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FLORESTAN NA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE (1987-1988): PROPOSTAS E PENSAMENTO EDUCACIONAL

FLORESTAN AT THE NATIONAL CONSTITUENT ASSEMBLY (1987-1988): EDUCATIONAL PROPOSALS AND THINKING

FLORESTAN EN LA ASAMBLEA NACIONAL CONSTITUYENTE (1987-1988): PROPUESTAS Y PENSAMIENTO EDUCACIONAL

RESUMO

O presente artigo visa analisar a participação de Florestan Fernandes na Assembleia Nacional Constituinte (1987-1988), especialmente no que tange a suas propostas e seu pensamento educacional. Adotamos três conceitos centrais na obra de Florestan desde o final dos anos 1950: 1) a evolução do pensamento educacional de Florestan; 2) a educação pública em um país de capitalismo dependente; e 3) a defesa da verba pública somente para a escola pública. Concluímos que Florestan participa ativamente do processo de construção da nova Constituição, sobretudo com suas propostas educacionais. Inicialmente, o sociólogo se demonstra esperançoso, graças ao momento de efervescência política, mas, ao findar o processo, tece críticas a ele, pois avalia que a Constituição de 1988 resultou em uma forma de “ditadura institucionalizada”, estabelecida com o amplo poder do chamado centrão, o grande bloco de partidos brasileiros de centro-direita.

Palavras-chave
Educação; Florestan Fernandes; Assembleia Nacional Constituinte de 1987-1988

ABSTRACT

This article aims to analyze the participation of Florestan Fernandes in the National Constituent Assembly (1987-1988), especially with regard to his educational proposals and educational thinking. We have adopted three central concepts in Florestan’s work since the late 1950’s: 1) the evolution of Florestan’s educational thought; 2) public education in a country of dependent capitalism; and 3) the defense of public funding only for public schools. We conclude that Florestan participates actively in the construction process of the new Constitution, notably with his educational proposals. Initially, the sociologist is hopeful due to the moment of political effervescence, but, when the process ends, he criticizes its results, for he evaluates that, unfortunately, the 1988 Constitution was brought about in a form of “institutionalized dictatorship”, supported by the broad power of the so-called centrão, the big bloc of Brazilian center-right parties.

Keywords
Education; Florestan Fernandes; 1987-1988 National Constituent Assembly

RESUMEN

Este artículo tiene como objetivo analizar la participación de Florestan Fernandes en la Asamblea Nacional Constituyente (1987-1988), especialmente en lo que respecta a sus propuestas educacionales y su pensamiento educacional. Hemos adoptado tres conceptos centrales en la obra de Florestan desde finales de la década de 1950: 1) la evolución del pensamiento educativo de Florestan; 2) la educación pública en un país de capitalismo dependiente; y 3) la defensa de la financiación pública sólo para las escuelas públicas. Concluimos que Florestan participa activamente en el proceso de construcción de la nueva Constitución, sobre todo con sus propuestas educativas. Inicialmente, el sociólogo se ve esperanzado por el momento de efervescencia política, pero, cuando termina el proceso, lo critica, ya que evalúa que, lamentablemente, la Constitución de 1988 dio lugar a una forma de “dictadura institucionalizada”, habiendo contado con el amplio poder del llamado centrão, el gran bloque de partidos brasileños de centroderecha.

Palabras-clave
Educación; Florestan Fernandes; Asamblea Nacional Constituyente de 1987-1988

Introdução

A educação é o principal dilema histórico do Brasil, afirma Florestan Fernandes (1989)FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Cortez, 1989.. O autor lança tal consideração pelo fato de ter vivido intensamente a luta pelas melhorias da escola pública no país. Ele mesmo comenta que sua relação com a temática e seus dilemas se iniciou na década de 1940, quando pesquisou sobre o folclore em São Paulo, trabalho que visava compreender a “[...] formação e a função do dinamismo autônomo de socialização das crianças” (FERNANDES, 1995FERNANDES, F. Tensões na educação. São Paulo: Sarahletras, 1995., p. 5). No final da década de 1950, dedicou-se veementemente à Campanha em Defesa da Escola Pública (CDEP) – momento em que lutou contra as investidas de representantes das escolas privadas (leigas e confessionais) e de setores da Igreja Católica, encabeçados pelo deputado Carlos Lacerda (União Democrática Nacional – UDN), que se colocavam politicamente a favor, sobretudo, de que a verba pública fosse destinada também ao setor privado. Mais tarde, na década de 1980, prosseguiu em sua defesa da destinação de recursos públicos exclusivamente para escolas públicas, como deputado federal pelo Partido dos Trabalhadores (PT), nos debates na construção da Constituição de 1988 e, por fim, nos diálogos e discussões a respeito da Lei de Diretrizes de Bases da Educação Nacional (FERNANDES, 1976FERNANDES, F. A sociologia numa era de revolução. São Paulo: Zahar, 1976.).

O incansável militante, ao analisar sua atuação nos períodos de 1940 a 1960 e de 1980 a 1990, comenta que suas experiências como parlamentar lhe mostraram que o empenho pela estagnação das condições da educação brasileira está ligado diretamente aos interesses das elites conservadoras e de suas representações políticas. Embora adotem um discurso carregado de pensamentos democratizantes (e cheio de ideias iluministas), esses sujeitos utilizam-se de seu poder de manipulação para viabilizar seus negócios, com a simplória argumentação de que suas ações favoreceriam o desenvolvimento econômico e, consequentemente, trariam melhorias à educação (FERNANDES, 1995FERNANDES, F. Tensões na educação. São Paulo: Sarahletras, 1995.).

Para Florestan, esses grupos sempre trabalham para manter seus privilégios como classe dominante e, por essa razão, historicamente se mobilizam ora dentro dos limites de atuação do Estado, ora de modo violento, a depender da conjuntura (FERNANDES, 1989FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Cortez, 1989.). Isso ocorreu em diversos momentos na história brasileira, por exemplo, no golpe de abril de 1964, quando a burguesia nativa1 1 Florestan chama a burguesia brasileira de “burguesia nativa” pelo fato de o grupo historicamente não ter tido – assim como as burguesias dos países representantes do capitalismo central não tiveram – a intenção política de fomentar o desenvolvimento estrutural de posicionamento nacionalista, focando na formação de uma nação soberana (FERNANDES, 2005). Logo, a “burguesia nativa” não poderia receber o nome de “burguesia nacional” ou “burguesia brasileira”, pois seus intentos não correspondiam a tal postura e, pelo contrário, estavam sob direcionamento cultural, político e econômico de projetos imperialistas. e o imperialismo coordenaram de forma truculenta e impositiva ações para a tomada do poder no país, tal como vinham fazendo em grande parte da América Latina (FERNANDES, 2015FERNANDES, F. Poder e contrapoder na América Latina. 2. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2015.). A educação, nesse processo, era um dos elementos que se fazia presente na agenda e nos interesses desses grupos.

Este artigo visa analisar a participação de Florestan na Assembleia Nacional Constituinte (1987-1988), especialmente no que tange a suas propostas educacionais e a seu pensamento educacional.

Vale ressaltar que Florestan observa o fenômeno educacional como sociólogo (FERNANDES, 1978FERNANDES, F. A condição de sociólogo. São Paulo: Hucitec, 1978.), e não como pedagogo. Embora seu foco não fossem os processos pedagógicos relativos à sala de aula, ele sempre se fez presente nos principais debates, como militante e acadêmico, pensando a educação pública nacional e lutando por ela.

Como salientado por Leher (2018)LEHER, R. Universidade e heteronomia cultural no capitalismo dependente: um estudo a partir de Florestan. Rio de Janeiro: Consequências, 2018., suas experiências de exílio após a instauração da ditadura empresarial-militar em 1964 – principalmente com sua aposentadoria compulsória em 1968, com o aprofundamento de suas leituras de autores marxistas e com o direcionamento das pesquisas nas quais buscou compreender as especificidades da formação do capitalismo brasileiro – são pontos fundamentais para entender a evolução de seu pensamento sobre o dilema educacional brasileiro. Em outras palavras, o autor compreende a educação, a priori, como sociólogo.

