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Além da Agenda Endógena da Educação: propostas para a construção coletiva de um projeto de desenvolvimento

Beyond an Endogenous Agenda in Education: proposals for the collective construction of a development project

Au dela de L'agenda Endogène de L'éducation: propositions pour la construction collective d'un projet de developpement

Resumos

Em pleno século 21, o Brasil ainda acumula desigualdades e ausências no campo educacional. As causas são múltiplas e estão associadas aos aspectos endógenos do sistema educacional, bem como aos aspectos associados às marcas profundas da crônica desigualdade social. O objetivo deste artigo é esboçar elementos que auxiliem a construção de uma agenda para a educação na perspectiva do desenvolvimento. Para isso será preciso realizar reformas estruturais para ampliar o financiamento, fortalecer o pacto federativo, desmercantilizar a oferta de serviços e promover a eficiência da gestão pública. Também requer o resgate da democracia e da política, o reforço do papel do Estado e a gestão macroeconômica voltada para o objetivo de redistribuir renda e garantir direitos sociais.

Education; Social Welfare Economics; Social Protection; Social and Labor Economics; Education and Development


In the wake of the 21st century, Brazil continues to accumulate huge inequalities and large deficits in the educational field. The causes are multiple, associated with endogenous aspects of the educational system itself, as well as with deep marks of chronic social inequalities. The aim of this paper is to outline elements that would help build an agenda for education from a developmentalist perspective. To this end, structural reforms must be carried out, so as to enhance financing, strengthen the federative pact, decommodify the provision of educational services and improve the efficiency of public management. It also requires rescuing democracy and politics, reinforcing the State's role and improving macroeconomic management oriented towards better income redistribution and consolidation of social rights.

Teacher Education Policies ; Permanent Forums for Teacher Education Support; Collective Social Subjects


On est en plein XXIème siècle et le Brésil accumule toujours des inegalités et des déficits aigus dans le domaine de l´éducation. Les causes en sont nombreuses, elles sont liées aux aspects endogènes du système éducatif et aussi associées aux marques profondes d'une inegálité sociale chronique. Cet article a pour but de soulever quelques éléments qui pourraient servir à la mise en place d´un agenda pour l´éducation dans une optique du développement. Pour autant, il faudra envisager des réformes structurelles de sorte à élargir le financement du secteur, renforcer le pacte de la fédération, obtenir la dé-marchandisation des services éducatifs et promouvoir une gestion publique véritablement efficace. De même, il faudra s´engager dans la récupération de la démocratie et de la politique et dans la préservation du rôle de l´Etat et d´une gestion macroéconomique orientée vers la redistribution des revenus et la garantie des droits sociaux.

Éducation; Économie du Bien-être Social; Protection Sociale; Économie Sociale et du Travail; Éducation et Développement


Apresentação

A maior parte dos países desenvolvidos eliminou o analfabetismo no início do século 20. O Brasil ainda acumula desigualdades e ausências. A escolaridade média da população é baixa e o analfabetismo funcional é elevado. A universalização da oferta apresenta lacunas no ensino infantil, médio e superior. A taxa de reprovação é elevada em relação aos países da América Latina. Entrada tardia na escola, aprendizado deficiente, reprovação, evasão e retorno levam à "distorção idade-série". Mais grave é que estar na escola não garante o aprendizado. Ofertar um ensino de qualidade continua sendo o grande desafio da agenda dos educadores.

As causas desses problemas são múltiplas e estão associadas a aspectos endógenos e exógenos à escola. A responsabilidade do sistema educacional tem dimensões relacionadas a uma série de deficiências específicas vinculadas a fatores como, por exemplo, formação, carreira e salários dos professores; infraestrutura inadequada; tamanho da escola; número de alunos por sala de aula; turnos de funcionamento e tempo parcial; organização escolar; processos pedagógicos; organização curricular; e políticas de acesso, permanência e acompanhamento pedagógico.

Mas as deficiências do sistema educacional brasileiro também decorrem de aspectos exógenos ao setor educacional, associadas às marcas profundas da crônica desigualdade social brasileira que têm raízes históricas herdadas do passado escravocrata (CARVALHO, 2001CARVALHO, J. M. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.), do caráter específico do capitalismo tardio (CARDOSO DE MELLO, 1998CARDOSO DE MELLO, J. M. O capitalismo tardio; contribuição à revisão crítica da formação e do desenvolvimento da economia brasileira. 10. ed. Campinas: IE-UNICAMP, 1998.) e da curta experiência democrática. (SKIDMORE, 1989SKIDMORE, T. E. Brasil: De Castelo a Tancredo. 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989.)

Num país de capitalismo tardio, igualdade de oportunidades é mito. Fatores históricos, culturais e socioeconômicos interferem no aprendizado: raça, pobreza, desigualdade da renda, inserção precária no mercado de trabalho, analfabetismo dos pais, moradias precárias, falta de acesso à saúde, saneamento e transporte público, cultura da violência que impera nas periferias urbanas, desestruturação das famílias, crescente papel da mulher no mercado de trabalho e como chefe da família, dentre outros.

Não é por acaso - ou por culpa da vítima - que, por exemplo, a escolaridade média dos negros e não negros apresenta enorme desigualdade. O mesmo se observa em relação à população que vive no campo e nas cidades. Os educandos de famílias em situação de miséria extrema são grupos vulneráveis e com dificuldades para aprender, se não forem objetos de atenção especial. O próprio sistema educacional é reprodutor das desigualdades. As regiões mais pobres do país têm os piores indicadores de educação, adequação da infraestrutura escolar, formação de professores.

Nesse sentido, subdesenvolvimento também representa um forte limitador do aprendizado. Existem evidências da correlação entre educação e distribuição de renda. Sociedades mais igualitárias e com maior renda per capita apresentam melhores indicadores de desempenho como, por exemplo, anos de escolaridade e qualidade da educação.

Em função desse fato, as notas a seguir procuram ressaltar a importância da construção coletiva de um projeto de transformação que deveria servir como referência para a luta política no Brasil neste início do século 21. Neste artigo serão privilegiados os condicionantes políticos e econômicos exógenos ao setor da educação, dado que as questões endógenas têm sido amplamente estudadas e debatidas pelos especialistas setoriais. Numa eventual etapa posterior deste trabalho, poder-se-á articular o enfoque endógeno com o exógeno tratado no âmbito deste artigo.

A construção coletiva de um novo projeto de transformação

Este artigo tem por objetivo esboçar elementos que auxiliem a construção coletiva de uma agenda para a Educação na perspectiva do desenvolvimento. Isso porque nas últimas décadas o campo progressista deixou de tratar dos grandes temas nacionais relacionados ao enfrentamento do subdesenvolvimento político, econômico e social do país. (FAGNANI, 2014FAGNANI. E. Fragmentação da luta política e agenda de desenvolvimento. Iniciativa: Plataforma Política Social. 2014. Disponível em: <http://plataformapoliticasocial.com/2014/07/22/fragmentacao-da-luta-politica-e-agenda-de-desenvolvimento/>.
http://plataformapoliticasocial.com/2014...
)

A fragmentação da luta política em torno de pautas setoriais específicas tem prevalecido ante o debate de temas estruturais. Com raras exceções, perdeu-se a perspectiva de que o encaminhamento de muitas dessas pautas segmentadas depende de superarem-se constrangimentos estruturais políticos e econômicos mais gerais. A segmentação de pautas tende a conduzir os diversos atores políticos para labirintos cujas portas de saída dificilmente serão encontradas.

Esse quadro mais geral tem influenciado a ação dos movimentos sociais, partidos políticos e sindicatos do campo progressista. "Os partidos estão desengonçados, os movimentos sociais fracionados, os sindicatos aquém do espaço que lhes cabe", alerta a professora Maria da Conceição Tavares (2014TAVARES, M. C. Resistir para avançar. O resto é arrocho. Entrevista a Saul Leblon. Carta MaiorSão Paulo, 11/06/2014. Disponível em: <http://www.cartamaior.com.br/?/Editorial/Maria-da-Conceicao-Tavares-Resistir-para-avancar/31125>.
http://www.cartamaior.com.br/?/Editorial...
).

O papel que se espera dos partidos políticos progressistas, como instituições articuladoras das demandas da sociedade, numa perspectiva de transformação foi esvaziado nas últimas décadas.

O ataque ao poder dos sindicatos, protagonista das transformações sociais no capitalismo, também foi um dos focos da investida neoliberal. No Brasil da década de 1990 os sindicatos sofreram duros golpes e derrotas. Em parte por isso, o movimento sindical permanece defendendo pautas corporativas do "chão de fábrica" em detrimento do debate sobre os grandes temas nacionais.

