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NEOLIBERALISMO, TRABALHO E PANDEMIA: EXPERIÊNCIAS E ENFRENTAMENTOS DE JOVENS DAS PERIFERIAS

NEOLIBERALISM, WORK AND THE PANDEMIC: EXPERIENCES AND WAYS OF COPING AMONG URBAN OUTSKIRTS’ YOUNG PEOPLE

NEOLIBERALISMO, TRABAJO Y PANDEMIA: EXPERIENCIAS Y ENFRENTAMIENTOS DE LA JUVENTUD PERIFÉRICA

RESUMO

Considerando os efeitos das políticas neoliberais na precariedade de direitos, especialmente na educação e no trabalho, a situação pandêmica agravou a falta de proteção social e as diversas formas de insegurança material e incertezas simbólicas enfrentadas pelos jovens em um momento crucial de constituição de aspirações e projetos de futuro, sobretudo entre aqueles pertencentes às camadas populares, mulheres, negros e moradores das periferias. Este artigo apresenta resultados de pesquisa de caráter quantitativo e qualitativo realizada com 208 jovens residentes nas periferias de São Paulo (SP), com foco nos impactos do neoliberalismo e da pandemia em suas trajetórias. Os resultados demonstram os desafios e as múltiplas estratégias coletivas mobilizadas por tais atores.

Palavras-chave:
Jovens; Pandemia de Covid-19; Neoliberalismo; Trabalho; Periferias

ABSTRACT

Considering the effects of neoliberal policies on the precariousness of rights, especially in education and work, the pandemic situation has aggravated the lack of social protection and the various forms of material insecurity and symbolic uncertainties faced by young people at a crucial moment of constitution of aspirations and projects of the future, mainly for those belonging to the popular classes, women, black people, and residents of the urban outskirts. This paper presents the results of a quantitative and qualitative research conducted with 208 young people living in the outskirts of São Paulo (SP), Brazil, focusing on the impacts of neoliberalism and the pandemic on their trajectories. The results demonstrate the challenges and multiple collective strategies mobilized by these actors.

Keywords
Youth; Covid-19 pandemic; Neoliberalism; Work; Outskirts

RESUMEN

Considerando los efectos de las políticas neoliberales sobre la precariedad de los derechos, especialmente en la educación y el trabajo, la situación de pandemia ha agravado la falta de protección social y las diversas formas de inseguridad material e incertidumbres simbólicas que enfrentan los jóvenes en un momento crucial de constitución de aspiraciones y proyectos de futuro, especialmente para aquellos pertenecientes a las clases populares, mujeres, negros y residentes de las periferias. Este artículo presenta los resultados de una investigación cuantitativa y cualitativa realizada con 208 jóvenes residentes en las afueras de São Paulo, centrándose en los impactos del neoliberalismo y la pandemia en sus trayectorias. Los resultados demuestran los desafíos y las múltiples estrategias colectivas movilizadas por esos actores.

Palabras clave
Juventud; Pandemia de covid-19; Neoliberalismo; Trabajo; Periferias

Introdução

A sequência de crises de repercussão global e alcances imprevisíveis ocasionadas seja por abalos financeiros, seja pelo transbordamento de novas doenças de animais para seres humanos, seja ainda por conflitos armados e até mesmo guerras tem novamente levado as ciências sociais a olharem para os Estados nacionais e suas reconfigurações nesse momento de inconteste – e aparentemente irrefreável – globalização. Como afirmou Ulrich Beck (2011)BECK, U. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. São Paulo: 34, 2011., tais riscos globais que ameaçam a vida de todas as pessoas (e todos podem se considerar afetados) levam a novas formas de politização involuntárias, constituindo uma nova maneira de reflexividade sobre o que parece ter se tornado “destino coletivo”.

Em tal situação, agravada sobremaneira pelo recente contexto pandêmico, generaliza-se o sentimento de crise, que deixa de se referir a uma situação passageira e excepcional, tornando-se normal no neoliberalismo (SANTOS, 2020SANTOS, B. S. A cruel pedagogia do vírus. São Paulo: Boitempo, 2020.), e põe em xeque as capacidades de agência e de reflexividade dos atores (GIDDENS, 2003GIDDENS, A. Mundo em descontrole: o que a globalização está fazendo de nós. Rio de Janeiro: Record, 2003.). Para refletir sobre a percepção e a compreensão das condições da própria conduta de jovens brasileiros durante a pandemia, apresentamos neste artigo algumas reflexões sobre formas de organização da juventude, enfatizando o modo como os jovens vivenciaram tal experiência, em meio a transformações nos modelos de desenvolvimento de tipos de solidariedade ainda em curso (DUBET, 2014DUBET, F. La Préférence pour l’inégalité: comprendre la crise des solidarités. Paris: Seuil, 2014.; MARTUCCELLI, 2006MARTUCCELLI, D. Forgé par l’épreuve. L’Individu dans la France contemporaine. Paris: Armand Colin, 2006.).

No Brasil, a aparente condição de imunidade e resistência dos jovens às consequências sanitárias da pandemia do coronavírus rapidamente foi sucedida por um rejuvenescimento dos índices de agravamento, internação e letalidade daqueles apressadamente responsabilizados pela indiferença, irresponsabilidade e disseminação da doença. A renovação da perspectiva negativa e pessimista em relação à juventude não apenas desconsiderou a persistência histórica e a dimensão estrutural das profundas desigualdades do país, como também obliterou o papel dos jovens em assumir riscos para cuidar dos mais velhos e tentar prosseguir com as atividades de “luta pelo próprio futuro”, fossem elas educacionais, fossem laborais (SILVA SOBRINHO; ABRAMO; VILLI, 2022SILVA SOBRINHO, A. L.; ABRAMO, H. W.; VILLI, M. (org.). Jovens e saúde: revelações da pandemia no Brasil 2020-2022. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2022.).

Entre o cuidado de si e o dos próximos, pressionados pelos discursos do hedonismo e conduta de risco e da responsabilização pelo futuro, por serem autores de seus projetos de vida, quais jovens puderam se isolar, deixar de trabalhar ou aderir a práticas de home office, ou ainda acessar o ensino remoto em vez de assumir novas atribuições nas famílias atravessadas por queda de renda, desemprego e também óbitos?

O aumento da evasão escolar (UNICEF, 2021FUNDO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A INFÂNCIA (UNICEF). Cenário da exclusão escolar no Brasil: um alerta sobre os impactos da pandemia da Covid-19 na Educação. Brasília: Unicef, 2021.), as dificuldades de acesso ao ensino remoto e o trabalho em condição de múltiplas precariedades e risco – como aquele de jovens entregadores por aplicativos, os bikeboys (ABÍLIO, 2020ABÍLIO, L. C. Uberização e juventude periférica: desigualdades, autogerenciamento e novas formas de controle do trabalho. Novos Estudos Cebrap, v. 39, n. 3, p. 579-597, 2020. https://doi.org/10.25091/s01013300202000030008
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; OLIVEIRA; CORROCHANO, 2023OLIVEIRA, C. D.; CORROCHANO, M. C. Juventude e trabalho na pandemia de Covid-19: a experiência dos “bike-entregadores” de aplicativos de delivery. Princípios, v. 42, n. 166, p. 113-131, jan./abr. 2023. https://doi.org/10.4322/principios.2675-6609.2023.166.007
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) – não atingiram toda a população juvenil. De fato, pode-se afirmar que a experiência pandêmica não foi idêntica para todas as pessoas, nem para todas as pessoas jovens, dado ter sido atravessada pela intersecção de várias das desigualdades constitutivas da nossa sociedade, como desigualdades de classe social, de gênero, por pertencimentos étnico-raciais, pelas sexualidades, ou ainda em decorrência do local de moradia (COLLINS; BILGE, 2020COLLINS, P. H.; BILGE, S. Intersectionality. Cambridge, Oxford, Boston, Nova York: Polity, 2020.).

Em nova torção discursiva e argumentativa, os jovens foram ora considerados culpados pela disseminação do vírus, ora condenados a fazer parte de uma nova cepa de “geração perdida” ou de “desengajados”, ora as duas coisas ao mesmo tempo, ignorando-se muitas vezes sua capacidade de ação e suas experiências concretas de estudo, lazer, trabalho, sociabilidade e solidariedade vivenciadas no tempo presente.