Adotamos quatro conceitos centrais na obra de Florestan desde o final dos anos 1950: 1) a evolução do pensamento educacional de Florestan; 2) a educação pública em um país de capitalismo dependente; e 3) a defesa da verba pública somente para a escola pública (LEHER, 2012LEHER, R. Florestan Fernandes e a defesa da educação pública. Educação & Sociedade, Campinas, v. 33, n. 121, p. 1157-1173, out./dez. 2012. https://doi.org/10.1590/S0101-73302012000400013
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).

Esta pesquisa é de natureza bibliográfica e documental. Para Gil (2012)GIL, J. A. Metodologia do trabalho científico. 22. ed. São Paulo: Cortez, 2012., a pesquisa bibliográfica se embasa em materiais já existentes e se constitui, sobretudo, por livros e artigos científicos. Já a pesquisa documental, embora semelhante à bibliográfica, “[...] vale-se de materiais que não recebem ainda um tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com os objetos da pesquisa” (GIL, 2012GIL, J. A. Metodologia do trabalho científico. 22. ed. São Paulo: Cortez, 2012., p. 45).

Como principal fonte bibliográfica, utilizam-se três textos nos quais Florestan abordou o tema da educação: Educação e sociedade no Brasil (1966), O desafio educacional (1989) e Tensões na educação (1995). Os livros de 1989 e 1995 trazem reflexões fundamentais sobre sua participação na Assembleia Nacional Constituinte (ANC), além de um balanço dessa. Como fonte secundária, utilizam-se os textos de Leher (2018)LEHER, R. Universidade e heteronomia cultural no capitalismo dependente: um estudo a partir de Florestan. Rio de Janeiro: Consequências, 2018. e Rodrigues (2022)RODRIGUES, F. DE C. Florestan Fernandes e a educação pública na Assembleia Nacional Constituinte (1987-1988). Pro-posições, Campinas, v. 33, n. 33, p. e20190115, 2022. https://doi.org/10.1590/1980-6248-2019-0115
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, pesquisadores que se debruçaram em estudar sobre o pensamento e a luta educacional de Florestan nos anos 1950 e 1980.

Os documentos selecionados foram retirados do conjunto de textos denominado O processo constituinte, organizado pelo Centro de Documentação e Informação da Câmara dos Deputados, e publicado em 1988. As sessões em que Florestan dissertou sobre educação como deputado federal na ANC de 1987-1988, de acordo com essa documentação, foram sete: 16 de março de 1987 – “A crise permanente da UnB”; 22 de abril de 1987 – “Apoio à educação”; 7 de maio de 1987 – “Tratamento injusto aos professores”; 24 de junho de 1987 – “A Constituinte e o sistema público de ensino”; 14 de julho de 1987 – “A consolidação da pesquisa científica”; 17 de julho de 1987 – “Homenagem à sociedade brasileira para o progresso da ciência”; e 13 de agosto de 1987 – “A reforma educacional”.

Florestan foi um dos importantes personagens desse momento da história recente do Brasil. Representante da classe trabalhadora e dos esquecidos, sua atuação se destacou tanto por sua pessoa como por sua luta ao longo de toda uma trajetória de militância. A raridade desse tipo de intelectual público se reforça não apenas pela participação de Florestan nesse momento decisivo da história brasileira – em que soube aproveitar a abertura histórica e as potencialidades da ANC –, mas também por sua percepção precisa de que a chamada redemocratização não se concretizaria, e muito menos de que as classes proprietárias perderiam o controle dessa transição (NOVAES; OKUMURA, 2020NOVAES, H. T.; OKUMURA, J. H. A tragédia educacional brasileira: diálogos com Florestan. Marília: Lutas Anticapital, 2020.).

Espera-se, assim, que o presente texto possa contribuir para reflexões sobre o pensamento educacional de Florestan e, principalmente, para a formulação de ações conscientes orientadas à resolução dos graves problemas da educação brasileira, oferecendo ao leitor algumas bases para compreendê-los e transformá-los.

A Evolução do Pensamento Educacional de Florestan

Na década de 1940, de acordo com Matui (2001)MATUI, J. Cidadão e professor em Florestan. São Paulo: Cortez, 2001., Florestan pauta-se no pensamento educacional de Fernando de Azevedo em suas reflexões. A base de seu pensamento, conforme aponta o autor, está calcada no positivismo de Émile Durkheim. Matui (2001)MATUI, J. Cidadão e professor em Florestan. São Paulo: Cortez, 2001. observa, porém, que logo Florestan mudará seu posicionamento teórico e se afastará de Fernando de Azevedo. Na década de 1950, percebendo que o aluno não é um ser passivo ao receber a cultura no ambiente escolar, Florestan, mesmo declarando-se marxista, pauta-se na sociologia de Karl Mannheim para compreender o fenômeno e participar da CDEP, na qual propõe ideias como militante (FERNANDES, 1966FERNANDES, F. Educação e sociedade no Brasil. São Paulo: Dominus, 1966.).

Nesse período, Florestan defendia haver uma estreita relação entre a ampliação do acesso à escola e o desenvolvimento da democracia (FERNANDES, 1966FERNANDES, F. Educação e sociedade no Brasil. São Paulo: Dominus, 1966.). Para ele, não havia como uma civilização moderna tomar rumos para o progresso tecnológico, científico e da própria democracia sem a presença massiva da escola pública e sem a oferta de condições para que os filhos dos trabalhadores permanecessem nesse espaço. A aplicação sistemática da ciência para o desenvolvimento da sociedade democrática, postulada por Mannheim, está presente em vários de seus textos (FERNANDES, 1959FERNANDES, F. A ciência aplicada e a educação como fatores de mudança cultural provocada. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Rio de Janeiro, v. 32, n.75, p.28-78, jul./set., 1959.; 1966FERNANDES, F. Educação e sociedade no Brasil. São Paulo: Dominus, 1966.).

Florestan fala sobre a questão de ser ou não marxista em pelo menos duas oportunidades. Em um artigo no qual analisa cartas que trocou com Florestan ao longo de 30 anos, Barbara Freitag (1996)FREITAG, B. Florestan por ele mesmo. Estudos Avançados, São Paulo, v. 10, n. 26, p. 129-172, jan./abr.1996. https://doi.org/10.1590/S0103-40141996000100015
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deixa claro que havia uma diferença entre o que o sociólogo pensava individualmente e o posicionamento da CDEP. Em uma carta de 29 de janeiro de 1971, Florestan diz que o movimento era composto por:

Um punhado de intelectuais, de estudantes, de líderes sindicais e políticos de esquerda, tentando enfrentar a avalanche da fome católica pelo controle das consciências e dos setores conservadores pela destruição da escola pública independente. Naquela situação, recorri a um equivalente da simulação: os pressupostos ideais do Estado democrático. Uma maneira de fazer a “crítica moral”, que desarma os inimigos e cria aliados, por ser irretorquível. Funda-se nos dados e nas exigências do “sistema”. Se ele existe, logo tem de manter-se e de aperfeiçoar-se. Nesse quadro, no qual imergia como uma putaine respectuese e com dor de cornos (tendo de falar ao público reiteradamente – o que às vezes não consta dos escritos – que aquilo não correspondia aos valores de minha posição pessoal, socialista), o argumento era por essência político e visava fazer aliados

(FERNANDES, 1971 apud FREITAG, 1996FREITAG, B. Florestan por ele mesmo. Estudos Avançados, São Paulo, v. 10, n. 26, p. 129-172, jan./abr.1996. https://doi.org/10.1590/S0103-40141996000100015
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, p. 152, grifos dos autores).

Florestan dialogava com os ideais dos grupos liberais representados por importantes intelectuais, como Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira, Lourenço Filho, Júlio de Mesquita Filho etc. Para ele, como demonstra Freitag (1996)FREITAG, B. Florestan por ele mesmo. Estudos Avançados, São Paulo, v. 10, n. 26, p. 129-172, jan./abr.1996. https://doi.org/10.1590/S0103-40141996000100015
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, nesse movimento não cabiam posições individuais, mas coletivas e, pelo contexto, eram extremamente necessárias alianças políticas para o fortalecimento do grupo.

