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DESVELANDO FORMAS ARBITRÁRIAS DE DOMINAÇÃO: O TRABALHO SOCIOLÓGICO DE PIERRE BOURDIEU

UNVEILING ARBITRARY FORMS OF DOMINATION: THE SOCIOLOGICAL WORK OF PIERRE BOURDIEU

DESVELANDO FORMAS ARBITRARIAS DE DOMINACIÓN: EL TRABAJO SOCIOLÓGICO DE PIERRE BOURDIEU

RESUMO

O texto procura, inicialmente, acompanhar a trajetória do sociólogo francês Pierre Bourdieu (1930–2002) ao longo de mais de quatro décadas, destacando suas atividades enquanto pesquisador e, também, como “agitprop” (“agitador profissional”). Num segundo momento, dedica-se a narrar minha experiência de trabalhar com os pressupostos teóricos desenvolvidos pelo autor em alguns campos do conhecimento. Conclui ressaltando que a leitura e a utilização de Bourdieu, vinte anos após sua morte, continua indispensável no sentido de desnaturalizar os mecanismos instituídos de ocultamento das relações que levam às divisões sociais.

Palavras-chave
Pierre Bourdieu; Mecanismo de dominação; Sociologia da educação e da cultura; Ativismo político; Pesquisar com Bourdieu

ABSTRACT

The text initially seeks to follow the trajectory of the French sociologist Pierre Bourdieu (1930–2002) over more than four decades, highlighting his activities as a researcher and as an “agitprop” (“professional agitator”). In a second moment, it is dedicated to narrating my experience of working with the theoretical assumptions developed by the author in some fields of knowledge. It concludes by emphasizing that the reading and use of Bourdieu, twenty years after his death, remains indispensable in the sense of denaturalizing the established mechanisms of concealment of the relationships that lead to social divisions.

Keywords
Pierre Bourdieu; Domination mechanism; Sociology of education and culture; Political activism; Research with Bourdieu

RESUMEN

El texto busca inicialmente seguir la trayectoria del sociólogo francés Pierre Bourdieu (1930–2002) a lo largo de más de cuatro décadas, destacando su actividad como investigador y también como “agitprop” (“agitador profesional”). En un segundo momento, está dedicado a narrar mi experiencia de trabajo con los supuestos teóricos desarrollados por el autor en algunos campos del saber. Concluye destacando que la lectura y uso de Bourdieu, veinte años después de su muerte, sigue siendo indispensable en el sentido de desnaturalizar los mecanismos establecidos de ocultación de las relaciones que conducen a las divisiones sociales.

Palabras clave
Pierre Bourdieu; Mecanismo de dominación; Sociología de la educación y de la cultura; Activismo político; Investigación con Bourdieu

Introdução

Como passam anos! Ultimamente têm passado muitos anos” (Rubem Braga, A companhia dos amigos)

Citar, dizem os Kabyles, é ressuscitar” (Pierre Bourdieu, Leçon sur la leçon)

As minhas mãos colocaram pedras

nos alicerces do mundo

mereço o meu pedaço de pão” (Agostinho Neto, Confiança)

Se fosse para buscar os favores do mundo, teria me

enfeitado de belezas emprestadas

(Michel de Montaigne, Les essais)

Pode ser que alguns leitores estranhem o tom do presente artigo porque, na maioria das vezes, vincular-se ao universo de Pierre Bourdieu implica em ingressar em trilhas ou caminhos que lembram David Bowie e Jennifer Connelly em LabyrinthLABYRINTH. Direção: Jim Henson. Companhias produtoras: Henson Associates, Inc. Lucasfilm, Los Angeles, Califórnia, USA, 1986 (101 min). (Labirinto – A magia do tempo, 1986): fascínio, hermetismo, revelações, incertezas, novidades, becos aparentemente sem saída. O próprio autor lembrou que Jean-Paul Sartre (2002/1965)SARTRE, J.-P. Crítica da razão dialética. Tradução: João Guilherme de Freitas Teixeira, São Paulo: DP&A, 2002., em A crítica da razão dialética, declarou a propósito de suas leituras juvenis de Marx: “eu compreendia tudo e não compreendia nada”. Ou seja, “há uma compreensão (escolar em geral) que é uma não compreensão, um fazer como se se compreendera, uma falta de compreensão fundada em resistências profundas” (BOURDIEU, 1997BOURDIEU, P. Que es hacer hablar a un autor? A proposito de Michel Foucault. In: BOURDIEU, P. Capital cultural, escuela y espacio social. México: Siglo Veintiuno, 1997., p. 19).

Vou procurar seguir a lição do sociólogo Wright Mills (1975/1959)MILLS, C. W. A imaginação sociológica. 4. ed. Tradução: Waltensir Dutra. Rio de Janeiro: Zahar, 1975. que, em A imaginação sociológica, recomendava que todas as pessoas que manejassem palavras deveriam se esforçar para escrever de forma clara. É o que pretendo fazer, refletindo sobre parte da obra de Bourdieu; de como é, para mim, trabalhar a partir de seus pressupostos e, também, acerca de sua permanência e importância para a pesquisa científica vinte anos após a sua morte, ocorrida em 2002, aos 71 anos.

Uma Longa Trajetória como Investigador e “Agitprop”

Há cinco anos, em verbete em que analisei o filme A Sociologia é um esporte de combate (LA SOCIOLOGIE... 2001LA SOCIOLOGIE est un sport de combat (A Sociologia é um esporte de combate). Direção e roteiro: Pierre Carles, Paris, França: CP Productions et VF Films, 2001 (146 min).), inseri uma frase de Bourdieu pronunciada na película em que afirma o seguinte: “a sociologia serve como um esporte de combate e, como tal, serve para se defender, não deve servir para atacar” (CATANI, 2017aCATANI, A. M. A Sociologia é um esporte de combate. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017a. p. 345-346., p. 346). Eu prosseguia:

Mas, defender quem, do quê? Defender aqueles indivíduos que se encontram em situação de perigo social real ou iminente diante dos poderes que os oprimem — os governos de direita e/ou de esquerda que, por vezes, operam de forma semelhante; a mídia, ao elaborar um discurso que ilumina determinadas dimensões sociais e obscurece outras; as associações internacionais trilaterais de crédito e fomento; os organismos patronais etc. A sociologia pode ajudar a explicar-lhes melhor a situação que vivenciam, as causas sociais que conduziram seus destinos a essa condição de desfavorabilidade. Entretanto, explicar, descrever, mostrar não é solucionar nem transformar — daí a necessidade dos movimentos sociais organizados.

(CATANI, 2017aCATANI, A. M. A Sociologia é um esporte de combate. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017a. p. 345-346., p. 346)

Obrigando-o a se tornar um “agitprop” (“agitador profissional”), que tanto horror causou a intelectuais ligados ao governo socialista francês já no final da década de 1990 e início dos anos 2000.

Vou falar de Bourdieu e de seus escritos “do fim para o começo”, a partir de sua militância, de seu ativismo, predominantes quando já era um autor consagrado e “o intelectual francês mais citado no mundo hoje” (PÉREZ; POUPEAU, 2022PÉREZ, A.; POUPEAU, F. A fabricação internacional das Ciências Sociais: Bourdieu e as Américas. In: ROCHA, M. E. M (Org.). Bourdieu à brasileira. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2022. p. 21-26., p. 21). Entretanto iniciou sua trajetória de “agitprop” bem cedo, como aparece em seu livro Interventions, 1961-2001: Science sociale et action politique (BOURDIEU, 2002BOURDIEU, P. Interventions 1961-2001: science sociale et action politique. Marseille: Agone, 2002.), organizado por Franck Poupeau e Thierry Discepolo, com uma centena de artigos que escreveu ao longo de quarenta anos, “constituindo-se em uma súmula de seu engajamento em distintos movimentos sociais franceses e estrangeiros” (CATANI, 2017bCATANI, A. M. Ativismo. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017b. p. 42-45., p. 43), revelando a intensidade e a contundência de seu pensamento. Ele foi ministrando cursos e desenvolvendo um conjunto de investigações empíricas e teóricas, ao mesmo tempo em que intervinha nos movimentos sociais que considerava significativos.