Esse enredo que acomete os partidos políticos e os sindicatos interfere na ação do movimento social em seu conjunto. Como se sabe, é da natureza destas mobilizações setoriais tratar de temas também setoriais ou específicos. Mas na ausência da ação mobilizadora dos partidos, observa-se a fragmentação das pautas de luta política em torno de questões muito específicas. Em geral, perdeu-se a perspectiva de que pouco poderá ser feito em termos setoriais na ausência de um projeto de transformação.

A academia também não escapa desta lógica. Em relação ao passado, sobretudo nos anos 1950 a 1970, são poucos os trabalhos que debatem as questões nacionais na perspectiva do desenvolvimento. A questão é complexa e reflete, em alguma medida, os valores do individualismo, da meritocracia e da produtividade que foram enraizados no seio das universidades.

O movimento social em defesa da Educação Nacional também é prisioneiro deste labirinto. Em relação ao passado - especialmente durante a fase de redemocratização do país nos anos 1970 - são poucos os trabalhos que debatem as questões educacionais na perspectiva de um projeto político, econômico e social de transformação. De modo geral, a agenda privilegia as questões internas ao setor. Perdeu-se, em alguma medida, a percepção de que o encaminhamento de muitas dessas questões depende de se superarem condicionantes mais gerais exógenos ao setor.

O mal-estar intensificado após os protestos populares de junho de 2013 reabre perspectivas para impulsionar a retomada do pensamento crítico sobre um projeto de transformação na perspectiva do desenvolvimento, com distribuição da renda e universalização da cidadania social. Em última instância, os protestos repuseram o conflito redistributivo no centro do debate nacional. As respostas não podem ser minimalistas, mas pensadas na perspectiva de um projeto de transformação.

O desafio do campo progressista é ampliar os diálogos na perspectiva de construir consensos para a formulação de um projeto nacional nucleado no combate às diversas faces das desigualdades sociais, o que demanda a construção de um campo de alianças e debates públicos cada vez mais ampliados.

Perspectiva histórica e estrutural

A perspectiva histórica e estrutural sugere que a raiz dos problemas atuais do sistema educacional está associada ao passado escravocrata, ao caráter específico do capitalismo tardio e à curta experiência democrática. Porém, ela também tem relação com o profundo antagonismo entre os princípios formais estabelecidos pela Constituição de 1988 e o contexto político e econômico vividos pelo Brasil durante a transição democrática e, especialmente, na década de 1990, quando o Brasil aderiu à doutrina neoliberal.

Nessa perspectiva, a política de educação reflete, com especificidades, a trajetória da política social brasileira nas últimas décadas entrecortada por dois movimentos que caminham em direção oposta. (FAGNANI, 2005FAGNANI, E. Política social no Brasil (1964-2002): entre a cidadania e a caridade. 2005. Tese (Doutorado em Educação) - Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2005.; 2011FAGNANI, E. A política social do Governo Lula (2003-2010): perspectiva histórica. Texto para Discussão n. 192, Campinas, IE/UNICAMP, junho, 2011.) O primeiro aponta o rumo da estruturação de políticas inspiradas em alguns dos valores dos regimes de Estado de Bem-Estar Social, implantados pela social-democracia europeia a partir de 1945. Esse processo ganhou impulso a partir de meados de 1970 pela ação das forças que lutavam pela redemocratização do país. Após árdua marcha, a Constituição de 1988 restabeleceu a democracia e desenhou o embrião da proteção social inspirada nos princípios da cidadania, universalidade e seguridade social.

O segundo movimento aponta na direção oposta, de impedir a consolidação das conquistas de 1988 e implantar o paradigma do Estado Mínimo no campo social. Esse ímpeto foi revigorado a partir de 1990, quando o Brasil fez opção tardia pelo neoliberalismo. Entre 1990-2002, sob a hegemonia do projeto liberal no plano internacional e local, a proteção social passou viver as tensões entre dois paradigmas antagônicos: valores do Estado Mínimo versus valores do Estado de Bem-Estar Social.

Em dois momentos essas tensões apresentam especificidades. O primeiro, no período 1990/92 (contrarreforma truncada), marcado pela formulação de agenda de reformas liberalizantes visando à revisão constitucional prevista para 1993. Todavia, essa revisão não ocorreu devido ao impeachment do presidente da República. [N.E.: Fernando Affonso Collor de Mello, 32º. Presidente do Brasil, 15.03.1990 a 02.10.1992].

O segundo, no período 1993/02 (retomada das reformas liberalizantes), marcado pela retomada das reformas exigidas pelo mercado. Nesta quadra, houve acentuada antinomia entre a estratégia macroeconômica e de reforma liberal do Estado, de um lado; e, de outro, as possibilidades efetivas de desenvolvimento e inclusão social.

Estas tensões entre paradigmas antagônicos tiveram sequência no período entre 2003 e 2014 e apresentaram configurações particulares em dois momentos. O primeiro, entre 2003/05 (uma difícil travessia), marcado pela continuidade das políticas econômicas e sociais da etapa anterior.

No segundo, entre 2006 e 2014 (breve ensaio desenvolvimentista), foi possível lograr melhor conjugação entre os objetivos econômicos e sociais, em relação ao passado. Em função do agravamento da situação internacional, no início da presente década, o ritmo do crescimento se desacelera, restringindo as possibilidades de ação social do governo. As tensões entre paradigmas antagônicos permanecem, embora com menor intensidade.

O "reformismo fraco" do Partido dos Trabalhadores (SINGER, 2012SINGER, A. Os sentidos do lulismo: reforma gradual e pacto conservador. São Paulo: Cia. das Letras, 2012. 276p. e 2014) fez com que muitos dos problemas estruturais, herdados do projeto neoliberal, não fossem enfrentados.

São emblemáticos os seguintes exemplos, a maior parte dos quais introduzidos pelo governo neoliberal de Fernando Henrique Cardoso (FHC) [N.E.: 34º. Presidente da República Federativa do Brasil, 01.01.1995 a 01.01.2003]: a tolerância com os processos de mercantilização das políticas sociais em diversas frentes; a manutenção dos mecanismos de captura do financiamento dos direitos sociais como a DRU (exceto no caso da educação) e os desvios de recursos da Seguridade Social, por exemplo; a reduzida importância atribuída à busca da justiça fiscal, como explícita no projeto de reforma tributária que tramita no Congresso Nacional desde 2003; a pouca relevância atribuída à revisão do pacto federativo - que se tornou assimétrico desde os anos de 1990, dificultando a cooperação federativa na gestão das políticas sociais; e a baixa prioridade atribuída à reforma da gestão pública com o objetivo de torná-la mais eficiente, sendo que, muitas vezes, optou-se pelo caminho mais fácil, de selar parcerias com organizações privadas.

Desta forma, não se observa um movimento articulado no sentido de recuperar alguns dos princípios inscritos da Constituição Federal de 1988 que não foram implantados ou foram desvirtuados entre 1990/2002.

Essa multiplicidade de fatores tem limitado a universalização da cidadania social prevista no texto constitucional.

Novo modelo de desenvolvimento?

Nos últimos anos, o crescimento econômico teve repercussões positivas sobre o mercado de trabalho e a potencialização do gasto social. Ambos os fatores revelam ter havido maior articulação entre objetivos econômicos e sociais em relação ao passado.

Entre 2003 e 2012, mais de 20 milhões de empregos formais foram criados e a taxa de desemprego caiu pela metade (de 12,3% para 5,5%). Em igual período o salário mínimo cresceu mais de 70% acima da inflação. A recuperação do emprego e da renda do trabalho deu vigor ao mercado interno, criando um círculo virtuoso entre produção, consumo e investimento.

A valorização do salário mínimo também teve impactos positivos sobre a renda dos beneficiários da Seguridade Social, outro núcleo da impulsão do mercado interno. O programa Bolsa Família teve forte expansão e mitigou as vulnerabilidades daqueles que vivem na pobreza extrema.

Essa conjugação de políticas econômicas e sociais contribuiu para a melhora dos indicadores de distribuição da renda, redução da pobreza, mobilidade social e consumo das famílias.

A ativação da atividade econômica fez crescer as receitas tributárias, melhorando as contas públicas e abrindo espaços para a expansão do gasto social, outro elemento estratégico que impulsionou o ciclo econômico e seu caráter mais redistributivo. O Gasto Social Federal per capita cresceu de forma significativa, passando de R$ 2.100,00 para R$ 3.325,00 (aumento real de quase 60%, em valores constantes de 2010) entre 2004 e 2010. (IPEA, 2011)

O principal item de ampliação do gasto social consistiu nas transferências de renda da Seguridade Social (previdência rural e urbana, assistência social e seguro-desemprego), sobretudo em função da valorização do salário mínimo que indexa mais de 34 milhões de benefícios diretos ao piso.