Outro ponto de destaque é que sua relação com a esquerda vem desde sua graduação na Universidade de São Paulo (USP), quando foi membro do Partido Socialista Revolucionário (a convite de Hermínio Sacchetta) e contribuiu com a tradução de um dos importantes livros de Karl Marx – a saber, Contribuição à crítica da economia política –, no ano de 1946 (CERQUEIRA, 2004CERQUEIRA, L. Florestan: vida e obra. São Paulo: Expressão Popular, 2004.). Já em 1989, quando é publicada a primeira edição de O Desafio Educacional, Florestan comenta no prefácio: “minhas experiências pessoais e a minha lealdade ao socialismo me ensinaram a não acreditar na apregoada ‘fé reformista’, que não passa de um engodo e de um expediente dos que procuram inibir ou calar os adeptos de transformações radicais” (FERNANDES, 2020FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Expressão Popular, 2020., p. 42).

Dialogando com Leher (2018)LEHER, R. Universidade e heteronomia cultural no capitalismo dependente: um estudo a partir de Florestan. Rio de Janeiro: Consequências, 2018., o pensamento educacional de Florestan não teve cisões e rupturas, mas uma evolução que partiu, sobretudo, de suas experiências pessoais; de seus estudos sobre o negro na sociedade de classes (BASTIDE; FERNANDES, 2008BASTIDE, R.; FERNANDES, F. Brancos e negros em São Paulo. São Paulo: Global, 2008.) e sobre a formação do capitalismo no Brasil (FERNANDES, 2005FERNANDES, F. A revolução burguesa no Brasil: ensaios de interpretação sociológica. São Paulo: Globo Livros, 2005.); e de suas análises sobre os governos empresariais e militares na América Latina (FERNANDES, 2010FERNANDES, F. Poder e contrapoder na América Latina. São Paulo: Expressão Popular, 2010.; 2015), para citar algumas de suas obras. Para Leher (2018)LEHER, R. Universidade e heteronomia cultural no capitalismo dependente: um estudo a partir de Florestan. Rio de Janeiro: Consequências, 2018., a visão de Florestan sobre os problemas educacionais brasileiros, a partir de 1980, é expressamente marxista.

O sociólogo lançava mão do conceito de capitalismo dependente (FERNANDES, 1989FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Cortez, 1989.), o qual, conforme Limoeiro-Cardoso, expressa-se pela “[...] forma periférica e dependente do capitalismo monopolista (o que associa inexorável e inextricavelmente as formas ‘nacionais’ e ‘estrangeiras’ do capital financeiro)” (1995, p. 1). Florestan desenvolve esse conceito principalmente no livro Sociedade de classes e subdesenvolvimento, de 1972, e o aprofunda em Revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica, de1975, pesquisas essas que visavam, grosso modo, compreender as especificidades do desenvolvimento do capitalismo brasileiro.

No campo da educação, graças ao direcionamento de suas pesquisas sobre tal problemática e a seus aprofundamentos nas leituras de autores marxistas, sobretudo de Lênin, Florestan depreende que não há possibilidade de avanço na educação brasileira sem que se articulem dois tipos de revolução: a revolução dentro da ordem – ou seja, as conquistas democráticas via Estado – e a contra a ordem – isto é, as mobilizações organizadas por movimentos sociais, sindicatos e partidos políticos, cuja militância tem por objetivo construir outra sociedade, socialista (FERNANDES, 1989FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Cortez, 1989.; 1995FERNANDES, F. Tensões na educação. São Paulo: Sarahletras, 1995.).

Pode-se dizer que o pensamento educacional de Florestan, em todos esses períodos, apresenta singularidades: seus escritos foram produzidos em momentos de militância e suas proposições representaram o pensamento coletivo. Pode-se apontar também que suas reflexões partiram de suas observações e interações como cientista social, não como educador/pedagogo. Há diferenças entre os períodos também: Nos anos 1950 e 1960, suas propostas não possuíam bases claramente marxistas, mas em Mannheim, apesar de Florestan sempre se haver considerado um homem de esquerda (FERNANDES, 1976FERNANDES, F. A sociologia numa era de revolução. São Paulo: Zahar, 1976.; FREITAG, 1996FREITAG, B. Florestan por ele mesmo. Estudos Avançados, São Paulo, v. 10, n. 26, p. 129-172, jan./abr.1996. https://doi.org/10.1590/S0103-40141996000100015
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). A partir da década de 1980, principalmente como político partidário, suas proposições passam a se sustentar mais no pensamento de autores marxistas. É a partir daí que Florestan sistematiza conceitos como o da autoemancipação e o da formação da autoconsciência, por exemplo (FERNANDES, 1989FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Cortez, 1989.). A escola pública passa a ser compreendida por ele como espaço oportuno para que a classe trabalhadora se desenvolva politicamente, a fim de criar condições para o pensar teórico e objetivo (teoria e prática) como classe revolucionária. Quando questionado sobre como seria uma escola que atendesse aos interessas da classe trabalhadora, Florestan respondia que seria aquela que oferecesse “ao trabalhador condições de desenvolvimento intelectual independente” (FERNANDES, 2020FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Expressão Popular, 2020., p. 230).

À altura da ANC de 1987-1988, portanto, o professor e militante histórico das causas educacionais já trazia em seu discurso toda uma bagagem intelectual e prática para contribuir com tão importante momento.

Florestan na Constituinte (1987-1988): Candidatura e Início dos Trabalhos

No rescaldo da ditadura empresarial-militar (1964-1985), era praticamente obrigatória a criação de uma ANC. Florestan foi eleito, em 1986, deputado federal constituinte pelo PT, com mais de 50 mil votos,2 2 Luiz Inácio Lula da Silva, nessa oportunidade, teve 650 mil votos. Ao todo, foram eleitos dezesseis deputados federais constituintes petistas (CERQUEIRA, 2004). em uma campanha na qual suas propostas levavam o conteúdo histórico de sua militância.3 3 A Constituinte de 1987-1988 iniciou-se com as delimitações e as deliberações do regimento interno. Sua estrutura organizativa se fundava em dois pontos: no alinhamento da organização e no direcionamento dos trabalhos. Ou seja, primeiro se definiu como seriam os processos, as etapas, os formatos das propostas, as distribuições de cargos e as funções dos parlamentares, bem como a participação, os instrumentos e os processos para a votação. Em seguida, definiram-se quais seriam os limites da soberania do documento, suas possíveis alterações, seu relacionamento efetivo com o Poder Executivo em geral, e de que forma ele seria compatível com o funcionamento concomitante do Congresso Nacional (NOGUEIRA, 2010). Sua vitória nas urnas representava sua jornada histórica como intelectual que encabeçou manifestações a favor da escola pública, lutou contra a ditadura, sofreu o exílio e não se entregou às imposições do regime.

O debate sobre o desenvolvimento da democracia no país pode ser elencado como uma das temáticas centrais na obra de Florestan e de sua militância, tanto na questão educacional como nas demais pesquisas por ele empreendidas. Observa-se, em seus posicionamentos, mesmo em conjunturas distintas (FERNANDES, 1966FERNANDES, F. Educação e sociedade no Brasil. São Paulo: Dominus, 1966.; 1989FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Cortez, 1989.), a recorrência de temas como a ampliação do atendimento da escola pública (expansão das vagas), sua qualidade, seu caráter laico e a permanência estudantil dos filhos da classe trabalhadora. No prisma sociológico de Florestan, portanto, sempre se fez presente a relação entre a melhoria da escola pública e o desenvolvimento da democracia.

Florestan afirmava ser marxista (FREITAG, 1996FREITAG, B. Florestan por ele mesmo. Estudos Avançados, São Paulo, v. 10, n. 26, p. 129-172, jan./abr.1996. https://doi.org/10.1590/S0103-40141996000100015
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; FERNANDES, 1989FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Cortez, 1989.), contudo, como seu posicionamento nos momentos de luta pela escola pública representava a posição dos movimentos sociais aos quais pertencia, seus textos expressavam os acúmulos oriundos dos debates e das proposições construídos pela coletividade.

Em sua candidatura pelo PT, as propostas para a educação se sintetizavam em dois eixos: 1) a necessidade de verba pública somente para a educação pública; e 2) o acesso e a permanência da classe trabalhadora em uma escola pública de qualidade, como mostram os trechos abaixo:

Dinheiro público para serviços públicos, como a estatização correspondente do sistema escolar, do sistema de saúde, do sistema bancário, do sistema de transporte, do sistema de moradia popular etc.