Após concluir a Escola Normal Superior (ENS) em Paris, em 1954, foi aprovado no concurso de Agrégation — concurso público de admissão ao cargo de professor de liceu ou de faculdade. Lecionou filosofia (1954–1955) no Liceu de Moulins, pequena cidade da região central da França e, de 1955 a 1958, prestou o serviço militar na Argélia, então colônia francesa, em plena guerra (1954–1962) por sua independência. Após cumprir suas obrigações militares, optou por ficar na Argélia, exercendo o magistério como professor assistente na faculdade de Letras de Argel. Nesse período (1958–1960) desenvolveu extenso trabalho de campo, que redundou numa etnologia da sociedade cabila — população camponesa habitante das regiões montanhosas da Argélia. Deve-se salientar que, sobre esse país situado no norte da África, Bourdieu publicou Sociologie de l’Algérie (1958), Travail et travailleurs en Algérie (1963, com Alain Darbel, Jean-Paul Rivet e Claude Seibel) e Le déracinement (1964, com Abdelmalek Sayad). Em 1977, surgiu Algérie 60: Structures économiques et structures temporelles, retomando investigações realizadas no país, especialmente no já mencionado Travail et travailleurs en Algérie. Mas a Argélia nunca deixou de ser objeto de suas preocupações: em 1972, saiu Esquisse d’une théorie de la pratique: Précédé de trois études d’ethnologie kabyle. Duas outras obras póstumas foram editadas, Images d’Algérie: une affinité élective (2003) e o volume de escritos organizados por Tassadit Yacine, Esquisses algériennes (2008).

Na “Cronologia de Pierre Bourdieu”, Maria Alice, Ana Paula, Cristina e eu escrevemos que “em função do agravamento do conflito colonial e diante das posições liberais que assume face à guerra civil de independência, é obrigado a voltar para a França, tornando-se Professor Assistente na Faculdade de Letras de Paris (Sorbonne)” (CATANI et al., 2017gCATANI, A. M. Cronologia de Pierre Bourdieu. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017g. p. 393-396., p. 394). De 1961 a 1964, trabalhou na Faculdade de Letras de Lille quando, pela primeira vez, ministrou cursos sobre Durkheim, Weber e Marx, bem como sobre a antropologia britânica e a sociologia norte-americana. “Paralelamente, prosseguiu o trabalho de análise dos dados de campo coletados durante o período argelino e em suas constantes viagens de férias ao país” (CATANI et al., 2017gCATANI, A. M. Cronologia de Pierre Bourdieu. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017g. p. 393-396., p. 394).

Em 1964, passou a lecionar na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais (EHESS) de Paris, também orientando teses, aos 34 anos. Foi indicado por Raymond Aron para sucedê-lo na direção do Centro de Sociologia Europeia, além de dirigir a coleção “Le Sens Commun”, na Éditions Minuit, na qual publicou um conjunto de livros dos mais variados matizes. Dentre as obras clássicas se destacam as de Émile Durkheim, Marcel Mauss, Maurice Halbwachs, Ernst Cassirer, Joseph Schumpeter, Mikhail Bakhtin, Émile Benveniste, Erwin Panofsky. Quanto às traduções de autores contemporâneos relevantes, apareceram Theodor W. Adorno, Basil Bernstein, Moses Finley, Erving Goffman, Albert Hirschman, Richard Hoggart, William Labov, Ralf Linton, Herbert Marcuse, Radcliffe-Brown. Igualmente tiveram livros editados, com suas pesquisas originais, jovens sociólogos e historiadores franceses e estrangeiros (Luc Boltanski, Robert Castel, Patrick Champagne, Christophe Charle, Jean-Louis Fabiani, Claude Grignon, Francine Muel-Dreyfus, Charles Suaud, Jeannine Verdès-Leroux, Anna Boschetti, Dario Gamboni), além de livros de seus amigos Jean Bollack e Louis Marin, de seu antigo mestre Jules Vuillemin e várias obras de sua autoria (e em co-autoria com outros colaboradores) (CATANI, 2017cCATANI, A. M. Bourdieu editor. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017c. p. 61-63., p. 61; WACQUANT, 2002WACQUANT, L. O legado sociológico de Pierre Bourdieu: duas dimensões e uma nota pessoal. Revista de Sociologia e Política. Curitiba, n. 19, p. 95-110, 2002., p. 98-99).

Mas voltemos a 1967, quando Bourdieu fundou o Centro de Sociologia da Educação e da Cultura na EHESS. Nesse centro “congregou e dirigiu, por mais de trinta anos, uma grande equipe de pesquisadores dedicados à compreensão das relações que se estabelecem entre o universo da cultura e o campo do poder e das classes sociais” (CATANI et al., 2017aCATANI, A. M. A Sociologia é um esporte de combate. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017a. p. 345-346., p. 394). Ele, que já publicara em 1964, com Jean-Claude Passeron, Os herdeiros: os estudantes e a cultura, lançou em 1970, também com Passeron, seu livro mais conhecido no terreno da educação: A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino, editado em vários países.

Na década de 1970, incrementou suas atividades acadêmicas no exterior, trabalhando em instituições relevantes: universidades de Chicago, Harvard, Princeton (EUA); Instituto Max Planck (Alemanha); Universidade de Todai (Japão). Em 1975, apoiado por Fernand Braudel, diretor da Maison des Sciences de L’Homme, criou a revista Actes de la Recherche en Sciences Sociales (ARSS), que dirigiu até 2001, tornando-se um dos periódicos mais relevantes em ciências sociais do mundo, procurando dar conta de um tríplice desafio, segundo Miceli (2002, p. A3)MICELI, S. Uma revolução simbólica. Folha de S. Paulo, São Paulo, ano 82, n. 31.277, 27 Jan. 2002. Tendências e Debates, p. A3.: “afirmar um rosto teórico original para o ofício de sociólogo, lançar as bases de alianças com cientistas sociais estrangeiros considerados pares [...] e testar os graus de universalização dos achados e dos conceitos derivados dos seus experimentos de investigação”.

Na publicação, além das temáticas que perpassam o tecido social, aparecem uma série de artigos dedicados à

[...] economia dos bens simbólicos (pintura, livros, literatura, moda, música, museus, academia, mito, ciência e as respectivas inter relações), à lógica da classificação social e à fabricação de coletivos sociais; textos referentes à etnicidade, à região, à nação, à vida social — envolvendo a família, a empresa, o partido, o Estado.

(WACQUANT, 2002WACQUANT, L. O legado sociológico de Pierre Bourdieu: duas dimensões e uma nota pessoal. Revista de Sociologia e Política. Curitiba, n. 19, p. 95-110, 2002., p. 104-105)

Há, igualmente, números que se ocupam das estratégias sociais de dominação, distinção e reprodução, além das práticas e dos poderes intelectuais. Wacquant (2002)WACQUANT, L. O legado sociológico de Pierre Bourdieu: duas dimensões e uma nota pessoal. Revista de Sociologia e Política. Curitiba, n. 19, p. 95-110, 2002. lembra, ainda, que a ARSS obteve grande êxito editorial, ultrapassando os domínios acadêmicos, com um público leitor regular próximo a dez mil — na França há apenas cerca de mil sociólogos.

Bourdieu, em 1981, foi eleito para a cadeira de Sociologia do Collège de France, instância máxima de consagração acadêmica do país (ver a respeito: CATANI, 1999aCATANI, A. M. Aulas no Collège de France. In: CATANI, A. M.; MARTINEZ, P. H. (Orgs.). Sete ensaios sobre o Collège de France. São Paulo: Cortez, 1999a. p. 7-13., 1999bCATANI, A. M. Algumas lições da aula inaugural de Pierre Bourdieu. In: CATANI, A. M.; MARTINEZ, P. H. (Orgs.). Sete ensaios sobre o Collège de France. São Paulo: Cortez, 1999b. p. 89-103., 2017eCATANI, A. M. Collège de France. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017e. p. 124-125.; ALMEIDA, 1999ALMEIDA, A. O Collège de France. In: CATANI, A. M.; MARTINEZ, P. H. (Orgs.). Sete ensaios sobre o Collège de France. São Paulo: Cortez, 1999. p. 15-30.; ERIBON, 1990ERIBON, D. Michel Foucault (1926-1984). São Paulo: Companhia das Letras, 1990.; LÉVI-STRAUSS, 1986LÉVI-STRAUSS, C. Minhas palavras. São Paulo: Brasiliense, 1986.; MICELI, 1999MICELI, S. Um intelectual do sentido. Folha de S. Paulo, São Paulo, ano 79, n. 25.512, 7 Feb. 1999. Caderno Mais!, p. A5.).

