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Elitismo cultural e "democratização da cultura" no Império Romano Tardio

Resumo

A produção literária e artística dos últimos séculos da Antiguidade apresenta todos os sinais de elitismo cultural. Por trás desta aparência, e contrastando com a impossibilidade radical de democratização política do regime imperial, podemos, no entanto, reconhecer os sinais de um processo que o historiador italiano Santo Mazzarino denominou de "democratização da cultura". Outros historiadores denomiranarm-no de "vulgarização". A historiografia catastrofista do "declínio" do mundo antigo e da queda do Império romano atribuiu uma grande responsabilidade ao que apresentava como um nivelamento por baixo da sociedade antiga e de sua cultura sob a ação conjugada de dois fatores: a cristianização, promotora de um populismo cultural, e a barbarização, destruidora das mais altas realizações da tradição clássica. Todavia, a "democratização" pode também ser analisada em termos de "democratização positiva", ascendente (de baixo para cima). O debate continua vivo entre os historiadores atuais para definir se essas tendências à democratização da cultura representaram um fenômeno negativo ou positivo. É necessário, no entanto, afastar todo julgamento de valor a priori, necessariamente subjetivo, se quisermos estudar o fenômeno em seus diversos aspectos. Os resultados desse tipo de pesquisa são diversos, segundo os domínios em que se manifesta uma democratização: a produção literária e artística, a produção material, o pensamento jurídico, as crenças religiosas, as evoluções linguísticas, a afirmação das culturas nacionais.


TRADUÇÃO TRANSLATION

Elitismo cultural e "democratização da cultura" no Império Romano Tardio

Jean-Michel Carrié

Historiador e Arqueólogo - Professor Doutor - Diretor de Pesquisas da École des Hautes Études en Sciences Sociales, Paris - UMR8567 - EHESS/CNRS 2, Rue Vivienne, 75002, Paris, França. Editor chefe da Revista Antiguidade Tardia. E-mail: carrie@ehess.fr

RESUMO

A produção literária e artística dos últimos séculos da Antiguidade apresenta todos os sinais de elitismo cultural. Por trás desta aparência, e contrastando com a impossibilidade radical de democratização política do regime imperial, podemos, no entanto, reconhecer os sinais de um processo que o historiador italiano Santo Mazzarino denominou de "democratização da cultura". Outros historiadores denomiranarm-no de "vulgarização". A historiografia catastrofista do "declínio" do mundo antigo e da queda do Império romano atribuiu uma grande responsabilidade ao que apresentava como um nivelamento por baixo da sociedade antiga e de sua cultura sob a ação conjugada de dois fatores: a cristianização, promotora de um populismo cultural, e a barbarização, destruidora das mais altas realizações da tradição clássica. Todavia, a "democratização" pode também ser analisada em termos de "democratização positiva", ascendente (de baixo para cima). O debate continua vivo entre os historiadores atuais para definir se essas tendências à democratização da cultura representaram um fenômeno negativo ou positivo. É necessário, no entanto, afastar todo julgamento de valor a priori, necessariamente subjetivo, se quisermos estudar o fenômeno em seus diversos aspectos. Os resultados desse tipo de pesquisa são diversos, segundo os domínios em que se manifesta uma democratização: a produção literária e artística, a produção material, o pensamento jurídico, as crenças religiosas, as evoluções linguísticas, a afirmação das culturas nacionais.

Introdução

Desde a publicação, em 1788, do famoso livro de Edward Gibbon, História do declínio e da queda do Império romano, este paradigma (de "declínio") dominou a análise do período hoje unanimante designado como "Antiguidade Tardia". As teorias de « declínio » que monopolizaram a historiografia desde o fim do século XVIII até a década de 1950, apresentavam a decadência do mundo antigo como um nivelamento por baixo da sociedade antiga e de sua cultura sob a ação conjugada de dois fatores: a cristianização, promotora de um populismo cultural e a barbarização, destruidora das mais altas realizações da tradição clássica.

Assim, a « decadência » do Império romano foi atribuída a causas tais como a mestiçagem e a hibridação (Tenney Frank desde 1916, Martin P. Nilsson em 1926), a barbarização (Meyer), a eliminação dos melhores (Seeck, retomado por Stein, depois por Rostovtseff ), levando todos a uma idêntica perda de identidade cultural e moral.

Foi necessário esperar a década de 1960 para apresentar uma alternativa a este paradigma que dominava a historiografia. Foi, com efeito, em 1960 que o historiador italiano Santo Mazzarino, em um texto memorável apresentado no XI Congresso Internacional de Ciências Históricas de Estocolmo, propôs uma reflexão sobre o seguinte tema: « A democratização da cultura no « Baixo-Império » (usava-se, ainda nesta época, o conceito de Baixo-Império). Fixando claramente os limites operacionais desse paradigma, que tinha sentido essencialmente para século III, Mazzarino convidava a reler sob uma nova perspectiva as tendências de fundo da Antiguidade Tardia, em particular a afirmação das culturas nacionais nos seus aspectos religiosos e linguísticos, assim como a difusão do cristianismo, os movimentos de resistência camponesa nas províncias, etc. Os aspectos de « democratização positiva », ascendente (de baixo para cima) que Mazzarino destacava em certas evoluções do mundo romano no século III, opunham-se ao paradigma da decadência. Na mesma época, o historiador da arte Ranuccio Bianchi Bandinelli apresentava uma arte provincial diferente da arte das capitais, tendendo a se afastar das convenções da « forma helenística culta». Este tipo de percepção da Antiguidade Tardia não foi diferente para o historiador francês Henri-Irénée Marrou, entre outros.