A igualdade dos cidadãos perante a lei possui um corolário inevitável: a igualdade das oportunidades educacionais. Democracia exige educação das elites e das classes dominantes para aceitar como iguais e como parceiros (no plano do contrato ou no da vida pública) aqueles que lhes são socialmente “inferiores”. Democracia exige também educação das classes trabalhadoras e destituídas, tanto para se verem como “cidadãos”, membros prestantes da nação e do Estado, quanto para serem desiguais, preservarem sua identidade de classe, raça, de etnia ou de “pobres”. [...] o Congresso Constituinte precisará revelar uma capacidade criadora com mil facetas. E essa tarefa complexa é muito difícil nesta transição para o século XXI, na qual só “educar para a liberdade” é para uma “sociedade democrática” falaciosa, no que se confundia educação com dominação cultural e ideológica, escola como equivalente da fábrica, produzindo a cabeça de milhões de dominados e de subalternizados. Hoje, trata-se de educar para que o cidadão conviva e conflite com o trabalhador e, assim, as contradições entre o ser e o vir-a-ser engendrem, historicamente, uma revolução democrática permanente

(FERNANDES, 2006FERNANDES, F. Pensamento e ação: o PT e os rumos do socialismo. São Paulo: Globo Livros, 2006., p. 185).

As demandas educacionais dos anos 1950, advindas principalmente das mobilizações da CDEP em 1959, reaparecem em seu programa político como deputado constituinte, pois, mesmo com o passar das décadas, ainda eram pautas a ser debatidas.

Sendo assim, a destinação da verba pública somente para a educação pública está presente como ponto fundamental, seja em 1959, seja em 1987-1988. Por qual motivo? Pelo fato de que o Brasil não tinha condições estruturais, fosse para atender a toda a população no que tange ao acesso à escola e à permanência estudantil, fosse para transformar essa demanda em espaços para a ampliação do mercado educacional no país. Para Florestan, o primeiro passo concreto seria este: dar ao setor público condições de atender e ofertar oportunidades de permanência na escola à toda a população.

A CDEP, em 1959, também levantou um debate sobre as formas pedagógicas hegemônicas e obsoletas que vinham sendo aplicadas no Brasil, sobre o aprofundamento do mercado educacional, sobre a pesquisa que o período empresarial-militar (1964-1985) instaurou, e, principalmente, sobre o problema histórico da democracia brasileira.

Silva e Santos (2020)SILVA, G.F.; SANTOS, W.S. Florestan Fernandes: defesa da educação pública e reparação racial aos negros na constituinte. Revista HISTEDBR on-line, Campinas (SP), v.20, p.e020040, 2020. https://doi.org/10.20396/rho.v20i0.8660236
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comentam que, na ANC, 53,3% dos deputados pertenciam ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) e 23,8%, ao Partido da Frente Liberal (PFL). Ou seja, de um total de 559 constituintes, 431 representavam o pensamento liberal. Já os partidos progressistas e de esquerda, como o Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido Comunista Brasileiro (PCB), o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e o Partido Socialista Brasileiro (PSB) somavam apenas 5,9% dos assentos. Nesse cenário, o chamado centrão, majoritariamente representando pelo PMDB, tinha a maioria esmagadora dos votos. Para os autores, podem ser atribuídas a esse grupo as impedições de possíveis avanços, mesmo dentro da ordem, na educação pública brasileira.

Como ressaltam Silva e Santos (2020)SILVA, G.F.; SANTOS, W.S. Florestan Fernandes: defesa da educação pública e reparação racial aos negros na constituinte. Revista HISTEDBR on-line, Campinas (SP), v.20, p.e020040, 2020. https://doi.org/10.20396/rho.v20i0.8660236
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, Florestan denunciava a composição política do ANC como uma reprodução da ditadura empresarial-militar, agora com roupagens democráticas (FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988.). A representação política do centrão, em sua leitura, além de impedir importantes avanços no debate democrático, fazia parte das estratégias da burguesia nativa para promover a tal “transição lenta, gradual e segura”, preconizada pelo regime militar.

A divisão dos grupos de trabalho da ANC foi pensada da seguinte forma: haveria oito comissões temáticas e uma comissão de sistematização. As oito primeiras seriam subdivididas em 24 comissões, que se responsabilizariam pela condução dos debates e pelo registro do processo de elaboração da Constituição. Florestan participou das subcomissões de educação da família, educação, cultura e esportes.

Essa sistematização do rito4 4 “[...] que a nova Carta Constitucional consagre os princípios de direito de todos os cidadãos brasileiros à educação, em todos os graus de ensino, e o dever do Estado em promover os meios para garanti-la. Ao mesmo tempo, se comprometem a lutar pela efetivação destes princípios, organizando-se nas suas entidades, exigindo compromissos dos candidatos às Constituintes a nível federal e estadual e cobrando o cumprimento das medidas propostas para a democratização da educação” (CARTA DE GOIÂNIA, 1986). e dos processos de trabalho, apesar das contradições relacionadas aos diversos interesses políticos, foi fundamental para que todas as representações participassem efetivamente e, sobretudo, para que demandas políticas específicas vindas dos partidos fossem contempladas nas mesas temáticas.

Braga (2020)BRAGA, L.C. A luta em defesa da educação pública no Brasil (1980-1996): obstáculos, dilemas e lições à luz da história. Marília: Lutas Anticapital, 2020., embasada na leitura dos diários publicados com as falas dos deputados federais constituintes, aponta que os principais opositores do pensamento educacional de Florestan, semelhante à experiência da CDEP, eram os representantes das escolas privadas e confessionais. A autora afirma que houve um momento em que esses representantes chegaram a passar por cima das regras e marcar conversas, no ambiente controlado dos gabinetes dos deputados, possivelmente para tentar fazer acordos que correspondessem aos seus interesses.

Outro fato apontado por Braga (2020)BRAGA, L.C. A luta em defesa da educação pública no Brasil (1980-1996): obstáculos, dilemas e lições à luz da história. Marília: Lutas Anticapital, 2020. sobre esse enfretamento político foi o de que não houve possibilidade de aglutinar os representantes de escolas privadas e confessionais e os defensores da escola pública em torno de pautas comuns, como a das condições de trabalho dos professores e de seus salários. Os dois grupos não conseguiram chegar a um acordo, graças a suas propostas e seus interesses políticos divergentes. Esse desdobramento trouxe dificuldades para que houvesse conquistas ao redor de temas que diziam respeito a todos os professores como classe profissional.

Assim, iniciou-se uma jornada que levaria mais de um ano e envolveria muitas lutas para a tomada de espaços políticos na nova Carta Magna, a qual, por sua vez, regeria esse novo momento, em que o país ultrapassava 21 anos de ditadura e vislumbrava a possibilidade de recomeçar e reconstruir-se sobre bases legais democráticas.

A Educação Pública em um País de Capitalismo Dependente

A educação no Brasil é, historicamente, um instrumento de exclusão e legitimação do status quo. Para Florestan, “[...] o principal dilema com que se defronta a Assembleia Nacional Constituinte de 1987-1988 é o da educação” (1988, p. 32). Segundo ele, os privilegiados monopolizam as oportunidades escolares e dominam a cultura. Por essa razão, a questão educacional é, a priori, uma questão política.

Florestan destaca que o aprofundamento da dependência econômica brasileira – ocorrido após o golpe de abril de 1964 e fruto das relações de dominação impostas pelo imperialismo norte-americano – havia deixado ainda mais frágil a situação de dependência econômica, política e cultural dos países da periferia do capital (FERNANDES, 1989FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Cortez, 1989.). De acordo com Bevins (2022)BEVINS, V. O método Jacata: a cruzada anticomunistra e o programa de assassinato em massa que moldou o nosso mundo. São Paulo: Autonomia Literária, 2022., havia um projeto de dominação cultural em curso desde o início da Guerra Fria, orquestrado pelos Estados Unidos em ao menos 23 países do Sul global. O Brasil, além de ser um deles, teria sido um grande parceiro nessa empreitada genocida. Um dos aspectos dessa dominação, sem dúvida, era o da educação (ARAPIRACA, 1979ARAPIRACA, J. O. A USAID e a educação brasileira: um estudo a partir de uma abordagem crítica da teoria do capital humano. 1979. 273 p. Dissertação (Mestrado em Educação) – Instituto de Estudos Avançados em Educação, Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, 1979.).