Através dos verbetes “Ativismo” e “Bourdieu editor” (CATANI, 2017bCATANI, A. M. Ativismo. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017b. p. 42-45.; 2017cCATANI, A. M. Bourdieu editor. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017c. p. 61-63.) pode-se detalhar parte das ações do pensador francês, constituindo-se em uma mescla de militância acadêmica e política. Nos anos 1980–90, continuou seu trabalho entendendo, como Durkheim, que os interesses da ciência só podem ser resolvidos pelos próprios cientistas. Com essa finalidade criou, em 1989, a Liber: Revista Europeia de Livros (depois, com o subtítulo Revista Internacional de Livros, adotado em 1994), que circulou até 1998, constituindo-se em publicação trimestral encartada em Actes… Publicada em diversos idiomas (francês, alemão, italiano, búlgaro, húngaro, sueco, romeno, grego, norueguês e turco), foi definida por Bourdieu como uma forma de resistência a uma situação de ajuste intelectual, propondo o resgate da capacidade de aliar a autonomia da esfera intelectual com o engajamento crítico, em um espaço público e político, tendo sido definidos o modelo e a “missão” dos intelectuais: em lugar do intelectual total sartriano, tem-se o intelectual transdisciplinar e internacional, alternativo aos poderes econômicos, políticos e à mídia (MICELI, 1997MICELI, S. Apresentação. In: BOURDIEU, P. (Ed.); MICELI, S. (Org.). Liber 1. São Paulo: EDUSP, 1997. p. 11-15., p. 12-13).

Em 1989, Bourdieu divulgou “Princípios para uma reflexão sobre os conteúdos do ensino”, relatório da comissão que presidiu com François Gros, então ministro da Educação Nacional, da Juventude e dos Esportes. Em 1991, tornou-se membro do Conselho Científico do Instituto Magreb–Europa e, nesse mesmo ano, criou a Associação de Reflexão sobre o Ensino Superior e a Pesquisa (ARESER), que passou a presidir. Em 1993, teve intensa participação no Parlamento Internacional dos Escritores e no Comitê Internacional de Apoio aos Intelectuais Argelinos.

A partir da década de 1990, ele assumiu papel combativo nos movimentos sociais antiglobalização e de apoio aos desempregados, aos trabalhadores do campo, aos imigrantes ilegais na França e aos intelectuais perseguidos em diversos países. Foi no início dos anos 1990, quando as desigualdades sociais já se manifestavam de forma contundente, que Bourdieu, através de ARSS, editou artigos baseados em depoimentos que homens e mulheres confiaram a vários autores “a propósito de suas existências e de suas dificuldades de viver” (BOURDIEU, 1993BOURDIEU, P. La misère du monde. Paris: Seuil, 1993., p. 9). Depois, tais estudos se ampliaram, resultando em livro de quase mil páginas — A miséria do mundo (1993) —, trabalhando a questão da miséria e do sofrimento social nas sociedades contemporâneas, que se tornou sucesso de vendas e editado em muitos países. Coordenado por Bourdieu, também autor de vários capítulos, contou com o trabalho de outros 22 colaboradores (CATANI, 2007CATANI, A. M. Compreendendo os fundamentos ocultos da dominação. Revista Educação, São Paulo, v. 5, p. 74-83, 2007., p. 80-81). A obra foi adaptada para vídeo e teatro.

Ele acompanhou de perto o conjunto de manifestações de rua ocorridas em Paris em dezembro de 1995, fazendo brilhante intervenção na Gare de Lyon (“Contra a destruição de uma civilização”), depois incluída em seu livro Contrafogos: táticas para enfrentar a invasão neoliberal (1998). Investindo contra as posturas tecnocráticas do governo socialista francês, assim iniciou sua fala:

Estou aqui para oferecer nosso apoio a todos os que lutam, há três semanas, contra a destruição de uma civilização associada à existência do serviço público, a da igualdade republicana dos direitos, direito à educação, à saúde, à cultura, à pesquisa, à arte e, acima de tudo, ao trabalho.

(BOURDIEU, 1998BOURDIEU, P. Contrafogos: táticas para enfrentar a invasão neoliberal. Consultoria: Sergio Miceli, Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998., p. 37)

Aliás, na contracapa da edição brasileira se encontra transcrita a definição de contrafogo: “s.m. Fogo ateado ao encontro de um incêndio florestal para impedir-lhe a propagação; fogo de encontro”.

Com um grupo de intelectuais fundou, em 1996, a editora Liber – Raisons d’agir, depois apenas Raisons d’Agir, publicando pequenos livros densos, bem documentados e baratos sobre problemas políticos e sociais da atualidade, escritos por sociólogos, economistas, escritores e artistas que possuíam “a vontade militante de difundir o saber indispensável à reflexão e à ação política em uma democracia” (CATANI, 1997CATANI, A. M. A aventura industrial e o cinema paulista (1930-1955). In: RAMOS, F. (Org.). História do cinema brasileiro. São Paulo: Art, 1987. p. 189-297., p. 82; 2017bCATANI, A. M. Ativismo. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017b. p. 42-45., p. 44; WACQUANT, 2002WACQUANT, L. O legado sociológico de Pierre Bourdieu: duas dimensões e uma nota pessoal. Revista de Sociologia e Política. Curitiba, n. 19, p. 95-110, 2002., p. 99-101). A maior parte desses livros foi editada contra uma situação de cerceamento da mídia e do mercado editorial, que se recusavam a discutir, aprofundar e publicar vários temas que, se escamoteados, contribuíram para a manutenção do que o autor chamou de “os fundamentos ocultos da dominação” (BOURDIEU, 1980BOURDIEU, P. La distinction: critique sociale du jugement. Paris: Minuit, 1979., p. 7). Isso porque a sociologia toca, na maioria das vezes, em “interesses vitais” e, em tais casos, não se pode esperar das autoridades, dos patrões, dos bispos, do próprio Estado ou dos jornalistas, que louvem um trabalho sistemático que solapa as próprias bases em que estão assentados tais mecanismos de dominação (BOURDIEU, 1980BOURDIEU, P. La distinction: critique sociale du jugement. Paris: Minuit, 1979., p. 7).

Iniciei dessa maneira o artigo para o número especial da Revista Educação, dedicado a Bourdieu:

A principal contribuição da sociologia de Bourdieu desenvolvida durante cerca de 45 anos foi, nas palavras de seu amigo e colaborador LoÏc Wacquant, a construção de ‘uma antropologia generativa dos poderes focada na contribuição especial que as formas simbólicas dão à respectiva operação, conversão e naturalização.

(CATANI, 2007CATANI, A. M. Compreendendo os fundamentos ocultos da dominação. Revista Educação, São Paulo, v. 5, p. 74-83, 2007., p. 74)

Na Raisons d’Agir apareceram, de sua autoria, Sobre a televisão (1996), o já citado Contrafogos (1998), Contrafogos 2: por um movimento social Europeu (2001), além de Diagnósticos e remédios urgentes para uma universidade em perigo (1997), este último do coletivo ARESER, que ele integrou. Há também vários outros livros sobre a atualidade, de jovens pesquisadores e ativistas, além de seu Ciência da ciência e reflexividade (2001) e Esboço de auto-análise (2004), póstumo. Pela mesma editora, em coedição com a Seuil, e preparado por vários de seus colaboradores, temos: Sobre o Estado. Curso no Collège de France (1989-1992) (2012); Manet. Uma revolução simbólica (2013). Raisons d’Agir e Demopolis lançaram A produção da ideologia dominante (2004), de Bourdieu e Luc Boltanski, enquanto O sociólogo e o historiador (Raisons d’Agir e Agone) de Bourdieu e Roger Chartier, saiu em 2010.

Em 13 de outubro de 1996, Bourdieu e outros intelectuais se posicionaram a favor do Movimento dos Sem Documentos; em janeiro de 1998, ele realizou intervenções públicas em prol do movimento dos desempregados e em 8 de abril escreveu no Le Monde “Por uma esquerda de esquerda”. A partir daí, intensifica-se uma campanha orquestrada contra ele na mídia. “Mestres do mundo, vocês sabem o que fazem?” foi publicado no Libération e no Le Monde (13 e 14/10/1999) e na Folha de S. Paulo (19/10/1999). Em 1 de maio de 2000, apoiou o “Manifesto pelos estados gerais do movimento social europeu” e aos movimentos de luta contra a mundialização neoliberal, reunidos em Nice (dezembro) e em Québec (abril/2001) (CATANI, 2017bCATANI, A. M. Ativismo. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017b. p. 42-45., p. 45).

