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Território Neutro: soberanias justapostas e duelos de honra às margens dos estados nacionais sul-americanos de meados do século XIX às primeiras décadas do século XX

Neutral Territory: Juxtaposed Sovereignties and Duels of Honor at the Margins of The South American National States from the Middle of the 19th Century to the First Decades of the 20th Century

RESUMO:

O presente artigo pretende discutir as relações entre as práticas de duelos de honra com a legislação penal e as fronteiras nacionais. Está organizado em três partes: (a) o Estado nacional e a fronteira, na qual se busca abordar como a historiografia tem lidado com a atuação do Estado nos espaços de fronteira e os aspectos das soberanias justapostas que colocam margens de ação para os indivíduos; (b) as discrepâncias das legislações sobre duelo de honra na Argentina, Brasil e Uruguai e suas soluções jurídicas díspares para o fenômeno; e (c) a busca dos duelistas por territórios neutros, analisando-se casos de duelos em espaços de fronteira. Por fim, pretende-se uma melhor compreensão da honra, e de seus sistemas de defesa, na transição de sociedades aristocráticas para as sociedades burguesas com a necessária reconfiguração de seus significados e uma reestruturação de suas definições sociais.

Palavras-chave:
honra; duelos de honra; fronteiras nacionais; legislação penal; Estados latino-americanos

ABSTRACT

This article discusses the relations between the practices of honor duels with criminal law and national frontiers. The article is organized in three parts: (a) the national State and the frontier, approaching how historiography has dealt with the State action in its borders and the aspects of the juxtaposed sovereignties that defines margins of action for the individuals; (b) the discrepancies of the laws regarding honor duels in Argentina, Brazil and Uruguay, and their different legal solutions to the same phenomenon; and (c) the search of the duelists for neutral territories, where cases of duels in border spaces are analyzed. Finally, a better understanding of honor and its defense systems is sought in the transition from aristocratic societies to bourgeois societies with the necessary reconfiguration of its meanings and restructuration of its social definitions.

Keywords:
honor; duels of honor; national borders; criminal legislation; Latin-American States

Em 16 de julho de 1938 estampava como manchete de capa do jornal A Razão, de Santa Maria, Rio Grande do Sul, a notícia do dia anterior de um desafio para duelo ocorrido em Porto Alegre.

“DESAFIADO PARA UM DUELO!

Em consequência de um incidente na sede da Federação Rural e dr. Roni Lopes de Almeida enviou seus padrinhos ao dr. Aníbal di Primio Beck

Porto Alegre, 15 (R) - Ontem á tarde registrou-se um incidente na sede da Federação das Associações Rurais, entre os drs. Aníbal di Primio Beck, presidente daquela entidade de classe, e Roni Lopes de Almeida, membro do conselho consultivo técnico.

O incidente foi assim divulgado: na tarde de ontem compareceu á Casa Rural o dr. Roni Lopes de Almeida. Ao chegar ali, encontrou-se com o dr. Aníbal de Primio Beck, com quem começou a discutir sobre assuntos referentes á Federação Rural. Em face dos termos empregados pelo dr. Roni Lopes de Almeida, o dr. Aníbal di Primio Beck revidou-os avançando contra aquele. O incidente não tomou, na ocasião, maiores proporções devido á pronta intervenção de outras pessoas que se encontravam na sede, da qual depois se retirou o dr. Roni Lopes de Almeida.

Agora, porém, o dr. Roni L. de Almeida, desafiou o dr. Aníbal di Primio Beck para um duelo a realizar-se no território uruguaio.

Ao mesmo tempo, o dr. Roni Lopes de Almeida, escolheu os seus padrinhos, que são os drs. Homero Fleck e Candido Carrion.

Não se sabe até agora, entretanto, qual tenha sido a resposta do dr. Aníbal di Primio Beck.

Numerosos amigos de ambos procuram harmonizar a situação, procurando uma formula de evitar a reparação pelas armas. (JORNAL A RAZÃO, 16/07/1938, capaDESAFIADO para um duelo! Jornal A Razão, Santa Maria, 16 de julho de 1938, capa.)

A transcrição da matéria nos apresenta um caso de defesa da honra através de duelo, no qual estavam envolvidas pessoas da elite econômica e política do Rio Grande do Sul. Sabendo-se que os duelos eram práticas de desagravo reservadas às elites, até aí, a notícia do jornal não indica nenhuma novidade. Por outro lado, considerar que no Brasil a prática de duelos também foi um expediente ao qual a elite recorreu, sendo que esse caso não configura uma excrescência ou excepcionalidade, é possivelmente o princípio de uma nova contribuição nesse campo de estudos. Contudo, a proposição geral desse artigo nasceu de outro elemento presente nessa notícia: a busca pelos contendores em realizar o duelo em território uruguaio.

No mesmo jornal, dois anos antes, localizamos outra notícia semelhante:

O duelo Cascardo-Marinho

Afirma-se que o general Gois Monteiro só poderá servir de testemunha fora do território nacional

Por isso anuncia-se que o comandante Cascardo vai escolher novo padrinho

Rio, 4 (R) - Continua na ordem do dia o duelo entre o comandante Hercolino Cascardo, presidente da Aliança Nacional Libertadora, e o sr. Roberto Marinho, diretor do vespertino “O Globo”.

Nas rodas ligadas aos dois duelistas não se sabe se o duelo será efetivado em virtude de determinados inconvenientes surgidos á ultima hora.

Entre esses está o caso do general Gois Monteiro que como padrinho do comandante Cascardo, só poderá servir de testemunha no duelo uma vez que este realize fora do território nacional.

Entretanto, afirma-se que o ex-ministro de guerra não desistirá de ser uma das testemunhas caso os duelistas sigam para o Uruguai, onde o encontro pelas armas faz parte da lei.

Noutras fontes, porém, afirma-se que tanto o comandante Cascardo como o jornalista Marinho desejam bater-se em território nacional.