Contudo, além das transferências monetárias às famílias, os gastos sociais também foram impulsionados na expansão da oferta de serviços sociais. Dados do IPEA (2011)INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Gastos com a Política Social: alavanca para o crescimento com distribuição de renda. Comunicado do IPEA, Brasília, n 75, 2011. revelam que gastos federais com educação, por exemplo, dobraram (valores constantes), passando de R$ 21,2 bilhões para R$ 45,5 bilhões entre 2000 e 2010.

Contribuiu para isso o fim da incidência da Desvinculação dos Recursos da União (DRU) sobre a receita líquida de impostos destinados à educação. Em parte, esse acréscimo também guarda relações com a aprovação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). A ampliação das possibilidades do financiamento teve efeitos na melhoria em diversos indicadores educacionais, bem como expansão da infraestrutura.

Em suma, a partir de meados da década passada, mesmo sob a hegemonia do neoliberalismo em escala global e do acirramento da competição capitalista sob a hegemonia dos mercados financeiros, foram engendradas brechas ao modelo econômico que vinha sendo implantado desde 1990 e que resultaram na melhoria dos padrões de vida da população. A economia cresceu e distribuiu renda, fato inédito nos últimos 50 anos.

O reconhecimento desse fato não implica endossar a ideia de que foi implantado um "novo padrão de desenvolvimento". Na verdade, caminhou-se no sentido da construção de um modelo econômico menos perverso que o padrão histórico.

Também parece questionável a visão de que os governos progressistas eleitos no Brasil e em diversos países da América Latina seriam "pós-neoliberais". (SADER, 2014SADER, E. Eles e nós: para a hegemonia pós-neoliberal, Carta Maior São Paulo, 4/3/2014.) É verdade que foi aberta uma nova etapa de lutas contra a doutrina neoliberal. Mas, apesar dessa marcha, o continente está muito aquém de "superar e virar a página do neoliberalismo".1 1 Segundo Boaventura de Souza Santos: "Nesta segunda década estes governos (progressistas e populares latino-americanos) continuam declarando-se pós-neoliberais e têm alguma razão, mas não toda a razão. Por que poderíamos chama-los pós-neoliberais? Bom, em parte porque o Estado controla muito mais a economia, é um interventor na mesma. Além disso, nacionalizaram-se muitas empresas no caso da Bolívia e Equador. Ou seja, existe um ativismo estatal mais forte que vai contra o neoliberalismo, e é por isso que o neoliberalismo internacional não perdoa estes governos e quer destruí-los. Agora, qual é a forma de operar destes países. Bom, são "pós-neoliberais" internamente para conseguir alguma medida de redistribuição social, mas não questionam o neoliberalismo internacional, o capitalismo financeiro nem as regras do livre comércio e jogam com as regras destes tratados. O modelo de desenvolvimento é neoliberal." Disponível em: <http://wp.mw.p3C2Pm-hMv>.

Embora positivos, os progressos sociais recentes não apagaram as marcas profundas da crônica desigualdade social brasileira - pano de fundo para o debate sobre a educação nacional. O Brasil continua sendo um país subdesenvolvido em termos econômicos, políticos, sociais e culturais. As múltiplas faces da desigualdade social do país são traços desse subdesenvolvimento.

Nos últimos anos, a desigualdade da renda do trabalho caiu de forma expressiva, mas ela ainda permanece entre as mais elevadas do mundo. A secular concentração da riqueza agrária está intocada, e a questão da Reforma Agrária segue pendente. A apropriação desigual do uso do solo continua a enriquecer os ricos e expulsar os pobres. A especulação mobiliária, com ativos financeiros, inclusive da dívida pública, persiste e é recorrentemente reforçada pela elevação nominal e real das taxas de juros. O sistema tributário não incide sobre a renda e o patrimônio e aprofunda o fosso entre milionários e deserdados. A heterogeneidade estrutural do mercado de trabalho persiste, mesmo após a notável recuperação do emprego formal dos últimos anos. A despeito das conquistas formais da Constituição de 1988 e da inclusão social no período recente, o acesso aos bens e serviços sociais básicos continua sendo desigual entre classes sociais e regiões.

O caminho para um país mais justo e civilizado requer que se enfrentem estas múltiplas faces da desigualdade social. Trata-se de tarefa extremamente complexa, com resultados de médio e longo prazo. A diversidade e a complexidade dos temas estruturais a serem enfrentados pressupõem a formulação de uma nova agenda de transformação.

Novos desafios ao pensamento estruturalista

Nos últimos anos, o debate sobre o desenvolvimento voltou a mobilizar a reflexão acadêmica, após ter sido interditado por mais de duas décadas. (CARNEIRO, 2012CARNEIRO, R. Velhos e novos desenvolvimentismos, Economia e Sociedade, Campinas, v. 21, número especial, dez. 2012.; BIELSCHOWSKY, 2012BIELSCHOWSKY, R. Estratégia de desenvolvimento e as três frentes de expansão no Brasil: um desenho conceitual., Economia e Sociedade Campinas, v. 21, número especial, dez. 2012.; BIANCARELLI, 2012BIANCARELLI, A. Economia, Sociedade e Desenvolvimento, 20 anos: notas de apresentação. Economia e Sociedade, Campinas, v. 21, número especial, dez. 2012. )

No Brasil do século 21, a formulação desse um projeto coloca novos desafios ao pensamento estruturalista. Além da ênfase na expansão do mercado interno de consumo de massas e na superação da persistente heterogeneidade estrutural da economia e do mercado de trabalho, entende-se que também é necessário formular ações específicas voltadas para promover uma sociedade mais homogênea e igualitária.

Mais especificamente, o projeto deve contemplar medidas voltadas para a promoção do bem-estar, distribuição da renda e da riqueza, universalização da cidadania e desmercantilização da oferta de serviços sociais básicos.

Uma agenda de transformação da proteção social e da educação deve estar assentada na defesa dos valores do Estado de Bem-Estar Social, muitos dos quais incluídos na Constituição de 1988. Como se sabe, esse regime foi modelo virtuoso do arranjo democrático, baseado nos princípios da igualdade e da universalização dos direitos encontrados pela social-democracia europeia. A chamada Golden Age (1947/1973) representa etapa inédita de capitalismo regulado que se consolidou no pós-guerra sob a hegemonia americana. (MAZZUCCHELLI, 2014)MAZZUCCHELLI, F. Nem sempre foi assim! Iniciativa: Plataforma Política Social. Disponível em: <https://revistapoliticasocialedesenvolvimento.files.wordpress.com/2014/10/revista06fred_vfinal.pdf>.
https://revistapoliticasocialedesenvolvi...

Um projeto de transformação também requer ações específicas voltadas para promover uma sociedade mais igualitária, pela via da universalização da cidadania social. No Brasil, a Constituição de 1988 consagrou as bases de um sistema de proteção inspirado em alguns dos princípios do Estado de Bem-Estar Social: universalidade, seguridade e direitos. Mas, passados 26 anos, as políticas universais apresentam lacunas e vazios de oferta de serviços que se refletem na falta de acesso para diversas camadas da população. Essas desigualdades se combinam com as desigualdades regionais da oferta dos serviços. Será preciso equalizar as condições de acesso para todos, incluindo as pessoas que estão totalmente excluídas dessa possibilidade.

A Seguridade Social ainda não foi consolidada de acordo com os princípios estabelecidos pela Constituição da República. Nenhum dos governos, desde 1989, observou os princípios constitucionais da Organização da Seguridade Social, do Orçamento da Seguridade Social e do controle social (Conselho Nacional da Seguridade Social).

Mais de um terço dos trabalhadores estão na informalidade, não contribuem para a previdência social e não terão proteção na velhice.

Formalmente, o Sistema Único de Saúde (SUS) é público e universal. Mas a privatização da oferta segue marcante, e diversos segmentos da população continuam sem acesso adequado aos serviços, notadamente àqueles de média complexidade.

O Brasil nunca contou com políticas nacionais de habitação popular, saneamento e mobilidade urbana que fossem portadoras de recursos financeiros e institucionais compatíveis com os problemas gerados pelo acelerado processo de urbanização excludente ocorrido a partir de meados do século 20.

A expressiva redução da miséria extrema não pode obscurecer a urgente tarefa de ampliar a cidadania social para esses segmentos. O desafio para o ciclo de reformas na perspectiva do desenvolvimento é transformar os brasileiros pobres em cidadãos portadores de direitos universais. Será preciso aprofundar nossas políticas sociais com ampliação de seu caráter inclusivo.