Poderia, inicialmente, parecer paradoxal aplicar o paradigma de « democratização da cultura » ao século IV, sabendo que as pesquisas dos últimos quarenta anos ressaltaram os aspectos incontestavelmente aristocráticos e elitistas do período. As pesquisas se multiplicaram sobre o tema da paideia, entre os quais as de Margarida de Carvalho. Este conceito de paideia, literalmente « educação » ou « patrimônio cultural transmitido pelo ensino », abrangia ao mesmo tempo a apropriação de uma herança cultural acadêmica transmitida por textos clássicos consagrados, uma aprendizagem da retórica, a adesão aos valores religiosos, morais e políticos tradicionais próprios da cidade antiga e a reivindicação de uma superioridade social, ao mesmo tempo natural e adquirida, que legitimava a dominação do grupo social que considerava ter o monopólio dessa tradição cultural. Ligada à tradição helênica e aos seus modos de transmissão (o ginásio, os retores e sofistas profissionais), a paideia era a marca das aristocracias citadinas do Oriente grego, caracterizava o mousikòs anér (homem amigo das musas, homem culto), equivalente, no Ocidente latino, ao doctus vir, como complemento indispensável do ideal humano do homo liberalis, ou seja, o homem totalmente livre e autônomo.

Alias, é necessário ressaltar que a vitalidade desta paideia elitista, que se reflete no alto nível da elaboração das produções literárias da época tardia, bastaria para justificar a total rejeição do conceito de decadência cultural apresentada para o fim da Antiguidade .

Foi precisamente o monopólio aristocrático da palavra antiga, ainda mais agravado pelos modos seletivos de sua transmissão até nós, que ocultou uma incontestável dualidade cultural - dualidade que não é, aliás, exclusiva das fases finais da Antiguidade. A ideologia aristocrática reconhecia apenas aos proprietários a qualidade de homo liberalis, relegando ao desprezo social todas as profissões que tinham vínculos de dependência, como os compradores (o caso dos comerciantes e artesãos), e os empregados (o caso de qualquer pessoa que recebesse remuneração, incluídos os funcionários imperiais - exceto os soldados, que eram pagos pelo Estado). O desprezo que englobava todas as atividades econômicas, excetuando-se a agricultura independente, se estendia à literatura técnica como um todo, nem mesmo os temas científicos podiam ser tratados, senão a partir de uma forma estritamente literária, que omitisse qualquer detalhamento técnico : as Geórgicas de Virgílio ou os tratados agronômicos em prosa são bons exemplos disto.

Entretanto, quando vemos a ideia desta paideia conservadora de polemizar as formas culturais concorrentes, que julga naturalmente inferiores por serem novas (fornecendo desde já argumentos ao paradigma do "Decline and fall"), já temos uma evidência de que algumas elites socioculturais não ficaram indiferentes ao aparecimento de novas tendências culturais. É por isso que o paradigma da democratização da cultura difundido por Mazzarino conserva toda sua razão de ser em todos os domínios nos quais o velho conceito de decadência apresenta seus limites: domínios tão diversos como a história do direito, das produções artísticas, da língua, da comunicação social, etc. Este paradigma permite que requalifiquemos produções culturais antes incompreensíveis : o direito tardio qualificado de "Vulgarrecht", a arte tardia apresentada como uma arte popular ou barbarizada, o latim tardio apresentado como "latim vulgar". A ambiguidade do conceito de "democratização da cultura" provém, primeiramente, do domínio político, mas é neste que ele menos se manifesta no caso da história romana tardia. Mazzarino não minimizava a estrutura fortemente hierarquizada da sociedade, a concentração dos poderes, as características absolutistas do regime imperial no fim da crise do século III. Mas, apresentava contramodelos, contrassistemas axiológicos que se desenvolveriam, não dentro do sistema imperial, mas de qualquer forma ao lado deste: não contrapoderes, mas modos paralelos. Mazzarino dava então sentido ao conceito de "democratização" para além da instituição política (pois, neste caso, não se tem democratização no sentido político, mas cultural). Por exemplo, na "guerra de línguas", no nascimento das identidades nacionais concomitante à cristianização. O colóquio de 2000 em Vercelli, na Itália, mostrou que o paradigma da "democratização da cultura" poderia ser aplicado não somente nos campos em que Mazzarino o aplicou, mas também a outros domínios bem mais vastos.

PRIMEIRA PARTE

Paradigma da "democratização como catástrofe" - Paradigma Gibboniano de "decadência".

Nos dias atuais, a ideia de que a democratização possa ser portadora do progresso, aparentemente se impôs. Não foi sempre assim, e ainda hoje o espectro da democratização "perniciosa", niveladora, regressiva não desapareceu da atualidade política. Mudou no sentido de que designa novas "classes perigosas", no caso os grupos étnicos. Basta ver como os movimentos nacionais populistas atuais repropõem para a Europa, no que diz respeito à imigração do terceiro mundo, os temas de decadência e de antidemocracia desenvolvidos desde a Revolução Francesa até o fim da segunda guerra mundial. O paradigma da "democratização catástrofe" apoiou-se sempre na convicção da existência de um abismo cultural separando classes superiores e classes inferiores. Esta dicotomia a priori entre cultura elitista e cultura popular ou vulgar, Peter Brown designa como "modelo em dois níveis". Brown se voltou para o quadro conceitual de Hume na sua obra Natural history of religion : "Aplicado à natureza das mudanças religiosas do fim da Antiguidade, o modelo em "dois níveis" incentiva o historiador a defender que uma mudança na fé dos homens do fim da Antiguidade deva ser o fruto da capitulação das elites esclarecidas da Igreja cristã diante dos modos de pensamento até aqui limitados ao "vulgar".

O modelo do nivelamento cultural - do alinhamento do nível cultural, intelectual e artístico das classes dominantes detentoras da paidea clássica às massas de rurais primitivas e aos soldados bárbaros - é a forma preferida, na primeira metade do século XX da velha teoria do declínio e da queda do mundo antigo, bem como de sua civilização. É sob esta forma depreciativa que a "democratização" apareceu como causalidade histórica: como regressão, como perda de qualidade, como processo de barbarização. Inspirado pelas interferências ideológicas da atualidade, este modelo alimentava-se de uma perspectiva tradicional dominada por preconceitos acadêmicos em matéria de literatura e de arte que o legitimava desde seu início.