Por isso, espera-se que o presidente da Aliança Nacional Libertadora resolva convidar outra testemunha para o seu caso. (JORNAL A RAZÃO, 10/07/1935O DUELO Cascardo-Marinho. Jornal A Razão, Santa Maria, 10 de julho de 1935, p. 2.)

Esses indícios iniciais levantaram uma série de questionamentos e possibilidades de análises. A primeira diz respeito aos contextos fronteiriços e o papel desempenhado pelo Estado nesses espaços, bem como, a justaposição de soberanias e legislações que ali se colocam e oferecem aos indivíduos diversas possibilidades entre as descontinuidades legais que deixam margens de ação. A segunda, decorre do primeira, mas refere-se especificamente às distintas legislações sobre duelo adotadas pelos países da tríplice fronteira, Argentina, Uruguai e Brasil.

A partir desses primeiros casos, a continuidade das pesquisas apontou inúmeros outros que, se não se colocavam exatamente no mesmo molde daqueles, de indivíduos que atravessam a fronteira especificamente rumo ao Uruguai para duelar, ou aventaram transpor esse limite político para esse fim em busca de amparo legal para realizar os duelos, apresentavam situações de homens que buscaram outras fronteiras internacionais para a realização de duelos pelo mundo. Esses demais casos abriram, por fim, novas perguntas e mais uma frente de análise. Ao tomarem esses espaços limítrofes como territórios neutros, indicavam que a justaposição de soberanias também funcionava para colocar-se a salvo de punição. Nesses casos temos que observar que a fronteira entre os Estados nacionais serviu de forma diferente ou, de maneira mais sútil, interpretada diferentemente pelos atores sociais envolvidos. Dado que a prática de duelos de honra era reiterada na maioria dos países latino-americanos, fica a indicação de que a transposição da fronteira política de seus Estados era um recurso utilizado pelos duelistas para fugirem da perseguição da lei, dada a sua proibição na grande maioria dos países, ou pelo menos para amenizarem o controle da justiça sobre esses confrontos em defesa da honra.

Dessa forma, o presente texto está organizado em três partes, a saber, (a) o Estado nacional e a fronteira - no qual busca-se abordar como a historiografia tem lidado com a atuação do Estado nos espaços de fronteira e, a partir disso, propor uma compreensão que nos leve a considerar o aspecto das soberanias justapostas que colocam margens de ação para os indivíduos; (b) as discrepâncias das legislações sobre duelo na Argentina, Brasil e Uruguai - que apresenta as soluções jurídicas díspares adotadas por esses três países, as quais possibilitaram um dos formatos mais bem-acabados desse modo de valer-se da descontinuidade legal existente entre estados; e, (c) território neutro - os casos de duelos em espaços de fronteira - o qual apresenta os episódios de duelo localizados que correspondiam ao formato de terem acorrido a regiões limítrofes para sua realização. Nessa parte retomaremos a questão da justaposição de soberanias e a possibilidade de compreender esses espaços como “territórios neutros”.

O Estado nacional e a fronteira

O significado mais evidente de uma fronteira é o de ser o local de vizinhança com o outro, seja este outro um país, província, soberania, etc. Nesse sentido, toda e qualquer fronteira traz a característica intrínseca da ambiguidade, uma vez que é “confins e limite de país, tanto separa Estados quanto os põe em contato” (PADRÓS, 1994, p. 68PADRÓS, Enrique Serra. Fronteiras e integração fronteiriça: elementos para uma abordagemconceitual. Humanas, Porto Alegre, v. 17, n. 1/2,p. 63-85, jan./dez. 1994.).

Ao levar em conta essa contradição inerente da fronteira, que tanto delimita quanto relaciona duas comunidades, avançamos sobre uma historiografia tradicional, tributária do nacionalismo territorialista, e podemos perceber ser inviável considerar que a fronteira, qualquer fronteira onde haja um mínimo de povoação em ambos os lados, possa exercer um papel absoluto de barreira entre as comunidades. Da mesma forma, percebe-se ser inviável considerar que as únicas relações que podem ser travadas entre os dois lados de uma fronteira sejam belicosas, a fim de proteger ou expandir o território. Essa concepção conservadora também incorria no equívoco de partir de uma ideia preconcebida de Estado e Nação, identificada com os limites político-administrativos que foram definidos muito posteriormente, como se os territórios estivessem fadados a fazer parte daquele mapa desenhado (supostamente) desde sempre, exaltando o pertencimento nacional evidente e inerente e direcionando a explicação para legitimá-lo, em detrimento do processo histórico de avanços e recuos do limite e dos diferentes grupos e agentes que atuaram nesses processos para além dos Estados e seus poderes instituídos envolvidos.

Vencido esse tipo de interpretação tradicional a respeito dos contextos fronteiriços funcionando unicamente como barreira e atribuindo um papel exclusivamente belicoso, de expansão e/ou defesa, aos Estados, análises que se dedicaram a contrapor essa versão voltaram seu interesse a ressaltar que as fronteiras são construções, e não determinações a priori, bem como, em ressaltar a dimensão da integração fronteiriça promovida pelas comunidades independente das relações estabelecidas entre os Estados ou da ação dos mesmos nesses espaços. Nesse sentido, definiu-se a distinção existente entre fronteira linha (dimensão política) e espaço de fronteira (dimensão social), sendo que neste último há uma predisposição às trocas e inteirações entre as comunidades de ambos lados, bem distante, portanto, da ideia de fronteira barreira e do outro como inimigo.

Contudo, ao voltar o foco das análises somente às comunidades de fronteira, decorreu-se na sobrevalorização do aspecto de integração dessas comunidades e, no limite dessa perspectiva, na supressão da fronteira em si. Considerar a integração plena das comunidades de uma fronteira leva a fronteira a perder sua razão de ser já que não está desempenhando uma de suas funções inerentes e indissociáveis de separação e contato.