No caso da educação nacional, apesar dos avanços recentes na democratização do acesso, na melhoria da gestão e elevação do patamar de gastos, ainda persistem lacunas e ausências. Para Waltenberg (2013WALTENBERG, F. Igualdade de oportunidades educacionais no Brasil: quão distantes estamos e como alcançá-la? In: FAGNANI, E. FONSECA, A (Org.). Políticas sociais, universalização da cidadania e desenvolvimento: educação, seguridade social, infraestrutura urbana, pobreza e transição demográfica. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2013.), qualquer agenda de desenvolvimento inclui a educação como um de seus componentes. O autor destaca o quão distante se encontra o Brasil de um ideal de igualdade de oportunidades educacionais, relacionando os aspectos acesso, permanência e qualidade. Também esboça algumas razões para nossos déficits quantitativos e qualitativos, com ênfase nas carências e desigualdades em termos de infraestrutura e condições salariais de professores.

Para ele, no Brasil, nem acesso, nem permanência são assuntos resolvidos. O problema é bastante evidente na Educação Infantil, no Ensino Médio e no Ensino Superior, níveis em que há graves subcoberturas, mesmo quando o foco se restringe a números agregados: quase um quarto das crianças de 4 a 5 anos nãoestá matriculado em estabelecimentos de ensino; a proporção sobe para quase quatro quintos, quando se voltam os olhos para a faixa anterior, de 0 a 3 anos; e um sexto dos jovens de 15 a 17 anos também se encontra excluído do sistema escolar, bem como pouco mais de um quarto daqueles na faixa etária compreendida entre 18 e 24 anos.

No ensino fundamental, quase todos os alunos em idade ideal (6-14 anos) encontram-se matriculados. Mas a permanência de muitos no sistema não está assegurada, como atesta a gradual evasão nas faixas etárias superiores. O acesso desigual observado nacionalmente, quando desagregado para as regiões, revela disparidades ainda mais fortes.

Ainda que cumpra louvar os avanços na cobertura populacional, é preciso qualificar a afirmativa frequente de que tenha sido de fato universalizado. Uma verdadeira universalização da matrícula em creches, pré-escola e escolas (alcançando os grotões), aliada a uma jornada integral, seriam medidas importantes pelos benefícios diretos proporcionados aos alunos, afirma o autor.

Como resultado de décadas de acesso e permanência desiguais nos diferentes níveis de ensino, o atraso escolar ainda preocupa no Brasil e o período de estudo médio da população ainda é de apenas 7,3 anos no país.

No Ensino Superior, observou-se na última década o incremento de 88,81% na matrícula em instituições públicas, com duplicação das matrículas em federais e 137,5% nas privadas. Contudo, as melhorias expressas pelo incremento da matrícula escondem outra relevante manifestação de desigualdade no acesso ao Ensino Superior: a da repartição dos alunos entre cursos com distintos graus de prestígio social.

Um indicador básico de qualidade da educação é a taxa de analfabetismo. Nesse quesito, embora a situação brasileira tenha melhorado bastante em uma década, o quadro permanece desolador: há 8,6% de analfabetos entre brasileiros com 15 anos ou mais.

Complementarmente, é preciso analisar níveis menos dramáticos de conhecimento e aprendizado do que o analfabetismo, embora a dificuldade de mensuração da qualidade seja muito maior. O autor destaca as profundas deficiências do aprendizado em relação a outros países, incluindo os latino-americanos.

As desigualdades de acesso, permanência e qualidade dependem da interação entre fatores determinantes da demanda por educação pelas famílias e características da oferta de educação pelas instituições públicas e privadas. Fatores ligados à interação entre características da demanda e da oferta fazem com que seja muito grande a desigualdade no volume de recursos efetivamente desfrutado por cada aluno brasileiro.

Ainda segundo Waltenberg (2013WALTENBERG, F. Igualdade de oportunidades educacionais no Brasil: quão distantes estamos e como alcançá-la? In: FAGNANI, E. FONSECA, A (Org.). Políticas sociais, universalização da cidadania e desenvolvimento: educação, seguridade social, infraestrutura urbana, pobreza e transição demográfica. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2013.), por múltiplas razões, são muito desiguais os recursos efetivamente desfrutados por cada aluno brasileiro. Além do problema distributivo, o nível médio de recursos em si é insuficiente: o gasto público com educação ainda é muito baixo na comparação internacional.

Em suma, apesar dos avanços recentes, os desafios da educação nacional ainda são enormes e devem ser enfrentados na perspectiva do desenvolvimento. O objetivo normativo geral de equalização de oportunidades poderia ser expresso, na esfera da educação, por meio da garantia, a todos os cidadãos, independentemente de sua origem social, de razoáveis condições de acesso e de permanência em cursos de boa qualidade.

Reformas para universalizar a cidadania social

Os impasses da educação nacional também decorrem da recorrente omissão do poder público. Educação de qualidade, universalização de acesso, resolução das desigualdades e ausências demandam custos elevados. Mas, como se sabe, o Brasil gasta pouco com educação na comparação internacional. Como ampliar os gastos com Educação para 7% do PIB, como prevê o novo Plano Nacional de Educação?

O enfrentamento desses problemas também requer o estabelecimento de pactos federativos e divisão de responsabilidades entre níveis de governo. A Constituição de 1988 determina que a gestão do sistema educacional deva ser realizada em "regime de cooperação" entre os entes federativos. Passados 26 anos, essa determinação constitucional ainda não foi regulamentada. O novo Plano Nacional de Educação contempla essa omissão. Como construir espaços de negociação e diálogos entre União, Estados e Municípios em torno de uma agenda ampla e complexa?

A crescente mercantilização e privatização também limitam as possibilidades de enfrentar-se a questão educacional. Os conflitos entre o interesse público e o privado se fazem sentir no currículo, na organização da escola, na qualidade do ensino e na avaliação. A questão que se coloca é: como redefinir o papel do Estado e as fronteiras entre o público e privado?

Estas questões não afetam apenas o setor educacional. Na verdade, o conjunto da proteção social brasileira padece dos mesmos limites estruturais. Em razão desse fato, a luta política tem de transcender os labirintos do setor educacional.

Financiamento do gasto social e educacional

O Brasil gasta pouco em educação em relação aos países desenvolvidos e países da América Latina. A experiência de nações que fizeram a "revolução educacional" revela ter havido expressiva ampliação do gasto público. Inspirando-se na experiência internacional, os movimentos sociais ligados à educação reivindicam corretamente a aplicação de 10% do PIB no setor. A ampliação dos gastos passa, dentre outros fatores, pela reforma tributária, revisão da política de isenções fiscais e extinção da DRU (no caso das demais políticas sociais).

5.1.1 - reforma tributária

O financiamento da proteção social e da educação depende de uma Reforma Tributária que enfrente as injustiças do sistema de impostos, cujos núcleos centrais vigoram desde meados da década de 1960. A tributação direta (que incide sobre a renda e o patrimônio) tende a ser progressiva. Mas, a participação relativa desses tributos é reduzida. Cerca da metade da arrecadação baseia-se em tributos indiretos (incidentes sobre consumo) que atingem proporcionalmente os mais pobres.

Em palestra realizada no Brasil o economista francês Thomas Piketty, autor do best-seller O Capital no Século 21, foi direto ao ponto:

A faixa mais alta de Imposto de Renda no Brasil é de 27,5%, inferior à menor dos Estados Unidos. Creio que uma das razões pela qual há muito desigualdade no Brasil é a progressividade do Imposto de Renda ser relativamente baixa. Há também muitos impostos indiretos, que são regressivos e pesam sobre as camadas populares. É importante também tratar de forma diferente as rendas anuais de R$ 100 mil e de R$ 1 milhão, R$ 5 milhões e R$ 10 milhões. Poderíamos ter faixas mais elevadas, de 50%, 60%. Também como os EUA, o Reino Unido, a Alemanha, que têm taxas que vão até 40%, 50%. É ainda mais impressionante o imposto sobre herança, 4% [na maioria dos Estados] é realmente baixo, muito perto de zero. (Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mercado/197559-e-um-erro-achar-que-pais-precisa-de-mais-mercado.shtml>.)

Em suma, será preciso formular uma reforma tributária de caráter progressivo e redistributivo que promova a justa distribuição de renda e de riqueza. É preciso alertar que o projeto de Reforma Tributária que tramita no Congresso Nacional (PEC 233/2008) não caminha na direção de corrigir essa injustiça fiscal. Muitos estudiosos chamam a atenção para a ausência de compromisso com a justiça tributária. (KHAIR, 2008KHAIR, A. Prioridade à Justiça Tributária. Carta Social e do TrabalhoCampinas, n. 8. Disponível em <www.eco.unicamp.br>.; DELGADO, 2008DELGADO, G. Reforma Tributária e suas Implicações para os Direitos Sociais - Seguridade Social. Carta Social e do Trabalho, Campinas, n. 8, jan./ago. 2008. [Publicação eletrônica disponível em <www.eco.unicamp.br>].; SALVADOR, 2008SALVADOR, E. Reforma Tributária Desmonta o Financiamento das Políticas Sociais, Carta Social e do TrabalhoCampinas, n. 8, jan.-ago. 2008.; POCHMMAN, 2008POCHMMAN, M. Tributação que Aprofunda a Desigualdade, Carta Social e do TrabalhoCampinas, n. 8, jan./ago. 2008.)