Para Florestan, a necessidade de romper com a dominação cultural imperialista imposta por meio da dominação econômica dos países do centro do capital era uma das principais problemáticas presentes na educação (FERNANDES, 1966FERNANDES, F. Educação e sociedade no Brasil. São Paulo: Dominus, 1966.). Ele considerava que a dominação cultural produzia no Brasil, entre outros dilemas, um atraso cultural e uma educação dependente, pois seria impossível a um país de capitalismo dependente ter uma educação independente (FERNANDES, 2020FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Expressão Popular, 2020.). No pensamento de Florestan, portanto, a formação do cidadão – tido, grosso modo, como um sujeito que possui plena capacidade de inserir-se no contexto econômico, produtivo e político em um Estado democrático e republicano – estava no cerne da questão educacional.

Para Leher (2018)LEHER, R. Universidade e heteronomia cultural no capitalismo dependente: um estudo a partir de Florestan. Rio de Janeiro: Consequências, 2018., fica clara a presença do pensamento marxista em Florestan, principalmente quando se considera sua formulação do conceito de capitalismo dependente (FERNANDES, 1989FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Cortez, 1989.) e seu posicionamento como político partidário (FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988.). Em uma breve análise, Florestan atribuiria os problemas educacionais do Brasil não só à presença de resquícios da sociedade colonial escravista, mas também à própria característica social, econômica, cultural e política de um país dirigido por uma elite associada ao imperialismo. Seriam, portanto, problemas atrelados à própria formação do capitalismo brasileiro e a seus desdobramentos históricos. Ou seja, os dilemas educacionais nacionais seriam fruto de políticas que decorrem da própria lógica do modo de produção capitalista mediado pelo Estado burguês. No caso do Brasil, como parte dos países da periferia do capital, tais dilemas se somariam ainda ao caráter dependente e subdesenvolvido de sua economia, e a uma estrutura sistêmica e pedagógica que abarca, tão somente, a formação do trabalhador para atender aos ditames econômicos pensados e impostos pela burguesia nativa, sob a égide do imperialismo.

Logo, pode-se apontar que o pensamento educacional de Florestan na década de 1980 – no contexto de conciliação entre diversos grupos progressistas e movimentos sociais, inclusive de educadores – ainda visa à construção do desenvolvimento da democracia via Estado (dentro da ordem), mas adicionado à necessidade da luta dos trabalhadores, como classe revolucionária, contra a ordem – isto é, por meio dos partidos, sindicatos e movimentos sociais – para a consolidação de uma democracia de viés socialista.

Tanto que, na sessão da ANC de 13 de agosto de 1987, Florestan destacou a necessidade de todos os cidadãos terem acesso a uma escola comum, isto é, a um mesmo formato de escola, independentemente da classe social. Em outras palavras, eram necessárias a democratização do acesso à educação – a abertura da escola às massas – e a modificação sistemática do acesso aos conteúdos de modo igualitário, sem discriminação social e econômica.

Sendo uma das características históricas da educação no Brasil a exclusão, pode-se afirmar que a falta de oportunidades iguais não apenas prejudica as questões educacionais como também intensifica a miséria, a fome e as possibilidades da classe trabalhadora e dos oprimidos de tomar consciência de sua própria condição como classe explorada. Com essa lógica de reprodução das desigualdades e das condições subalternas, sem a provocação de avanços democráticos ou de rupturas, o sistema educacional segue como um sistema a serviço dos privilegiados, pensado por privilegiados para privilegiados. Para o deputado Florestan, a função de um sistema escolar que não dê as mínimas condições estruturais de atender à classe trabalhadora tampouco a oportunidade de que ela esteja e permaneça na escola, ainda que em uma democracia, seria formalizar a continuação desse tipo de sociedade, que prega a igualdade em sua essência, mas que, nas condições concretas, ainda está presa a um passado regido por uma lógica escravocrata, disfarçada por um discurso liberal ludibriador.

No quesito da prática pedagógica, é necessário que a escola esteja atrelada a um movimento que vise à independência nacional, política, econômica e cultural; que dê subsídios para que a comunidade escolar se emancipe desses laços excludentes e dominadores; e que crie as bases para o fomento de um cenário que almeje à revolução democrática e educacional permanente. Mesmo sabendo que naquele momento não havia um cenário no Brasil para que a revolução socialista ocorresse, a revolução educacional seria uma das bases para o engendro das demais revoluções (FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988.).

Diante dessa questão, Florestan propôs, como projeto de dispositivo constitucional, o seguinte:

Art. A Educação Escolar é um direito fundamental, universal e inalienável. Todos devem ter oportunidades iguais de acesso à Educação Escolar e a seus frutos, ao desenvolvimento pleno da personalidade humana, à aquisição de aptidões para o trabalho, à formação de uma consciência social crítica e à preparação para a vida em sociedade democrática

(FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988., p. 119).

No artigo proposto, Florestan evidencia que o acesso à educação é um direito de todos. A conquista legal desse direito seria um grande avanço para os de baixo. Além da questão do acesso, o deputado, pensando em garantir melhores condições de permanência estudantil, propôs que as famílias de baixa renda recebessem subsídios (material escolar, transporte, alimentação, assistência pedagógica, médica, odontológica etc.) para conseguir manter seus filhos estudando, desde a pré-escola até a universidade (FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988.).

O analfabetismo, outro ponto problemático enfrentado pela população pobre, também foi contemplado em suas propostas. Florestan comenta que a marginalização cultural, o analfabetismo e a miséria fazem parte dos principais problemas ainda existentes no Brasil e que expressam as reais condições da grande maioria da população diante dos avanços trazidos pela tecnologia, bem como das formas e relações de trabalho moderno e suas necessidades formativas. Superar esses problemas seria, sobretudo, uma forma de os trabalhadores e os pobres alcançarem sua autonomia, podendo enfim compreender seus direitos e ter condições de lutar por eles e por sua emancipação.

As propostas de Florestan na ANC de 1987-1988 são, ao mesmo tempo, exigências ainda presentes, vindas da dramática condição histórica do Brasil. Para ele, se o país não provocasse essas transformações, estaria condenado a reproduzir mais uma vez uma educação desigual em termos tanto de estrutura como de qualidade. Em outras palavras, continuaria existindo no país uma educação restrita a alguns notáveis, ou seja, uma educação para uma elite intelectual pensante e dominadora; e outra, como já mostra a história do país, direcionada a manter os de baixo na condição de subalternos.

Percebe-se que o pensamento, as propostas e os debates levantados por Florestan estão atrelados a um conceito fundamental em sua teoria: o da “revolução dentro da ordem e contra ordem” (FERNANDES, 2005FERNANDES, F. A revolução burguesa no Brasil: ensaios de interpretação sociológica. São Paulo: Globo Livros, 2005.), pois estão calcados em proposições progressistas e socialistas. Nesse ponto, considera-se fundamental esclarecer que, para ele, essas duas revoluções deveriam ocorrer juntas. São duas formas de atuação, mas que deveriam acontecer em conjunto e de modo orgânico e permanente.

O autor compreende que, no processo político vivenciado na construção da Constituição de 1988, havia possíveis brechas que a própria contradição do capital e o reflexo da ditadura produziam dialeticamente. Ainda que com a esperança sobre o processo em baixa, em virtude da representação dos setores conservadores tanto na ANC como no controle da sociedade brasileira, Florestan tinha plena consciência de que a resistência dos partidos de esquerda (ou de centro-esquerda) era importante e poderia frear os intentos advindos da articulação dos grupos opositores.