A ideia que se colocava, portanto, era a de direcionar a análise para a noção de que o Estado, nos espaços de fronteira, chega fraco, parcial, muito acomodado e dependente dos poderes locais para seu funcionamento - o que, sem dúvida, tem lastro de verificação. Mas o exagero desse ponto de vista é nocivo às analises na medida em que pensar o Estado que atua de forma deficiente na fronteira pode levar a perceber esses espaços limítrofes como representando o oposto ao próprio Estado (THOMPSON FLORES, 2014THOMPSON FLORES, Mariana F. da C. Crimes de fronteira: a criminalidade na fronteira meridional do Brasil (1845-1889). Porto Alegre: EDIPUCRS, 2014.).

Uma dessas formulações exageradas pode ser localizada no verbete Fronteira, de autoria de Benedikt Zientara, da Enciclopédia Einauldi, de 1989, que serviu como uma das referências mais citadas nesse contexto intelectual. Quando Zientara afirma que “as populações que vivem numa zona de fronteira dão origem a uma comunidade fundada em interesses particulares” (ZIENTARA, 1989, p. 309ZIENTARA, Benedikt. Fronteira. In: ROMANO, Ruggiero (Org.). Enciclopédia Einaudi. Estado-guerra. Porto: Imprensa Nacional/ Casa da Moeda, 1989. Vol. 14. p. 306-317.) que são opostos aos das autoridades centrais respectivas, o autor incorre em desproporção da noção de integração fronteiriça. Essa ideia se aplicada indiscriminadamente, sem o devido cotejamento com as fontes, como se fosse um dado resolvido em si mesmo, sugeria que o Estado não exercia a mínima ingerência nos espaços de fronteira.

Além disso, outra inconsistência dessa interpretação, a qual deriva dessa noção desmedida de integração fronteiriça, está colocada na afirmação do autor de que a fronteira enquanto limite é “uma abstração que não tem existência real fora do mapa geográfico” (ZIENTARA, 1989, p. 307ZIENTARA, Benedikt. Fronteira. In: ROMANO, Ruggiero (Org.). Enciclopédia Einaudi. Estado-guerra. Porto: Imprensa Nacional/ Casa da Moeda, 1989. Vol. 14. p. 306-317.). Ora, ao pensar dessa maneira, esvaziamos a fronteira de significado. Se ela não existe no cotidiano dos fronteiriços, então o espaço não pode/não necessita ser analisado enquanto espaço de fronteira.

Rui Cunha Martins (2008)MARTINS, Rui Cunha. O método da fronteira: radiografia histórica de um dispositivo contemporâneo (matrizes ibéricas e americanas). Coimbra: Edições Almedina, 2008., ao destacar o paradoxo fim/início da fronteira, chama atenção para o fato de que, ao delimitar, a fronteira está naturalmente apontando o que lhe é externo, mas, sobretudo, está explicitando o “invólucro que ela delimita”, que é “a entidade patrocinadora da ativação dos limites” (MARTINS, 2008, p. 112-113MARTINS, Rui Cunha. O método da fronteira: radiografia histórica de um dispositivo contemporâneo (matrizes ibéricas e americanas). Coimbra: Edições Almedina, 2008.). Ao delimitar, portanto, a fronteira designa sua referência, o alcance de seu centro de poder. Nesse sentido, a fronteira não é o contrário do centro, mas sua reserva, ou sua outra natureza.

A fronteira é, portanto, a tentativa permanente de sinalizar uma sede. Diz-se “tentativa permanente de sinalizar” porque o fato de estar em constante contato com outra soberania requer de seu autor (aquele que a fronteira designa/referencia) a tarefa continuada de sua elucidação. Isso porque a fronteira carrega também um caráter instável, a contingência, que articula uma heterogeneidade de experiências e trajetórias e possibilita sua duplicação, sobreposição, apagamento, reposição. Dessa forma, trata-se de uma tarefa constante e para a qual não há previsão de conclusão, já que a fronteira referência nunca vai se impor à fronteira contingência; no entanto, o efeito da fronteira se dá na ação incessante de elucidação e não no resultado. Seu método de ação é progressivo, contínuo e sempre na tensão entre a designação da referência e a ação da contingência (MARTINS, 2008, p. 23MARTINS, Rui Cunha. O método da fronteira: radiografia histórica de um dispositivo contemporâneo (matrizes ibéricas e americanas). Coimbra: Edições Almedina, 2008.). Assim, a fronteira é um espaço periférico, mas não marginal, não foge ao controle do centro.

Dessa maneira, ao sabermos que o Estado (autor, referência, aquele que designa) se estende de forma específica para suas franjas e continuamente se institui e reitera naquele espaço1 1 Para Rui Cunha Martins, o Estado torna-se “facto notório” através do estabelecimento de marcos fronteiriços e das cerimônias que os envolvem (MARTINS, 2008, p. 113), pelo exercício das funções burocráticas do Estado levadas a cabo pelos poderes locais que se mostram, surpreendentemente, conservadores e não tendem a mostrar grande desalinho com o centro, já que acabam sendo os grandes beneficiários dos estímulos econômicos proporcionados pela fronteira (MARTINS, 2008, p. 35) . , compreendemos que sua linha demarcatória, o limite político em si, embora abstrato, cumpre função concreta na vida dos fronteiriços.