O objetivo maior é simplificar a estrutura de impostos. A proposta embute ameaças de desmonte das bases de financiamento das políticas sociais conquistadas pela Constituição de 1988. Observe-se que, por detrás da simplificação, esconde-se o fim das vinculações, a desoneração da folha de contribuição dos empregadores para previdência social e a extinção de fontes de financiamento do Orçamento da Seguridade Social (COFINS; PIS; Contribuição Social do Salário-Educação; e CSLL).

A concretização dessas mudanças - sem a garantia constitucional de vinculação de recursos - fragilizará o financiamento da educação e o Orçamento da Seguridade Social, afetando a sustentação dos gastos em setores como previdência social (INSS urbano e Previdência Rural), Assistência Social, Saúde, Seguro-Desemprego, geração de emprego e capacitação profissional. (Fundo de Amparo ao Trabalhador, FAT) (FAGNANI, 2008FAGNANI, E. Tributação, Equidade e Financiamento da Política Social. Nota Introdutória, Carta Social e do Trabalho, Campinas, n. 8, jan./ago. 2008. [ Publicação eletrônica disponível em <www.eco.unicamp.br>).)

5.1.2 - extinção da desvinculação das receitas da união (DRU)

Com o início da gestão de FHC no comando do Ministério da Fazenda, em maio de 1993, foi iniciada a gestação do Plano Real e adotaram-se várias medidas preparatórias. É neste contexto que, em 1993, foi instituído o Fundo Social de Emergência.2 2 Ao ser criado, o FSE era integrado pelos recursos do Imposto de Renda (IR) descontados de servidores públicos federais; parcela de recursos da arrecadação de impostos (IR, ITR e IOF) e de contribuições sociais (CSLL e PIS/Pasep); 20% da arrecadação total dos impostos e contribuições (ressalvadas as deduções anteriores); e 20% das contribuições previdenciárias eram desvinculadas. Com a sua renovação em 1996 (EC n.º 10) o FSE passou a ser denominado de Fundo de Estabilização Fiscal (FEF). Por problemas federativos, deixou de subtrair dos fundos constitucionais de repartição 20% da arrecadação dos impostos, mas manteve as demais desvinculações. Em 2000, o FEF passou a ser denominado de Desvinculação de Receitas da União (DRU), pela EC n.º 27, renovada pelas Emendas Constitucionais n.º 42 (2003), 56 (2007) e 68 (2011). Hoje, os efeitos da DRU estão restritos às desvinculações das contribuições sociais e das contribuições econômicas. A educação deixou de perder recursos com a EC n.º 59, de 2009. Esse conjunto transitório-permanente criado em 1994 deve vigorar pelo menos até 2015, nos termos da EC n.º 68. O nome não poderia ser mais impróprio, na medida em que tinha objetivos antissociais e era permanente. De fato, esse fundo foi, posteriormente, renomeado e passou a chamar-se, primeiro, Fundo de Estabilização Fiscal e, depois, Desvinculações de Recursos da União (DRU).

Essa medida desvincula receitas constitucionais garantidas aos programas sociais do governo federal (20% da arrecadação de impostos e contribuições federais). Afeta praticamente todos os setores sociais da Seguridade Social (SUS, Assistência Social, FAT, Previdência), educação (salário-educação e vinculações fiscais), habitação e saneamento (FGTS).

É verdade que a partir de 2009 a DRU gradativamente deixou de incidir sobre o setor da educação. Esse fato explica, em grande medida, a ampliação dos gastos federais nessa área. Mas o mesmo não se observa em relação aos demais setores sociais. Em 2012, por exemplo, a DRU retirou da Seguridade Social R$ 52,6 bilhões. O acumulado, apenas para o período 2005/2012, totaliza mais de R$ 286 bilhões. (ANFIP, 2013)

5.1.3 - revisão da política de isenções fiscais

O processo de supressão das receitas constitucionais para financiar o gasto social foi iniciado nos anos de 1990 e ganhou vigor a partir de meados da década passada, quando foram criados novos benefícios tributários, dirigidos para segmentos industriais e econômicos. Em 2012, por exemplo, as isenções tributárias concedidas sobre as fontes da Seguridade Social (CSLL, PIS/Pasep, Cofins e Folha de Pagamento) totalizaram R$ 77 bilhões de reais. (ANFIP, 2013ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS AUDITORES-FISCAIS DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL. (Ed.). Análise da Seguridade Social 2012. Brasília: ANFIP, 2013. 131p.)

Essas isenções restringem a arrecadação tributária dos três entes federativos e limitam o gasto social e educacional. No ensino superior é preciso buscar um equilíbrio financeiro mais adequado entre os recursos repassados, via incentivos fiscais, ao setor privado (Prouni, por exemplo) e os investimentos nas universidades públicas.

Fortalecimento do pacto federativo

Para enfrentar os desafios educacionais, também é preciso estabelecer pactos federativos e dividir responsabilidades entre níveis de governo. A Constituição de 1988 determina que a gestão do sistema educacional seja realizada em "regime de cooperação" entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Não obstante, até 2014, essa determinação constitucional - expressa nos artigos 23, 211 e 214 - ainda não havia sido regulamentada. O novo Plano Nacional de Educação procura enfrentar esta questão.

Esse fato é positivo, mas encerra enormes dificuldades. A tarefa de construir espaços de negociação Federativa exigirá pelos próximos anos enorme capacidade e disposição para o diálogo entre União, Estados e Municípios. O MEC terá papel central na coordenação desse processo, visando à criação de um ambiente propositivo de diálogo sobre uma agenda ampla e diversificada.

Para enfrentar este desafio, também será preciso fortalecer o Pacto Federativo. O pacto concertado em 1988 foi paulatinamente minado. De um lado, houve avanços no processo de descentralização da gestão de determinadas políticas sociais. De outro, foram feitos movimentos que limitaram a capacidade financeira de estados e municípios. Esse processo é percebido pela nova centralização das receitas fiscais e elevação do endividamento de estados e municípios em função da estratégia macroeconômica, seguida da adoção de severo programa de ajuste fiscal para esses entes. Este fato passou a comprometer a gestão das políticas sociais baseadas na cooperação entre os três níveis de governo.

O poder fiscal do Executivo federal vem sendo reforçado desde 1989, quando houve reação da área econômica à descentralização tributária determinada pela Constituição. A revitalização do centralismo tributário prosseguiu nos Governos de FHC, quando a carga tributária passou de 25% para 33% do PIB e seus efeitos foram capitalizados especialmente pela União.

O correto avanço da descentralização também foi limitado pelo fato de que a política econômica desestruturou as finanças dos estados e dos municípios. Uma das manifestações desse processo foi a elevação do endividamento desses entes, em consequência, sobretudo, da taxa de juros básicos elevada.

Após um longo período de endividamento, os governos estaduais tiveram de aceitar os termos impostos pelo governo federal no processo de renegociação de suas dívidas. Foram implantadas, dentre outras, as seguintes medidas: o Programa de Apoio à Reestruturação e ao Ajuste Fiscal dos Estados (Proes, 1997), seguido da Lei de Responsabilidade Fiscal e da Lei de Crimes Fiscais. (CAVALCANTI et al., 2004CAVALCANTI, C. E. G. et al. Execução orçamentária do governo do Estado de São Paulo: 1990-2003. Indicadores Diesp, São Paulo, v. 13, n. 98, jan./fev. 2004.)

Esse novo marco é severo, pois deixa pouca margem de manobra para o gasto público dessas esferas de governo, sobretudo em função da exigência de comprometer 13% das receitas correntes para o pagamento da dívida nos próximos 30 anos; de se manterem superávits primários elevados; de se respeitarem os limites de comprometimento das receitas em gastos com pessoal (55% da receita); e de restrições à contratação de novas operações de crédito. (DAIN, 2001DAIN, S. O financiamento público na perspectiva da política social. Economia e Sociedade v. 17. Campinas, 2001.; LOPREATO, 2002LOPREATO, F. L. O Colapso das finanças estaduais e a crise da federação. São Paulo: IE-Unicamp-Unesp, 2002.)

Essas novas regras estreitaram a margem orçamentária dos estados e municípios. É particularmente crítica a restrição aos gastos com pessoal, principal item de despesas nas áreas de educação, saúde e assistência social.

Para burlar esses rígidos parâmetros, foram engendrados mecanismos de contratação de pessoal por meio de Organizações Não Governamentais (ONG) e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), cujos dispêndios são contabilizados como "serviços de terceiros" e não como "despesas de pessoal".

As consequências do esvaziamento do pacto federativo para as políticas sociais são evidentes, na medida em que, Estados e Municípios assumiram a responsabilidade na oferta dos serviços de educação, saúde e assistência social.