Em 1997, Bourdieu criou, nas Éditions du Seuil, a coleção Liber, publicando, de sua autoria, Meditações pascalianas (1997), A dominação masculina (1998), As estruturas sociais da economia (2000), além do já citado, póstumo, Esquisses algériénnes (2008), organizado por Tassadit Yacine. Nessa coleção editaram Abdelmalek Sayad, Olivier Christin, Jacques Bouveresse, Frédéric Lebaron, Julien Duval, Yves Dezalay, Anna Boschetti, Aaron Cicourel. Após sua morte em janeiro de 2002, a coleção passou a ser dirigida por seu filho Jérôme Bourdieu, por Johan Heilbron e Yves Winkin, e publicaram-se obras de Louis Pinto, Pascal Durand, Sébastian Chauvin, Sylvie Tissot, Marie-France Garcia-Parpet etc (CATANI, 2017cCATANI, A. M. Bourdieu editor. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017c. p. 61-63., p. 62-63).

Trabalhando com Bourdieu Durante Décadas

Não há flecha que não tenha o arco da infância(Manuel Alegre, Alma).Em parte alguma do mundo me sinto em casa Em cada clima que encontro reconheço abatido que um dia a ele também já estive afeiçoado E dele me despego sempre estrangeiro(Giuseppe Ungaretti, Vagamundo)As palavras são metade de quem fala e metade de quem as ouve” (Michel de Montaigne, Les essais) “O passado é um conjunto vivo e morto(Antonio Gramsci, Concepção dialética da história)

Esta é a terceira vez que escrevo sobre Bourdieu em Educação & Sociedade. A primeira foi em 2002; a segunda, em 2011CATANI, A. M. As possibilidades analíticas da noção de campo social. Educação & Sociedade, Campinas, n. 114, p. 189-202, 2011. https://doi.org/10.1590/S0101-73302011000100012
https://doi.org/10.1590/S0101-7330201100...
. Este artigo provavelmente sairá em 2022, ou seja, um texto a cada 10 anos. Talvez eu não esteja por aqui em 2032 para escrever pela quarta vez.

Fui criado em Piracicaba, interior do estado de São Paulo, tendo cursado o antigo curso científico, concluindo-o em 1970. Fui para a capital, fiz curso pré-vestibular e ingressei, em julho de 1971, na Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas (EAESP/FGV), em Administração Pública, tendo concluído a graduação em junho de 1975. Na época, todos éramos bolsistas do governo do Estado, que pagava nossas mensalidades. Sou da 5ª turma de Administração Pública, curso que possui em sua grade curricular grande quantidade de disciplinas voltadas às humanidades. Devo ao antigo departamento de Ciências Sociais minha formação inicial na área, pois, com exceção de Henrique Rattner e Esdras Borges Costa, quase todos os outros professores haviam ingressado recentemente nos recém-criados programas de pós-graduação em níveis de mestrado e de doutorado — eram os casos de Sergio Miceli, orientado por Leôncio Martins Rodrigues; Vânya Sant’Anna e Maria Cecília Forjaz, orientandas de Francisco Weffort; Ruben Keinert, José Carlos Durand e Maria Rita Loureiro, por Luiz Pereira, todas(os) na USP. Maurício Tragtenberg defendera no início de 1973 seu doutorado, Burocracia e ideologia; Vilmar Faria voltara dos EUA, José Paulo Carneiro Vieira se preparava para estudar na França, Edgard Carone já era veterano, assim como a psicóloga Arakcy Martins Rodrigues. No Departamento de Economia interagia com Robert (Bob) Nicol, Bresser Pereira, Eduardo Suplicy, Roberto Perosa e Alkimar Ribeiro de Moura, enquanto Fernando Prestes Motta e Roberto Venosa, do Departamento de Administração, completavam os parceiros de diálogo de um jovem inquieto e que sempre se sentiu desconfortável com a possibilidade de a vida toda administrar instituições e pessoas.

Fui aprendendo, quase em tempo real, o que meus jovens professores aprendiam em seus cursos de pós-graduação, num momento peculiar da ditadura militar: ao mesmo tempo em que caçavam e baniam docentes e intelectuais, promoviam a expansão da rede universitária, faziam novas contratações e incentivavam a formação de quadros através dos programas de pós-graduação, no Brasil e no exterior.

Na EAESP/FGV, desde o início do curso, trabalhei como revisor de textos, monitor, auxiliar de pesquisas, estagiário junto ao Núcleo de Pesquisas e Publicações (NPP). Atuei com Edgard Carone, Paulo Rebouças, Antonio Nilson Quezado Cavalcanti, Bob Nicol, Vânya Sant’Ana e Sergio Miceli. Bob dirigia o NPP, que financiava pesquisas dos docentes da Getúlio Vargas e editava a Revista de Administração de Empresas (RAE). Esse treinamento com distintos professores, fazendo coisas diversas, foi-me bastante útil, posteriormente.

Fui aluno de Sergio Miceli na disciplina Sociologia I (primeiro semestre de 1972MICELI, S. A noite da madrinha. São Paulo: Perspectiva, 1972.), quando estudamos Durkheim, Weber e Marx e estrutura de classes sociais. Apesar das dificuldades iniciais, lendo inclusive os fundamentos empíricos da explicação sociológica, de Florestan, e, mesmo não tendo sido um aluno brilhante, não fiz feio. Gostei do que ouvi e li e, nesse momento, pensei que era a isso que eu queria me dedicar. Trabalhava com Bob Nicol na pesquisa para a sua tese de doutorado sobre a industrialização brasileira, orientada por Luiz Pereira. Acabada a pesquisa, ele me indicou para o Sergio, que tinha um generoso financiamento do NPP para sua investigação, que resultou em tese e livro: Intelectuais e classe dirigente no Brasil (1920-1945). Tinha cinco auxiliares de pesquisa (Regina Reiss, Paulo Lollato, Antonio Carlos Sachs, Caio Petersen e Ronaldo Bianchi). Eu fui o sexto e comecei a trabalhar em 13 de janeiro de 1973, dia em que ele apresentou e discutiu comigo o projeto, numa manhã triste, após sua volta da cerimônia fúnebre do crítico de arte e ensaísta Anatol Rosenfeld, morto dois dias antes. Fui contratado a partir de 16 de dezembro de 1973. Nesse momento, Sergio era redator-chefe da RAE e obtivera o mestrado com a dissertação A noite da madrinha, um estudo sobre o programa semanal de Hebe Camargo, nos domínios da sociologia da cultura que, valendo-se das concepções teórico-práticas de Bourdieu, desvenda os suportes ideológicos da classe média brasileira e investiga as condições em que a indústria cultural se consolidou.

Miceli enviou sua primeira carta a Bourdieu em 12 de fevereiro de 1970, aos 25 anos, propondo a organização de uma antologia de textos do sociólogo francês (ROCHA, 2022ROCHA, M. E. M. Bourdieu à brasileira. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2022., p 100-101), que viria a ser A economia das trocas simbólicas (1974BOURDIEU, P. A economia das trocas simbólicas. Tradução: Sergio Miceli. São Paulo: Perspectiva, 1974.), tendo escrito uma longa introdução de mais de 50 páginas (“A força do sentido”). Esse texto desempenhou um papel decisivo para habilitar precocemente o brasileiro como um dos maiores especialistas em Bourdieu e para definir a dominação simbólica como a chave principal de interpretação de sua obra (ROCHA, 2022ROCHA, M. E. M. Bourdieu à brasileira. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2022., p. 106).

Fui auxiliar de pesquisa do Sergio até agosto de 1974MICELI, S. A força do sentido. In: BOURDIEU, P. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 1974, p. VII-LXI., quando ele se dirigiu para a França com a família para fazer doutorado com Bourdieu. A equipe se desfez, fui recontratado e trabalhei até junho de 1975, quando me formei na FGV, coletando dados, enviando materiais, fichando memórias e biografias. Por intermédio de Vanya Sant’Anna, professora de Ciência Política, estabeleci contato com Gabriel Cohn, que me aceitou para cursar o mestrado em Sociologia na USP.

A convite do Sergio viajei a Paris e me hospedei em sua casa, pois minhas aulas na USP só começariam em março de 1976. Eu, que nunca viajara de avião, fiz um voo VARIG, Viracopos/Paris, descendo em Charles de Gaulle e sendo recebido por Miceli e Cláudio Vouga, docente da USP exilado. Ness e trabalho, como auxiliar e olhando como a equipe de Bourdieu pesquisava, aprendi o que se chama de cozinha da pesquisa, em que tudo é importante, não apenas os textos teóricos e as grandes interpretações. Sujei muito as mãos na empiria: lia, tomava notas, copiava, fazia longos fichamentos, recortava jornais, organizava pastas, ajudava a elaborar quadros e tabelas, numa época em que não existia computador nem internet. Trabalhei muito na Biblioteca Municipal “Mário de Andrade” (São Paulo) e na Biblioteca Nacional (Rio de Janeiro).