Contudo, essa noção clara da linha de fronteira não será empecilho para que as relações sejam travadas através da fronteira. Há pessoas que, sem negar seu pertencimento2 2 Mesmo que os Estados Nacionais ainda não estejam devidamente estabelecidos e, respectivamente, nem as identidades nacionais, estaremos falando de múltiplas relações de identidade possíveis, como as provinciais, por exemplo, que se demarcam de um lado e outro da fronteira. Sobre esse aspecto, a noção de “estrangeiridade”, cunhada pelo antropólogo Alejandro Grimson, é fundamental e consiste no fato de que habitar um espaço de fronteira sugere, de forma recíproca e incontornável, o fato de ser estrangeiro diante dos habitantes do outro lado (GRIMSON, 2003, p. 24). , desenvolvem partes importantes de suas vidas no outro lado ou, pelo menos, contam de alguma forma com aquele espaço nas suas estratégias sociais. Portanto, as relações estabelecidas podem ser consideradas como “transfronteiriças” “porque atraviesan el límite material de la frontera política, y no porque las fronteras simbólicas vinculadas a la nacionalidad no sean significativas” (GRIMSON, 2003, p. 26GRIMSON, Alejandro. La nación en sus límites: contrabandistas y exiliados en la frontera Argentina-Brasil. Barcelona: Gedisa, 2003.).

A autora Julia Chindemi também aponta uma ideia semelhante a esta das relações transfronteiriças de Alejandro Grimson. Segundo ela, em um espaço de fronteira existe a dimensão territorial limitante e a dimensão espacial desterritorializada. A primeira é a concepção jurídica da fronteira estabelecida através de instituições, órgãos e limite geopolítico (CHINDEMI, 1999CHINDEMI, Julia Valeria. Las tradiciones de frontera internacional en Rio Grande delSur: un análisis en la larga duración. Dissertação de Mestrado - UNB, Brasília, 1999.). A segunda perpassa os dois lados e compreende práticas históricas que possibilitaram a coexistência e articulação de vínculos entre os habitantes dos dois lados. São exemplos desses circuitos, que, para a autora, originaram as “tradições de fronteira internacional”, o uso de recursos econômicos como as redes de contrabando e o grande número de proprietários de terra em ambos lados de uma fronteira; a mobilidade da população, que forma um mercado de trabalho internacional, bem como o caráter plurinacional das forças militares; o espaço fronteiriço que oferece refúgio político e promoveu a manutenção de grupos parentais (de sangue ou não) que atravessavam o limite político e instituem redes através da fronteira. Chindemi afirma que a ideia dos circuitos desterritorializados não pretende comprovar uma identidade fronteiriça/regional, uma irmandade imemorial oposta à nacional, reforçando singularmente as diferenças, mas analisar as práticas históricas que possibilitaram a coexistência e articulação de vínculos internacionais/regionais com os nacionais.3 3 Para a autora, os circuitos desterritorializados na fronteira platina do Rio Grande do Sul começaram a se formar a partir da invasão da Banda Oriental (1811-1816), que contou com forças rio-grandenses (CHINDEMI, 1999, p. 7-35).

Dessa forma, o Estado na fronteira se faz presente através da burocracia específica que o mesmo ali instala e municia para garantir a manutenção dos limites políticos, qual seja: guardas de fronteira, alfândegas, mesas de renda, fortes, presídios, etc.

Essa percepção permitiu-nos vislumbrar que a legislação dos respectivos Estados de cada lado da fronteira gerava uma justaposição de soberanias, cujas legislações distintas e, por vezes conflitantes, colocadas em contato imediato e, geralmente, na ausência de acordos internacionais que regulassem tais situações, deixavam a brecha para a ação dos fronteiriços que diariamente manejavam essas situações a seu modo, acomodando-se entre as esferas institucionais e as redes transfronteiriças de que dispunham. Nesse delicado concerto entre a ação do Estado e as redes sociais locais que atravessavam a fronteira, pode-se dizer que nenhum se sobrepunha. Ambos atuavam concomitantemente e, não raro, um operava através do outro mutuamente (FARINATTI, 2007FARINATTI, Luís Augusto E. Confins Meridionais: famílias de elite e sociedade agrária na Fronteira Sul do Brasil (1825-1865). Tese de Doutorado - PPGHIS-UFRJ, Rio de Janeiro, 2007.; VOLKMER, 2007VOLKMER, Márcia S. “Onde começa ou termina o território pátrio”: os estrategistas dafronteira: empresários uruguaios, política e a indústria do charque no extremo oeste do RioGrande do Sul (Quaraí, 1893-1928). Dissertação de Mestrado - UNISINOS, São Leopoldo,2007.; YOUNGER, 2008YOUNGER, Joseph. Corredores de comércio e salas de justiça: lei, coerção e lealdade nasfronteiras do Rio da Prata. AEDOS - Revista do Corpo Discente do PPG em História da UFRGS, v. 1, n. 1, p. 290-311, 2008.; THOMPSON FLORES, 2014THOMPSON FLORES, Mariana F. da C. Crimes de fronteira: a criminalidade na fronteira meridional do Brasil (1845-1889). Porto Alegre: EDIPUCRS, 2014.; MENEGAT, 2015MENEGAT, Carla. “Transportando fortunas para povoar deserta e inculta campanha”:brasileiros e produção pecuária no norte do Uruguai em meados do Século XIX. Tesede doutorado, PPG História - UFRGS, 2015.).

Essa valência estratégica da fronteira fica explícita no que concerne à esfera criminal. Ao cometer um crime e fugir para o outro lado da fronteira, o criminoso colocava-se fora do alcance da justiça devido à impossibilidade da justiça de um lado interferir na do outro. Vários sujeitos se valiam dessa lacuna legal para praticar delitos nesse espaço. Escravizados que fugiam pela fronteira acreditando que, a partir do momento em que estivessem se colocado sob a lei de outro país, que não admitia a escravidão, seriam automaticamente livres; ladrões que atravessam tropas de gado pela fronteira sabendo que nada poderiam sofrer uma vez que concluíssem a travessia; bem como autores de furto em geral, de agressões de homicídios e de toda sorte de crimes que têm na fuga pela fronteira a estratégia para sua ação criminosa, sendo o contrabando, de certo, o mais emblemático e evidente (THOMPSON FLORES, 2014, p. 63-104THOMPSON FLORES, Mariana F. da C. Crimes de fronteira: a criminalidade na fronteira meridional do Brasil (1845-1889). Porto Alegre: EDIPUCRS, 2014.). Os preceitos internacionais de aplicação de leis penais, que tinham base no princípio da territorialidade, o qual prevê a aplicação da lei nacional ao delito cometido exclusivamente no território do próprio país, ofereceu proteção e certa imunidade aos sujeitos que procuravam atravessar fronteiras para o cometimento de contravenções. A questão de como esse manejo da incompatibilidade legal existente entre soberanias justapostas foi transposto e apropriado por duelistas como “território neutro” será tema de análise na sequência.