De forma ilustrativa, observe-se que dados recentemente divulgados pela Confederação Nacional de Municípios (CNM) apontam que 5.368 prefeituras (96,4% do total) vão encerrar o ano de 2014 com irregularidades listadas no Cadastro Único de Convênios, da Secretaria do Tesouro Nacional. Os municípios inscritos no cadastro ficam impedidos de receber transferências voluntárias da União para obras e investimentos. (Disponível em: http://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2014/12/04/96-das-prefeituras-estao-em-cadastro-negro-e-sem-direito-a-verba-federal.htm.)

A revisão do pacto federativo também precisa enfrentar o equacionamento do estoque das dívidas de estados e municípios que é corrigido pelo IGPM, o que o eleva constantemente, apesar do comprometimento de 13% das receitas.

Mercantilização das políticas sociais e educacionais

A mercantilização das políticas públicas é processo que avança em diversos campos e limita as possibilidades de que a questão social seja efetivamente enfrentada no Brasil. Com a globalização e o neoliberalismo, a política social passou a ser importante nicho de mercado de valorização do capital. Os complexos capitalistas dominados pelas finanças internacionais e nacionais invadiram áreas como saúde, educação, previdência, saneamento e transporte público, por exemplo.

As políticas liberalizantes transformaram a área social em espaço privilegiado da acumulação de capital sob a dominância das finanças internacionais. Para o mercado, a atuação do Estado é legítima apenas para a população situada abaixo da "linha de pobreza" monetária (US$ 2 por dia) arbitrada pelas instituições internacionais. Os demais devem recorrer ao setor privado regido pela lógica do seguro social.

Incentivadas pelo governo federal e avalizadas pelo Parlamento, a partir de 1990 diversas modalidades de mercantilização foram amplamente difundidas pelos três níveis de governo para diversos setores sociais.

No caso da educação a privatização atingiu especialmente o ensino superior. Nas décadas de 1960 e 1970, a participação do setor privado cresceu de 40% até pouco mais do que 60% das matrículas. A crise da década de 1980 interrompeu momentaneamente a privatização, em função da recessão econômica e a consequente redução de renda das famílias.

Desde os anos de 1990 a privatização continua ocorrendo pela difusão de diversos mecanismos de subvenções na forma de isenções de taxas, contribuições e impostos (nacionais, estaduais e municipais), abatimento de despesas com educação privada no imposto de renda de pessoa física, repasses diretos de recursos públicos para entidades privadas, pagamento das mensalidades dos alunos ou financiamento delas pelo setor público, convênios com ONGs ligadas a instituições privadas, entre diversas outras. (HELENE, 2012HELENE, O. Como foi e é construída a privatização do ensino superior no Brasil. Correio da Cidadania. 28 de Março de 2012.)

Assim, o campo educacional continua sendo permeado por crescentes conflitos entre o interesse público e o privado que se fazem sentir no currículo, na organização da escola, na qualidade do ensino e na avaliação. O estímulo à expansão de ofertas de matrículas "gratuitas" pelo setor privado aparece como estratégia para atender as metas estabelecidas para a educação infantil, ensino médio, ensino superior e pós-graduação.

A mercantilização do ensino superior recebeu novo impulso a partir a instituição do PROUNI e do fortalecimento do FIES. A questão que se coloca é: como redefinir o papel do Estado e as fronteiras entre o público e privado?

A mercantilização da educação não é caso isolado. O Sistema Único de Saúde (SUS), por exemplo, surgiu como antítese do sistema privatista adotado pela ditadura militar. Era de se esperar que os governos democráticos pós-1990 expandissem a oferta pública de saúde para fazer valer os princípios determinados pela Carta Magna. Todavia, na prática, houve crescente processo de mercantilização das ações da saúde.

No caso do saneamento, a partir da década de 1990, os governos estaduais e municipais foram induzidos a optar entre três arranjos principais: a privatização das concessionárias estaduais de saneamento; a privatização das autarquias municipais; e a prestação direta dos serviços pelos municípios. Essa diretriz foi revigorada a partir de 1997, quando as privatizações nos setores da infraestrutura econômica já estavam encaminhadas. Exemplo disso é a decisão do Conselho Monetário Nacional (Resolução n. 162/97) de condicionar a liberação de empréstimos aos governos estaduais à apresentação de um programa de venda das empresas de saneamento.

No caso do transporte público, a partir de 1990 houve incentivo às concessões e às privatizações dos sistemas de alta capacidade (metrôs e trens metropolitanos). Esse movimento atingia, especialmente, o sistema ferroviário existente nas principais regiões metropolitanas do país, muitos dos quais assumidos pelos governos estaduais, a partir da privatização da Rede Ferroviária Federal (RFFSA) e da extinção da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) - agência federal criada em 1982 para gerir esses sistemas, separando-os da competência da RFFSA. O mesmo movimento também foi impulsionado no caso dos poucos sistemas de metrô existentes no país.

Também se destaca a tentativa de privatizar a Previdência Social brasileira. Com base na experiência chilena, no início da década de 1990 o Banco Mundial elaborou o mencionado "modelo dos três pilares". (WORLD BANK, 1994)WORLD BANK. Envejecimiento sin Crisis: políticas para la protección de los ancianos y la promoción del crecimiento. Oxford: Oxford University Press, 1994. Na década de 1990, nove países de América Latina fizeram as reformas propostas pelo Banco Mundial. O governo de FHC procurou seguir essa trilha. No final de 1998, após longa tramitação, foi concluída uma etapa importante, com a aprovação da Emenda Constitucional n. 20/98. Além de suprimir direitos, seu objetivo último era fomentar, para o setor financeiro, o mercado de previdência complementar do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) e do Regime Próprio da Previdência do Servidor Público (RPPSP) para o setor financeiro.

O primeiro passo foi restringir as regras para a aposentadoria e estipular um teto nominal de benefícios extremamente baixo (atualmente de R$ 3.916,00). Com isso, os contribuintes (RGPS e RPPSP) que desejarem uma aposentadoria com valor acima desse teto seriam forçados a aderir aos fundos de previdência complementar geridos pelo setor financeiro.

O segundo passo foi a pronta regulamentação do Regime da Previdência Complementar (RPC), voltado para os trabalhadores do RGPS que pretendessem receber acima do teto. Concluiu-se com êxito essa etapa.

O terceiro passo era fazer o mesmo com a previdência do servidor público. A aprovação da previdência complementar pública - que somente ocorreu em março de 2012 - implicaria transferir para o setor financeiro a gestão de parte expressiva da contribuição previdenciária de mais de seis milhões de funcionários ativos da União, dos 27 estados e dos 50 maiores municípios do país.

A agenda de desenvolvimento precisa estabelecer políticas regulatórias que limitem o crescente e preocupante avanço da mercantilização das políticas sociais. No campo econômico, a privatização das empresas estatais minou as possibilidades de o Estado coordenar investimentos públicos que alavancam o investimento privado. Hoje, o Estado brasileiro é refém do setor privado monopolista internacional e não dispõe de instrumentos públicos adequados para impulsionar os investimentos e o crescimento.

No campo social, a privatização avança em todos os setores. Vivemos uma etapa crucial: ou enfrentamos o avanço da mercantilização, ou também ficaremos reféns das corporações globais e nacionais, o que inviabilizará qualquer possibilidade de êxito da agenda nacional-desenvolvimentista.

Reforma do Estado e gestão pública

A agenda desenvolvimentista deve propor ações para fortalecer a gestão estatal, enfraquecida pelo avanço de diversos mecanismos de gestão privada que cria duplicidades, fragmentação, descontrole e ingovernabilidade de ministros, secretários, diretores e gestores.

A ampliação das organizações sociais e ONGs na gestão das políticas sociais subordinam o Estado à lógica destas instituições que, em geral, contratam sem concurso público, compram sem licitação e não estão sujeitas ao controle dos órgãos fiscalizadores. Paradoxalmente, essas instituições passam a ser o núcleo da ação estatal.

A Lei de Responsabilidade Fiscal, ao restringir a contratação de pessoal, incentiva a difusão de organizações sociais, ONGs, OSCIPS e Cooperativas. Essas organizações sociais (criadas em 1997) acabam sendo utilizadas com a finalidade de "burlar" a própria Lei de Responsabilidade Fiscal (criada em 1999), pois os gastos dessas instituições são contabilizados como "serviços de terceiros" e não como "despesas de pessoal".

A crescente participação dessas organizações sociais na gestão das políticas sociais tem acarretado desafios complexos para gestão pública. A convivência numa mesma unidade de profissionais contratados por formas tão diversas fere o princípio constitucional da isonomia e cria obstáculos para a gestão de recursos humanos.