Diante das tantas perdas e dores vividas nesse contexto, os jovens não ficaram em silêncio; experimentações e conflitos ganharam destaque, contudo tal afirmação não equivale a afirmar que a gravidade do momento vivido naquele contexto possa ser de algum modo compensado, como, por exemplo, ressalta o alerta do Grupo de Pesquisa Cidade e Trabalho (2020)GRUPO DE PESQUISA CIDADE E TRABALHO. (Micro)políticas da vida em tempos de urgência. Dilemas, n. 59, p. 1-13, 2020. Disponível em: https://www.reflexpandemia.org/texto-59. Acesso em: jan. 2021.
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. Nesse sentido, trata-se de apresentar aqui parte dos resultados de uma pesquisa realizada entre 2020 e 2022 em São Paulo (SP) – ao longo da pandemia, portanto –, com o objetivo de corroborar o processo de elaboração de políticas públicas de trabalho para a juventude, políticas sobretudo direcionadas a jovens moradores das periferias com experiências individuais ou coletivas de geração de trabalho e renda.

A investigação ocorreu em distritos localizados nas zonas sul e leste do município de São Paulo marcados por vulnerabilidades na medida em que reúnem localização periférica, uma população majoritariamente com baixa escolaridade, limitado acesso a direitos básicos e elevados índices de violência (KOWARICK; MARQUES, 2011KOWARICK, L.; MARQUES, E. M. São Paulo: novos percursos e atores. São Paulo: 34, 2011.). Todavia, são também espaços onde se observam diversidade de sociabilidades familiares e comunitárias, significativa produção cultural e lutas por direitos de cidadania (TELLES; CABANES, 2006TELLES, V. S.; CABANES, R. (org.). Nas tramas da cidade: trajetórias urbanas e seus territórios. São Paulo: Humanitas, 2006.; SPINK; WILSON; JIMÉNEZ, 2016SPINK, P. K.; WILSON, R. H.; JIMÉNEZ, E. R. Estação de Pesquisa Urbana M’Boi. Working Papers, n. 10, set. 2016. (Documentos de Trabalho.)).

Na sequência desta introdução, o artigo divide-se em cinco partes. Na primeira seção, apresenta-se a metodologia empregada e destacam-se aspectos da pesquisa realizada entre pares e no momento da pandemia. A seguir, em diálogo com achados da investigação, discutem-se as singularidades da juventude brasileira diante dos desafios específicos estabelecidos pelo neoliberalismo nos projetos de futuro e nos modelos de inserção no mercado de trabalho. A terceira parte apresenta os jovens interlocutores do estudo, focalizando especialmente em suas experiências de trabalho. Na quarta parte a ênfase recai sobre a ação dos jovens que trabalhavam por conta própria ou que se organizaram coletivamente para gerar trabalho e renda, no enfrentamento das dificuldades e na atuação solidária com suas famílias, coletivos e territórios. Por fim, o artigo termina com algumas considerações e indicações de desdobramento em outras pesquisas.

Pesquisar Jovens com Jovens e Durante o Isolamento Social

Se a diversidade de situações vividas pelos jovens e as incertezas que marcam seus trajetos têm exigido novos desenhos de pesquisa (FERREIRA, 2017FERREIRA, V. S. Ser DJ não é só soltar o play: a pedagogização de uma nova profissão de sonho. Educação & Realidade, v. 42, n. 2, p. 473-494, 2017. https://doi.org/10.1590/2175-623664318
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), a realização de um estudo durante a pandemia de Covid-19tornou fundamental encontrar outros modos de contato e diálogo com esses sujeitos. Escolheu-se uma pesquisa que também se propôs a envolver e motivar para práticas de investigação jovens pesquisadores nos locais onde o estudo ocorreu. A participação juvenil deu-se desde o planejamento até a execução e a análise dos resultados, seguindo a metodologia de pesquisa entre pares (PHILLIBER, 1999PHILLIBER, S. In search of peer power: a review of research on peer-based interventions for teens. In: BEARMAN, P.; BRUCKNER, H.; BROWN, B.; THEOBARD, S.; PHILLIBER, S. (org.). Peer potential: making the most of how teens influence each other. Washington, D.C.: National Campaign to Prevent Teen Pregnancy, 1999. p. 81-111.).

A primeira etapa do estudo, pouco antes de ser decretada a quarentena em São Paulo, realizou-se por intermédio de um mapeamento participativo, com foco nos atores, ações e relações sociais nos territórios (ESTEVES; PEREIRA; SPINK, 2019ESTEVES, E. G.; PEREIRA, C. S.; SPINK, P. Conexões da Zona Sul: mapeamento participativo de atores, ações e relações solidárias. Athenea Digital, Barcelona, n. 1, v. 19, e2180, fev. 2019.). O diálogo, a circulação por diferentes organizações e coletivos e a participação em um conjunto amplo de atividades marcaram a obtenção de dados iniciais sobre as experiências de jovens e coletivos juvenis engajados em atividades de geração de trabalho e renda. Em um segundo momento, diante do necessário distanciamento social em virtude da pandemia, a pesquisa passou a ser feita de modo remoto.

A participação de jovens como pesquisadores e moradores dos mesmos territórios dos demais interlocutores foi fundamental. Ao longo de toda a investigação, eles examinaram ativamente os caminhos e instrumentos de pesquisa, deram sugestões e contribuíram para os ajustes dos procedimentos definidos inicialmente. Duas situações bastante valorizadas pelos participantes foram a aproximação com jovens de outras “quebradas” e o estabelecimento de relações pessoais após a pesquisa, por meio de redes sociais ou aplicativos de mensagem, tendo como pontos de partida os interesses compartilhados e mapeados durante as entrevistas (CORROCHANO; LACZYNSKI, 2021CORROCHANO, M. C.; LACZYNSKI, P. Coletivos juvenis nas periferias: trabalho e engajamento em tempos de crise. Linhas Críticas, v. 27, p. e36720, 2021. https://doi.org/10.26512/lc.v27.2021.36720
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; CORROCHANO et al., 2021CORROCHANO, M. C.; ROLDAN, A. J. M.; MEDEIROS, K.; VIEIRA, L.; NOGUEIRA, M. E. R.; NEVES, M.; CRUZ, L. Colectiva de jóvenes en Brasil: sobre investigación, acción y aliento en timpos pandémicos. In: ARANCIBIA, M.; CARCAR, F.; FAINSTEIN, C.; MIRANDA, A. (org.). Sobre esquinas y puentes: juventudes urbanas, pobreza persistente y estratégias productivas comunitárias. Ciudad Autônoma de Buenos Aires: Flacso, 2021. p. 201-230.).

Por meio das plataformas de videochamada do Google Meet ou do Zoom, foram realizados um survey com amostra não aleatória e entrevistas com 208 jovens entre 18 e 29 anos que trabalhavam individualmente por conta própria, ou eram o que poderia ser chamado de “empreendedores”, e que trabalhavam em coletivos, cooperativas ou associações, com ou sem formalização jurídica, mas que também geravam algum tipo de trabalho e renda. Todas as chamadas foram antecedidas por contatos telefônicos para identificação de equipamentos e dispositivos disponíveis. Em alguns casos, foi necessária a utilização de aplicativos de troca de mensagem instantânea, como o WhatsApp. Por sugestão dos próprios jovens pesquisadores, o envio de memes ou figurinhas, entre outras estratégias, contribuiu para convidar participantes e estimular a aceitação de fazer parte da investigação.

A pesquisa em ambiente digital já vinha se disseminando como método mesmo antes da Covid-19, contribuindo para a consolidação de novos campos de estudo, mas não sem algumas tensões que também foram vividas em nossa pesquisa (KOZINETS, 2014KOZINETS, R. V. Netnografia: realizando pesquisa etnográfica online. Porto Alegre: Penso, 2014.). A principal delas foi a dificuldade diante das tecnologias virtuais entre alguns jovens, dadas as desigualdades desse acesso e de uso ainda presentes no Brasil, mesmo considerando a sua recente expansão nas periferias, especialmente por meio do telefone celular (CETIC, 2021CENTRO REGIONAL DE ESTUDOS PARA O DESENVOLVIMENTO DA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO (CETIC). Pesquisa sobre o uso das tecnologias de informação e comunicação nos domicílios brasileiros: TIC Domicílios 2020. São Paulo: Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR, Comitê Gestor da Internet do Brasil, 2021. Disponível em: https://cetic.br/media/docs/publicacoes/2/20221121125504/tic_domicilios_2021_livro_eletronico.pdf. Acesso em: 3 fev. 2022.
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). Assim, quando necessário, foram fornecidos chips ou acionadas entidades locais para empréstimo de computador e/ou conexão.