Também é importante destacar que Florestan não era ingênuo a ponto de acreditar que mudanças legais levariam necessariamente a mudanças profundas na sociedade. Havia em sua compreensão uma refinada leitura sobre o contexto brasileiro. Coutinho (2011)COUTINHO, C. N. Cultura e sociedade no Brasil. 4. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2011. o classifica como um dos autores mais importantes das Ciências Sociais do Brasil no século XX, pois – como Caio Prado Júnior, Sérgio Buarque de Holanda e Gilberto Freyre – Florestan teve a capacidade de elaborar em sua obra certa “imagem do Brasil”, mesmo que não estática. Ianni (1996)IANNI, O. A sociologia de Florestan Fernandes. Estudos Avançados, São Paulo, v. 10, n. 26, p. 25- 33, jan./abr. 1996. https://doi.org/10.1590/S0103-40141996000100006
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evidencia que Florestan, além da importante obra, foi o criador da escola crítica de sociologia no Brasil pelo fato de conceber, sobretudo a partir do final da década de 1960, textos que debatiam a condição do país com a finalidade de expor os dilemas históricos ainda pendentes. Utilizou-se dos direcionamentos de suas pesquisas para explicitar as contradições do país. Assim, é evidente que as conquistas legais seriam importantes, mas que só poderiam ser efetivadas por meio de uma verdadeira pressão social dos de baixo.

Dessa forma, pensando a escola como instituição que atende a grande parte da população, Florestan, por meio de um projeto de lei, propôs o seguinte:

Art. A escola é uma unidade básica do Sistema de Educação Brasileiro e a sala de aula um ponto de partida e o ponto terminal do ensino como atividade pedagógica. Nelas todos são agentes e todos possuem papeis ativos na experimentação pedagógica, como processo recíproco de transformação do educador e do educando. Cabe à escola e à sala de aula papéis dinâmicos e específicos: a vinculação de algumas formas de trabalho manual, de atividades recreativas e de práticas esportivas ao ensino, como condição de amadurecimento concomitante das potencialidades perceptivas e cognitivas do aluno como fato de incremento dos laços de camaradagem e de solidariedade humana; a associação dos vários tipos de conhecimento, do folclore, às artes, às ciências e às filosofias como base de elaboração de um horizonte intelectual equilibrado; a formação da consciência social democrática do cidadão e a construção de uma cultura cívica civilizada; a identificação, a crítica objetiva e o combate aos preconceitos sociais contra os indígenas, o negro, os brasileiros estigmatizados por serem oriundos de regiões rústicas ou subdesenvolvidas, os pobres, os favelados, os portadores de deficiências físicas ou mentais, as mulheres, os idosos, os filhos ilegítimos e os menores abandonados, os transexuais etc.; a inculcação do repúdio às práticas discriminatórias correspondentes, abertas ou encobertas; o estudo e a explicação da história real ou verdadeira do Brasil, com a explicitação dos crivos ideológicos que fomentaram uma consciência falsa da formação e do desenvolvimento da sociedade brasileira, com a exaltação do homem branco e das classes dominantes e o menosprezo do indígena, do negro e do branco ou mestiço pobres; a difusão do conhecimento dos povos do Terceiro Mundo e em particular da América Latina; a compreensão do papel da luta de classes na transformação da sociedade moderna e na conquista da autonomia do Brasil em todas as esferas da organização da economia da sociedade e da cultura

(FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988., p. 122).

A proposta ressalta o ambiente escolar e a sala de aula como as principais fontes geradoras de relações democráticas, de formação da coletividade e da fraternidade entre indivíduos e grupos. Esses espaços, na visão do autor, com base na atuação intencional pedagógica, na cultura e na consciência democrática desempenhariam um papel crucial na formação dos cidadãos. Nessa atuação, por exemplo, as formas de discriminação e pensamento individualista seriam extenuadas pelas relações igualitárias provocadas pelas experiências democráticas. Paralelamente, Florestan incluiu em seu projeto a necessidade de o povo brasileiro compreender sua realidade por meio dos fatos passados por seus antecessores. Assim, a tomada de consciência por parte da classe trabalhadora seria possibilitada pelo entendimento das contradições do modo de produção capitalista e pela observação de suas próprias histórias e relações objetivas cotidianas.

Okumura, analisando a proposta de Florestan em relação a seu pensamento educacional na década de 1980, comenta que:

As proposições citadas acima são reflexos de seu pensamento sobre o papel da escola pública nos anos 1980. Diferente da ideia de ser somente um espaço que promova a formação democrática do cidadão crítico e participativo, a escola teria que ser um local onde a classe trabalhadora pudesse tomar a direção do seu saber, conduzisse e produzisse suas práticas e conteúdos educacionais, e alcançasse sua autoemancipação pela consciência de classe revolucionária

(2019, p. 132-133).

Com o intuito de viabilizar a autonomia administrativa da escola, Florestan propôs ainda a criação dos Conselhos Escolares:

Art. Ficam criados os Conselhos Escolares, que funcionarão como órgão de assessoria e como elementos de ligação entre a comunidade escolar, a administração da escola e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Educacional. Em sua composição deverão estar representantes, paritariamente, os professores, os alunos, os funcionários e/ou os representantes da Associação de Pais. Suas composição e atribuição deverão ser reguladas pela Lei e Diretrizes de Bases da Educação Nacional

(FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988., p. 123).

Todas as representações são citadas em seu projeto de lei para que houvesse a possibilidade de uma tomada de decisões democrática no âmbito da administração escolar. A participação efetiva de profissionais da educação, de alunos e de pais (comunidade escolar) estava balizada com os mesmos peso e poder de deliberação. Em complemento a essa proposta, Florestan incluiu a necessidade de os representantes da escola serem eleitos pela comunidade:

Art. Os diretores e vice-diretores, os reitores e os vice-reitores das escolas ou dos estabelecimentos de ensino de todos os níveis e graus são eleitos pela comunidade escolar, entre candidatos selecionados e indicados pelos Conselhos Escolares.

Parágrafo único. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional garantirá os direitos dos diretores e supervisores efetivos e da escolha dos já concursados e regulará o provimento dessas funções através de eleições (FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988.).

A proposta compunha mais um mecanismo “dentro da ordem” que possibilitaria experiências democráticas à comunidade escolar. Nesse processo, a legitimação da representação do grupo traria ao coletivo fortalecimento político e, em diálogo com seu pensamento educacional, maior viabilidade de transformar o ambiente escolar em um espaço apropriado à classe trabalhadora e regido por ela.

Em consonância com as demandas históricas das lutas empreendidas pelos professores por melhores condições de trabalho na profissão docente, pelo desenvolvimento da ciência e da universidade no Brasil e pela autonomia pedagógica das escolas, Florestan propôs o seguinte:

Art. O Conselho Nacional de Desenvolvimento Educacional indicará, em conformidade com o que for estabelecido pela Lei de Diretrizes de Bases da Educação Nacional: 1º) como se organizarão as diversas categorias de carreiras unificadas no magistério, garantindo a isonomia salarial, a provisão de cargos e funções por concurso público de títulos e provas, salários condignos e condições eficientes de trabalho, aposentadoria com proventos integrais e direitos à sindicalização; 2º) a íntima associação do ensino à pesquisa, especialmente na universidade, de modo a assegurar um padrão mínimo comum de qualidade em todas as instituições, a promover a expansão da pesquisa em todos os campos do saber e através dela conquistar a autonomia cultural, artística e tecnológica do País e contribuir para a melhoria das condições de vida, trabalho e participação política da maioria da população brasileira; 3º) como as comunidades escolares, através das Conselhos Escolares, orientarão a seleção, a produção, a tradução e a edição de livros didáticos, com vistas a resguardar sua qualidade e a consagrar os princípios do pluralismo intelectual.

Parágrafo único. A aposentadoria integral dos professores ocorrerá aos 25 (vinte e cinco) anos de trabalho e a aposentadoria proporcional aos 20 (vinte) anos de trabalho (FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988., p. 123).

Nessa oportunidade, Florestan trata de pontos fundamentais, que representavam sua luta histórica pela educação brasileira: a necessidade de melhores condições de trabalho para a atuação docente tanto em salário quanto em qualificação formativa; a necessidade de a universidade atuar como instituição que não somente forma e faz pesquisas visando à atuação do mercado, mas que tenha tais ações como norte para o desenvolvimento do país, buscando autonomia cultural, artística e tecnológica; e a necessidade de as representações eleitas pelas escolas poderem pensar e escolher os matérias didáticos que comporão suas práticas pedagógicas diante da sua realidade e respeitando o pluralismo de ideias, como condição fundamental para a formação científica e democrática (FERNANDES, 1966FERNANDES, F. Educação e sociedade no Brasil. São Paulo: Dominus, 1966.; 1989; 1995).