As discrepâncias das legislações sobre duelo na Argentina, Brasil e Uruguai

Foi ao longo dos séculos XVIII e XIX, sendo para alguns lugares até o século XX, que os duelos foram mais recorrentes, tendo se tornado parte do substrato cultural da elite ocidental. Contudo, a prática de duelar está presente na história da humanidade desde épocas remotas, havendo relatos desse tipo de recurso presentes na Antiguidade, nas célebres Ilíada e Odisseia, de Homero; na cultura Celta, em relatos de Posidônio, entre outros vestígios (REMEDI, 2011, p.17REMEDI, José M. R. Palavras de honra: um estudo acerca da honorabilidade na sociedade sul-rio-grandense do século XIX, a partir dos romances de Caldre Fião. Tese (Doutorado em História). São Leopoldo: UNISINOS, 2011.). Segundo Foucault, no entanto, parecem ter sido os germanos que aperfeiçoaram o duelo e estenderam sua prática para o resto da Europa incorporando-o, de certa forma, ao direito germânico (FOUCAULT, 2002, p. 56FOUCAULT, Michel. A verdade e as formas jurídicas. Rio de Janeiro: NAU, 2002.). Durante a Idade Média a prática do duelo foi tomada sob a compreensão de ordálio, prova de status jurídico cujo resultado era interpretado como um julgamento divino, mas sofreu diversas inflexões no período até constituir-se em um instrumento de direito costumeiro laico. Já os Estados modernos, que se estabeleceram muito em função do monopólio do exercício da violência, procuraram retirar a possibilidade individual de se “fazer justiça pelas próprias mãos” levando os duelos a uma mudança, no sentido de uma elegância de corte agregada e proeminente aos valores de combate. Segundo Corbin (2013, p. 9)GUILLET, François. O duelo e a defesa da honra viril. In: CORBIN, Allan; COURTINE, Jean-Jacques; VIGARELLO, Georges. (Org.). História da Virilidade. Petrópolis: Vozes, 2013. Vol. 2, p. 97-152., a “corte palaciana dos séculos XVI e XVII acresce as etiquetas, cultiva as posturas, flexibiliza os corpos, reforçando a questão da aparência, ao passo que outrora predominava uma arte mais guerreira”. O século XIX, contudo, foi o do auge da virilidade e o do refinamento e normatização dos duelos.4 4 Esse mote constitui o argumento central desenvolvido no texto “O duelo e a defesa da honra viril” de FrançoisGuillet, In: CORBIN, COURTINE, VIGARELLO, 2013, p. 97-152.

Identifica-se, portanto, um ressurgimento dos duelos nesse último período, porém de forma ressignificada. Afirma-se ressignificada porque os duelos eram, antes de tudo, uma prática da aristocracia, podendo ser considerados obsoletos nesse novo contexto burguês. Supostamente iam de encontro ao ideal pleno do Estado, cuja razão de ser repousa largamente no monopólio do exercício da violência, e os duelos, portanto, consistiam justamente no oposto a isso: são recursos privados e extraoficiais de justiça.

Ocorre que o Estado, a partir do século XVIII, é o estado burguês, que preconiza pela individualidade e livre iniciativa, que se replica para o âmbito da defesa pessoal de direitos, onde a honra está inserida. É também um estado de elite fluída, não mais aristocrática estamental, que dá possibilidade de ascensão para muitos e que desprotege, de certa forma, membros mais antigos da elite. Desta forma, por sua vez, muitos grupos desta elite constituirão no duelo todo um complexo ritual que delimita aqueles que compartilham dos ritos em detrimento de outros, servindo como instrumento de demarcação em contextos sociais urbanizados e tomados pelas “multidões” nos quais as hierarquias pareciam irem-se borrando. Dessa forma, segundo Ute Frevert, a honra e o duelo, no século XIX, eram uma instituição da vida social, faziam parte da “atmosfera burguesa”. Nesse sentido, pensar os duelos como relíquias feudais anacrônicas é ignorá-los enquanto fenômenos concretos que têm sentido dentro da cultura burguesa (FREVERT, 1993, p. 208FREVERT, Ute. Honour and Middle-Class Cultures: The History os Duel in England and Germany. In: KOKCA, Jürgen, MITCHEL, Allan. Bourgeois Society in Nineteenth-Century Europe. London: WBC Bookbinders, 1993.).