A ideia de "Revolução Social do século III" criada pelo historiador russo Rostovtseff resultou, segundo o mesmo, da aliança do Estado com os camponeses que se posicionaram contra a burguesia urbana por meio da proletarização do exército. Ela levou a "uma absorção progressiva das classes superiores pelas classes inferiores, sendo acompanhada pelo rebaixamento geral dos ideais". É claro que, na perspectiva rostovtseffiana, uma democratização desse tipo só podia ser uma ilusão: "... nós nos esforçamos para mostrar que a crise social do século III foi suscitada em uma larga medida pelo movimento revolucionário das massas (aqui ele pensa na Revolução Bolchevique), levando a um nivelamento geral. Constituindo dessa forma uma democracia de escravos, o Baixo-Império romano era menos democrático do que o Alto-Império", etc. Com esta análise política - o estabelecimento de uma falsa democracia, na realidade confiscada por uma monarquia absolutista e mais desigual do que o regime "liberal" precedente, Rostovtseff transplantava uma análise catastrofista da evolução cultural que, aliás, só esboçou, só teorizou e não aprofundou em detalhes. É necessário precisar, antes de tudo, que o esquema apresentado por Rostovtseff era bastante arbitrário, porque não constatamos nem ruralização, nem proletarização do recrutamento militar no século IV e muito menos uma militarização durável do regime.

Mais recentemente, encontramos um ponto de vista relativamente próximo ao de Rostovtseff no historiador americano Ramsay McMullen: «O trono foi inicialmente ocupado e, em seguida, rapidamente cercado por pessoas de pouca cultura. Elas trouxeram consigo as atitudes e as limitações características das cidades menos desenvolvidas, das províncias, e seus modos de vida, ou seja [...], "do campo e do país". Associando « militarização » e « rustificação », McMullen apresenta um quadro desolador do declínio da cultura, da produção literária e da ciência a partir do século IV. Ele deplora a hostilidade com relação aos intelectuais, a filosofia tardia é rebaixada, por ele, ao nível da astrologia e da magia, a matemática ao nível da numerologia. Além disso, MacMullen reapresenta ideias velhas, que mesmo Rostovtseff já havia rejeitado em sua época, como a ligação apresentada por Gibbon entre decadência e cristianização. Não é de se espantar que McMullen apresente uma incompreensão total frente às análises de Peter Brown. Ele não o entende.

Brown cita Rostovteff como ponto de conclusão, arquetípico e texto de referência da tendência tradicional que foi durante muito tempo dominante para interpretar as transformações culturais do fim da Antiguidade como uma « rápida democratização da cultura das elites greco-romanas e, simultaneamente, como a diluição catastrófica das concepções de uma minoria nas crenças das massas provinciais mais primitivas ». Se Rostovtseff aplicasse mais ao plano político o paradigma da decadência pelo nivelamento e contaminação, este teria se estendido por um consenso a todos os domínios da cultura antiga tardia, literária, artística, jurídica, linguística, etc. Ele tem um efeito amálgama a partir do emprego pouco rigoroso de adjetivos pejorativos com valores semânticos próximos : « popular », « vulgar », « bárbaro », etc.

Caso da análise da arte tardia como popular

Os julgamentos de valor acadêmicos depreciavam sistematicamente as produções tardias, apresentadas como uma regressão estética com relação às convenções da arte clássica, que visavam uma imitação idealista do real e à reprodução das proporções com formas técnicas sofisticadas. Por falta de análises semióticas das produções artísticas tardo-antigas, estas foram indissociavelmente qualificadas como populares, bárbaras, tecnicamente rudimentárias, por referência, justamente, às normas da arte clássica. Assim, no início do século XX, o historiador de arte, Wladimir de Grüneisen atribuía a simplificação do retrato tardio à influência dos artesãos vindos do povo e às « influências orientais » mal definidas; para ele, a « simplificação » do retrato clássico foi um traço negativo, como um empobrecimento gráfico e como uma decadência.

O caso do latim tardio como « vulgarismo » generalizado, apresentado como barbarização e contaminação.

Os mesmos preconceitos « puristas » que se impunham aos historiadores da arte têm reinado, ainda por mais tempo no estudo da língua, fundados sobre conceitos tais como o « bom uso », oposto a uma língua dita « vulgar », ignorando a natureza fundamentalmente evolutiva de todas as línguas e suas adaptações às finalidades comunicativas. Hoje, somos conscientes da necessidade de definir toda língua, não como um sistema de norma única, mas como uma galáxia de subsistemas, de registros, de níveis, de códigos. Somos sensíveis à evidência elementar de que nenhuma língua se fala como se escreve. Por falta de registros do latim oral, tal como era falado, no mínimo podemos encontrar alguns vestígios sob forma de citação, ou mesmo diálogos da vida cotidiana. Os latinistas enfim se convenceram que o próprio Cícero, não falava como escrevia e que os escritores do século IV faziam o mesmo. Ora, o ensinamento escolar da « versão latim » ou da « versão grego » nos liceus europeus recomenda a imitação dos « bons autores », como Cícero por exemplo. Este tipo de aprendizagem só encoraja uma visão velha e fixista das línguas antigas, pois é desnecessário dizer que nenhuma língua é imutável. As línguas mudam constantemente. Esse conservadorismo linguístico só podia interpretar em termos de contaminação do bom uso a língua da gíria da populaça - ou seja, em termos de « vulgarização » à diferença entre os enunciados literários e os enunciados « standards » que são, no entanto, contemporâneos e, mais geralmente, a transformação do latim tardio, fenômeno evolutivo natural em todas as línguas. Como imaginar, sob um olhar tão fixista, que toda transformação intralinguística não seja sinal de um abandono do « bom uso » pelo alinhamento com a linguagem desviante das classes inferiores, dos bárbaros ou dos provinciais mal latinizados, ele mesmo consequência do nivelamento social e cultural pela base? Esta assimilação do latim tardio ao latim « vulgar » foi bem descrita em sucessivos colóquios, Latin vulgaire-latin tardif, que tiveram como objetivo salutar e de se opor à velha forma de análise. Em outros termos, o que chamamos de « latim vulgar » no século XIX foi a língua correta e corrente da Antiguidade tardia.

A qualificação do direito tardio como « Vulgarrecht », direito vulgar.