Sobre isso, é importante destacar que o sociólogo vivenciou a crescente precarização das condições de trabalho dos docentes. Florestan faleceu em agosto de 1995, portanto não acompanhou todas as políticas educacionais que viriam a ser implementadas no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2003). Entretanto, era possível perceber que elas não iriam solucionar as péssimas condições de trabalho da educação brasileira. Para viabilizar a busca da autonomia nacional por parte das universidades, Florestan propôs em seu projeto o seguinte:

As universidades receberão suas dotações orçamentárias em tempo hábil para projetar seus programas de ensino, pesquisa e expansão, em termos da mais completa autonomia pedagógica, cientifica e técnico-administrativa

(FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988., p. 124).

Como ex-professor da USP – e, por isso, ciente das condições internas da universidade e de suas necessidades –, o autor salientou na proposta que a verba pública destinada à universidade pública seria administrada e aplicada conforme as deliberações e o planejamento efetivados pela própria instituição.

Verba Pública Somente para a Escola Pública

Para Fernandes (2020)FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Expressão Popular, 2020., não há de fato um Estado democrático sem que o acesso e as condições de permanência na escola para todos sejam estabelecidos. Retomando a luta pela escola pública nacional, em mais de uma oportunidade, ele coloca em pauta a necessidade de a verba pública ser destinada à escola pública.

Por motivo do estacamento da expansão da escola pública, não havia motivos razoáveis para que a verba pública se destinasse, como forma de auxílios ou bolsas, às escolas privadas. Na década de 1960 – contexto cujos debates precederiam a construção e a elaboração da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – emergiram argumentos que preconizavam que o cidadão teria o direito de escolher o tipo de escola que seus filhos iriam frequentar. Contra esses argumentos, Florestan afirmava que:

No parecer, com que me honrou o Sr. Relator, vem dito que é necessário manter esse princípio de atribuir recursos públicos a escolas privadas, de uma forma direta ou por bolsas de ensino, para garantir o pluralismo educacional. Ora, o pluralismo educacional não depende da verba pública. Ao contrário, ele exige que, ao lado da escola pública, exista a escola confessional e também a escola que vive de seus lucros, que comercializa o ensino, que transforma o ensino em mercadoria

(FERNANDES, 1989FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Cortez, 1989., p. 20-21).

A nova Constituição deveria canalizar suas forças para deliberar ações, por meio das leis, que contemplassem o setor público, não o contrário. Como representantes do povo, os deputados estavam presentes para pensar embasamentos legais sistematizados em prol da construção da democracia e, certamente, do desenvolvimento da escola pública, no que tange à sua estrutura de atendimento, à sua qualidade e à garantia da permanência dos estudantes da classe trabalhadora, estrutura, qualidade e permanência essas que dependiam da verba pública para efetivar-se (FERNANDES, 1989FERNANDES, F. O desafio educacional. São Paulo: Cortez, 1989.).

A nova Constituição, como principal documento da esfera legal do país, se caminhasse por outras vias, não daria o primeiro passo para resolver o problema educacional histórico do Brasil. Florestan, na sessão da ANC do dia 24 de junho de 1987, ressaltou a importância do tema e se mostrou horrorizado pelos encaminhamentos que a Comissão de Sistematização estava dando ao problema. Ele denunciou a posição dos colegas, dizendo que:

O que está acontecendo não é o pior dos desfechos, mas a notícia que vem num jornal, segundo a qual a exclusividade de recursos públicos para a escola pública teria sido eliminada e ter-se-ia introduzido o tráfico antidemocrático, antirrepública e antieducacional de destinar à escola privada, comercial, mercantil ou confessional uma parte dos recursos públicos, de associar o Estado ao desenvolvimento do sistema público e, ao mesmo tempo, do sistema privado de ensino. Isso representa um golpe moral no crescimento da democracia no Brasil

(FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988., p. 85).

Outra consequência dessa deliberação, de acordo com Florestan, era a de não criar condições para a luta contra o analfabetismo de jovens e adultos e contra a evasão escolar (FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988.). Sem verbas exclusivas para a educação, seria impossível viabilizar o mínimo de desenvolvimento nesse setor. Ele também aproveitou a ocasião para ressaltar que o expressivo crescimento do setor privado escolar se sustentava, em contrapartida, pelo sucateamento e pelo ofuscamento do setor público nas últimas décadas.

Os representantes dos grupos de investidores do mercado educacional e de parte da Igreja Católica estavam atrelados aos interesses das escolas particulares (confessionais e leigas) nesse cenário de disputa pela verba pública. Se essa de fato fosse destinada a essas instituições privadas, para o autor, as possibilidades de construção de uma “revolução educacional e democrática” seria comprometida pela falta de recursos, pois não havia possibilidade de atender às demandas da escola pública brasileira – setor evidentemente deficitário – sem que essa acessasse os recursos de modo integral.

Em vista disso e focando na resolução desse problema, nas propostas que encaminhou aos relatores, Florestan propôs o seguinte:

Art. O ensino privado, leigo ou confessional, é livre em todos os graus no Território Nacional. As entidades privadas de ensino devem dispor de meios próprios de autofinanciamento, submeter-se aos padrões oficiais de organização, qualidade e promoção vigentes no ensino público e observar as modalidades de supervisão e fiscalização fixadas pelos órgãos competentes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. Elas e suas mantenedoras ou proprietárias estão taxativamente excluídas do acesso aos recursos públicos destinados à educação escolarizada e de isenções ou concessões fiscais de qualquer natureza

(FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988., p. 120).

Florestan representava a luta histórica dos defensores da escola pública no Brasil desde a década de 1930. Também coadunava com o acúmulo dos debates que os movimentos sociais de educadores5 5 Os anos 1980 foram um dos momentos mais vibrantes da história do país. Isso, por um lado, levou Florestan a ter certa esperança sobre a abertura histórica do país e as possibilidades de uma ANC popular. Como deputado constituinte, ele logo percebeu um refluxo da ditatura no final dos anos 1970 e no decorrer dos anos 1980. Por outro lado, ele também percebeu que o refluxo foi muito breve e que essa abertura democrática histórica em pouco tempo se fechou ou iria se fechar. As manobras do centrão na Constituinte, a eleição manipulada de Fernando Collor de Mello e a eleição de Fernando Henrique Cardoso rapidamente fecharam o circuito de novo (FERNANDES, 2014), represando a demanda secular do povo por uma educação pública, de qualidade, para todos, que contemplasse todos os níveis de ensino e, principalmente, que fosse emancipatória. (professores, alunos, intelectuais e funcionários) e grupos organizados da educação. Pensando na qualidade da oferta de ensino e na condição dos trabalhadores vinculados ao setor privado e à forma de gestão das escolas privadas, Florestan propôs o seguinte:

Art. O reconhecimento dos estabelecimentos privados de ensino só poderá ser concedido quando os órgãos competentes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios tiverem comprovado sua capacidade material, financeira e pedagógica de atenderem suas funções educacionais e desde que se disponham: 1ª) a garantir aos seus professores padrões salariais equivalentes aos das escolas públicas do mesmo grau, estabilidade no emprego e participação direta dos docentes nas decisões pedagógicas e administrativas essenciais para as atividades educacionais e, quando for o caso, de ensino e extensão; 2ª) a praticar uma gestão democrática dos estabelecimentos, mediante a criação de um conselho deliberativo, do qual participem, paritariamente, os representantes do corpo docente, do alunado e/ou da Associação de Pais

(FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988., p. 120).

Visando à garantia de recursos para a promoção da expansão da escola pública e sua manutenção, e complementando as propostas correlatas à regulamentação da existência da escola privada e de seu funcionamento, Florestan sugeriu ainda que:

A União aplicará nunca menos de 13% (treze por cento) e os estados, o Distrito Federal e os municípios 25% (vinte e cinco por cento), no mínimo, de sua receita tributária global na manutenção e desenvolvimento do ensino público gratuito.

§ 1º. A Lei estabelecerá os mecanismos através dos quais serão fiscalizadas a arrecadação e a aplicação desses recursos e as sanções ou penalidades a que estarão sujeitas as autoridades responsáveis pela inobservância parcial ou total desse preceito constitucional

(FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988., p. 121).