Desemprego e precariedade laboral atingem amplas camadas juvenis em todo o mundo, independentemente dos capitais escolares ou culturais, fenômeno ainda mais acentuado com a crise financeira de 2008. Com base nos dados levantados, discutimos como no contexto brasileiro uma resposta possível à relação entre expectativas de futuro e recompensas palpáveis diante do investimento em formação passa pela emergência de novas culturas do trabalho, em que a precarização pode ser ressignificada pelas possibilidades de autonomia e improvisação abertas pelos mesmos riscos que ameaçam a segurança e a estabilidade da vida juvenil (PAIS, 2016PAIS, J. M. Jovens, trabalho e futuro: dilemas e desafios. In: ROCHA, G. P. N.; GONÇALVES, R. L.; MEDEIROS, P. D. (org.). Juventude(s): novas realidades, novos olhares. Vila Nova de Famalicão: Humus, 2016. p. 19-42.).

A disseminação do termo “brasilianização do Ocidente” permite perceber (BECK, 2000BECK, U. The brave new world of work. Cambridge: Polity Press, 2000.; GUIMARÃES, 2007GUIMARÃES, N. A. La « Brésilianisation » de l’occident? Revue Tiers Monde, v. 1, n. 189, p. 155-174, 2007.) como a cultura do salário e da proteção social nunca foi uma realidade entre nós. Aqui a exclusão nunca é total: ela se combina com inclusões e formas precárias e desumanas de integração e participação. A resposta ao desemprego não é a inclusão no trabalho dito formal – resguardado por direitos –, mas nos trabalhos degradantes, precários, ou iniciativas outras que possibilitam acesso a consumo de mercadorias e serviços (MARTINS, 1997MARTINS, J. S. Exclusão social e a nova desigualdade. São Paulo: Paulus, 1997., 2002MARTINS, J. S. A sociedade vista do abismo: novos estudos sobre exclusão, pobreza e classes sociais. Petrópolis: Vozes, 2002.). Em uma dinâmica contraditória – própria do capitalismo –, os processos excludentes são transitórios e fomentam também reelaborações includentes de formas degradadas, precárias, marginais ou em condições adversas. O problema então passa a ser verificar os modos pelos quais os sujeitos criam respostas às contradições sociais nas quais estão imersos.

Que Juventude e Qual Trabalho na Contemporaneidade?

Os jovens das periferias com os quais tivemos contato nesta pesquisa demonstraram assumir muitas responsabilidades compatíveis com a vida adulta, como é típico da juventude brasileira que tem de trabalhar para poder fruir a própria condição juvenil (ter acesso ao lazer, manter-se estudando etc.) – algo que outros estudos vêm indicando há algum tempo em nosso país (MADEIRA, 1986MADEIRA, F. R. Os jovens e as mudanças estruturais na década de 70: questionando pressupostos e sugerindo pistas. Cadernos de Pesquisa, n. 58, p. 15-48, ago. 1986.; SPOSITO, 2005SPOSITO, M. P. Algumas reflexões e muitas indagações sobre as relações entre juventude e escola no Brasil. In: ABRAMO, H. W.; BRANCO, P. P. M. (org.). Retratos da juventude brasileira: análises de uma pesquisa nacional. São Paulo: Instituto Cidadania, Fundação Perseu Abramo, 2005. p. 87-127.; CORROCHANO, 2012CORROCHANO, M. C. O trabalho e a sua ausência: narrativas juvenis na metrópole. São Paulo: Annablume/Fapesp, 2012.). Muito distante de uma caminhada linear progressiva rumo a um ideal organizado e previsível, a trajetória de vida desses jovens aponta para etapas ainda indefinidas, arriscadas, incertas, demandando reorientações, reinserções, reconversões, recomposições, tornando o presente repleto de inquietudes, ansiedades e medos diante da perspectiva de um longo e contraditório caminho de aprendizagens, reconstruções e instabilidades (PAIS; FERREIRA, 2010PAIS, J. M.; FERREIRA, V. S. (org.). Tempos e transições de vida: Portugal ao espelho da Europa. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2010.).

Em certa medida, é possível perceber suas ações na dimensão econômica como parte de uma postura de assunção de controle das situações de viragem que podem mudar suas vidas. Isso forja identidades flexíveis, plurais, abertas a sucessivas reconfigurações e descontinuidades, tornando os jovens propensos a assumir diferentes frentes de trabalho e de atuação concomitantes, de modo equilibrista.

Se há precarização das condições de trabalho, redução de investimentos de recursos em políticas sociais, repressão a sindicatos, transposição de riscos e eventuais prejuízos privados para contas públicas, grande margem de atuação do setor privado na formulação de normas e leis, além do papel repressivo da polícia e do poder judiciário, que caracterizaram em parte o neoliberalismo, o Estado aparece como instância de extrema relevância na criação do ambiente favorável ao mercado financeiro e de restrição aos direitos dos trabalhadores e de diminuição do bem-estar da população. Trata-se de um projeto, portanto, que, em vez de promover a retirada do Estado, investe na reestruturação de suas funções, mantendo esse Estado forte e ativo, mas voltado para a criação e o estabelecimento do mercado (WACQUANT, 2012WACQUANT, L. Três etapas para uma antropologia histórica do neoliberalismo realmente existente. Caderno CRH, Salvador, v. 25, n. 66, p. 505-518, 2012. https://doi.org/10.1590/S0103-49792012000300008
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).

Entre as interpretações do neoliberalismo, algumas voltam-se para as análises de suas características “essenciais”, como aquelas que focalizam as formas de legitimação de cunho economicista, ou sobre a racionalidade política calcada no mercado e na ampliação da concorrência em diferentes esferas da vida, considerando as instituições, as subjetividades e também a gestão do Estado (BOURDIEU, 1998BOURDIEU, P. Contrafogos: táticas para enfrentar a invasão neoliberal. Rio de Janeiro: J. Zahar, 1998.; FOUCAULT, 2004FOUCAULT, M. Naissance de la biopolitique: cours au collège de France. 1978-1979. Paris: Seuil, Gallimard, 2004.).

Segundo a síntese elaborada por Dardot e Laval (2016)DARDOT, P.; LAVAL, C. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016., o Estado não se apresentaria numa forma mínima, mas de modo empreendedor. Dessa maneira, ao construir o mercado, adotaria as normas econômicas do neoliberalismo para seu próprio funcionamento. Em âmbito global, esse Estado neoliberal competiria com outros, mas internamente conduziria os indivíduos a se perceberem como empresas a serem geridas em busca de valorização. Tal panorama configuraria uma perigosa convergência entre a desresponsabilização do Estado quanto à garantia de direitos e a responsabilização individual rumo à erosão da cidadania e do modelo de democracia liberal (BROWN, 2019BROWN, W. Nas ruínas do neoliberalismo: a ascensão da política antidemocrática no ocidente. São Paulo: Filosófica Politeia, 2019.).

Todavia, os diferentes países – e o seu conjunto populacional com desigualdade no acesso aos direitos – não recebem passivamente as influências nem as disjunções estruturais advindas desse processo (ONG, 2006ONG, A. Neoliberalism as exception: mutations in citizenship and sovereignty. Durham/Londres: Duke University Press, 2006.; WACQUANT, 2012WACQUANT, L. Três etapas para uma antropologia histórica do neoliberalismo realmente existente. Caderno CRH, Salvador, v. 25, n. 66, p. 505-518, 2012. https://doi.org/10.1590/S0103-49792012000300008
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). É preciso considerar os contextos locais e as configurações históricas específicas, fazendo com que “a cultura e a subjetivação neoliberais também se hibridizem com outras culturas, práticas e visões de mundo locais, com arranjos populares singulares” (ANDRADE; CÔRTES; ALMEIDA, 2021ANDRADE, D. P.; CÔRTES, M.; ALMEIDA, S. Neoliberalismo autoritário no Brasil. Caderno CRH, v. 34, e021020, 2021. https://doi.org/10.9771/ccrh.v34i0.44695
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, p. 3).

