educational politics.

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  • Notas
  • 2
    . Articulado ao conceito de competitividade, temos o conceito de eqüidade, assim definido por Gentili (1996, p. 43): "Vale destacar que 'eqüidade' costuma se contrapor, na terminologia neoliberal, a 'igualdade'. O conceito de eqüidade articula-se assim com um conceito de justiça que reconhece a necessidade de respeitar, e inclusive promover, as diferenças naturais existentes entre as pessoas. Justo é o sistema social onde tais diferenças são respeitadas contra toda pretensão arbitrária (política) por garantir uma suposta igualdade". A competitividade aqui, segundo Coraggio (1996, p. 93-94), é entendida como algo altamente saudável e necessário para que possamos ter maior qualidade e produtividade, permitindo uma redução no tempo e um aumento significativo na qualidade.
  • 3
    . Esta fragmentação, segundo Frederico (1995, p. 182), pode ser observada nos seguintes níveis:
    a) fragmentação no interior da industria para se atingir a produção flexível; b) fragmentação do mercado através da passagem da produção em massa para a produção de artigos "diferenciados", objetivando atender as expectativas de um mercado consumidor segmentado; c)fragmentação da classe operária, pelo mercado de trabalho dual e suas conseqüências nefastas (crise do sindicalismo e das demais formas de associativismo); d) fragmentação do sujeito político, com a substituição da ação classista, pela ação molecular de "minorias", em seu interminável movimento de diferenciação; e) fragmentação do discurso político: a luta contra a exploração econômica transfere-se para a denúncia de injustiças, e a reivindicação jurídica dos "direitos da cidadania" reduzida a façanha de pulverizar o mundo do trabalho num amontoado de cidadãos onde reivindicam consumidores; f) finalmente, pode-se assistir a fragmentação da própria atividade política, com a substituição dos partidos pela ação particularistas dos lobbies, grupos de interesse e corporações profissionais.
  • 4
    . Para uma análise crítica da presença dominante do lema "aprender a aprender" no relatório Jacques Delors, ver Duarte (2000).
  • 5
    . Para uma análise crítica da nova LDB, ver Saviani (1997).
  • 6
    . "Além disso, parece-nos que freqüentemente essa questão é mal interpretada, pois se afirma que trazer Vigotski para o interacionismo-construtivista seria trazer o social para esta corrente. O senso comum pedagógico expresso na matéria publicada pela revista Nova Escola (Lagoa, 1994) já traduz isso dizendo que Vigotski seria uma "pitada de social no construtivismo". Uma leitura atenta de Vigotski revela que, apesar de tratar da questão da intersubjetividade, ele nunca reduziu o social a isso. Até porque a interação entre subjetividades era para Vigotski sempre uma interação historicamente situada, mediatizada por produtos sociais, desde os objetos até os conhecimentos historicamente produzidos, acumulados e transmitidos (Duarte, 1996, p. 87).
  • 7
    . Esta questão que envolve a caracterização do construtivismo no Brasil vem sendo objeto de estudos mais aprofundados em projeto de pesquisa integrado, coordenado pelo Prof. Dr. Newton Duarte e financiado pelo CNPq, intitulado: "Construtivismo: Suas muitas faces, interfaces e filiações", no qual atuaremos como membro da equipe de pesquisa até sua conclusão, em julho de 2000.
  • * Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação, área de concentração em Educação Escolar, da Unesp/FCL de Araraquara, bolsista do CNPq.
    Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação, área de concentração em Educação Escolar, da Unesp/FCL de Araraquara, bolsista do CNPq. E-mail: learce@zipmail.com.br
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Dez 2001
    • Data do Fascículo
      2001

    Histórico

    • Recebido
      15 Ago 2000
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