Os séculos XVIII em diante, por tanto, são do triunfo do individualismo burguês e, nesse sentido, é possível compreender que a responsabilidade de defesa da honra seja percebida também como individual e particular, como questões cuja resolução não se atribui a terceiros, mesmo que esse terceiro seja o Estado. Os duelos, nesse contexto, assumem contornos diferenciados e combinam, muitas vezes, o uso privado de violência com o recurso à justiça formal (não raro casos de ofensa que levaram a um duelo tem seu correspondente num processo judicial de calúnia ou injúria) (FERNÁNDEZ, 2008, p.160-162FERNÁNDEZ, María A. Entre la ley del más fuerte y la fuerza de la ley. Las distintas respuestas frente a los insultos, Buenos Aires. 1750-1810. In: PESAVENTO, Sandra, GAYOL, Sandra. Sociabilidades, justiças e violencias: práticas e representações culturais no Cone Sul (séculos XIX e XX). Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008. p.147-172.), além disso, esses duelos distanciam-se daqueles relacionados ao costume aristocrático através da ampla elaboração e uso de normas e regras específicas.5 5 A complexa formulação de regras e a constituição de sociedades de duelistas como mecanismos de distinção são temas abordados por Norbert Elias a respeito da elite alemã do século XIX. Ver: ELIAS, 1997. Os manuais de honra e os livros de conduta cavalheiresca tornam-se habituais dessa elite. Países como França, Alemanha e Itália indicavam a ocorrência de cerca de 100 a 300 duelos por ano, considerando apenas aqueles que tiveram registro6 6 Lembremo-nos que os duelos ocorriam secretamente devido sua criminalização (embora saibamos da condescendência com o qual a legislação penal os tratava), por isso, esses números além de não serem exatos devem subregistrar o total real das ocorrências. , nos anos finais do século XIX (PICCATO, 1999, p. 334PICCATO, Pablo. Politics and the Technology of Honor: Dueling in Turn-of-the-Century Mexico. Journal of Social History, Vol. 33, nº 2, 1999, p. 331-354.; GAYOL, 2007, p. 211).

Na América Latina7 7 Os estudos sobre duelos ainda são, proporcionalmente a outros temas historiográficos, reduzidos na América Latina. Mesmo assim, temos estudos, a partir da década de 1990, que abrangem do século XVI à primeira metade do século XX, que tratam de duelos entre membros das elites e dos setores populares, em comum enfrentam a dificuldade de acesso às fontes que descrevam práticas que eram em grande parte discretas ou secretas. Podemos citar, entre os trabalhos que abordam o tema para a América Latina, CHASTEEN, 1990; PICCATO, 1999; PARKER, 1999, 2000; GAYOL, 1999, 2004, 2008; AGUILERA PEÑA, 2000; para o Brasil temos, REMEDI, 2003, 2009, 2011; BRAGA-PINTO, 2014; THOMPSON FLORES, 2016; e, THOMPSON FLORES, AREND, 2017. , espaço ao qual este artigo se limita, o auge dos duelos localiza-se a partir do último quartel do século XIX estendendo-se até as primeiras décadas do século XX. Em específico temos em foco três países, Argentina, Uruguai e Brasil, onde há uma constante no que se refere a que todos eles vivenciavam contextos tidos, à época, como modernos.

No caso argentino, o período entre 1860 e 1916 é compreendido pela historiografia como correspondendo à Argentina Moderna, já que a partir de 1862, com o governo de Mitre, muitos portenhos, que haviam se exilado no período rosista, como Alberdi e Sarmiento, retornaram e começaram a colocar em prática suas modernas teorias econômicas e sociais. A modernização tendeu a se consolidar nos governos posteriores de Sarmiento, 1868-1874, e Avellaneda, 1874-1880. Passou-se a investir na modernização da produção primária (com cercamento de campos, cruzamento de raças de gados, produção de lã e cereais) visando atender o mercado europeu industrializado em detrimento da produção de charque para países escravistas. Nesse contexto, teve início também a política de imigração, sobretudo italiana, que, em um período de mais ou menos meio século, aumentou a população total da Argentina cerca de sete vezes. O crescimento acelerado da riqueza trouxe a europeização de Buenos Aires no que se refere aos gostos e costumes e agravou a dicotomia cidade - campo (ROMERO, 2008, Capítulo IXROMERO, J.L. La Republica: estabilización política y cambio economicosocial(1862-1880). In: ROMERO, J.L.Breve História de la Argentina. 7ª ed. Buenos Aires: Fondo de CulturaEconômica, 2008, Capítulo IX.). Segundo Sandra Gayol (2008, p.13)GAYOL, Sandra. Exigir y dar satisfacción: um privilegio de las elites finisseculares. In: PESAVENTO, Sandra Jatahy; GAYOL, Sandra (Orgs.). Sociabilidades, justiças e violências: práticas e representações culturais no Cone Sul (séculos XIX e XX). Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008, p. 147-172., a partir da década de 1870, mas, sobretudo, entre 1880 e 1920, os duelos tornaram-se uma instituição da vida da elite argentina, uma verdadeira “mania”. Por esse período os códigos e rituais sofreram a mais apurada definição. Os duelos eram um gesto público e necessário para ingressar ou permanecer nas elites. Para a autora a explicação desse fenômeno dos duelos está diretamente relacionado ao referido contexto de modernidade conformando o que Gayol chama de honra republicana (2008, p.18-19GAYOL, Sandra. Exigir y dar satisfacción: um privilegio de las elites finisseculares. In: PESAVENTO, Sandra Jatahy; GAYOL, Sandra (Orgs.). Sociabilidades, justiças e violências: práticas e representações culturais no Cone Sul (séculos XIX e XX). Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008, p. 147-172.).

No que se refere ao Uruguai, o auge dos duelos pertence ao contexto dos governos colorados de José Batlle y Ordoñez e Baltasar Brum, responsáveis por realizar reformas modernizadoras como a lei do divórcio por parte da mulher, jornada de trabalho de 8 horas, laicização do Estado, etc. (BARRAN, CAETANO, 1996BARRAN, J.P.; CAETANO, G. (eds.). História de la vida privada en el Uruguay: entre la honra y el desorden, 1780-1870. Montevideo: Taurus, 1996.; FERNÁNDEZ SALDAÑA, 1996FERNÁNDEZ SALDAÑA, José María. La violencia en el Uruguay del siglo XIX: crónicas de muertes, duelos, atentados y ejecuciones. Montevideo: Cal y Canto, 1996.; SILVA GRUCCI, 2018SILVA GRUCCI, G. Duelos en el Río de la Plata. Montevidéu: Editorial Fin de Siglo, 2018.).