O contexto latino-americano é historicamente marcado por um modo de constituição dos indivíduos afastado das interpelações institucionais, desenhando um quadro de ação solitária (ou familiar) de enfrentamento dos desafios da vida social, de busca individual por respostas ou soluções à parte ou mesmo contra o Estado. Nesse contexto, questiona-se a impressão de novidade da concepção de emergência de um sujeito neoliberal. Entre nós, a representação dos indivíduos passa mais perto da figura de heróis em resistência e êxito graças ao próprio trabalho e esforço pessoal, dada a fraca institucionalidade dos suportes (MARTUCCELLI, 2010MARTUCCELLI, D. ¿Existen individuos en el Sur? Santiago: LOM Ediciones, 2010.; ARAUJO; MARTUCCELLI, 2014ARAUJO, K.; MARTUCCELLI, D. Beyond institutional individualism: agentic individualism and individuation process in chilean society. Current Sociology, v. 62, n. 1, p. 24-40, jan. 2014. https://doi.org/10.1177/0011392113512496
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).

Essa perspectiva demarca que, antes de se ver como um self-made man, o indivíduo latino-americano se aproxima mais de um indivíduo relacional, dependente da criação, manutenção e jogo de uma teia de relações com os outros. Isso se dá porque os apoios não são encontrados nas instituições; devem ser construídos, reforçados e recriados individualmente. Desse modo, embora o esforço pessoal seja valorizado, ele não condiz totalmente com a tese do empreendedor de si ou da governamentalidade neoliberal, e sim com uma relação com as habilidades e as relações pessoais dos indivíduos com seus grupos de pertença, redes de relações e de suportes (TARÁBOLA, 2016TARÁBOLA, F. S. Aspirantes: desafios de estudantes da USP egressos de escolas públicas no contexto do novo tensionamento político-social brasileiro. Tese (Doutorado em Educação) 424f. – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2016.). Cada um cria seu modelo alternativo de inclusão social para aliviar as insuficiências sistêmicas, preenchendo lacunas e buscando superá-las sozinho ou com apoio de sua rede de relações familiares e pessoais. Não se afirma que práticas ou adesões a certos postulados do neoliberalismo não existam, mas que há contradições e limites nesse processo de inculcação ideológica e formação subjetiva (MARTUCCELLI, 2020MARTUCCELLI, D. Límites y malentendidos del sujeto neoliberal en América Latina. La libertad de pluma. Revista Digital, ano 3, n. 10, p. 1-23, mar. 2020.).

Se tipos de trabalho informais, subcontratados, com baixa remuneração e sem direitos – precários, enfim – não são novidade no Brasil (sobretudo entre jovens, especialmente os moradores das periferias como os participantes da pesquisa aqui relatada), a justaposição dos discursos e das práticas de cunho neoliberal por parte das instituições parece fazer aflorar o sentimento de estar capturado por um sistema inescapável e no qual se devem buscar formas de sobrevivência e resistência, por intermédio mesmo das condições individuais e de suas relações próximas (família, amigos, vizinhos etc.).

No caso da América Latina, as imensas desigualdades que assolam a região foram agravadas no contexto pandêmico (PEREZ; VOMMARO, 2023PEREZ, O. C.; VOMMARO, P. Juventudes latino-americanas: desafios e potencialidades no contexto da pandemia. Civitas: Revista de Ciências Sociais, v. 23, e43706, 2023. https://doi.org/10.15448/1984-7289.2023.1.43706
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), em consonância com uma perspectiva situada em que os problemas que impactam as juventudes estão relacionados às condições específicas das regiões em que vivem. Mas houve também solidariedade de resistência ora nesse sistema, mobilizando as regras do jogo, ora contra ele, como relataram por diversas vezes os jovens participantes da investigação. Parece ser essa a configuração estrutural específica da economia e da cultura que marca a realidade concreta e histórica desse grupo de jovens brasileiros que apresentamos a seguir.

Jovens Interlocutores: Breve Perfil e Experiências de Trabalho

Os interlocutores da pesquisa estão engajados em empreendimentos e coletivos que de diferentes modos resultam em trabalho e renda para seus participantes. Do total de entrevistados, 103 jovens (49,5%) tinham um empreendimento ou negócio próprio, e 105 (50,5%) buscavam gerar trabalho e renda por meio de seus coletivos. Ainda que o campo da cultura seja predominante, reiterando a importância dessa dimensão para as ações coletivas juvenis (ALMEIDA, 2009ALMEIDA, E. Os estudos sobre grupos juvenis: presenças e ausências. In: SPOSITO, M. P. (org.). O estado da arte sobre juventude na pós-graduação brasileira: educação, ciências sociais e serviço social (1999-2006). Belo Horizonte: Argumentum, 2009. p. 121-174.; TOMMASI, 2018TOMMASI, L. Empreendedorismo e ativismo cultural nas periferias brasileiras. H-ermes, v. 1, n. 13, p. 167-196, 2018. https://doi.org/10.1285/i22840753n13p167
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), outras áreas parecem emergir, mobilizando tanto a ação política quanto estratégias de sobrevivência, tais como a produção de moda, de alimentos e refeições, a prestação de serviços estéticos e de beleza, design gráfico e comunicação.

No intervalo etário reconhecido como juventude no país (BRASIL, 2013BRASIL. Presidência da República. Lei nº 12.852, de 5 de agosto de 2013. Institui o Estatuto da Juventude e dispõe sobre os direitos dos jovens, os princípios e diretrizes das políticas públicas de juventude e o Sistema Nacional de Juventude. Brasília: Presidência da República, 2013. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Lei/L12852.htm. Acesso em: 14 abr. 2022.
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), dialogamos com jovens entre 18 e 29 anos. Em tal recorte, o perfil majoritário identificou-se como do gênero feminino (53%), seguido pelo masculino (40,4%) e entre quem se apresenta como não binário (3,6%). Em termos étnico-raciais, houve maior autodeclaração de negros (70%), brancos (27%) e pouca participação de indígenas e amarelos (1,5% cada). Dessa breve síntese, a intersecção indica a presença destacada de jovens mulheres negras, perfazendo 41,7% dos jovens participantes da investigação.

Outro interessante dado que compõe o perfil desse grupo é a autoidentificação como periféricos e periféricas, indicativo já apreendido em outras investigações com concentração de populações marginalizadas econômica, racial e socialmente (D’ANDREA, 2020D’ANDREA, T. Contribuições para a definição dos conceitos periferia e sujeitas e sujeitos periféricos. Novos Estudos Cebrap, v. 39, n. 1, p. 19-36, 2020. https://doi.org/10.25091/s01013300202000010005
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; NASCIMENTO, 2011NASCIMENTO, É. P. É tudo nosso! Produção cultural na periferia paulistana. Tese (Doutorado em Antropologia Social) 225f. – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011.). O relevante indicador objetivo de sua situação socioeconômica – metade tinha renda familiar de até dois salários mínimos e a outra metade entre dois e cinco salários mínimos – dialoga com a preocupação com a “periferia”, temática central em seus relatos.

A maioria dos jovens é solteira (83,6%) e mora com algum responsável familiar (54,3%). Apenas 13% dos participantes são casados e 9% têm filhos, informação relevante quando se consideram os marcos normativos da transição para a vida adulta.

Ainda nessa perspectiva, considerando a expansão dos níveis de escolarização no Brasil, a despeito dos persistentes desafios, do total de entrevistados somente 14% não completou a educação básica (ensino médio), e, dos 86% que declararam ter completado o ensino médio, 7% finalizaram o nível técnico e 58% cursaram ou estavam cursando o nível superior. São características que podem ser lidas como “marcadores geracionais”, no sentido de que indicam um aspecto de viragem estruturalmente diferente e desigual em relação à geração dos pais desses jovens. A postergação de casamento, da saída da casa dos pais e da parentalidade caminha com o aumento da escolaridade média e se junta à participação nos processos de transformações tecnológicas e sociais em curso em um mundo sujeito à acelerada globalização e transnacionalização econômica, política e cultural (PAIS; BENDIT; FERREIRA, 2011PAIS, J. M.; BENDIT, R.; FERREIRA, V. S. (org.). Jovens e rumos. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2011.).

