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Ética e estética numa sociedade administrada

ÉTICA E ESTÉTICA NUMA SOCIEDADE ADMINISTRADA * * Resenha dos livros Teoria Crítica, ética e educação e Teoria Crítica, estética e educação - o primeiro organizado por Luiz A.C. Nabuno Lastória, B.C. Guimarães da Costa e Bruno Pucci; o segundo por este último autor e Antonio Alvaro Soares Zuin e Newton Ramos-de-Oliveira (Campinas/Piracicaba: Autores Associados/Editora Unimep, 2001). ** Paula Ramos de Oliveira é professora da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp, Campus de Araraquara. E-mail: paula-ramos@uol.com.br

Paula Ramos** * Resenha dos livros Teoria Crítica, ética e educação e Teoria Crítica, estética e educação - o primeiro organizado por Luiz A.C. Nabuno Lastória, B.C. Guimarães da Costa e Bruno Pucci; o segundo por este último autor e Antonio Alvaro Soares Zuin e Newton Ramos-de-Oliveira (Campinas/Piracicaba: Autores Associados/Editora Unimep, 2001). ** Paula Ramos de Oliveira é professora da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp, Campus de Araraquara. E-mail: paula-ramos@uol.com.br

O pensamento de Theodor W. Adorno firma-se cada vez mais fortemente em nossos tempos. Dotado de dialeticidade e assentado num marxismo que manteve sua integridade como centro heurístico, esteve em diálogo com as correntes filosóficas significativas do século que há pouco se fechou. Caracterizou-se, assim, como instrumento capaz de desvelar a falsidade de uma realidade construída por uma sociedade opressora. Eis aí a atração exercida pelos conceitos adornianos e, sobretudo, por seu processo, extremamente original de investigação e desvelamento. A Escola de Frankfurt foi seu espaço privilegiado, um ambiente aberto de trabalho realmente coletivo, porque feito por estudiosos de diferentes formações acadêmicas, que conjugavam esforços, mas não uniformizavam, não empobreciam os caminhos.

Ser investigador desse pensamento original é reproduzir-lhe os traços básicos: ser marxista heurístico, estar em diálogo constante com linhas divergentes, conjugar visões acadêmicas e estar extremamente ligado a conceitos e conclusões atualizadas e, sobretudo, a um processo rigoroso de reflexão crítica. Este conjunto de compromissos tem sido efetivado também por este grupo de investigadores brasileiros que, reunidos no Colóquio "O ético, o estético Adorno" (Piracicaba/SP, 1998), têm seus ensaios reunidos nos dois livros que são objeto de nossos comentários: Teoria Crítica, ética e educação e Teoria Crítica, estética e educação. Ambos têm uma origem comum no mesmo objeto formal - a Teoria Crítica - e seu objeto material na educação. Só se distinguem pela ênfase maior na ética ou na estética, motivo pelo qual usaremos estes vocábulos para diferenciá-los.

Ética é composto por três seções: o desvelamento do modelo opressivo de globalização agora imposto, a problemática ética que aí se instala e a formação cultural. A globalização como atualmente realizada é estudada por Bruno Pucci, Ramón Peña Castro, Nelson Palanca e Rafael Cordeiro. As conexões íntimas entre este modelo e a sociedade administrada são evidenciadas, bem como sua construção e dinâmica pelo predomínio do pensamento instrumental. Neste solo opressor, como ver a afirmação ética? Eis o problema investigado a seguir por Oswaldo Giacóia Júnior, Marcia Tiburi, Rodrigo Duarte, Iray Carone, Luiz A. Nabuco Lastória, Ricardo C. Barbosa, Adriano Correa Silva e Humberto A. de O. Guido. Neste núcleo da Ética, a problemática é investigada nos mais variados campos: na investigação científica, na psicanálise, na práxis. Os combates são indicados entre a barbárie que se firma e se expande e o esclarecimento que resiste, porque é essencial aos seres bem formados. Nestes estudos centrais, desfilam ao lado de Adorno os grandes nomes da tradição humana: os demais integrantes da Teoria Crítica; aqueles que sustentam as raízes do pensamento lúcido, como Platão, Arístóteles, Descartes, Giambattista Vico, Thomas Hobbes, Immanuel Kant, Hegel; e, ainda, os interlocutores contemporâneos, como Jürgen Habermas, Karl Otto Apel, Freud, Agnes Heller.