Iniciado o mestrado, fui contratado como professor horista na FGV, lecionando para os alunos de Administração de Empresas e Administração Pública; depois obtive bolsa da FAPESP e segui minha carreira, na UNESP (Araraquara), na UNICAMP e na Faculdade de Educação da USP, onde me aposentei em julho de 2019. Colaborei, nesse período, em quase todos os jornais da grande imprensa e da imprensa nanica. Na Getúlio integrei equipes de bancas de vestibulares aos cursos de graduação, de especialização, do mestrado e doutorado por 20 anos, elaborando questões de História Geral e do Brasil, além de temas para a prova de Redação e corrigindo-as. Escrevi para a RAE dezenas de resenhas. Foi nesse processo, acredito, que aprendi a escrever.

O fato é que, até os dias atuais, publiquei mais de cinco dezenas de trabalhos, entre livros, artigos em periódicos, capítulos de livros, coletâneas, resenhas e introduções sobre Bourdieu e/ou acerca de sua forma de pesquisar e de apresentar os resultados de investigações desenvolvidas — ver, dentre outros: CATANI, 1981CATANI, A. M. Vinícius de Moraes, crítico de cinema: início dos anos 40. Filme Cultura, Rio de Janeiro, EMBRAFILME, 14, n. 38-39, p. 42-52, 1981., 1983CATANI, A. M. A Sombra da Outra: A Cinematográfica Maristela e o cinema industrial paulista nos anos 50. 1983. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1983., 1987CATANI, A. M. A aventura industrial e o cinema paulista (1930-1955). In: RAMOS, F. (Org.). História do cinema brasileiro. São Paulo: Art, 1987. p. 189-297., 1991CATANI, A. M. Cogumelos de uma só manhã: B. J. Duarte e o cinema brasileiro – ANHEMBI (1950-62). 1991. Tese (Doutorado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1991., 1994a, 1994b, 1995CATANI, A. M. B. J. Duarte, cineasta e crítico de cinema paulista: breve trajetória. Comunicação & Política, Rio de Janeiro, v. 4, n. 1, p. 106-121, 1995., 1996CATANI, A. M. Octavio Ianni sociólogo da cultura. In: FALEIROS, M. I.; CRESPO, R. (Orgs.). Humanismo e compromisso: ensaios sobre Octavio Ianni. São Paulo: EDUNESP, 1996. p. 131-142., 1997, 1998CATANI, A. M. Um educador engajado. In: MARTINEZ, P. H. (Org.). Florestan ou o sentido das coisas. São Paulo: Boitempo, 1998. p. 127-142., 2000aCATANI, A. M. Anhembi e a crítica de cinema (1950-1962). In: SOCINE (Org.). Estudos de Cinema: SOCINE II e III. São Paulo: Annablume, 2000a. p. 171-188., 2000bCATANI, A. M. Pierre Bourdieu e a formação de uma teoria social que procura revelar os fundamentos ocultos da dominação. In: BRUHMS, H.; GUTIÉRREZ, G. (Orgs.). O corpo lúdico. Campinas: Autores Associados, 2000b. p. 53-65., 2001aCATANI, A. M.; CATANI, D. B.; PEREIRA, G. R. As apropriações da obra de Pierre Bourdieu no campo educacional brasileiro, através de periódicos da área. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, n. 17, p. 63-85, 2001a. https://doi.org/10.1590/S1413-24782001000200006
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, 2001bCATANI, A. M.; CATANI, D. B.; PEREIRA, G. R. Pierre Bourdieu e as leituras de sua obra no campo educacional brasileiro. In: TURA, M. L. R. (Org.). Sociologia para educadores. Rio de Janeiro: Quartet, 2001b., 2002aCATANI, A. M. A Sombra da Outra: A Cinematográfica Maristela e o cinema industrial paulista nos anos 50. São Paulo: Panorama, 2002a., 2002b, 2004CATANI, A. M. História do cinema brasileiro: 4 ensaios. São Paulo: Panorama, 2004., 2006CATANI, A. M. No berço é que o destino toma conta dos homens? Tese (Livre-Docência) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006., 2009aCATANI, A. M. A revista de cultura Anhembi (1950-62): um projeto elitista para elevar o nível cultural do Brasil. Maringá: Eduem, 2009a., 2009b, 2012CATANI, A. M. No berço é que o destino toma conta dos homens? Hispanista, Niterói, n. 50, p. 10-27, 2012., 2013aCATANI, A. M. No berço é que o destino toma conta dos homens? In: CATANI, A. M. (Org.). Origem e destino: pensando a sociologia reflexiva de Bourdieu. Campinas: Mercado de Letras, 2013a. p. 79-98., 2013bCATANI, A. M. Novos modos de regulação e batalhas na produção do conhecimento – um estudo de caso. Revista Eletrônica de Educação, São Carlos, v. 13, p. 996-1012, 2019. https://doi.org/10.14244/198271993458
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, 2018CATANI, A. M. A Vera Cruz e os estúdios paulistas nos anos 1950. In: RAMOS, F. P.; SCHVARZMAN, S. (Orgs.). Nova história do cinema brasileiro (vol. 1). São Paulo: Edições Sesc, 2018. p. 432-453., 2019CATANI, A. M. Novos modos de regulação e batalhas na produção do conhecimento – um estudo de caso. Revista Eletrônica de Educação, São Carlos, v. 13, p. 996-1012, 2019. https://doi.org/10.14244/198271993458
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, 2021aCATANI, A. M. Freire escrevendo cartas à mão. In: PAIXÃO, A. M.; MAZZA, D.; SPIGOLON, N. (Orgs.). Centelhas de transformação – Paulo Freire e Raymond Williams. São José do Rio Preto: HN, 2021a. p. 75-101., 2021bCATANI, A. M. Borboleteando na biblioteca. Revista Brasileira de Pesquisa (Auto) Biográfica, v. 6, n. 17, p. 34-46, 2021b. https://doi.org/10.31892/rbpab2525-426X.2021.v6.n17.p34-46
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; CATANI; AZEVEDO, 2013CATANI, A. M.; AZEVEDO, M. N. Estudos de políticas de educação em uma perspectiva comparada: uma antecipação crítica de Bourdieu e Passeron. In: OLIVEIRA, J.F.; PESSOA, J. M. (Orgs.). Pesquisar com Bourdieu. Goiânia: Cânone Editorial, 2013. p. 134-151.; CATANI; CATANI; PEREIRA, 2001aCATANI, A. M. A constituição do campo cinematográfico em São Paulo nos anos 40 e 50. In: RAMOS, F. P.; MOURÃO, M. D.; CATANI, A. M.; GATTI, J. (Orgs.). Estudos de cinema 2000 – SOCINE. Porto Alegre: Sulina, 2001. p. 209-216., 2001bCATANI, A. M.; CATANI, D. B.; PEREIRA, G. R. Pierre Bourdieu e as leituras de sua obra no campo educacional brasileiro. In: TURA, M. L. R. (Org.). Sociologia para educadores. Rio de Janeiro: Quartet, 2001b., 2002CATANI, A. M. A sociologia de Bourdieu (ou como um autor se torna indispensável a nosso regime de leituras). Educação & Sociedade, Campinas, v. 23, n. 78, p. 57-75, 2002. https://doi.org/10.1590/S0101-73302002000200005
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; CATANI; HEY; AZEVEDO, 2015CATANI, A. M.; HEY, A. P.; AZEVEDO, M. L.. Políticas de Educação Superior no Brasil: um programa de pesquisa a partir de Sobre o Estado, de Pierre Bourdieu. In: VALDEZ, D.; ASSIS, L. (Orgs). Política e História da Educação: saberes, tempos e lugares. Campinas: Mercado de Letras, 2015. p. 69-76.; CATANI; OLIVEIRA, 2002CATANI, A. M.; CATANI, D. B.; PEREIRA, G. R. As apropriações da obra de Pierre Bourdieu no campo educacional brasileiro. Revista Portuguesa de Educação, Braga, v. 15, n. 1, p. 5-25, 2002.; CATANI; PEREIRA, 2002CATANI, A. M.; PEREIRA, G. R. Espaço social e espaço simbólico: introdução a uma tipologia social. Perspectiva, Florianópolis, v. 20, n. especial, p. 107-120, 2002.; AZEVEDO; CATANI; HEY, 2017AZEVEDO, M. L. N.; CATANI, A. M.; HEY, A. P. Circulação das ideias e internacionalização da educação superior a partir da teoria dos campos de Pierre Bourdieu. Educação, Porto Alegre, v. 40, n. 3, p. 297-304, 2017. https://doi.org/10.15448/1981-2582.2017.3.28980
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; HEY; CATANI, 2008HEY, A. P.; CATANI, A. M. Bourdieu e a educação. Cult, São Paulo, n. 128, p. 62-64, 2008. Available from: https://revistacult.uol.com.br/home/bourdieu-e-a-educacao/. Access on: 09 Nov. 2022.
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, 2009HEY, A. P.; CATANI, A. M. La Universidad de San Pablo (USP) y la formación de cuadros dirigentes. Fundamentos en Humanidades, San Luis, v. X, n. I (19), p. 57-76, 2009., 2012HEY, A. P.; CATANI, A. M. Campo universitário e novos doutores: discutindo as humanidades no Brasil. In: ALMEIDA, M. L. P.; THOMÉ, N. (Orgs.). Educação, história e política: uma discussão sobre processos formativos e socioculturais. Campinas: Mercado de Letras, 2012. p. 23-38., 2013HEY, A. P.; CATANI, A. M. Ladrilhando o concreto: construindo pesquisas a partir de Bourdieu. In: OLIVEIRA, J. F.; PESSOA, J. M. (Orgs.). Pesquisar com Bourdieu. Goiânia: Cânone Editorial, 2013. p. 31-52., 2018HEY, A. P.; CATANI, A. M. O Vocabulário do mestre – entrevista sobre a recepção de Bourdieu no Brasil. Sociologia, São Paulo, p. 44-46, 2018.; HEY; CATANI; AMORIM, 2020HEY, A. P.; CATANI, A. M.; AMORIM, A. M. Internacionalização e transnacionalização na pós-graduação e a educação no Brasil: alguns embates. Inter-Ação, v. 45, n. 3, p. 670-687, 2020. https://doi.org/10.5216/ia.v45i3.62129
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; HEY; CATANI; MEDEIROS, 2018HEY, A. P.; CATANI, A. M.; MEDEIROS, C. C. C. A Sociologia da Educação de Bourdieu na revista Actes de la Recherche en Sciences Sociales. Tempo Social, São Paulo, v. 30, n. 2, p. 171-195, 2018. https://doi.org/10.11606/0103-2070.ts.2018.122400
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; OLIVEIRA; CATANI, 2012OLIVEIRA, J. F.; CATANI, A. M. La reconfiguración del campo universitario en Brasil. Conceptos, actores, estrategias y acciones. Perfiles Educativos, Ciudad de México, v. 34, n. 135, p. 149-163, 2012..