A importância do trabalho na vida dos jovens brasileiros, já identificada por estudos anteriores, também é corroborada nesta pesquisa. A crise socioeconômica amplificou a necessidade e o desejo de trabalhar para enfrentar o desafio do próprio sustento, ou de apoio familiar. Embora ansiassem por se manter somente com o trabalho efetuado no coletivo ou empreendimento individual – como todos manifestaram em seus depoimentos –, apenas uma pequena parcela dos jovens conseguia ganhar a vida exercendo tais atividades. Somando esse cenário com o diminuto acesso ao emprego formal por esse grupo (apenas 25%), tem-se como resultado a simultaneidade de trabalhos e múltiplas estratégias de sobrevivência, realidade para 77% de jovens engajados em coletivos e 53% com empreendimentos.

Em consonância com o panorama indicado de insuficiência de renda para a própria subsistência ou de suas famílias, na pesquisa encontramos 33% buscando outro trabalho. Além disso, os jovens também pretendiam manter formas alternativas de geração de renda por causa de outro fator: essas ações apareciam a eles e elas como permeadas pela sociabilidade e realização expressiva da identidade e criatividade. Os “corres” marcavam o cotidiano desse grupo, corroborando estudos sobre as especificidades do trabalho juvenil e do próprio mercado de trabalho brasileiro (GUIMARÃES; HIRATA; SUGITA, 2009GUIMARÃES, N. A.; HIRATA, H.; SUGITA, K. (org.). Trabalho flexível, empregos precários? Uma comparação Brasil, França, Japão. São Paulo: Edusp, 2009.) diante da ausência de mecanismos mais sólidos de seguridade social.

Mesmo antes do contexto pandêmico, os jovens interlocutores da pesquisa já relatavam dificuldades relativas à inserção no mercado de trabalho, sobretudo considerando o acesso a empregos de maior qualidade, com salários e jornadas compatíveis com sua formação escolar e responsabilidades familiares. Ao lado disso, a busca por um trabalho em que se sentissem realizados ou atrelado à sua área de formação já havia mobilizado muitos deles a tentar outros modos de ganhar a vida. De fato, a emergência de novas subjetividades e necessidades vocalizadas pela atual geração de jovens têm sido apreendida por investigações recentes (FERREIRA, 2017FERREIRA, V. S. Ser DJ não é só soltar o play: a pedagogização de uma nova profissão de sonho. Educação & Realidade, v. 42, n. 2, p. 473-494, 2017. https://doi.org/10.1590/2175-623664318
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; TOMMASI, 2018TOMMASI, L. Empreendedorismo e ativismo cultural nas periferias brasileiras. H-ermes, v. 1, n. 13, p. 167-196, 2018. https://doi.org/10.1285/i22840753n13p167
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; LIMA; PIRES, 2019LIMA, J.; PIRES, A. S. Juventudes e a nova cultura do trabalho: considerações a partir do trabalho digital. In: LEITE, M. P.; BIAVASCHI, M. B.; PAEZ, C. S.; LIMA, J. (org.). O trabalho em crise: flexibilidades e precariedades. São Carlos: Edufscar, 2019. p. 105-130.). Pode-se dizer que o maior acesso à educação básica e superior e permanência também têm contribuído para a produção de um conjunto de anseios e aspirações, incluindo relativos ao trabalho, à semelhança do que já reconhecia Pierre Bourdieu (1983)BOURDIEU, P. Questões de sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983., em seu famoso texto “Juventude é apenas uma palavra”.

Como já afirmado anteriormente, os jovens anseiam constituir uma experiência no mundo do trabalho que dialogue com as especificidades de suas histórias e singularidades, estabelecendo “correlação entre o curso frequentado e a inserção laboral em determinado setor” como forma de exercício de “controle sobre seus processos de integração social” (CORROCHANO; SOUZA; ABRAMO, 2019CORROCHANO, M. C.; SOUZA, R.; ABRAMO, H. Jovens ativistas das periferias: experiências e aspirações sobre o mundo do trabalho. Trabalho Necessário, v. 17, n. 33, p. 162-186, jul. 2019. https://doi.org/10.22409/tn.17i33.p29373
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, p. 167). Assim, a quase totalidade dos jovens entrevistados manifestou desejo de ter a atuação no empreendimento/coletivo como única fonte de renda, o que parece remeter a aspectos de uma “nova cultura do trabalho” (PAIS, 2016PAIS, J. M. Jovens, trabalho e futuro: dilemas e desafios. In: ROCHA, G. P. N.; GONÇALVES, R. L.; MEDEIROS, P. D. (org.). Juventude(s): novas realidades, novos olhares. Vila Nova de Famalicão: Humus, 2016. p. 19-42.).

Em relação a essa “novidade”, destaca-se que, nesse caso, tal cultura é atravessada pela baixa remuneração, além de intermitência de renda no caso de vários deles e da concomitância em mais de um trabalho – entre os participantes de coletivos, 39,6% tinham uma terceira fonte de renda, situação existente para 29,8% dos empreendedores. O retrato mostrou-nos que, nessa síntese, para a minoria (em torno de 25% para os dois grupos) o outro emprego era formalizado e com direitos assegurados. Assim, se é possível perceber a emergência dessa mudança no que tange ao mercado laboral, também se vê o quanto ele traz de recombinações com as contradições e profundas desigualdades sociais de nosso contexto social específico, como investigações recentes acerca dos fenômenos de “empreendedorismo popular” e do chamado ativismo cultural nas periferias brasileiras têm demonstrado (COSTA, 2022COSTA, H. Um lugar ao sol. Tese (Doutorado em Ciências Sociais). 276f. – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2022.).

Os jovens das periferias têm, em meio a atividades realizadas em suas localidades, a oportunidade de geração de renda – baixa, intermitente e sem seguranças, combinando precarização do trabalho com o desejo de trabalhar escapando de condições degradantes e de subordinação no mercado formal de trabalho. Em uma indiferenciação entre tempo livre e aquele dedicado à geração de renda, percebemos nesses jovens o sentimento de autonomia e valorização da iniciativa individual em um trabalho no qual a sociabilidade se mistura ao lazer, o ativismo à diversão, lugar de moradia a espaços laborais em busca de autorrealização (TOMMASI, 2018TOMMASI, L. Empreendedorismo e ativismo cultural nas periferias brasileiras. H-ermes, v. 1, n. 13, p. 167-196, 2018. https://doi.org/10.1285/i22840753n13p167
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; TOMMASI; SILVA, 2020TOMMASI, L.; SILVA, G. M. Empreendedor e precário: a carreira “correria” dos trabalhadores da cultura entre sonhos, precariedades e resistências. Revista de Ciências Sociais Política & Trabalho, n. 52, p. 196-211, jan./jun. 2020. https://doi.org/10.22478/ufpb.1517-5901.2020v1n52.51018
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).

Características dessa nova cultura contraditória e precária do trabalho no Brasil foram ainda mais ressaltadas durante a pandemia e se revelam na experiência vivida pelos jovens periféricos, entre os quais se pode antever uma espécie de prenúncio de tendências sociais mais profundas e em curso em nossa sociedade. Mais do que isso, pelo modo como enfrentaram tais desafios e agiram em relação a eles, por meio do aprendizado, da ação individual e coletiva, consideramos a existência de brechas e a produção de novas possibilidades de enfrentamento coletivo ante a tais injunções contemporâneas.

Reconfigurações e Respostas de Jovens Brasileiros às Crises

Os jovens interlocutores de nossa pesquisa estavam inseridos em situações em que a pandemia teve efeitos mais agudos: trabalhar por conta própria ou de forma coletiva de modo informal (CARVALHO; NOGUEIRA, 2020CARVALHO, S. S. D.; NOGUEIRA, M. O. O trabalho precário e a pandemia: os grupos de risco na economia do trabalho. Boletim Mercado de Trabalho, v. 26, n. 70, p. 50-68, 2020. https://doi.org/10.38116/bmt70/nta2
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). Uma das principais marcas dos relatos é o reconhecimento dos efeitos devastadores da pandemia nas regiões periféricas das cidades, sobretudo entre os mais pobres, as mulheres e as pessoas negras.