Do terceiro bloco de estudos da Ética, a educação, falaremos ao final, pois é solo comum aos dois livros.

Do livro Ética passamos diretamente ao Estética por uma ponte construída por Rodrigo Duarte, com seu artigo "Mundo globalizado e estetização da vida". Rodrigo - que já no livro anterior havia se debruçado sobre esta problemática em "Ética e prática social: uma abordagem a partir da Teoria Crítica" - amplia seus instrumentos de investigação, examinando a apropriação da cultura por sua antítese, a onipresente indústria cultural, numa confirmação do agudo insight que Adorno e Horkheimer tiveram deste cimento da vida danificada. O tema é retomado, então, por Ramos-de-Oliveira, que analisa as duas faces opressivas, a da indústria cultural e a da semiformação. Agindo pelo lado objetivo e reforçando-se subjetivamente por seu produto, ambas, a indústria cultural e a semiformação, envenenam a produção, a circulação e a distribuição dos bens culturais e tendem até a atingir parte substancial da recepção. Nesse espaço de fechamento do conjunto ético e abertura do conjunto estético é que se insere também o texto de Jeanne Maria Gagnebin. Aponta-se, nessa reflexão em torno de mimesis e autonomia, as linhas confluentes entre as duas experiências fundamentais, a estética e a ética.

Hélio Roque Hartmann, Amós Nascimento, Luiz H. Fabiano e Henrique G. Sobreira analisam conceitos extremamente interessantes como especificidades utópicas da arte, dialética da comunicação, mecanismos psicológicos da identidade do educador e racionalidade burguesa como obstáculo a um projeto de sociedade justa.

Diez ilustra esta problemática analisando a arte de Chagall e Glauce Arzua, tomando como objeto de reflexão os estilos musicais de Schoenberg e de Stravinksy.

Toda essa riqueza conceitual e esse dinamismo reflexivo que investigam a industrialização da arte e da cultura, atuando sobre o processo de dominação dos homens, formam um complexo que coloca desafios ao educador de nosso tempo e nossos espaços. Belarmino C.G. da Costa alerta-nos que o extraordinário desenvolvimento das transformações tecnológicas torna tais desafios mais prementes. São territórios novos a serem percorridos, investigados e dominados. Aos educadores conscientes cabe tomar em consideração este mundo que se firma através do pensamento uniformizadamente instrumental, como nos adverte o ensaio de Monique Andries Nogueira. Aqui retomamos o que chamávamos de terceiro bloco do Ética para destacar os estudos de Marcia R.T. Dias, Paulo Sérgio Bereoff, Antônio Álvaro Soares Zuin e Roberto Rondon - todos com firme e lúcido compromisso com o objeto central do processo formativo e cada um apontando para uma determinada área, sem perda da visão de conjunto: a indústria fonográfica, o trabalho corporal, a luta incessante para estimular a emancipação.

Como constatado, é toda uma equipe que - cada um com sua formação profissional específica e seus interesses especiais - ajuda a construir um painel inevitável de problemas e reflexões ao educador de nossos dias.

Ética e Estética são dois grandes livros, pela atualidade de seus temas e pelo valor inestimável de seus ensaios. E esta qualidade é elevada ao mais alto expoente pelo fato de trazer dois ensaios de Theodor W. Adorno: "A arte é alegre?" e "Teses sobre religião e arte hoje". Estes ensaios convidam à leitura e à releitura. São monumentos que exemplificam a riqueza e profundidade do pensamento de Theodor W. Adorno e seu significado estimulante para a educação e para os educadores.

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    Resenha dos livros
    Teoria Crítica, ética e educação e
    Teoria Crítica, estética e educação - o primeiro organizado por Luiz A.C. Nabuno Lastória, B.C. Guimarães da Costa e Bruno Pucci; o segundo por este último autor e Antonio Alvaro Soares Zuin e Newton Ramos-de-Oliveira (Campinas/Piracicaba: Autores Associados/Editora Unimep, 2001).
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    Paula Ramos de Oliveira é professora da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp, Campus de Araraquara.
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Out 2001
    • Data do Fascículo
      Out 2001
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