Outra medida projetada por Florestan para corroborar a ampliação progressiva do acesso à escola e os avanços qualitativos dos serviços oferecidos à população estabelecia o seguinte:

Art. A Lei de Diretrizes e Bases estabelecerá medidas que visem eliminar progressivamente a escolarização parcial, precária e de baixa qualidade que prevalece em todos os tipos de escolas no pré-escolar e nos três graus de ensino. Ao mesmo tempo serão tomadas medidas para aumentar a permanência das crianças e dos estudantes nos estabelecimentos de ensino pré-escolar e do Primeiro, Segundo e Terceiro Graus, transformando-se todos os tipos de escola em comunidades existenciais de vida, nas quais a criança, o professor, o estudante e os funcionários convivam oito horas por dia

(FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988., p. 122).

Para Florestan, as propostas elencadas em seu projeto de lei expressavam nada menos que as necessidades reais da dramática realidade nacional (FERNANDES, 1988FERNANDES, F. O processo constituinte. Brasília, DF: Câmara dos Deputados/Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 1988.). Ao mesmo tempo, se aceitas, representariam a esperança inflamada nos corações do povo. A nova Constituição poderia trilhar dois rumos diferentes: ou reproduziria os velhos costumes, excludentes e carregados da histórica indiferença aos oprimidos; ou abriria a possibilidade de construir um país democrático.

Um projeto educacional que possibilitasse a igualdade, a liberdade e a emancipação do povo brasileiro dos fantasmas do passado e das garras da dominação imperialista era o grande desafio posto aos deputados federais constituintes. As transformações sociais não são consequências naturais da história, mas fruto de lutas políticas concretas que impedem ou possibilitam os avanços necessários. Florestan participou desse processo, levando consigo sua consciência e postura emancipadoras à ANC de 1987-1988.

Considerações Finais

Este artigo procurou analisar a contribuição de Florestan à ANC de 1987-1988, expondo o balanço que ele fez sobre as possibilidades e limitações de esse processo fazer o Brasil dar certo, principalmente em função do poder do chamado centrão, bloco de forças conservadoras identificado com os partidos brasileiros de centro-direita.

Pensa-se que pesquisas como esta podem ajudar a compreender melhor um dos momentos mais decisivos da história brasileira, o qual, lamentavelmente, teve um desfecho ruim, no entendimento de Florestan. A nova Carta Magna brasileira, mesmo com suas positividades, reproduziu o caráter autocrático da burguesia nativa, dando continuidade a seu projeto. Ela foi concebida nesse momento histórico sob uma ação contrarrevolucionária, graças à expressiva participação política dos movimentos sociais, que lhe deu roupagens de democracia. Florestan, porém, denominou o resultado dos debates, dos processos e do documento promulgado de ditadura institucionalizada.

Resgatar o pensamento educacional de Florestan e apresentar sua participação nos anos 1980 é fundamental para compreender o período e lutar por uma educação pública de qualidade, em um momento de avanço da extrema direita – que defende a mercantilização da educação e chama os professores de doutrinadores, desviando o foco das questões principais, a saber: a necessidade de melhoria das condições de trabalho na escola pública e a exclusividade da verba pública para a escola pública.

Os anos 1980 foram um dos momentos mais vibrantes da história do país. Isso, por um lado, levou Florestan a ter certa esperança sobre a abertura histórica do país e as possibilidades de uma ANC popular. Como deputado constituinte, ele logo percebeu um refluxo da ditatura no final dos anos 1970 e no decorrer dos anos 1980. Por outro lado, ele também percebeu que o refluxo foi muito breve e que essa abertura democrática histórica em pouco tempo se fechou ou iria se fechar. As manobras do centrão na Constituinte, a eleição manipulada de Fernando Collor de Mello e a eleição de Fernando Henrique Cardoso rapidamente fecharam o circuito de novo (FERNANDES, 2014FERNANDES, F. Circuito fechado. São Paulo: Globo Livros, 2014.), represando a demanda secular do povo por uma educação pública, de qualidade, para todos, que contemplasse todos os níveis de ensino e, principalmente, que fosse emancipatória.

Notas

  • 1
    Florestan chama a burguesia brasileira de “burguesia nativa” pelo fato de o grupo historicamente não ter tido – assim como as burguesias dos países representantes do capitalismo central não tiveram – a intenção política de fomentar o desenvolvimento estrutural de posicionamento nacionalista, focando na formação de uma nação soberana (FERNANDES, 2005FERNANDES, F. A revolução burguesa no Brasil: ensaios de interpretação sociológica. São Paulo: Globo Livros, 2005.). Logo, a “burguesia nativa” não poderia receber o nome de “burguesia nacional” ou “burguesia brasileira”, pois seus intentos não correspondiam a tal postura e, pelo contrário, estavam sob direcionamento cultural, político e econômico de projetos imperialistas.
  • 2
    Luiz Inácio Lula da Silva, nessa oportunidade, teve 650 mil votos. Ao todo, foram eleitos dezesseis deputados federais constituintes petistas (CERQUEIRA, 2004CERQUEIRA, L. Florestan: vida e obra. São Paulo: Expressão Popular, 2004.).
  • 3
    A Constituinte de 1987-1988 iniciou-se com as delimitações e as deliberações do regimento interno. Sua estrutura organizativa se fundava em dois pontos: no alinhamento da organização e no direcionamento dos trabalhos. Ou seja, primeiro se definiu como seriam os processos, as etapas, os formatos das propostas, as distribuições de cargos e as funções dos parlamentares, bem como a participação, os instrumentos e os processos para a votação. Em seguida, definiram-se quais seriam os limites da soberania do documento, suas possíveis alterações, seu relacionamento efetivo com o Poder Executivo em geral, e de que forma ele seria compatível com o funcionamento concomitante do Congresso Nacional (NOGUEIRA, 2010NOGUEIRA, A. M. Assembleia Nacional Constituinte de 1987-88. In: ABREU, A. A. et al. (coords.). Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro – Pós-1930. Rio de Janeiro: CPDOC-FGV, 2010. Disponível em: https://www18.fgv.br//cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/assembleia-nacional-constituinte-de-1987-88. Acesso em: 29 nov. 2022.
    https://www18.fgv.br//cpdoc/acervo/dicio...
    ).
  • 4
    “[...] que a nova Carta Constitucional consagre os princípios de direito de todos os cidadãos brasileiros à educação, em todos os graus de ensino, e o dever do Estado em promover os meios para garanti-la. Ao mesmo tempo, se comprometem a lutar pela efetivação destes princípios, organizando-se nas suas entidades, exigindo compromissos dos candidatos às Constituintes a nível federal e estadual e cobrando o cumprimento das medidas propostas para a democratização da educação” (CARTA DE GOIÂNIA, 1986Pino, I. et.al. Educação e Constituinte: Carta de Goiânia Revisitada. Educação & Sociedade, Campinas,v. 39, nº. 145, p.811-816, out./dez. 2018. https://doi.org/10.1590/ES0101-73302018v39n145ED
    https://doi.org/10.1590/ES0101-73302018v...
    ).
  • 5
    Os anos 1980 foram um dos momentos mais vibrantes da história do país. Isso, por um lado, levou Florestan a ter certa esperança sobre a abertura histórica do país e as possibilidades de uma ANC popular. Como deputado constituinte, ele logo percebeu um refluxo da ditatura no final dos anos 1970 e no decorrer dos anos 1980. Por outro lado, ele também percebeu que o refluxo foi muito breve e que essa abertura democrática histórica em pouco tempo se fechou ou iria se fechar. As manobras do centrão na Constituinte, a eleição manipulada de Fernando Collor de Mello e a eleição de Fernando Henrique Cardoso rapidamente fecharam o circuito de novo (FERNANDES, 2014FERNANDES, F. Circuito fechado. São Paulo: Globo Livros, 2014.), represando a demanda secular do povo por uma educação pública, de qualidade, para todos, que contemplasse todos os níveis de ensino e, principalmente, que fosse emancipatória.

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Editor de seção: Carmen Sylvia V. Moraes. https://orcid.org/0000-0002-3059-2102

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    19 Abr 2021
  • Aceito
    09 Mar 2023
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