Aqueles que atuavam em coletivos ou empreendimentos, especialmente no campo da cultura, foram os que mais destacaram as dificuldades para a continuidade de seu trabalho. As perdas relativas à impossibilidade de apresentações presenciais, do contato mais direto com o público e da possibilidade de circulação ganharam força em seus relatos. Várias análises evidenciaram o quanto o mercado de trabalho no setor cultural foi bastante afetado pela pandemia de Covid-19, fosse em função da diminuição da demanda por trabalhadores da área considerando a queda da produção em outros setores, fosse pela necessidade de isolamento e distanciamento social, interrompendo-se atividades em museus, teatros, casas de espetáculo, cinemas, entre outros. Pesquisa realizada no Brasil (GÓES; ATHIAS; MARTINS, 2022GÓES, G. S.; ATHIAS, L. Q.; MARTINS, F. S. O mercado de trabalho no setor cultural: a influência da pandemia de Covid-19 nos seus fluxos e estoques. Carta de Conjuntura, n. 54, p. 1-14, 1º trim. 2022.) registrou retração de 27,7% do contingente de pessoas ocupadas no setor cultural entre o fim de 2019 e o fim de 2022, contra 12,8% de pessoas ocupadas em outros setores.

Os efeitos da pandemia de Covid-19 foram sentidos por todos os interlocutores, como esperado. Vários apontaram os trabalhos cancelados, a necessidade de buscar alternativas de renda e trabalho em outras áreas, de inserir-se em ocupações precárias muito distantes daquilo que planejavam para suas trajetórias. Um dos primeiros aspectos foi a diminuição da renda proveniente do trabalho: 63% dos jovens em empreendimentos tiveram alguma diminuição da renda, em comparação com 53% dos jovens em coletivos, embora em ambos os casos também tenham sido observados aqueles que declararam não ter tido sua renda alterada (23,6% em empreendimentos e 27,1% em coletivos) ou ter tido aumento de renda (12,5 e 6,3%, respectivamente). Parte considerável (75%) passou a trabalhar em home office (incluindo na segunda fonte de renda para 60% dos entrevistados), e 62% dos participantes tiveram a quantidade de afazeres domésticos aumentada ou muito aumentada. Nesse último caso, considerando a distribuição desigual do trabalho não remunerado doméstico e de cuidado entre homens e mulheres (HIRATA; KEGOAT, 2003HIRATA, H.; KEGOAT, D. A divisão sexual do trabalho revisitada. In: MARUANI, M.; HIRATA, H. (org.). As novas fronteiras da desigualdade. São Paulo: Senac, 2003. p. 111-124.; RODRÍGUEZ ENRIQUEZ; MARZONETTO, 2015RODRÍGUEZ ENRIQUEZ, C. M.; MARZONETTO, G. L. Organización social del cuidado y desigualdad: el déficit de políticas públicas de cuidado en Argentina. Revista Perspectivas de Políticas Públicas, v. 4, n. 8, p. 103-134, 2015. https://doi.org/10.18294/rppp.2015.949
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), entre estas últimas o aumento foi ainda maior: 65,1% das mulheres, em contraste com 55% dos homens, identificaram aumento substantivo desse tipo de trabalho.

Observaram-se algumas diferenças entre os relatos de jovens que participavam de grupos ou empreendimentos mais consolidados e de grupos que estavam iniciando suas atividades quando a quarentena foi deflagrada. Ainda que todos tenham buscado realizar remotamente seus roteiros, peças de teatro, espetáculos de dança e apresentações, a possibilidade de continuar gerando renda por intermédio dessas atividades aconteceu para os grupos mais consolidados. Em todo caso, duas questões aparecem como relevantes aqui: em primeiro lugar, a forma como todos, mesmo aqueles grupos que não tinham recursos, buscaram manter ativas, de modo remoto, algumas atividades de seu empreendimento ou coletivo, mesmo combinando-as com outros trabalhos, em geral bastante precários; e, em segundo lugar, os apoios e trocas entre eles, permitindo muitas vezes a continuidade das ações no interior de grupos menos consolidados.

No caso dos coletivos culturais, as dificuldades para realizar um trabalho artístico distante do público e dos colegas (sem a troca de olhares, sensações e emoções partilhadas quando estão no palco) estiveram presentes em todos os relatos, ao lado das desiguais condições para realização de um trabalho artístico online nas periferias, onde também a ausência ou as dificuldades de conexão são permanentes.

A realização do trabalho de forma remota, em home office, como uma das medidas para evitar a propagação da Covid-19 fez parte do cotidiano de várias pessoas em diferentes partes do mundo. No Brasil, em maio de 2020, havia 8,7 milhões de pessoas trabalhando remotamente (IBGE, 2020INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE). PNAD Covid-19. IBGE, 2020. Disponível em: https://covid19.ibge.gov.br/pnad-covid/trabalho.php. Acesso em: fev. 2022.
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). Pesquisas indicam diferenças significativas de realização desse trabalho considerando o tipo e o setor de atuação, a disponibilidade de equipamento e conexão, as dificuldades e facilidades para lidar com as plataformas digitais e o próprio perfil de quem trabalha, levando-se em conta idade, gênero, cor/raça, classe e local de moradia, o que também ficou evidente entre nossos interlocutores.

Para além disso, havia a própria configuração de suas casas, ruas e bairros. Era preciso encontrar um espaço em que fosse possível ensaiar, gravar, apresentar. Como afirmou uma jovem negra de 29 anos:

Como conseguir as condições e o silêncio necessário para gravar uma apresentação em um lugar onde tudo é compartilhado, até os barulhos são compartilhados? Aqui, o privilégio de ter silêncio não existe

(RMN29)1 1 A fim de preservar o anonimato dos jovens interlocutores da pesquisa, utilizamos abreviaturas para identificá-los. Assim, R significa respondente, seguido por H ou M, referindo-se a homem ou mulher, respectivamente. Na sequência há menção a autodeclaração de cor/raça, com uso de B para pessoas brancas, N para as que se identificaram como pretas ou pardas, segundo critérios do IBGE. Por fim, há menção à idade dos respondentes. No caso de haver coincidência na nomenclatura usada na composição da identificação, empregamos letras minúsculas para singularizar os indivíduos. .

Em espaços em que tudo se compartilha, incluindo o ruído, era necessário criar estratégias para incorporar o próprio cotidiano no trabalho a ser realizado. Era também preciso desdobrar-se entre os afazeres domésticos, os cuidados com filhos ou outros parentes (destacado pelas jovens mulheres, como mencionamos) e os estudos para aqueles que ainda estudavam, além do trabalho artístico ou outros trabalhos (CORROCHANO; ARANCIBIA; MIRANDA, 2022CORROCHANO, M. C.; ARANCIBIA, M.; MIRANDA, A. Transições juvenis na Argentina e no Brasil: trabalho, educação e família. Revista HISTEDBR On-line, Campinas, v. 22, e022058, 2022. https://doi.org/10.20396/rho.v22i00.8671757
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).

Para tais jovens, expor a casa e a própria intimidade doméstica também foi uma questão, como relata uma jovem moradora da zona leste, bailarina em um coletivo de dança:

Então de repente você está, esse espaço de estar, sua morada tá pro trabalho de uma forma, eu não falo nem de trabalhar de casa, mas de expor sua casa. Então, quando eu gravo de dentro da minha casa, existe uma quantidade de pessoas que desconheço que estão entrando nesse espaço que também é meu. Então é isso. É uma dificuldade gravar. De certo modo, é uma exposição. Então, de repente eu tenho que gravar essas cenas na minha cozinha, no meu quarto, no meu banheiro. É uma exposição. Também é uma relação que a gente vai perceber essas diferenças de classe, né? Vou pegar especificamente essa diferença porque tem a ver com em qual espaço eu gravo, qual o tamanho do espaço que eu tenho para poder realizar?

(RMN26).