O caso brasileiro é o que está mais a descoberto em termos de investigação, e é sobre ele que viemos nos dedicando. As pesquisas preliminares já apontam que o contexto político do advento da República no Brasil, marcado também pela voga da modernidade em todos os aspectos (NEVES, 2014NEVES, Margarida de Souza. Os cenários da República. O Brasil na virada do século XIX para o século XX. In: FERREIRA, J., DELGADO, L. de A. N. (org) O Brasil Republicano. O tempo do liberalismo excludente. Da Proclamação da República à Revolução de 1930. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2014.), da mesma forma que nos outros casos, incidiu na prática de duelos pela elite sob essa perspectiva moderna e aburguesada, envolto na complexificação das regras acessíveis a poucos.

Contudo, embora admita-se a princípio que, a partir da bibliografia existente para Argentina e Uruguai perceba-se que a dimensão e o volume dos casos de duelos nos países vizinhos foram superiores ao caso brasileiro - ocupando páginas diárias nos jornais, envolvendo aulas de esgrima com professores franceses para membros da elite, criando ambiente para a circulação de códigos cavalheirescos que traziam normatizações a respeito da prática de duelar, surtindo certa competição entre os cavalheiros por número de duelos em que já haviam se envolvido e, até mesmo, percebendo-se uma necessidade de duelar alguma vez para alcançar aceitação social -ainda assim, vale refletir porque Argentina, Brasil e Uruguai chegaram a diferentes formulações legais para um tema que lhes era transversal.

No caso da Argentina o duelo era compreendido como delito especial pelo Código Penal de 1887, ou seja, figura delitiva especial com penas atenuadas nos resultados de morte ou lesão, demarcando, a eventual morte num duelo, de um assassinato comum e distinguindo o duelo de conflitos populares ordinários (GAYOL, 1999, p. 315GAYOL, Sandra. Duelos, honores, leyes y derechos: Argentina 1887-1923. Anuario IEHS, Instituto de Estudios Históricos Sociales, Facultad de Ciencias Humanas, Universidad Nacional del Centro, Tandil, Argentina, nº 14, 1999, p. 313-330.). Em 1891 foi apresentado um projeto de despenalização do duelo na Argentina que jamais foi aprovado.8 8 As argumentações apresentadas em defesa desse projeto de lei eram idênticas as que foram defendidas no contexto da descriminalização do duelo no Uruguai anos depois. Ver: GAYOL, 1999, p. 313-330.

No caso brasileiro, desde as Ordenações Filipinas, sendo reafirmado em toda a legislação penal posterior, tanto no Brasil quanto em Portugal, o duelo sempre foi tipificado como crime, ou seja, proibido. No período imperial, os crimes motivados por questões de honra só figuram como circunstâncias atenuantes dos crimes de homicídio, ferimento, agressão, etc., sem a referência ao termo duelo, na Parte Primeira,Título I, Capítulo III, Secção II, Artigo 14, incisos 2 e 3 (crime justificado em defesa de seus direitos) e Artigo 18, incisos 4, 6, e 8 (circunstâncias atenuantes por reagir a uma desonra precedida por agressão ou provocação) (BRASIL, 1831BRASIL. Lei de 16 de dezembro de 1830. Código Criminal do Império do Brazil, Rio de Janeiro, jan. 1831. Disponível em: Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LIM/LIM-16-12-1830.htm . Acesso em: 9 nov, 2018.
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).

Já no Código Penal da República, uma mudança jurídica importante ocorre na medida em que o duelo ganha uma menção a parte e aparece explicitamente tipificado como crime, no Capítulo VI do Título X, “Dos crimes contra a segurança de pessoa e vida”, compreendendo do artigo 307 ao 314. Apartar o crime de duelo das tipificações comuns de homicídio e ferimentos, não só resguarda a suposta distinção do ato em relação a um crime bárbaro e injustificado, como também reforça a tônica de penalizar de forma mais branda aqueles que porventura incorressem no referido delito. Diferente do caso argentino, no Brasil republicano o duelo não era considerado delito especial, embora, em entrevista a um periódico do Rio de Janeiro, Alcântara Machado, professor da faculdade de Direito de São Paulo e um dos redatores da primeira versão do código, tenha afirmado que a comissão revisora pretendeu reputar o duelo como contravenção e não como crime.9 9 Jornal A Razão. Entrevista com Alcântara Machado. 4/7/1939. Na versão final do Código, contudo, vê-se que o duelo está configurado como crime. No entanto, segue a mesma orientação do caso argentino de garantir o tratamento jurídico diferenciado e mais ameno aos infratores. Enquanto que as penas previstas para o crime de homicídio no mesmo código do Brasil previam de 6 a 24 anos de reclusão, e 12 a 30 anos nos casos com circunstâncias agravantes, as penas para uma eventual morte em duelo indicavam 1 a 4 anos apenas. Além disso, os incisos do artigo 313 foram cuidadosamente redigidos para descrever as circunstâncias distintivas que configuram um duelo resguardadas a uma determinada camada social apta a lançar mão daqueles recursos, diferenciando de conflitos comuns de outras ordens para os quais as penas seriam pesadas (BRASIL, 1890BRASIL. Decreto nº. 847, de 11 de outubro de 1890. Código Penal dos Estados Unidos do Brazil, Rio de Janeiro, out. 1890. Disponível em: Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1824-1899/decreto-847-11-outubro-1890-503086-publicacaooriginal-1-pe.html . Acesso em: 10 nov. 2018.
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).

Segundo João Batista Pereira, um dos revisores e posterior comentador do Código Penal de 1890, a redação de todo o código foi difícil em função do grau de desatualização da lei vigente até então. Nas palavras do autor e comentador, “o que tínhamos não era péssimo, era simplesmente detestável”, sendo que o Código de 1830 era uma importação irrestrita das Ordenações Filipinas “mixto de despotismo e de beatice (...) confundia o crime com o pecado”.