O grande historiador do direito romano Jean Gaudemet evocava assim a decadência da civilização jurídica romana: « Na grande época de Papiniano e de Paulo, se sucederam o Spätklassik, o Frühnachklassik e o direito vulgar ». Este último conceito, sem ligação com o direito « popular », se definia pela antítese com o direito « clássico », caracterizado pelo nível teórico elevado da elaboração do direito positivo sob a base de um raciocínio científico. Essa alta exigência intelectual e cultural se inseria na figura do iuris prudens. O « Vulgarrechet » seria o direito que se tornou « vulgar », como o direito empírico e não mais científico, se contentando em transmitir as obras canônicas da jurisprudência clássica julgadas úteis para o ensinamento. Mas o termo foi empregado de uma forma cada vez menos rigorosa, criticada por Domenico Vera e Simon Corcoran que contestaram que a formação cultural dos funcionários da chancelaria tivesse desaparecido desde a época de Constantino.

O cristianismo como religião popular

Entre os argumentos correntes sobre os quais se apoiava o paradigma da « democratização catastrófica », figurava a ideia de que o cristianismo, como religião populista, que exaltava os simples de espírito só podia impor valores vulgares e assegurar a revanche do pensamento irracional sobre a razão, da incultura sobre a cultura. O clichê do cristianismo como uma religião popular propagada primeiramente junto aos pobres e desmunidos e a ideia de que a cultura dos pobres tenha influenciado o cristianismo foi um clichê compartilhado pela historiografia agnóstica e também pela cristã de todas as convicções. Gibbon foi, durante muito tempo a principal influência, chegando mesmo a apresentar o que chamamos, anacronicamente, de passagem do « teísmo » antigo às superstições cristãs (culto de santos, relíquias, etc.), como « introdução de uma mitologia popular que procurava restaurar o regime do politeísmo ». Segundo o historiador italiano Arnaldo Momigliano, « A abolição cristã das fronteiras interiores entre os sábios e o vulgar teve implicações evidentes. Para as pessoas cultas isto significava a recepção e a aceitação de crenças desprovidas de sentido crítico e de sutileza : como os milagres, as relíquias e as aparições. ».

Em todas estas apresentações do período, o esquema recorrente é aquele da contaminação das altas esferas socioculturais pelos modos primitivos de pensar e de sentir das classes sem educação: mais do que uma democratização, uma proletarização geral do nível de desempenho artístico, intelectual e cultural. Encontra-se aqui, sem esforço, as resistências da burguesia europeia face à democratização do ensino e aos riscos de perder suas próprias posições de dominação da cultura e, através desta, de monopolização do poder político.

Para resumir esta primeira parte, eu diria que, para aqueles que defendem a « democratização-catástrofe », há uma forte ligação entre cristianização e recessão cultural, cristianização cultural e Oriente, classes populares « perigosas » e Oriente, cristianismo e religião popular, classes populares e barbarização. A reação em favor de uma « democratização positiva », tal como se pode ver no desenvolver da segunda metade do século XX é então, logicamente, concentrada sobre a cristianização da cultura, sobre os fenômenos orientais, sobre a análise sociológica do mundo provincial e sobre o impacto da hibridização bárbara.

SEGUNDA PARTE.

Da « democratização catástrofe » à « democratização positiva »: Inversão do paradigma, correntes históricas dos anos 50-60.

Uma visão mais rica dos conteúdos culturais e de suas novas condições de circulação, dá um novo sentido ao paradigma da « democratização ». Numerosos são os domínios de estudos que concorrem para reavaliação. Apresento aqui um rápido inventário comentado.

Os novos atores e os vetores culturais

A exigência cada vez mais forte de desenvolver uma sociologia dos fenômenos culturais pôs em foco o surgimento, na época tardia, de novos atores e vetores culturais, tais como o monge, o militar, o burocrata, o bárbaro, etc. No que diz respeito à Igreja, o grupo eclesiástico subalterno, por causa da falta de fontes, é muito mal conhecido se comparado com o que conhecemos em relação aos bispos. O escritor Firmico Materno apresenta algumas das « novas profissões » que são recrutadas no nível curial e não senatorial : o que qualificaríamos hoje como « profissionais intermediários »: os burocratas (scribae de governadores, de magistrados, do senado, funcionários executivos do príncipe, chefes do serviço da chancelaria ou dos serviços fiscais, tanto na esfera pública quanto privada), os intendentes ou os administradores (actores aut procuratores) que estavam a serviço dos grandes proprietários absenteístas, ao lado das figuras mais tradicionais da sociedade antiga, os mestres de retórica (rhetores) e de gramática (grammaticii), cuja importância social cresce, como mostrou Robert Kaster . Estes detentores de emprego médio, colocados em posições estratégicas da comunicação social, veiculavam, todavia, valores diferentes daqueles da aristocracia. Pertencem ao meio que Aulo Gélio designava com desprezo como vulgus semidoctum (pessoas mediócres, pouco sábias).

Pode-se acrescentar a estes novos atores culturais, as mulheres, que têm um papel ativo na transmissão da cultura cristã. A polemica pagã não se engana com o exemplo de Célsio, que designa as "mulheres idiotas" (gynaiôn tinôn anoètôn)" como agentes da subversão religiosa no seio das famílias, pois tais mulheres se contaminavam quando se misturavam aos domésticos e aos fornecedores que encontravam cotidianamente e que constituíam, para o vir doctus, a parte mais inculta da sociedade humana, a mais estranha à paideia e à aprendizagem da razão.

A arte tardia

Desde 1901, o historiador de arte Aloïs Riegl tinha "libertado" a arte antiga tardia da acusação de ter se tornado uma arte popular, explicando-a por uma mudança na vontade expressiva e nas mensagens transmitidas àquilo que se habitou atribuir à falta de técnica dos artistas "vindos do povo". Reigl explicava o abandono das convenções clássicas nas artes plásticas pela intenção de exprimir a transcendência, mais do que a forma e pelo interesse colocado no conteúdo, ou seja, na finalidade exterior da obra de arte, mais do que a reprodução realista das formas naturais.