A centralidade com que o local de moradia aparece não está apenas nos destaques relativos à falta de conexão, à dificuldade de acessar equipamentos de maior qualidade e aos barulhos compartilhados. A valorização do remoto só aparece quando se salienta a possibilidade de não enfrentar várias horas de deslocamento para chegar a seus locais de trabalho, considerando problemas de mobilidade da cidade e a distância dos locais onde moravam.

Entre os que ainda estudavam (56,7%), 31% continuaram realizando atividades de estudo de maneira remota, contra 30% que não estavam conseguindo fazê-lo, fosse por falta de oferta, fosse porque fora preciso intensificar atividades de trabalho, fosse porque não estavam conseguindo combinar as inúmeras atividades no período. A despeito disso, 52% pretendiam continuar os estudos, contra 12% que não projetavam voltar aos estudos e 32% que estavam em dúvida quanto à continuidade.

“Se a gente não tecer redes agora, a gente não vai sobreviver” (RMN22).

A fala da jovem que trabalhava como atriz e era integrante de um coletivo de teatro é emblemática de um conjunto de ações que vários coletivos realizaram para apoiar uns aos outros e dos suportes que receberam de pessoas e associações locais. Isso não significa que ignoravam desigualdades na distribuição dos recursos. Muitos declararam, tanto dentro quanto fora do contexto pandêmico, que sempre os grupos mais consolidados obtinham maior acesso a recursos, bem como verbas de editais públicos e privados. Mas o que ganhou força em seus relatos foram os esforços de apoio mútuo, que, embora já existentes, foram ampliados no contexto da pandemia.

As redes são fundamentais para o trabalho de tais jovens, sobretudo porque estes oscilam entre períodos de trabalho intenso e de falta de trabalho ou de projetos, quando vivenciam mais fortemente incertezas e riscos materiais concretos, entretanto deixar de receber remuneração não implica parar de trabalhar. Esse tempo é em geral utilizado para a criação, invenção, elaboração de projetos, investimentos em comunicação para divulgação ou estabelecimento de contatos, construindo e firmando redes. Corre-se sempre atrás, seja para pagar as contas, seja para ter acesso a editais que trarão recursos.

Como afirma uma jovem atriz e participante de coletivo de teatro, os apoios na elaboração de projeto e na escrita, no enfrentamento das burocracias e na busca por cartas de recomendação foram fundamentais para que seu grupo pudesse concorrer com um projeto em um edital público e aprová-lo, mesmo no contexto da pandemia:

Então é assim também... um panorama periférico de como as pessoas se relacionam. É um ato de conseguir resistir, de conseguir sobreviver ajudando o outro e também sendo ajudado

(RMP29).

Parcerias e atividades conjuntas entre grupos são comuns e demonstraram ser uma importante forma de sobrevivência durante a pandemia, conforme relatou uma jovem participante de uma companhia de teatro e de um coletivo de literatura:

A gente começou a fazer pequenas coisinhas para estimular, para que continuássemos conectados uns com os outros. A gente fez uma experiência de criar um poema contínuo, onde a gente junta outros artistas e faz um poemão. Então a gente começou a fazer essas iniciativas. Essa não era remunerada, mas a gente fez para que a gente pudesse continuar juntos de alguma forma

(RMN20).

Permanecer juntos com aqueles que disputam o mesmo financiamento e mesmo quando um grupo consegue mais recursos do que o outro, o que muitas vezes acontece, é emblemático sobre tais suportes. Nesse momento, os jovens indicaram que se tornava mais importante permanecer unidos, o que nem sempre significava ausência de conflitos. O apoio também pode vir da contratação de serviços, pois muitas vezes o coletivo que alcançava mais recursos contratava outro com poucos recursos ou que não haviam sido contemplados com eles. Como a literatura demonstra, essa constituição de redes já era uma realidade entre esses coletivos, mas intensificou-se na pandemia.

A troca de saberes também foi uma prática recorrente. Nem todos os jovens e coletivos tinham familiaridade com o uso das redes sociais para divulgação de seus trabalhos, ainda que as utilizassem pessoalmente. Como afirma uma jovem negra participante de um coletivo de dança:

A gente teve algumas pessoas que nos ajudaram nesse trampo de mexer com as plataformas online... A gente teve formação com essa galera que mexe com streaming pra gente fazer essas lives

(RMN23).

A disseminação de informações também fez parte das ações desses coletivos, sobretudo dos coletivos de comunicação. Era preciso combater a ausência de informações ou fake news. Se esse sempre foi um objetivo dos coletivos de comunicação na “quebrada”, o contexto pandêmico também intensificou a necessidade de falar sobre a importância do distanciamento social, do uso de máscaras e de outras medidas para evitar a disseminação do vírus, ao lado da apresentação de dados sobre o aumento da violência contra mulheres e contra jovens negros. Também foram esses coletivos que contribuíram para que informações acerca de formas de apoio e editais públicos e privados chegassem.

A pandemia passou a ser tematizada por vários desses coletivos que criam podcasts, tais como Lugar de Quarentena, criado pelo coletivo de comunicação de que participa Riane, 29 anos, ou como o de Sidneia, negra, 29 anos, que participa de um coletivo que criou um podcast e um jornal mural para expor tanto os casos de violência no bairro quanto as ações solidárias que se disseminavam. No caso de tais coletivos, o volume e o ritmo do trabalho aumentaram muito, também porque os grupos assumiram outras funções de caráter público, suprindo a importante ausência do Estado na preservação da vida:

Mas, a gente... Mas aí nosso trabalho aumentou, porque a gente sabia quem ia se prejudicar mais com a pandemia, né? E esse não tava sendo um grupo assistido pela grande mídia. Disparar mais informações, mais do que a gente consegue, mais do que a nossa frequência pra tentar meio que correr contra o tempo e evitar grandes tragédias, assim, né?

(RMB29).

As redes de apoio e de solidariedade não estiveram presentes apenas entre os jovens atuantes em coletivos; mesmo entre aqueles que se declararam “empreendedores individuais”, também puderam ser observadas iniciativas de construção de laços e realização de ações conjuntas, como afirma uma jovem negra que aos 22 anos toca um microempreendimento individual formalizado:

Chama junto, puxa junto. É o que a gente tem tentado fazer bastante nessa pandemia. Chamar os nossos para trabalhar junto, para fazer a coisa acontecer junto

(RMN22).

Tal postura mostrou-se extremamente significativa, uma vez que 86,1% dos jovens em empreendimentos relataram ter passado pela necessidade de mudanças nas atividades realizadas no empreendimento em função da pandemia. Além disso, 73,6% deles não se afastaram do trabalho em razão do contexto: 23,6% seguiram trabalhando da mesma forma, 27,8% trabalharam em home office, 18,1% começaram a trabalhar após a pandemia, 2,8% perderam o emprego, e 12,5% ficaram sem trabalhar.

Houve também aqueles que iniciaram seus negócios na pandemia porque foram demitidos. Considerando os limites do sistema de proteção social no Brasil e do próprio “auxílio emergencial”, disponibilizado pelo governo federal no contexto pandêmico, vários interlocutores desta pesquisa decidiram começar alguma atividade para gerar renda. Para muitos deles, não se tratou de começar qualquer negócio: era preciso realizar um negócio com sentido para si próprio e para o seu entorno, o que também contribui para contestar a construção de uma subjetividade neoliberal, especialmente entre jovens que se consideram “empreendedores”.

Foi assim que outra jovem negra de 26 anos decidiu abrir um negócio no ramo de alimentação depois de ser demitida no início da pandemia (RMN26). Aproveitando a experiência da mãe, que havia trabalhado como vendedora ambulante de acarajé por muitos anos, convidou outra amiga, também negra, para começar a Cozinha das Pretas, passando a produzir bolos e acarajés para vender. Ao lado da venda, há a busca pela valorização da trajetória de sua própria mãe e da cultura negra.

Outra jovem, dessa vez branca e com 20 anos, também passou a produzir comida vegana, não apenas para gerar renda em função do desemprego, mas para incentivar a alimentação saudável a um preço justo nas periferias (RMB20). Essa mesma jovem também estabeleceu uma relação de troca com blogueiras do território onde morava: oferecia marmitas saudáveis em troca de divulgação nas redes, o que para ela contribuiu de modo muito significativo para sua expansão. Depois de seis meses procurando emprego na pandemia, outra jovem de 20 anos decidiu abrir uma loja para vender roupas que não seguissem o estilo nem o padrão que a sociedade impõe às pessoas – uma loja “descontruída”, como ela mesma define (RMP20). Um jovem de 21 anos, negro, começou a produzir camisetas com estampas valorizando a periferia, algo que ele e um colega sempre sonharam em fazer e que conseguiram com um pouco mais de tempo que tiveram na pandemia em função do trabalho remoto, segundo a percepção que apresentaram (RHN21).