Em vários dos textos referenciados no parágrafo anterior, Bourdieu não é citado explicitamente, mas trabalho valendo-me de sua forma de trabalhar. Explico melhor: em 2012 Miceli lançou Vanguardas em retrocesso: ensaios de história social e intelectual do modernismo latino-americano, uma história social da cultura da região em ensaios comparados onde se examinam os campos intelectuais argentino e brasileiro. São estudados Tarsila do Amaral e Ricardo Güiraldes; Lasar Segall e Xul Solar, Florestan Fernandes e Gino Germani, Jorge Luis Borges e Mário de Andrade. No livro não há qualquer referência a Bourdieu; entretanto não se faz uma análise propriamente literária das obras de Borges e dos outros literatos, sociólogos e pintores examinados. O esforço do autor caminha no sentido de mostrar que, pela posição ocupada no campo literário de seu país:

[..] há todo um conjunto de obras que exaltam o escritor argentino, apagando as constrições sociais de sua trajetória, “como se fosse desígnio exclusivo a rendição ao culto do escritor puro, o mais acabado espécime contemporâneo do homem de letras, o qual teria se afirmado por forças apenas do gênio literário, e cuja gênese poderia subsistir na penumbra de alusões, anedotas, esquisitices”.

(MICELI, 2012MICELI, S. Vanguarda em retrocesso: ensaios de história social e intelectual do modernismo latino-americano. São Paulo: Companhia das Letras, 2012., p. 45)

O sociólogo brasileiro explora, ainda, a relação que Borges mantinha com a elite criolla, com o escritor Macedonio Fernández, seu padrinho literário, a cegueira progressiva do pai e a própria, a perda da fortuna, o celibato planejado, suas relações com a vanguarda europeia, os padrões de excelência que apregoava, o culto à personalidade de que é objeto, parte cultivado por ele e que acaba por integrar sua obra.

Examinando a trajetória de Mário de Andrade, Miceli mostra que ele transitou entre a elite política e intelectual brasileira em condições materiais e simbólicas quase sempre desfavoráveis. Como tantos outros intelectuais, ele foi obrigado, para sobreviver, a integrar um sistema de apadrinhamento do Estado, colaborar em jornais e órgãos da imprensa oligárquica dominante, aceitar trabalhos literários e jornalísticos de encomenda.

Em “Estruturas sociais e estruturas mentais”, prólogo de La noblesse d’État: Grandes écoles et esprit de corps, Bourdieu (1989, p. 13)BOURDIEU, P. La noblesse d’État: Grandes écoles et esprit de corps. Paris: Minuit, 1989. escreveu que “a sociologia da educação é um capítulo e não dos menores, da sociologia do conhecimento e também da sociologia do poder”. Em La distinction, critique sociale du jugement (1979), relembra o autor nesse mesmo prólogo, que entendia a estrutura do espaço social como resultante de dois princípios de diferenciação fundamentais, o capital econômico e o capital social, sendo que “a instituição escolar desempenha papel determinante na reprodução da distribuição do capital cultural e, portanto, na reprodução da estrutura do espaço social, tornando-se uma aposta central nas lutas pelo monopólio das posições dominantes” (BOURDIEU, 1989BOURDIEU, P. La noblesse d’État: Grandes écoles et esprit de corps. Paris: Minuit, 1989., p. 13-14).

As lutas em torno da apropriação da cultura e do conhecimento legítimos assumem papel central em uma sociologia crítica, voltada ao desvelamento das estruturas de dominação vigentes (HEY; CATANI, 2018CATANI, A. M. A Vera Cruz e os estúdios paulistas nos anos 1950. In: RAMOS, F. P.; SCHVARZMAN, S. (Orgs.). Nova história do cinema brasileiro (vol. 1). São Paulo: Edições Sesc, 2018. p. 432-453., p. 46). Bourdieu procurou questionar como e por que, na sociedade francesa — mas que podem ser generalizadas para várias outras formações sociais —, pequenos grupos conseguem se apoderar dos meios de dominação, “permitindo nomear e representar a realidade, construindo categorias, classificações e visões de mundo às quais todos os outros são obrigados a se referir. Compreender o mundo”, como já se escreveu antes, “converte-se em poderoso instrumento de libertação”. E tal procedimento se realiza, dentre outros domínios, no educacional (HEY; CATANI, 2008HEY, A. P.; CATANI, A. M. Bourdieu e a educação. Cult, São Paulo, n. 128, p. 62-64, 2008. Available from: https://revistacult.uol.com.br/home/bourdieu-e-a-educacao/. Access on: 09 Nov. 2022.
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, p. 62).

Procurei, em meus escritos em sociologia da educação e em políticas de educação superior, estar atento a essas dimensões e complexidades exploradas por Bourdieu. Na impossibilidade de detalhar o conjunto de trabalhos desenvolvidos em tais campos do conhecimento, optei por concluir o presente item expondo brevemente as pesquisas que realizei e que resultaram em meu mestrado, em meu doutorado e em minha livre-docência.

Defendi minha dissertação de mestrado (A Sombra da Outra: A Cinematográfica Maristela e o cinema industrial paulista nos anos 50) em 1983, transformando-a em livro em 2002. Estudei a Cinematográfica Maristela (1950–1958) mostrando que ela surgiu na esteira de uma série de empreendimentos desenvolvidos pela burguesia paulista no pós-guerra, em especial a Cinematográfica Vera Cruz (1949–1954). Houve uma febre pelo cinema, que levou ao surgimento de várias pequenas produtoras e de todo um aparato de legitimação e difusão cultural na área: cineclubes, concursos, prêmios, festivais, congressos, legislação, comissões, grupos de trabalho, publicações especializadas, críticos, associações de classe.

Capitaneada pela família Audrá (industriais, proprietários de terras, metalúrgica, companhia de transportes), a Maristela foi considerada a prima pobre ou a sombra da Vera Cruz, tendo seus estúdios no bairro de Jaçanã. Produziu mais de uma dezena e meia de filmes, alugou seus estúdios e equipamentos para outros produtores, mas não suportou os elevados custos de produção e o baixo preço dos ingressos, que tornava impossível fazer frente aos trustes estadunidenses, aqui representados pelas grandes produtoras. Fiz amplo levantamento bibliográfico, consultei 4 jornais diários da grande imprensa, 5 revistas, vários arquivos públicos e privados, além de realizar mais de 20 depoimentos com produtores, diretores, atrizes, atores, críticos, roteiristas, técnicos etc. Tive acesso ao arquivo da empresa e pude delinear os contornos do campo cinematográfico paulista do período.