No ano de 1959, Ranuccio Bianchi Bandinelli se liberou também do julgamento acadêmico, chegando a afirmar que o naturalismo idealista do classismo helênico, longe de se inscrever em um "sentido da história" progressista, tinha representado um acidente de percurso na história da arte universal. Foi a partir de um "fundo não figurativo primitivo", capaz de um grande refinamento, que teriam se inspirado "as tradições artísticas indígenas", que esperavam somente o enfraquecimento da tradição helenística para tomar posse do terreno. A Antiguidade Tardia teria então visto, não a criação de uma arte nova, mas a retomada, encorajada pelas circunstâncias, das tradições artísticas indígenas, prolongando, segundo Bandinelli, "uma concepção fundamentalmente não figurativa, originada e largamente corrente na época neolítica", sem necessitar de influências bárbaras exteriores : elas "saem da substância da civilização imperial". Todavia, Bianchi Bandinelli continuou fiel ao senário rostovtseffiano, com relação à evolução social, associando o fim do "naturalismo helênico elegante" à ascensão ao poder das classes plebeias, eliminando a velha classe patrícia, consequência da falta de unidade imperial. Isto feito, se voltava ao paradigma da "democratização catástrofe".

A língua

A questão da pretendida decadência linguística do mundo antigo foi retomada e renovada sob seus dois aspectos principais.

Com relação às novas línguas "nacionais" concorrentes do grego, as pesquisas recentes dissiparam o mito do caráter popular de sua origem ou de sua difusão. Neste caso, para o copta, ou seja, a língua egípcia transcrita em alfabeto grego, a pesquisa recente dissipou o clichê de uma origem pretendidamente popular de seu uso, mostrando que foi criada por "letrados bilíngues" desprovidos de pensamentos nacionalistas ou separatistas. No caso do siríaco, ou seja, da ascensão ao estatuto de língua escrita do aramaico (língua mais difundida no Oriente na época romana) para língua falada pela maior parte da população oriental, sua difusão como língua de uso corrente é tardia (século VI) sobre o território controlado por Roma. Porém do lado Persa, desde o século III, o siríaco já era ao mesmo tempo a língua de cultura e a língua usual. Em outras províncias, uma situação de bilinguismo em diversos níveis parece se manter até o século V. Para a Gália, Greg Wolf exclui que o gaulês-latim tenha sido "a língua intermediária de grupos socialmente, culturalmente ou politicamente entre os Gauleses e os Romanos". Por mais que os textos galo-latinos tenham sido produzidos por estes que, em um certo sentido, eram ao mesmo tempo Romanos e Gauleses", não existiu guerra de línguas nas províncias do Império.

Por outro lado, o fenômeno complexo da passagem do latim às línguas românicas foi enfim estudado de forma científica, restituindo à língua sua função comunicativa, a diversidade de seus registros ou níveis de realizações, seguindo a gama diversificada dos níveis de competência e da performance de seus utilizadores. A equação latim tardio = latim vulgar se perdeu, ao mesmo tempo que se fez recuar vários séculos evoluções antes consideradas como tardias, mas cuja aparição deve ser atribuída à evolução natural da língua falada. Quanto à constituição das línguas românicas, tardiamente separadas do latim, é hoje reconsiderada na perspectiva de uma evolução interna da língua latina que minimiza o papel das línguas vernáculas neste processo. Esta evolução interna é confirmada pela universalidade das leis de passagem do latim para as línguas românicas nas diversas regiões ocidentais desde a Ibéria até a Dácia. O traço essencial desta transição do latim às línguas românicas, a passagem de uma língua "sintética" para línguas "analíticas", não pode ser considerado como característica de uma língua mais popular.

O caso das línguas técnicas

O florescimento dos tratados técnicos é uma particularidade da Antiguidade Tardia, sobretudo se considerarmos as tendências mais técnicas e menos literárias que as predecessoras. O notável estudo de John N. Adams intitulado "Tratado de arte veterinária de Pelagônio" desqualifica o conceito de "latim vulgar", mostrando como a linguagem técnica e profissional se constituiu a partir da língua corrente, sem se afastar, todavia, das tendências gerais, sem renunciar também à linguagem educada, sem reticências com relação ao léxico "rústico", perfeitamente integrado à língua corrente.

O caso de Paládio, autor de um "Tratado de Agricultura", é interessante para análise, pois no prefácio, o autor escreve que o livro é destinado aos rustici; em consequência, renuncia aos vãos ornamentos estilísticos. Ao mesmo tempo não lhe falta o purismo, nem a preciosidade com a língua. Isto não é contraditório, porque, se por um lado Paládio apresenta aos seus pares sinais de identificação com eles, por outro, preocupa-se em conservar o nível de acessibilidade que se tinha proposto. Conseguia então falar a vários públicos ao mesmo tempo. Cassiodoro recomendava a leitura de Paládio aos seus monges, ressaltando suas qualidades de explanator, de vulgarizador. Dizendo isto, Cassiodoro não deixava de ser um homo disertissimus, pois era capaz de se distanciar de sua cultura super elitista para julgar este tratado adaptado ao nível cultural e linguístico do público para o qual era destinado, os rustici.

Este senador aristocrático respeita a igual dignidade dos homens, sejam eles cultos ou não, dotados ou não para os trabalhos espirituais. Cassiodoro vê os homens como todos igualmente necessários para a conclusão das coisas divinas. Por meio da literatura técnica tardia, podemos ver a expansão da comunicação social e encontrar os registros intermediários da língua sub representada nos textos que chegaram até nós.

O cristianismo como fator de "democratização da cultura"

O público revindicado pelos cristãos é o "povo simples". Assim, no Pseudo-Clementinas, o retrato ideal do comunicador dos desenhos de Deus é Barnabé, que não falava com "uma finesa puramente retórica", mas "com simplicidade e sem circunlocução". O cristianismo, cujos aspectos de "populismo cultural" são cada vez mais refutados, não precisou alfabetizar as massas para sensibilizá-las sobre a existência de textos escritos e importantes para a salvação. O problema não era propiciar uma compreensão escrita dos textos, mas torná-los compreensíveis oralmente; e parece que a Igreja, em alguns séculos, teve sucesso. Momigliano falava sobre a "teologia para a massa". Seja como for, a cristianização contribuiu fortemente para renovar as condições sociológicas da comunicação e da cultura. A questão dos públicos e dos seus diversos níveis de participação a uma inspiração cultural por natureza unificadora apresenta-se ainda hoje como um apaixonante campo de estudo.