A constituição federal reza que os serviços sociais devem ser ofertados pelo Estado. Contudo, os governos a partir de 1990 não criaram carreiras públicas de Estado para a gestão pública eficiente. As terceirizações seguidas por todos os níveis de governo têm limitado a política de gestão de recursos humanos em diversos setores sociais, minando por dentro as possibilidades da gestão pública eficiente.

A consequência é o caos da gestão "pública". Num mesmo equipamento (hospital, escola, Cras), existem trabalhadores contratados por diferentes entidades o que traz problemas de comando e contrastes salariais.

Será preciso tornar mais flexível a Lei de Responsabilidade Fiscal para os setores sociais como saúde, educação e assistência social, que são intensivos em mão de obra. Essa medida é necessária para barrar o círculo negativo da privatização e, ao mesmo tempo, fortalecer a gestão pública das políticas de saúde, assistência social e educação, cuja responsabilidade foi transferida para os governos municipais e estaduais.

Desde os anos de 1990 encontra-se em curso um processo de sucateamento da oferta pública de serviços sociais que realimenta continuamente a crença da "ineficiência" do Estado. A suposta inanição governamental revigora a estratégia de transferir a responsabilidade pública para a iniciativa privada, tida como "eficiente". A mercantilização avança como o caminho de menor resistência. Em breve, chegaremos um ponto sem retorno.

Vamos aproveitar o "bônus" demográfico?

Além dos "velhos problemas", a dinâmica demográfica pressionará o Estado, a sociedade e democracia para que enfrentem novos desafios.

O envelhecimento da população aumentará os gastos públicos com saúde e previdência. De fato, entre 2000 e 2050 a população de idosos aumentará de 5,5% para 15,3% da população total. Nesse sentido, a questão que se coloca é como enfrentar esse desafio na perspectiva progressista? Como financiar a saúde e a previdência num contexto de queda da relação entre contribuintes e beneficiários? Como capturar a parcela da renda auferida pelos ganhos de produtividade?

No caso da educação os efeitos da transição demográfica representam uma oportunidade. Estimativas do IBGE revelam que entre 2000 e 2050 a participação relativa da população com até 14 anos na população total cairá de 29,8% para 19,3%. Entre 2010 e 2040 esse contingente cairá de cerca de 45 milhões para 20 milhões de crianças e adolescentes.

Esse "bônus demográfico" - que já está acontecendo - representa uma extraordinária janela de oportunidade - que poderá ou não ser aproveitada - para revolucionar a educação nacional. A menor pressão de gastos e esforços para promover a expansão quantitativa da oferta de ensino poderá resultar em medidas concretas que enfrentem as deficiências na qualidade do aprendizado (educação em tempo integral, valorização dos profissionais, classes menores, acompanhamento individualizado do desempenho etc.). Aproveitaremos o "bônus" demográfico?

Condicionantes políticos e econômicos gerais

O debate sobre educação e suas relações com um projeto de desenvolvimento requer, necessariamente, o resgate da democracia e da política, o reforço do papel do Estado e a gestão macroeconômica voltada para o objetivo de redistribuir renda e universalizar a cidadania.

7.1 - política e democracia

Não existem perspectivas favoráveis para a agenda desenvolvimentista, se ela não for pensada na perspectiva da democracia. Com o neoliberalismo, a soberania popular foi enfraquecida, ao mesmo tempo em que aumentou o controle, pelo dinheiro, sobre as formas de representação. Existe convergência de opiniões no sentido de que o sistema representativo monopolizado pelos partidos está envelhecido e burocratizado, e os cidadãos não se sentem representados.

Os partidos e o sistema político como um todo estão submetidos à mercantilização do voto, tornando-se dependentes das bancadas particularistas de toda espécie, que atendem aos interesses de poder econômico em diversas frentes. A educação não escapa desta lógica. Sua consolidação também encontra limites na ação da bancada dos parlamentares financiados pelo setor empresarial privado que opera no setor. Este fato é evidenciado pela composição atual do Congresso por representação (antes da eleição de 2014) elaborada pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). (Disponível em <http://www.redebrasilatual.com.br/politica/2013/10/camara-podera-ter-renovacao-de-61-dos-deputados-e-reduzir-bancada-de-trabalhadores-2066.html>.)

Figura 1

A crise do sistema partidário impõe limites ao presidencialismo de coalizão. As alianças para assegurar a governabilidade tornam qualquer governo refém de interesses fisiológicos e de partidos sem conteúdo programático ou com posições ideológicas antagônicas. Esse quadro limita as possibilidades da implantação de uma agenda de transformação na perspectiva que estamos apontando. Nesta perspectiva, a reforma política é a mais importante das reformas.

7.2 - papel do estado

Em sociedades de capitalismo tardio, o Estado cumpre tarefas essenciais no planejamento de ações de longo prazo, financiamento dos projetos estruturantes e coordenação dos investimentos públicos e privados. O papel do Estado nacional no desenvolvimento é inquestionável inclusive nos países do centro do sistema capitalista como Alemanha, Japão, Inglaterra e EUA. O mesmo se verifica nos casos da Coreia do Sul e de Taiwan, e mais recentemente da China. "Não há na história econômica do capitalismo, nenhum caso de país que tenha se desenvolvido sem o concurso expressivo de seu Estado Nacional", afirma Cano (2010CANO, W. Uma Agenda Nacional para o Desenvolvimento. Revista Tempo do Mundo, Brasília, v. 2, n. 2, ago. 2010., p. 7).

Reza a Constituição de 1988 que a educação é pública, universal e gratuita. Cumprir este dispositivo requer, necessariamente, ampliar os investimentos governamentais na construção e fortalecimento da rede pública. Será preciso ampliar a oferta de serviços públicos e reforçar a ação direta do Estado, nos três entes federativos, para confrontar e impor limites ao avanço da mercantilização do setor.3 3 Observe-se que estudo realizado por professores da UNB e da UFSC (SOARES NETO, J. et al., 2013) propõe uma escala para analisar dados sobre a situação da infraestrutura das mais de 194 mil unidades de ensino básico no Brasil, públicas e privadas. As escolas foram classificadas em quatro categorias: elementar, básica, adequada e avançada, de acordo com a qualidade da infraestrutura. Um fato que chama a atenção é que somente 0,6% das unidades de ensino teve a infraestrutura considerada "avançada", com recursos como laboratório de ciências e dependências que atendam estudantes com necessidades especiais. Na posição oposta, 44% das instituições de educação básica foram classificadas na categoria "elementar". Os dados revelam que as grandes diferenças entre as regiões do país aparecem também na infraestrutura das escolas. Em todas as regiões a taxa de colégios públicos classificados como de infraestrutura avançada não excede os 2%.

7.3 - Gestão macroeconômica

O crescimento econômico baseado na indústria de transformação é condição necessária para o desenvolvimento com redistribuição da renda e ampliação da cidadania. A experiência internacional ensina que nenhum país tornou-se desenvolvido sem uma indústria forte e competitiva. No entanto, os pressupostos teóricos que dão substrato ao tripé macroeconômico (câmbio flutuante, superávit fiscal e metas de inflação) não convergem nem para o crescimento, nem para o fortalecimento da indústria.

Esse modelo foi concebido para "impor limites à discricionariedade da atuação do Estado e submeter às autoridades políticas aos princípios de uma visão liberal de desenvolvimento", sublinham Biancarelli e Rossi (2013BIANCARELLI, A.; ROSSI. P. A política macroeconômica em uma estratégia social-desenvolvimentista. In: FAGNANI. E.; FONSECA, A. (Org.). Políticas sociais, universalização da cidadania e desenvolvimento: economia, distribuição da renda, e mercado de trabalho. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2013.). Com o aprofundamento da crise financeira de 2008, o tripé transformou-se numa "armadilha para o crescimento".

O "reformismo fraco" (SINGER, 2012SINGER, A. Os sentidos do lulismo: reforma gradual e pacto conservador. São Paulo: Cia. das Letras, 2012. 276p.) dos governos do Partido dos Trabalhadores não foi capaz de alterar esse mecanismo introduzido pelo governo neoliberal de FHC em 1998. A promoção dessas mudanças estruturais é de difícil encaminhamento, pois trafega no contrafluxo da ideologia dominante e da correlação de forças favorável ao poder econômico. Não obstante, em função da longa estagnação da economia mundial, o "tripé" passou a ser questionado, inclusive, por instituições que representam o establishment da ordem ideológica, econômica e política globais.

A autocrítica dos erros da ortodoxia foi recentemente exposta pelo economista-chefe do FMI, Olivier Blanchard, no artigo Where danger lurks (Onde o perigo se esconde), no qual admite o fracasso daqueles que deveriam ser os guardiões da estabilidade do capitalismo. "A crise deixou claro que a visão crescentemente benigna das flutuações econômicas no produto e no emprego, dominante até a crise financeira global de 2008, estava errada; e que há necessidade de uma avaliação profunda [...]". Guiada por incompreensões e dogmatismos, "[...] a política econômica, em especial a política monetária, assumiu um elemento de magia negra [...]", afirma Blanchard. O reposicionamento do economista-chefe do FMI não é fato isolado. (DRUMMOND, 2014DRUMMOND, C. A obsessão da economia ortodoxa atrasa o Brasil. Carta Capital, São Paulo, 06/12/2014.)