Defendi meu doutorado em 1992 e, a partir do original — Cogumelos de uma só manhã: B. J. Duarte e o cinema brasileiro: ANHEMBI (1950-1962) —, publiquei um livro e alguns artigos. Situei a revista de cultura Anhembi, de periodicidade mensal, no movimento cultural burguês que ocorria em São Paulo com a fundação de companhias teatrais, empresas cinematográficas, bienal de artes plásticas, museus de arte etc. O poder público participa marginalmente de tais empreendimentos. Explorei as tomadas de posição políticas do periódico e sua ação cultural. Reunia o melhor da intelectualidade brasileira e de parte da internacional, objetivando elevar o nível cultural do Brasil. Encabeçada por Paulo Duarte, jornalista, escritor, arqueólogo, professor, exilou-se várias vezes por opor-se a Getúlio Vargas e foi um dos artífices da criação da USP (1934). Respaldado por um conjunto de anunciantes composto por empresários, banqueiros e instituições de classe patronais, Anhembi tinha cerca de 220 páginas, iniciando-se com editorial, artigos de acadêmicos de renome e 80 a 90 páginas com as “Seções de 30 Dias”, dedicadas a literatura, teatro, cinema, música, artes, esportes, ciências.

Examinei a seção “Cinema de 30 Dias”, dirigida por B. J. Duarte, documentarista científico premiado dezenas de vezes, no País e no exterior, crítico conservador, jornalista, e bastante ativo no campo cinematográfico paulista nos anos 1940, 1950 e 1960. Escreveu 95 textos e outras 200 matérias sem assinatura. Condenava as chanchadas cariocas, defendia a importação de bons técnicos e de um cinema de “boa qualidade” produzido nos grandes estúdios. Rejeitava a ação da maioria das pequenas produtoras, vistas como “cogumelos de uma só manhã”. Duarte elege Alberto Cavalcanti, em oposição aos técnicos “improvisados”, aos “aventureiros” e aos “cineastas de arribação”, como o cineasta ideal, aquele que seria capaz de conferir-lhe um padrão universal, respeitado em todo o mundo e, no caso do Brasil, em condições de efetuar a obra cultural e educativa ainda não realizada: “a de elevar o povo ao cinema”, o contrário do que se havia feito até então, isto é, “baixar o cinema ao povo” (CATANI, 2009aCATANI, A. M. A revista de cultura Anhembi (1950-62): um projeto elitista para elevar o nível cultural do Brasil. Maringá: Eduem, 2009a., p. 45).

No berço é que o destino toma conta dos homens? é o título de minha livre-docência, defendida na Faculdade de Educação da USP em 2006. Reuni artigos sobre sociologia da cultura publicados anteriormente em periódicos acadêmicos e em livros. Foram reescritos, revisados, acrescidos de introdução e de conclusão. Nova versão foi publicada em livros no Brasil e na Argentina (CATANI, 2013CATANI, A. M.; AZEVEDO, M. N. Estudos de políticas de educação em uma perspectiva comparada: uma antecipação crítica de Bourdieu e Passeron. In: OLIVEIRA, J.F.; PESSOA, J. M. (Orgs.). Pesquisar com Bourdieu. Goiânia: Cânone Editorial, 2013. p. 134-151., 2016CATANI, A. M. Orígen y destino: pensando la sociología reflexiva de Bourdieu. Buenos Aires: CLACSO, 2016.). Analisei as trajetórias de Vinícius de Moraes, B. J. Duarte, Octavio Ianni, Florestan Fernandes e Pierre Bourdieu, situando-os em seus respectivos campos de produção simbólica. Uma frase do Journal Intime do escritor suíço de expressão francesa Henri-Frédéric Amiel (1821–1881) — “Chaque jour nous laissons une partie de nous-mêmes en chemin” — muito se assemelha ao que Bourdieu escreveu em Esboço de auto-análise: “Nesse esforço para explicar-me e compreender-me, poderei doravante apoiar-me nos cacos de objetivação de mim mesmo que fui deixando pelo caminho, ao longo de minha pesquisa, e tentarei aqui aprofundar e ainda sistematizar” (BOURDIEU, 2005BOURDIEU, P. Esboço de auto-análise. Tradução: Sergio Miceli. São Paulo: Companhia das Letras, 2005., p. 39).

Atualmente desenvolvo investigação financiada pelo CNPq, com bolsa de produtividade em pesquisa: “A apropriação da obra de Pierre Bourdieu no Brasil através de periódicos do campo educacional (2000-2017)”. Examino 10 revistas acadêmicas Qualis A1 na área de Educação, quando da época da submissão do projeto (julho de 2018), a saber: Avaliação, Cadernos CEDES, Cadernos de Pesquisa, Educação e Pesquisa, Educação em Revista, Educar em Revista, Educação & Realidade, Educação & Sociedade, Pro-Posições e Revista Brasileira de Educação.

Concluindo

Não posso oferecer a realidade dos fatos,

mas apenas a sua sombra”

(Stendhal, Vie de Henry Brulard)

Ter contato com os escritos de Bourdieu quando ainda era jovem fez com que eu encarasse a vida de forma distinta, levando-me a fazer registros e anotações com algum grau de sistematização. Mas me ensinou, também, que escrever nunca é simples, sempre surgem dificuldades nesse proceder (ver, por exemplo, FREIRE; GUIMARÃES, 2000FREIRE, P.; GUIMARÃES, S. Aprendendo com a própria história II. São Paulo: Paz e Terra, 2000., p. 57; COMPAGNON, 2019COMPAGNON, A. A era das cartas. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2019., p. 17).

Bourdieu escrevia e reescrevia exaustivamente seus artigos e livros, exigindo o mesmo de seus colaboradores. Narro um episódio que presenciei na França em outubro de 1975, quando era hóspede de Miceli. Na ocasião, Sergio redigia o artigo que publicaria em ARSS em novembro desse mesmo ano. Bourdieu rabiscava, sugeria, corrigia, revisava o que lhe era entregue. Foram feitas algumas versões desse texto sobre os anatolianos, com telefonemas de Bourdieu quase diários, antes das 8 horas da manhã.

Acrescente-se, ainda, o que Bourdieu escreveu em seu Esboço de auto-análise (2005, p. 93), quando falou de seu “humor borboleta” (à maneira de Fourier), sendo constantemente instigado a novas pesquisas e novos objetos (ver CATANI, 2021CATANI, A. M. Borboleteando na biblioteca. Revista Brasileira de Pesquisa (Auto) Biográfica, v. 6, n. 17, p. 34-46, 2021b. https://doi.org/10.31892/rbpab2525-426X.2021.v6.n17.p34-46
https://doi.org/10.31892/rbpab2525-426X....
).

Escrevi um pequeno livro dedicado à sociologia reflexiva de Bourdieu, examinando brevemente, também, as trajetórias de Florestan Fernandes e Octavio Ianni, como já mencionei. Os dois sociólogos brasileiros, assim como o francês, têm suas origens em berços modestos e lutaram muito para atingir posições acadêmicas de realce no campo simbólico ao qual se dedicaram (CATANI, 2013CATANI, A. M.; AZEVEDO, M. N. Estudos de políticas de educação em uma perspectiva comparada: uma antecipação crítica de Bourdieu e Passeron. In: OLIVEIRA, J.F.; PESSOA, J. M. (Orgs.). Pesquisar com Bourdieu. Goiânia: Cânone Editorial, 2013. p. 134-151., p. 92-93).

Bourdieu era filho de um carteiro e funcionário dos correios, procedente de uma família de parceiros rurais. Sua mãe pertencia à família camponesa prestigiosa, cujo pai foi dono de serraria e transportadora de madeira. Quando se casou, baixou na escala social e econômica, quase sempre enfrentando grandes dificuldades financeiras. “Aluno brilhante, porém sempre considerado ‘problemático’ e ‘indisciplinado’, a partir dos 11 anos foi interno no liceu da capital de sua província e, depois, no Liceu Louis Le Grand (Paris); posteriormente, cursou a École Normale Supérieure (ENS)” (CATANI, 2013CATANI, A. M.; AZEVEDO, M. N. Estudos de políticas de educação em uma perspectiva comparada: uma antecipação crítica de Bourdieu e Passeron. In: OLIVEIRA, J.F.; PESSOA, J. M. (Orgs.). Pesquisar com Bourdieu. Goiânia: Cânone Editorial, 2013. p. 134-151., p. 95; DORTIER, 2002DORTIER, J. F. Les idées pures n’existent pas. Sciences Humaines, numéro spécial: Pierre Bourdieu, Paris, p. 3-8, 2002.). Da pré-adolescência ao final de sua formação, na ENS, Bourdieu foi bolsista do governo.