Os teólogos eclesiásticos e os condutores de homens souberam tirar partido das possibilidades de trabalhar mais com as competências orais do que com as escritas no contato com o público. Atanásio, o bispo antiariano de Alexandria, contentava- se em constatar que seu poema antiariano, que expunha posições doutrinais complexas em forma popular, era cantado até nos albergues de Alexandria. Agostinho, justificando as razões que o tinham conduzido a compor o Psalmus contra partem Donati , exprimia- se assim: "Eu quis que a causa dos Donatistas conseguisse atingir a consciência do povo mais humilde, dos ignorantes, dos iletrados, e que ela se gravasse em sua memória." Com efeito, tratava-se em responder ao adversário donatista em seu terreno sociológico e com as suas próprias armas. Por si só, o refrão pode dar uma ideia da simplificação verbal e métrica operada: "Vos qui gaudetis de pace, modo verum iudicate." Como vemos, a polêmica religiosa contribuiu muito para o desenvolvimento de uma língua capaz de exprimir simplesmente as ideias complexas, contrariamente a toda uma tradição elitista da paideia que defendia uma concepção exclusiva da cultura e que multiplicava artificialmente em barreiras comunicativas de modo que a massa, o "vulgum pecus", fosse deixada de lado.

As novas tipologias culturais penetravam nas classes superiores, que as incorporavam segundo suas próprias configurações mentais. Um exemplo é apresentado pelas leituras das mulheres piedosas do círculo de Jerônimo. Como mostra Averil Cameron, "não foi o controle da cultura superior por alguma coisa de substancialmente mais popular, mas a abertura de novos canais comunicativos absorvendo os elementos que tinham, desde o início, pertencido ao discurso cristão: a importância dada à figuração, o emprego do paradoxal e da narratividade" .

Do ponto de vista dos sistemas de valores, a pressão da mensagem evangélica sobre a moral social, no sentido de uma democratização, é bem mais ambígua. As práticas sociais podiam estar em atraso aos discursos sobre as condições sociais terrestres e o discurso sobre essas mesmas condições. Assim, Agostinho elabora o início de uma superação dos preconceitos inveterados contra o comércio e os comerciantes. Mas, ao mesmo tempo, mostra-se muito prudente com relação ao estatuto jurídico dos indivíduos, que conhece o quadro da audientia episcopalis, instituição judiciária delegada aos bispos. Agostinho respeita então, escrupulosamente, as noções humanas de liberdade e de servidão (Lettre 24* Divjak), conforme a divisão fundamental que estabeleceu entre a cidade terrestre e a cidade celeste.

Passar-se-á, igualmente, na conduta da "caridade eversiva" de Melânia, a Jovem, e de Piniano. Este casal de riquíssimos herdeiros de patrimônios senatoriais distribuíram suas terras aos pobres e libertaram em massa seus escravos. Sem dúvida tal gesto era eminentemente aristocrático (mutatis mutandis, um tipo de neo-graquismo); sem dúvida esse comportamento foi vigorosamente condenado pela aristocracia dominante e pela própria Igreja. Todavia, o fato de ter sido possível, mostra a extensão do conflito de valores colocado pela cristianização. Além disso, a condenação do "extremismo" de Melânia e de Piniano não implica a rejeição dos valores que os inspiraram, mas denuncia uma dilapidação, com consequências perigosas, para a continuação política da ordem senatorial e os efeitos ineficazes com relação à própria caridade. Melhor seria que a doação voluntária em favor dos pobres passasse pela intermediação da Igreja, pronta a administrar um patrimônio garantido a continuidade. Mesmo que devamos relativizar procedimentos e discursos minoritários, parece-me, de toda forma, que se pode falar em "democratização" da cultura, no sentido em que uma concorrência foi conhecida e admitida para o poder político, e interiorizada por alguns dos atores sociais dominantes, entre valores sociais estabelecidos e valores preconizados pelo cristianismo.

Desde 1980 questionava-se a hierarquia de valores culturais que o cristianismo induziu em alguns "privilegiados culturais", perfeitos representantes da cultura aristocrática. Em primeiro lugar, os valores literários: tendo que defender as Escrituras contra os pagãos que viam nelas histórias para velhinhas, os intelectuais cristãos se viram forçados a colocar em prática um discurso pobre, mas verídico, acima das mentiras da retórica mais bem elaborada. Invertendo a acusação pagã, Arnóbio mostra que um trivialis et sordidus sermo (discurso trivial e pobre) é uma garantia de verdade, pois ele pode dispensar as sutilezas da dialética, da lógica e da retórica que só servem de muletas para falsos raciocínios. A pobreza estilística e linguística das Escrituras obriga, então, aos aristocratas convertidos a admitir e justificar uma exceção abissal em todo seu sistema de referências mentais, colocando em questão os próprios valores da paideia que faziam parte de sua indentidade de classe. Também com relação aos valores intelectuais: Jerônimo proclama a vaidade da ciência. Eusébio considerava ímpios os esforços da ciência para explicar racionalmente os fenômenos que exprimiam apenas a vontade divina; e considerava como heréticos aqueles que aplicavam a dialética estoica aos dogmas trinitários. Ora, tal atitude não se explica pelo suposto caráter "popular" do cristianismo das origens, como ainda defende Ramasay MacMullen. Ela se explica pelo fato da nova religião ter se difundido, pelo contrário, de cima para baixo na sociedade, pois os membros da elite sociocultural não podiam se tornar cristãos sem dar uma reviravolta em todo seu sistema de valores precedente. Quando, por exemplo, alguns membros da aristocracia se transformavam em monges (ao contrário das lendas falsas, os monges não vinham das classes inferiores da sociedade), é precisamente porque a espiritualidade ascética exigia dos membros das classes superiores, formadas pela paideia clássica, uma total reconversão intelectual que vemos se exprimir nos Apophtegmata Patrum (coletâneas de sentenças de anacoretas egípcios) um anti-intelectualismo exagerado. É essa apologia à ignorância, provocadora, que os comentadores do passado, hoje ainda seguidos por MacMullen, tiveram a ingenuidade de considerar como descrição realista do nível cultural dos monges. Sem dúvida, não era supérfluo repetir indefinidamente aos "herdeiros culturais" da época um discurso antídoto. Esta revolução interior não foi menor para os bispos que, sobretudo quando provinham das classes superiores, se encontravam entre as altas exigências intelectuais e culturais da exegese textual ou da polêmica doutrinária, e a necessidade de tornar as Escrituras acessíveis aos fiéis incultos ou analfabetos (rudes, illiterati). Pode se perguntar como conseguia co-habitar em Cassiodoro, autor das Variae e das Institutiones: exemplo extremo de dupla personalidade intelectual e cultural.