No Brasil, a gestão do "tripé" macroeconômico tornou-se ideia fixa. Qualquer visão crítica é considerada herética. Como diz Luís Gonzaga Belluzzo (2014BELLUZZO, L. G. A política econômica do período de construção da crise será abandonada. Carta Maior, São Paulo, 11/11/2014.): "[...] antigamente, as notícias chegavam ao Brasil por navio, hoje parecem vir em carro de boi".

Cabe aos movimentos sociais da educação a tarefa de incorporar este tema crucial nas respectivas agendas de lutas. Será preciso pressionar por alternativas a esse modelo de gestão macroeconômicas imposto pelo mercado. Sem alterar esse quadro, serão remotas as possibilidades de um novo projeto de transformação e de melhorias efetivas das condições educacionais.

A ausência de crescimento econômica fragiliza o mercado de trabalho e reduz as possibilidades do financiamento da proteção social brasileira. A manutenção do "tripé" e o aprofundamento da gestão econômica ortodoxa poderão acentuar a recessão e a ampliação dos encargos financeiros, que representa outra grave ameaça aos avanços no setor da educação.

Uma economia estagnada não gera riqueza a ser distribuída. Muitas vezes, destrói ou concentra a riqueza acumulada. O caso da União Europeia é emblemático, mesmo sendo o berço dos regimes de Welfare State, desde 2008 a chamada 'austeridade' tem ampliado a pobreza, a desigualdade e a destituição social. (FEBBRO, 2014)

Considerações finais

O objetivo deste artigo é esboçar elementos que auxiliem a construção coletiva de uma agenda para a educação na perspectiva do desenvolvimento. Nesse esforço foram privilegiados os condicionantes políticos e econômicos exógenos ao setor da educação, dado que as questões endógenas têm sido amplamente estudadas e debatidas pelos especialistas setoriais e pelos movimentos sociais.

A diversidade e a complexidade dos temas estruturais a serem enfrentados pressupõem a formulação de uma agenda de transformação, o que coloca novos desafios ao pensamento estruturalista. Além da ênfase na expansão do mercado interno de consumo de massas e na superação da persistente heterogeneidade estrutural da economia e do mercado de trabalho, entende-se que também é necessário formular ações específicas voltadas para promover uma sociedade mais homogênea e igualitária.

Uma agenda de transformação da proteção social e da educação para o Brasil deve estar assentada na defesa dos valores do Estado de Bem-Estar Social, muitos dos quais incluídos na Constituição de 1988. Todavia, o que se estabelece na Constituição não é a realidade implantada no país. Quando a Constituição da República será cumprida?

A agenda da educação deve considerar o fato de que, apesar dos avanços sociais recentes, o Brasil continua sendo um país subdesenvolvido. Nesta perspectiva, a agenda deve, necessariamente, incorporar a pauta da superação das diversas faces da crônica desigualdade social brasileira.

A Constituição de 1988 consagrou as bases de um sistema de proteção inspirado nos princípios do Estado de Bem-Estar Social. Mas as políticas universais apresentam lacunas e vazios de oferta de serviços que se refletem na falta de acesso para diversas camadas da população. Essas desigualdades se combinam com as desigualdades regionais da oferta dos serviços. Portanto, uma das tarefas que se colocam é enfrentar o desafio de universalizar a cidadania social.

Para isso será preciso superar temas estruturais em diversas frentes, com destaque para: limitar as diversas formas de captura dos recursos sociais pela área econômica e pelo setor privado; realizar a reforma tributária que priorize a justiça fiscal; renegociar e fortalecer o pacto federativo que tem sido esvaziado desde o ano de 1990; desmercantilizar as políticas sociais; e realizar uma reforma do Estado visando promover a eficiência da gestão pública.

O debate sobre a educação e suas relações com um projeto de desenvolvimento que privilegie o enfrentamento das múltiplas faces da desigualdade social brasileira - que estão intrinsecamente relacionadas à questão educacional -, requer, necessariamente, o resgate da democracia e da política, o reforço do papel do Estado e a gestão macroeconômica voltada para esse objetivo.

O enfrentamento destes temas complexos exige consensos entre os diversos atores do campo progressista em torno da importância da formulação de novo projeto nacional de transformação, que articule políticas econômicas e sociais num contexto de reforço do papel do Estado e da centralidade da dimensão da política e da democracia em uma perspectiva ampliada.

Mesmo com dúvidas e incertezas, cabe ao campo progressista ampliar os diálogos na perspectiva de se construírem consensos em torno de um projeto identificado com as reivindicações da sociedade.

A geração desses consensos requer amadurecimento, e para crescer é preciso que haja massa crítica suficientemente potente para influenciar e direcionar o debate. Neste sentido, recomenda-se a adoção de ações que caminhem no sentido de fomentar redes de pesquisa e de pensamento crítico, com o objetivo de criar e estimular o debate que estamos propondo. Nesta perspectiva, seria importante a realização de esforços no sentido de que sejam estruturados foros de discussão de temas estratégicos para o desenvolvimento brasileiro.

A tarefa é complexa, tanto pelo caráter estrutural dos fenômenos quanto pelo conservadorismo das elites, num contexto em que a correlação de forças favorece as finanças globalizadas. Todavia, não há outro caminho a seguir, caso os setores progressistas queiram, de fato, construir um país mais civilizado.

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  • 1
    Segundo Boaventura de Souza Santos: "Nesta segunda década estes governos (progressistas e populares latino-americanos) continuam declarando-se pós-neoliberais e têm alguma razão, mas não toda a razão. Por que poderíamos chama-los pós-neoliberais? Bom, em parte porque o Estado controla muito mais a economia, é um interventor na mesma. Além disso, nacionalizaram-se muitas empresas no caso da Bolívia e Equador. Ou seja, existe um ativismo estatal mais forte que vai contra o neoliberalismo, e é por isso que o neoliberalismo internacional não perdoa estes governos e quer destruí-los. Agora, qual é a forma de operar destes países. Bom, são "pós-neoliberais" internamente para conseguir alguma medida de redistribuição social, mas não questionam o neoliberalismo internacional, o capitalismo financeiro nem as regras do livre comércio e jogam com as regras destes tratados. O modelo de desenvolvimento é neoliberal." Disponível em: <http://wp.mw.p3C2Pm-hMv>.
  • 2
    Ao ser criado, o FSE era integrado pelos recursos do Imposto de Renda (IR) descontados de servidores públicos federais; parcela de recursos da arrecadação de impostos (IR, ITR e IOF) e de contribuições sociais (CSLL e PIS/Pasep); 20% da arrecadação total dos impostos e contribuições (ressalvadas as deduções anteriores); e 20% das contribuições previdenciárias eram desvinculadas. Com a sua renovação em 1996 (EC n.º 10) o FSE passou a ser denominado de Fundo de Estabilização Fiscal (FEF). Por problemas federativos, deixou de subtrair dos fundos constitucionais de repartição 20% da arrecadação dos impostos, mas manteve as demais desvinculações. Em 2000, o FEF passou a ser denominado de Desvinculação de Receitas da União (DRU), pela EC n.º 27, renovada pelas Emendas Constitucionais n.º 42 (2003), 56 (2007) e 68 (2011). Hoje, os efeitos da DRU estão restritos às desvinculações das contribuições sociais e das contribuições econômicas. A educação deixou de perder recursos com a EC n.º 59, de 2009. Esse conjunto transitório-permanente criado em 1994 deve vigorar pelo menos até 2015, nos termos da EC n.º 68.
  • 3
    Observe-se que estudo realizado por professores da UNB e da UFSC (SOARES NETO, J. et al., 2013) propõe uma escala para analisar dados sobre a situação da infraestrutura das mais de 194 mil unidades de ensino básico no Brasil, públicas e privadas. As escolas foram classificadas em quatro categorias: elementar, básica, adequada e avançada, de acordo com a qualidade da infraestrutura. Um fato que chama a atenção é que somente 0,6% das unidades de ensino teve a infraestrutura considerada "avançada", com recursos como laboratório de ciências e dependências que atendam estudantes com necessidades especiais. Na posição oposta, 44% das instituições de educação básica foram classificadas na categoria "elementar". Os dados revelam que as grandes diferenças entre as regiões do país aparecem também na infraestrutura das escolas. Em todas as regiões a taxa de colégios públicos classificados como de infraestrutura avançada não excede os 2%.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    30 Dez 2014
  • Aceito
    27 Fev 2015
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