Miceli (1999, p. A5)MICELI, S. A condição do trabalho intelectual (comentários). In: CATANI, A. M.; MARTINEZ, P. H. (Orgs). Sete ensaios sobre o Collège de France. São Paulo: Cortez, 1999. p. 115-119. lembra que Bourdieu sempre reiterou ao longo de sua obra os ganhos heurísticos dessa experiência cruzada entre o “desenraizamento de um universo familiar” e a “familiarização com um universo estrangeiro”. Dortier (2002, p. 4-6) fala das dolorosas experiências no Liceu e na ENS do provinciano “de esquerda e desajeitado”, num mundo que não era o seu, composto por jovens burgueses, brilhantes e falantes; destaca o forte sotaque e as dificuldades iniciais “no manejo das palavras”. Em algumas páginas de Esboço de auto-análise, escrito entre outubro e dezembro de 2001, quando estava hospitalizado, na fase terminal de sua doença, bem como no artigo “Eu tinha 15 anos: Pierre por Bourdieu” (2002), pode-se ler sobre as mais de 300 advertências que recebeu quando era interno, as dificuldades de diálogo com os pais (que o consideravam privilegiado, pois pouco puderam estudar), as artimanhas para enfrentar os rigorosos invernos nos alojamentos etc. Duas citações indicam como Bourdieu vivenciou essa experiência:

“Para dar uma ideia poderia, invocando Goffmam de ‘Asilos: estudo sobre a condição social de doentes mentais e outros reclusos’, rememorar que o internato não é separado, na série das ‘instituições totais’, de instâncias como a prisão ou o hospital psiquiátrico ou, mais próximo, da colônia penitenciária tal como evoca Jean Genet em ‘Milagre da rosa’, do que por uma diferença de grau”; e “Vivi minha vida de interno numa espécie de fúria empedernida”.

(BOURDIEU, 2002BOURDIEU, P. Interventions 1961-2001: science sociale et action politique. Marseille: Agone, 2002., p. 46)

Florestan, Ianni e Bourdieu trabalharam incessantemente, permanecendo fieis às suas classes de origem: Ianni deu aulas até as vésperas de sua morte; Florestan, antes de se submeter ao transplante de fígado que o matou, deixou artigos prontos para a Folha de S. Paulo, onde assinava coluna semanal; Bourdieu, como foi dito, escrevia no hospital. Lembrou-me a narrativa do poeta, escritor e político português Manoel Alegre, que foi visitar o escritor Miguel Torga (1907–1995), internado em estado terminal. Ele o encontrou assim:

[..] segurando o caderno e a caneta como quem, no campo de batalha, ferido de morte, não larga as suas armas. Eram já poucas as forças, mas a mão mantinha-se firme na caneta e no caderno. Não queria ser apanhado desprevenido (ou desarmado) se uma vez mais lhe aparecesse aquele primeiro verso, que sempre nos é dado, como se costuma dizer [...] Aquela mão antiga a segurar o caderno e a empunhar a caneta até o fim.

(ALEGRE, 2010ALEGRE, M. O miúdo que pregava pregos numa tábua. 3. ed. Alfragide: Dom Quixote, 2010., p. 85-86)

Mas o que significa permanecer fiel às suas classes de origem? Entendo que se possa buscar a resposta nos respectivos itinerários de pesquisa, uma vez que Florestan, Ianni e Bourdieu sempre procuraram investigar as causas das grandes exclusões presentes nas sociedades capitalistas contemporâneas, os excluídos, os marginais, o proletariado e a ação das elites — estas, procurando manter o status quo.

Para compreender o pensamento e o método de trabalho bourdieusianos há que se recorrer, ao menos, a um grupo de interlocutores com os quais dialogou ao longo do processo de constituição de sua forma de pensar. São eles: Gaston Bachelard, Georges Canguilhem, Émile Durkheim, Norbert Elias, Michel Foucault, Erving Goffman, Martin Heidegger, Claude Lévi-Strauss, Karl Marx, Marcel Mauss, Maurice Merleau-Ponty, Jean-Paul Sartre, Max Weber, Ludwig Wittgenstein (CATANI et al., 2017CATANI, A. M. Abrindo a caixa de ferramentas. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017f, p.15-17., p. 17). Outros ainda podem ser lembrados, como Blaise Pascal, Noam Chomsky, Ferdinand de Saussure, John Langshaw Austin,

Maria Alice Nogueira, Ana Paula Hey, Cristina Medeiros e eu entendíamos seu trabalho científico como sendo o de “fornecer instrumentos de construção da análise sociológica que não se constituam em meros conceitos descritivos, mas que envolvam uma epistemologia prática” (CATANI et al., 2017CATANI, A. M. Actes de la Recherche en Sciences Sociales. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (Orgs.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica, 2017d. p. 25-26., p. 15). Ele lembrou, em sua aula inaugural no Collège de France, que todas as propriedades que essa ciência enuncia podem e devem ser aplicadas ao sujeito que faz a ciência (BOURDIEU, 1988BOURDIEU, P. Lições da aula. São Paulo: Ática, 1988., p. 4). No seu compreender, “a crítica epistemológica não se dá sem uma crítica social” (BOURDIEU, 1988BOURDIEU, P. Lições da aula. São Paulo: Ática, 1988., p. 7). Ele erigiu uma maneira de fazer ciência por meio de “análises concretas de situações concretas” (CATANI, 2013CATANI, A. M.; AZEVEDO, M. N. Estudos de políticas de educação em uma perspectiva comparada: uma antecipação crítica de Bourdieu e Passeron. In: OLIVEIRA, J.F.; PESSOA, J. M. (Orgs.). Pesquisar com Bourdieu. Goiânia: Cânone Editorial, 2013. p. 134-151., p. 102; HEY; CATANI, 2013CATANI, A. M.; AZEVEDO, M. N. Estudos de políticas de educação em uma perspectiva comparada: uma antecipação crítica de Bourdieu e Passeron. In: OLIVEIRA, J.F.; PESSOA, J. M. (Orgs.). Pesquisar com Bourdieu. Goiânia: Cânone Editorial, 2013. p. 134-151., p. 51).

Ler Bourdieu nos dias atuais continua sendo indispensável, pois ele se propôs a “desnaturalizar os mecanismos instituídos de ocultação das relações que levam às divisões sociais”, além de explorar diversos campos sociais (artístico, científico, cultural, do poder, econômico, esportivo, filosófico, intelectual, jurídico, literário, político, religioso, universitário…), “demonstrando em detalhes a lógica própria da gênese de certas relações e das lutas simbólicas para sua instituição”. Tal proceder constitui-se em abordagem vigorosa e também possível de “servir como parâmetro para construções analíticas consistentes da configuração do mundo social atual” (HEY; CATANI, 2018HEY, A. P.; CATANI, A. M. O Vocabulário do mestre – entrevista sobre a recepção de Bourdieu no Brasil. Sociologia, São Paulo, p. 44-46, 2018., p. 44).

Em suma, sua teoria social implica certa forma de engajamento com a ciência, com o saber científico acumulado e com as tomadas de posição relativas ao seu uso como desvelador de formas arbitrárias de dominação.

Gostaria de concluir com algumas palavras de José Saramago, que muito tem a ver com o que escrevi até o momento: “Lembrei-me daquela história de Italo Calvino, em que os generais ocupam a biblioteca nacional com a missão de expurgar obras não patrióticas e de tanto estudar os livros para decidir se são patrióticos ou não, acabam rendendo-se ao pensamento crítico” (SANTOS, 2010SANTOS, J. R. A última entrevista de José Saramago. Rio de Janeiro: Usina de Letras, 2010., p. 19).

Dedicatória

Para meu amigo Manoel Cesário Simões (1953-2022), que sempre achou engraçado as coisas que eu escrevi.

Referências

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Filmes

  • LABYRINTH. Direção: Jim Henson. Companhias produtoras: Henson Associates, Inc. Lucasfilm, Los Angeles, Califórnia, USA, 1986 (101 min).
  • LA SOCIOLOGIE est un sport de combat (A Sociologia é um esporte de combate). Direção e roteiro: Pierre Carles, Paris, França: CP Productions et VF Films, 2001 (146 min).
Editora de Seção: Débora Mazza

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    05 Out 2022
  • Aceito
    25 Out 2022
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