Deste conjunto de novas análises saem linhas de convergência

Parece-me que, ao longo de meio século de pesquisas, se criou alguns paralelismos nos métodos de análise e nos paradigmas que, por sua vez, revelaram alguns paralelismos substanciais no tecido cultural da Antiguidade Tardia.

Uma dessas questões me parece se estabelecer entre o gosto pelo retrato tal como mostrou André Grabar e o gosto pela narração tal como analisou Averil Cameron. Nos dois casos aparece o mesmo desejo de figurativismo, acompanhado pela procura de uma forte expressão afetiva, particularmente visível no caso da figura de Maria, exercendo em paralelo um papel de guia na elaboração da narrativa cristã e no desenvolvimento das artes plásticas cristãs, em particular dos sarcófagos. Quanto à expressão simbólica (por exemplo, o olhar dos imperadores), tal expressão pode aparecer aos defensores de uma estética winckemaniana como mal feita, ingênua, incapaz de manter as normas clássicas e as capacidades técnicas de uma "idade de ouro" da criação artística. Foi recentemente que a aproximação feita com os Panegíricos imperiais restituiu sua significação simbólica e ideológica ao fulgor oculorum dos retratos imperiais. O caminho não fora já traçado por Aloïs Riegl, ao colocar em paralelo as passagens de Agostinho relativas à arte com tendências de fundo na produção artística tardia?

Um outro caso de paralelismo me parece estar em torno do conceito de comunicação. Da comunicação linguística à comunicação social: citamos a título de exemplo as aclamações cívicas, o cerimonial do adventus, as facções, as relações de patrocinium, o culto dos santos, as relíquias, a pastoral, os ritos mortuários, as vestimentas, os gestos, os fenômenos de aculturação. Nestes diversos campos de análise o paradigma linguístico encontra seu papel de guia para o conjunto das ciências humanas.

Funcionalidade das linguagens de comunicação, pesquisa de semântica social : André Grabar não se pergunta mais se os retratos cristãos eram esquemáticos e estereotipados, porque eles respondiam às exigências de um público "democratizado" e saiam do atelier de artistas degradados em artesãos "vulgares". Ele se pergunta: "O que os cristãos da Baixa Antiguidade esperavam destes retratos?". Compararemos esta questão com a de Peter Brown se perguntando : "A que tipo de expectativa e a que tipo de necessidade respondiam os homens santos aos homens da época ?" Ou ainda, com a iniciativa de Averil Cameron: " que tipo de narrativa as mulheres e os homens desta época tinham vontade de escutar ?" Ora, o conceito de intencionalidade que guia e aproxima as diversas análises se encontra já expresso e resumido, de uma forma antecipadora, no termo "Kunstwollen". Segundo Reigel, "O homem não é somente um ser passivo que percebe com seus sentidos, mas também um ser ativo que quer descobrir o mundo pela sua própria vontade (variável segundo o povo, o lugar e o tempo)." O conceito riegliano de obra de arte, interpretando a realidade segundo o desejo do homem, é curiosamente próximo do conceito de "história que as pessoas querem escutar" de Averil Cameron. Ao mesmo tempo, Riegl relaciona a arte desta época a uma Weltanschauung (concepção de mundo) compartilhada por todos os homens da época - ele não apresenta nenhuma discussão sobre este tema - separando claramente a "arte popular" da "grande arte" falando a todos. Prefigura, assim, a rejeição atual do "modelo em dois níveis", ao mesmo tempo em que direciona sua análise para um viés mais elitista. Essa Weltanschauung (concepção de mundo) modelada pelo cristianismo lhe parecia introduzir na obra de arte uma ligação mágica - e não mecânica - entre as formas sensíveis. Mas longe de ver nessa evolução uma regressão cultural do tipo "vulgar", justificava, ao contrário, a arte tardo-antiga, tão diferente da arte da fase precedente, como uma etapa necessária do desenvolvimento da aventura artística humana.

Arte e religião tiveram um papel central na mutação do paradigma "democratização da cultura" e na inversão do tipo catastrofista ao tipo progressista. Para Mazzarino, precisamente, como indica Andrea Giardina, as raízes da inversão das perspectivas de Rostovtseff devem ser procuradas "ao lado da história das religiões e ainda mais na história da arte".

Um paralelismo de conjunto aparece entre o abandono progressivo da ideia do cristianismo como "religião popular" e a ideia do caráter popular das línguas "nacionais" e de sua difusão. No entanto, mais globalmente ainda, é o fato de colocar em causa as distâncias entre cultura elitista e cultura popular.

A existência de tal distância entre cultura elitista e cultura popular não cessou de ser questionada ao longo das décadas passadas, na medida que se aprofundava a análise das relações entre classes dominantes e classes dominadas.

No estudo do discurso cristão, Avereil Camron não cessou de criticar a ideia da literatura cristã compreendida como "popular". Denunciou, em particular, o cliché das Vidas dos santos apresentadas como "narrativas vindas do povo e destinadas ao povo", tendo como objetivo representar "a fé popular do II e do III séculos". Esse tipo de contrassenso ilustra a maneira mais clara, como para a produção artística ou a história das línguas, os efeitos desastrosos dos julgamentos de valor pré-concebidos. Com relação à outra extremidade do espectro social, Averil Cameron colocou em evidência a infiltração nas classes superiores das novas características culturais.

