SOBRE A CAPA
Livro livre
Rosária Maria Lúcia Prenna Geremia
Bibliotecária, Biblioteca da Faculdade de Medicina/Biblioteca Central Irmão José Otão, Pontifícia Universidade Católica (PUCRS), Porto Alegre, RS
Todos que nasceram no milênio passado, até a década de 60, foram acostumados a buscar a maior parte de suas informações em fontes impressas.
Os livros e os periódicos, mesmo para aqueles menos curiosos ou interessados, representavam o maior manancial para as respostas às indagações, existenciais ou não. As bibliotecas, então, eram as depositárias por excelência de toda a produção do conhecimento.
Desde que iniciei meu estágio curricular há 41 anos, ainda no primeiro ano da faculdade de Biblioteconomia, por influência de meu irmão, que já havia iniciado seu curso de Medicina, venho exercendo meu trabalho em bibliotecas universitárias médicas. Tenho uma satisfação íntima nada ínfima, não só por tudo que minha profissão me aportou em maravilhosos relacionamentos humanos, mas também por ter me privilegiado acompanhar, num relativo curto espaço de tempo, um salto imensurável na disseminação da informação.
Sou do tempo em que, para se fazer uma pesquisa sobre uma patologia específica, além de se pesquisar nos livros especializados, buscava-se atualização nos Index Medicus1, que eram mensais e traziam uma informação defasada, em média de 6 meses. Paralelamente, surgiu o Cumulated Index Medicus2, que apresentava a produção anual, facilitando os levantamentos retrospectivos. Já desde 1966, a National Library of Medicine (Bethesda, EUA) iniciava o uso do computador com seu MEDLINE, ainda hoje a maior fonte de informação para a área das Ciências da Saúde, atualmente com mais de 70 milhões de acessos mensais! Poucos sabem que o Brasil, em 1972, foi o primeiro país fora dos EUA que teve acesso à distância ao MEDLINE: claro que esse acesso, não sendo público, tinha um custo bastante elevado, diferentemente de hoje, que, através do PUBMED, seu acesso é público e gratuito.
A internet revolucionou a comunicação literária, subvertendo os parâmetros da informação: como num passe de mágica, cuja varinha de condão são as pontas de nossos dedos, saltamos rios e oceanos sem pontes, cruzamos fronteiras e continentes sem passaporte, acessando em qualquer latitude e longitude os catálogos e acervos de bibliotecas próximas ou longínquas!3 Daí para diante, a voracidade por informações quase chega às raias da truculência. Hoje, um pesquisador exige as informações antes mesmo de elas estarem impressas... E o epub* * Electronic publication - ahead of print (publicação eletrônica - antes de imprimir). se impôs.
Em contrapartida, a virtualidade cresce. Há a tendência de que os editores de periódicos disponibilizem cada vez mais, retrospectivamente, suas coleções, até que as mesmas estejam totalmente digitalizadas. Porém, nesse ínterim, no dia-a-dia têm-se tornado extremamente valiosas as coleções mais antigas, cuidadosamente preservadas em papel impresso nas bibliotecas, porque é limitado e temerário, ainda, contar somente com textos disponíveis virtualmente.
Questiono-me quanto ao futuro das obras impressas. Inquieto-me quanto à conservação dos riquíssimos acervos convencionais das milhões de bibliotecas que existem no mundo. Sofro verdadeiro dilema quando tenho que rejeitar preciosas doações devido ao espaço físico exíguo de uma biblioteca!
Consola-me saber que o papel dura mais de 500 anos e constatar que o CD não tem a duração tão perene quanto se dizia quando surgiu.
Como é mais fácil ser profeta do passado, na dúvida, cada vez mais rendo minhas homenagens a Gutenberg, que propiciou a invenção do livro impresso, que, na origem da palavra líber Livro (do latim liber = livre). , enseja também a liberdade não prensada.
- 1. Index Medicus. Bethesda: National Library of Medicine; 1960-2005.
- 2. Cumulated Index Medicus. Bethesda: National Library of Medicine; 1960-2000.
- 3. Geremia RMLP. Aflições e reflexões [editorial]. Acta Med. 2004;25:xvii-xviii.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
31 Mar 2008 -
Data do Fascículo
Dez 2007
