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A Psiquiatria rumo à integração e ao reconhecimento da complexidade

EDITORIAL

A Psiquiatria rumo à integração e ao reconhecimento da complexidade

César Luís de Souza Brito; Jacó Zaslavsky; Júlio Chachamovich

Editores da Revista

A acolhida obtida pela Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul em todo o Brasil foi muito gratificante para todos nós. Recebemos muitos cumprimentos por seu conteúdo. Gostaríamos de agradecer a todos que nos enviaram comentários e sugestões.

Chegamos ao segundo número do ano e cremos que nossa linha editorial, fruto do espírito de nossa Sociedade de Psiquiatria ao longo dos anos, representa fielmente o esforço integrativo de tantos colegas, tão necessário à nossa ciência. Nessa busca de aprimoramento, tivemos a participação de um dos membros de nosso Conselho Editorial, Antonio Marques da Rosa, no XI Curso de Editoração Científica, promovido em São Paulo pela Associação Brasileira de Editores Científicos (ABEC), entidade à qual nossa revista é filiada. A respeito, veja o Editorial a convite.

O espírito humano, tanto em sua criatividade como na patologia, está envolto em grande complexidade de causas e influências diretas, causais e associadas. Nosso conhecimento psiquiátrico não pode desconhecer as diversas facetas biológicas, psicológicas, sociais e culturais, envolvidas nas produções do psiquismo humano. Sabemos que é necessário aprofundar nossos conhecimentos em campos que, pela sua natureza complexa, exigem que a pesquisa estabeleça um reducionismo a serviço de uma melhor compreensão dos fenômenos, ainda que parcialmente.

Desse modo temos, por um lado, o aprofundamento da bioquímica e fisiologia cerebral, por outro as concepções psicanalíticas, com modelos explicativos frutos de cuidadosa observação e inferência, perpassados por reflexões sociológicas e filosóficas sobre o agir e o padecer humano. O espectro é muito amplo. A linguagem equívoca e hermética, em muitos casos, excluindo os iniciados, dificulta a obtenção do conhecimento em áreas para além da sua.

No entanto, se como cientistas é nosso compromisso aprofundar o conhecimento nas áreas que de antemão sabemos ser apenas um pequeno recorte da realidade, como psiquiatras clínicos, temos o dever de conhecer mais amplamente o que é produzido cientificamente em nossa área. Essa meta ideal talvez seja impossível de atingir. Entretanto, para nós, editores e membros de uma Sociedade de Psiquiatras, resta a incumbência de criar espaços institucionais em que a divulgação e o debate de idéias, por vezes tão díspares, possam ter seu lugar e vez, resultando daí um acercamento daquele ideal. Felizmente, parece estar iniciando na comunidade científica um período de aproximações dos saberes e tentativas de síntese entre os diversos campos do conhecimento psiquiátrico.

Como expressão disso, apresentamos neste número a versão para o português do artigo Repensando a ação terapêutica de Glen O. Gabbard e Drew Westen, gentilmente enviado em primeira mão por seus autores e com os direitos de publicação da tradução cedidos pelo International Journal of Psychoanalysis. O artigo vem ao encontro de nossa linha editorial, que visa à integração das diversas áreas do conhecimento psiquiátrico. Nele, os autores refletem sobre a necessidade de reavaliar os modelos de ação terapêutica da psicanálise e psicoterapia, integrando e contextualizando os conhecimentos provenientes da fisiologia cerebral e das ciências cognitivas.

Seguimos com o artigo de Richard Lucas, Managing depression – analytic, antidepressants or both? O autor procura compreender, de modo atualizado, as funções dos antidepressivos e da psicoterapia (psicanálise) no manejo da depressão.

A criatividade, em suas formas cotidianas e variadas, é o fenômeno que os autores Flávio Shansis, Marcelo Pio de Almeida Fleck, Ruth Fichards, Dennis Kinney, Ivan Izquierdo, Bettina Mattevi, Gabriel Maldonado e Marcelo Berlim procuram detectar e medir através do artigo Desenvolvimento da versão para Português das Escalas de criatividade ao Longo da Vida.

A supervisão psicanalítica é o tema abordado por Jacó Zaslavsky em seu artigo A supervisão psicanalítica: revisão e tentativa de sistematização. A supervisão tem sido, ao longo dos anos, importante método de ensino da psicoterapia. A sistematização desse método é oportuna, à medida que muito se evoluiu na técnica psicoterápica e psicanalítica, não podendo o ensino ficar excluído desses novos conhecimentos e técnicas.

O tema da adesão ao tratamento é sempre importante em nossa ciência. Detectar que fatores influenciam positivamente e negativamente o processo de adesão é de fundamental importância para nossa prática. Assim, o artigo de José Menna Oliveira e colaboradores, Adesão ao tratamento e hospitalizações entre pacientes que realizam aplicações de Flufenazina Depot, ajuda-nos a compreender alguns desses fatores.

Sob a denominação de observação do tratamento, o tema da adesão ao tratamento também é trazido a nós por Dóris Vasconcellos e colaboradoras, no artigo Condições psicológicas para a observação das terapias antiretrovirais altamente ativas. Sob o enfoque da pesquisa qualitativa, as autoras demonstram a influência decisiva do estabelecimento de um vínculo positivo, inclusive da importância da relação médico-paciente, como fator de adesão ao tratamento.

O paradigma do Pensamento Complexo (ou da complexidade) é trazido para a psiquiatria através do artigo de Ercy José Soar Filho, Psiquiatria e pensamento complexo. Esse atual paradigma, que tem ampliado a noção de ciência e observação, traz sua contribuição ao lançar luz sobre a multicausalidade e influências recursivas que se encontram presentes na nosologia psiquiátrica.

A eletroconvulsoterapia é um tema carregado de preconceitos, cuja discussão, com freqüência, mostra a emoção sobrepujando a razão. No artigo de Juliana Perizzolo e colaboradores, Eletroconvulsoterapia: revisão de alguns aspectos relacionados com a sua prática, o conhecimento técnico atualizado sobre o tema é trazido à baila de modo claro e objetivo.

As repercussões do fechamento de hospitais públicos é lembrado através do artigo de Renata Brasil e colaboradores, Repercussões do fechamento da Unidade de Desintoxicação do Hospital Psiquiátrico São Pedro. O tema é atual e importante nesse momento em que passamos pela reforma psiquiátrica, trazendo mais elementos para que possamos embasar nossas atitudes e posturas, visando à melhoria do sistema de saúde mental em nosso país.

Sentimo-nos muito satisfeitos pela repercussão do artigo de Eric Kandel, que mobilizou em nossos leitores um estimulante debate o qual esperamos prossiga com outros artigos. São essas reflexões que a seção de Cartas aos Editores está destacando.

Nosso desejo é que a Revista de Psiquiatria seja, cada vez mais, uma fonte de conhecimento e reflexão ativa entre seus leitores, tornando-se também um veículo de intenso debate e atualização. Pensamos ter atingido esse objetivo no atual número e fazemos votos de que os leitores se sintam estimulados a expressar suas idéias em nossa revista, tanto com cartas como com artigos.

Finalmente, gostaríamos de destacar a participação do Dr. Júlio Chachamovich, que substituiu temporariamente as funções de nosso editor, Dr. Jacó Zaslavsky, bem como de todo o conselho editorial, que tornou possível manter a qualidade desse número.

Esperamos que os leitores façam uma boa leitura e que este número seja do agrado de todos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Set 2005
  • Data do Fascículo
    Ago 2003
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