Outros jovens precisaram reconverter suas atividades para gerar trabalho e renda para si próprios, mas também seguiram realizando ações de apoio, como destaca uma interlocutora de 24 anos, negra, que tinha uma loja de roupas que precisou fechar na quarentena (RMN24a). Ela conseguiu doações de várias instituições para produzir e vender máscaras, mas não produzia as peças apenas para vender; também colaborou voluntariamente para a produção e distribuição gratuita delas no bairro. Ou como revela a experiência de outro jovem proprietário de loja de roupas que passou a produzir máscaras (RHN23). Ele considerava um absurdo pensar em vender roupas em um “período tão trágico”. No caso de outro jovem entrevistado, detentor de um pequeno restaurante com sua esposa, começou a produzir marmita para vender e distribuir localmente (RHB28).

Por fim, há ainda aqueles que estavam concomitantemente voltados tanto à procura de um emprego formal quanto à manutenção de investimentos nas probabilidades futuras de geração de trabalho e renda em seus empreendimentos ou coletivos. Isso se dava ainda que houvesse questionamentos acerca das garantias de estabilidade com o suposto “registro em carteira de trabalho”, posto que paralelamente ao que os jovens denominaram de “flexibilidade dos coletivos” a ausência de direitos já figurava como marca das trajetórias profissionais antes mesmo da intensificação de tal situação pelas consequências sociais da pandemia de Covid-19.

Em comum, tanto considerando aqueles organizados em coletivos quanto os empreendedores individuais, constatou-se a inserção em ações solidárias de distribuição de alimentos, produtos de higiene e máscaras. A frase de uma jovem negra, 24 anos, que participava de um coletivo de velejadores da periferia, sintetiza:

“Todo mundo estava em casa isolado, mas a gente teve que ir para a guerra. Então, a gente fez políticas públicas de verdade” (RMN24b).

Ela e seus colegas não apenas se mobilizaram como coletivo para apoiar a distribuição de alimentos e máscaras, como também buscaram engajar amigos e familiares em todo o processo:

“Era preciso convencer nossos pais, irmãos, amigos, tios e tias, primos e primas a também apoiarem” (RMN24b).

Ou como afirma um jovem de 28 anos branco que tinha um ateliê de produção de pentes garfo:

“Nossa militância não teve quarentena. A gente desde o começo foi atrás de cesta básica, a gente mobilizou a rede de apoio para atuar, fomos atrás de outras instituições” (RHB28).

Muitos jovens enfatizaram que, embora seus coletivos e empreendimentos não tivessem foco assistencialista, não era possível “fechar os olhos” diante das urgências do momento. Nas palavras de um jovem de 24 anos:

“Tipo, a gente não fez mais apenas o acesso à cultura e à arte, a gente trabalhou uma parada mais social. Uma parada de entender mais as dificuldades da região” (RHN24).

Considerações Finais

Em um dos trabalhos que se tornaram referência para os estudos dos movimentos sociais, da educação e também das juventudes, Alberto Melucci (2001)MELUCCI, A. A invenção do presente: movimentos sociais nas sociedades complexas. Petrópolis: Vozes, 2001. alertava-nos para os riscos de análises realizadas no “calor da hora”, que poderiam implicar certa “miopia do presente”. No contexto de deflagração da pandemia de Covid-19, proliferaram estudos destacando o aumento dos índices de evasão escolar e as dificuldades de acompanhamento do ensino remoto, o crescimento do desemprego e do desalento que recaíram especialmente sobre as gerações mais jovens, sobretudo aqueles mais pobres, mulheres, negros e moradores de periferias, no entanto várias dessas questões não se iniciaram na pandemia.

A expressiva piora das condições de inserção no mercado de trabalho para o conjunto da população, especialmente para os mais jovens, já vinha se configurando no mundo desde 2008 e no Brasil desde a crise econômica e institucional iniciada em 2015 e a reforma trabalhista em 2017. No mesmo ano, a aprovação da reforma do ensino médio, que continua sendo implementada, já contribuía para aprofundar as desigualdades entre as jovens gerações. Em comum, ambas as reformas tornam evidentes os efeitos das políticas neoliberais em todo o globo, ao mesmo tempo que exigem a reflexão sobre o modo como se realizam em países como o nosso.

Se o neoliberalismo aparece como um tsunami incontrolável, essa onda não chega da mesma forma a todos os contextos. Os países, suas histórias, estruturas, instituições e atores não o absorvem livremente, como se fossem recipientes vazios. Ruídos, atritos, reações e conflitos demarcam ações de conformidades e resistências, como se pode ver atualmente nas formas de organização e mobilização de jovens diante das reformas educacionais em curso no país (GOULART et al., 2021GOULART, D. C.; SIQUEIRA, G. P.; LOURENCO, V. C.; NASCIMENTO, T. F. M. Inova educação: leitura crítica sobre a proposta de reforma educacional dirigida à juventude paulista. São Paulo: Ação Educativa Assessoria e Pesquisa, 2021.).

A pandemia tornou evidentes os limites impostos pelo neoliberalismo, explicitando as profundas desigualdades que assolam as sociedades capitalistas, mas também os modos diversos de respostas em cada um dos países. Ao mesmo tempo, também iluminou formas de ação coletiva e de criação de estratégias e práticas no enfrentamento desses limites.

Os dados analisados neste artigo contribuem para a discussão dos modos como os jovens dialogam e reagem a discursos, projetos de sociedade e injunções de saídas individualizantes a questões macroestruturais, como as relacionadas ao mundo do trabalho, da geração de renda e do enfrentamento das desigualdades. No contexto das periferias de São Paulo, nossos interlocutores organizaram-se para sobreviver e resistir, mas também para intervir de maneira propositiva diante do presente pandêmico, ao mesmo tempo que continuavam a construir projetos de futuro. A despeito do fortalecimento da lógica do “empreendedor de si” (seja no campo da educação, seja no campo do trabalho) entre os jovens com os quais produzimos esta investigação, a busca por uma vida melhor ainda se dá coletivamente.

Por fim, ainda que se disseminem análises em torno da construção de uma “subjetividade neoliberal”, no contexto de novas configurações do trabalho e do capital, parece-nos fundamental questionar adesões plenas e definitivas a tais princípios para escapar de generalizações excessivas. Considerando também o olhar para os sujeitos, de maneira especial os jovens, em suas especificidades – históricas, locais, etárias, de cor/raça, gênero e territoriais, suas experiências e suas ações –, temos recepções inesperadas, resistências diversas, criações e muitos limites a tal projeto (MARTUCCELLI, 2020MARTUCCELLI, D. Límites y malentendidos del sujeto neoliberal en América Latina. La libertad de pluma. Revista Digital, ano 3, n. 10, p. 1-23, mar. 2020.).

Nota

  • 1
    A fim de preservar o anonimato dos jovens interlocutores da pesquisa, utilizamos abreviaturas para identificá-los. Assim, R significa respondente, seguido por H ou M, referindo-se a homem ou mulher, respectivamente. Na sequência há menção a autodeclaração de cor/raça, com uso de B para pessoas brancas, N para as que se identificaram como pretas ou pardas, segundo critérios do IBGE. Por fim, há menção à idade dos respondentes. No caso de haver coincidência na nomenclatura usada na composição da identificação, empregamos letras minúsculas para singularizar os indivíduos.
  • O artigo é parte dos resultados do projeto de pesquisa Coletiva Jovem: um projeto de pesquisa e ação para suporte aos coletivos de produção nas periferias de São Paulo e Buenos Aires, realizado com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, e do projeto O trabalho como prova e as provas do trabalho: desafios de jovens na sociedade contemporânea, realizado com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

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Editor de Seção: Débora Mazza https://orcid.org/0000-0002-8968-4597

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    30 Abr 2023
  • Aceito
    19 Jul 2023
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