Mudança na representação do processo geral da cristianização: como mostra Ewa Wipszycka, "nada nos autoriza a pensar que o povo era mais aberto ao cristianismo do que a elite. A divisão da sociedade em pagãos e cristãos era uma divisão vertical. Um dos traços da religião cristã, na época que nos interessa, era esta capacidade de atrair alguns representantes de todas as camadas sociais, de todos os níveis da cultura." Igualmente em linguística : Michel Banniard recusa a distinção entre um latim vulgar, línguas dos iletrados e incultos, e um latim literário, língua da elite.

Em suma, é particularmente significativo ver como, de uma forma complementar, Santo Mazzarino re-habilitou a cultura do Império tardio com sua apreciação positiva de "democratização" - assim se desligando de preconceitos elitistas que menosprezavam o período pelos historiadores classicizantes, conformistas, enquanto Peter Brown re-habilitava o que passava por uma cultura "popular", uma subcultura de analfabetos, como cultura do conjunto das classes sociais, compreendendo também as classes superiores. A forma na qual Mazzarino "mudou" as fórmulas de Rostovtseff para converter a "democratização catástrofe" em "democratização positiva" passou, ela também, por uma redefinição das relações entre os níveis da sociedade.

Conclusão

O paradigma da "democratização da cultura" não recebeu o interesse que merecia, foi rapidamente esquecido ou abandonado. Mazzarino é um pouco responsável, pois tinha um estilo enigmático, quase incompreensível no mundo científico anglo-saxônico. Apesar disto, este paradigma foi colocado numa posição central na nova forma de ver a antiguidade tardia. Sob sua formulação mazzariniana ou em outras formas, conscientemente ou inconscientemente, este paradigma acompanhou, alimentou, animou pesquisas e polêmicas.

Este paradigma conserva todo seu valor heurístico e operatório no esforço pluridisciplinar, visando à melhor compreensão das transformações dos séculos III e IV (mesmo além). Sem poder, ele próprio, fornecer uma resposta, é difícil esgotar suas capacidades de estimulação intelectual, de elucidação e de colocar em perspectiva as evoluções socioculturais do período. Hoje ainda, permanece a forma talvez mais econômica para designar metaforicamente um terreno de investigação científica nos contornos evolutivos, o meio mais cômodo de entrar em acordo para designar um conjunto de objeto de estudo e um tipo de questionamento, com as acepções diferentes segundo os domínios nos quais se aplica. É um paradigma flexível que tem seu sentido a partir do tema em que o aplicamos.

Qualquer que seja o domínio, o período, o contexto no qual aplicamos o paradigma de "democratização da cultura", uma das suas contribuições mais proveitosas me parece ser a forma como ajuda a conhecer as relações entre elite e massa: não como uma justaposição de dois mundos fechados um sobre o outro, mas como uma coexistência ativa. Desse ponto de vista, tendemos atualmente a privilegiar, na cultura da antiguidade tardia, não mais o rebaixamento das formas superiores da cultura clássica colocada à disposição das massas, mas o surgimento de domínios culturais entre classes dominantes e dominadas. O fenômeno é particularmente claro na produção cristã, recortada entre expressões elitistas (teologia, recuperação da herança clássica e mesmo emulação com esta) e expressões populares. A novidade é que os mesmos atores sociais (por exemplo os bispos de origem senatorial ou os bispos vindos de uma cultura aristocrática de classe) tenham tido, pelo cristianismo, o dever de interpretar a cultura em seus diversos níveis. Agostinho ensinava o cristianismo aos iletrados, rudes. Cassiodoro procurava educar os monges, etc. É por isso que nas pesquisas das últimas décadas os problemas relativos ao público e a comunicação são levados ao primeiro plano. Um outro domínio incontestável de pertinência do paradigma é o estudo dos efeitos da cristianização sobre as práticas culturais e as atitudes das diversas classes no que diz respeito a cultura.

Agradecimentos

Primeiramente, gostaria de agradecer à Senhora Professora Margarida Maria de Carvalho (Unesp-Franca) que me convidou para proferir esta conferência e ao Senhor Professor Fábio Faversani (UFOP) que convidou Deivid Valério Gaia para a tradução da mesma. Agradeço também aos senhores colegas que nos receberam com muito carinho em suas respectivas universidades : Cláudia Beltrão (Unirio), Fábio Faversani (UFOP), Gilvan Ventura da Silva (UFES), Norberto Luiz Guarinello (USP), Pedro Paulo de Abreu Funari (UNICAMP), Regina Bustamante (UFRJ) e Renan Frighetto (UFPR). Agradeço ao meu aluno Deivid Valério Gaia por traduzir este texto. Por fim, agradeço vivamente toda a equipe de pesquisadores do Laboratório de Estudos sobre o Império Romano (Leir - Nacional).

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Tradução recebida em 03/2010.

Aprovada em 04/2010.

Jean-Michel Carrié. Elitismo cultural e "democratização da cultura" no Império Romano Tardio. Conferência de abertura do XI CEAM e I GEAM / LEIR da Universidade Estadual Paulista - UNESP, Campus Franca. Agosto de 2009.

Deivid Valério Gaia

Mestre e Doutorando em História e Antropologia da Antiguidade / História econômica e social do mundo antigo - École des Hautes Études en Sciences Sociales - EHESS - Paris e pela Universidade de São Paulo sob a orientação de Jean-Michel Carrié e de Norberto Luiz Guarinello. UMR8567 - EHESS/CNRS 2, Rue Vivienne, 75002, Paris, França. Membro do Centre Louis Gernet - recherches comparées sur les sociétés anciennes e do Laboratório de Estudos sobre o Império Romano LEIR/USP-MA. E-mail : deivid.valeriogaia@ehess.fr

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Set 2010
  • Data do Fascículo
    2010

Histórico

  • Recebido
    Mar 2010
  • Aceito
    Abr 2010
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