Esse novo código foi responsável por criar leis específicas para criminalizar atos que não necessariamente eram novidade. De certo que uma lei é criada quando se coloca a demanda pela regulação de determinados usos e costumes e é nesse sentido que Batista Pereira coloca a ideia de que o código de 1890 estava atualizado em relação à modernidade que se impunha. Modernidade essa de ares marcadamente arcaicos já que referido compêndio de leis foi, antes de tudo, um regulador moral das famílias norteado pelos padrões conservadores da burguesia extremamente assinalados pelo dimorfismo sexual.

Conforme Azeredo e Serafim (2012AZEREDO, Jéferson Luis de; SERAFIM, Jhonatan Goulart. Relações de gêneros:(des)construindo conceitos a partir dos códigos penais de 1890 e 1940. Revista Técnico Científica (IFSC), v. 3, nº. 1, p. 432-446,2012. Disponível em: <Disponível em: https://periodicos.ifsc.edu.br/index.php/rtc/article/viewFile/598/428 >. Acesso em: 20 set. 2018.
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) o código de 1890 explicitou as relações de gênero cristalizando o patriarcalismo e definindo diferenças entre o masculino e feminino no âmbito criminal, embasado em um discurso médico e jurídico vigentes (pseudo) legítimos. É nesse sentido, portanto, que o duelo e o defloramento estreiam nesse código como novas categorias criminais. Os crimes contra honra passaram a ser os mais abundantes no judiciário (AZEREDO, SERAFIM, 2012AZEREDO, Jéferson Luis de; SERAFIM, Jhonatan Goulart. Relações de gêneros:(des)construindo conceitos a partir dos códigos penais de 1890 e 1940. Revista Técnico Científica (IFSC), v. 3, nº. 1, p. 432-446,2012. Disponível em: <Disponível em: https://periodicos.ifsc.edu.br/index.php/rtc/article/viewFile/598/428 >. Acesso em: 20 set. 2018.
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) e os crimes sexuais, em especial, os que geravam a maior estatística criminal (FAUSTO, 1984FAUSTO, Boris. Crime e Cotidiano. A criminalidade em São Paulo (1880-1924). São Paulo: Editora Brasiliense, 1984.). Duelo e defloramento representavam, portanto, o emblema desse código e do ideal de sociedade que pautava em relação ao papel que correspondia a homens e mulheres diante das questões de honra: a eles cabia o papel ativo na manutenção e restauração da mesma, e a elas o papel passivo de quem só podia incorrer na infâmia.

Contudo, no que se refere ao duelo, apenas facultado aos homens, não apenas a questão moral levou a incluir no novo código uma lei que por tantos anos não pareceu oportuna. Certamente, uma maior utilização de tal expediente de justiça privada foi assertiva para que se colocasse como necessária nesse contexto legal.

Nesse sentido, cabe questionar como e porque meios semelhantes - Argentina, Brasil e Uruguai - chegaram a soluções jurídicas tão distintas e, especialmente, no caso do Uruguai que deu lugar a uma realidade legal sem parâmetros no mundo ocidental com a descriminalização do duelo.

A chamada Ley del Duelo, que legalizou a prática de duelos até a década de 1990, foi aprovada no Uruguai em 6 de agosto de 1920, no governo colorado de Baltasar Brum, sucessor político de José Batlle. A proposta de lei já havia sido apresentada anteriormente, em maio de 1919, pelo deputado blanco Juan Andrés Ramirez, tendo sido derrotada naquele momento, mas no ano seguinte, foi o partido colorado que a tirou da gaveta e reacendeu o debate que culminou com sua validação. O contexto que possibilitara essa mudança de orientação de um ano para o outro do partido colorado está relacionado a um duelo realizado entre o ex-presidente colorado, mas ainda líder político, José Batlle y Ordoñez e Washington Beltran Barbat, político blanco em ascensão e periodista do El País. Só naquele último ano, Batlle já havia batido-se em duelo outras duas vezes além dessa, mas o desfecho fatal para Beltran e uma possível condenação a Batlle pela morte do contendor, já que naquele momento não usufruía de foro privilegiado por não ocupar nenhum cargo político formal, levaram o partido colorado a convenientemente recuperar a proposta de lei elaborada pela oposição.10 10 Há teorias de que o desfecho do duelo entre Batlle e Beltrán teve contornos de assassinato, teria desrespeitado os códigos cavalheirescos já que os primeiros tiros foram para cima, das duas partes, mas o seguinte foi, por parte de Batlle, em direção a parte superior do corpo de Beltrán, visando claramente atingi-lo. Essa descrição do duelo é respaldada por uma autopsia histórica realizada pelo médico legista Guido Berro em 2011 com base na autópsia descrita no processo crime do duelo. Outra fonte que defende a hipótese do assassinato é o jornalista Diego Fischer, que defende que a descrição da autópsia do processo indica o uso de “bala marcada” por parte de Batlle (artifício empregado no projétil para que tenha maior letalidade). Ver: BERRO, 2011; FISCHER, 2010. Chama a atenção, em todo esse contexto, o fato de que, diferentemente da primeira ocasião em que a lei fora proposta, na qual prevaleceu a divergência político partidária, a aprovação da lei contou com votos e debates que não seguiram essas divisas, os argumentos a favor e contra a lei nada tiveram que ver com as divisões tradicionais da política uruguaia (PARKER, 1999PARKER, David S. La Ley Penal y las “leyes caballerescas”: hacia El duelo legal em El Uruguay, 1880-1920. In: Anuario IEHS, Instituto de Estudios Históricos Sociales, Facultad de Ciencias Humanas, Universidad Nacional del Centro, Tandil, Argentina, nº 14, 1999, pp.295-330.). A possível prisão de Batlle em função do duelo fatal com Beltran não foi, no entanto, o único elemento que garantiu o apoio de colorados a um projeto de lei originalmente blanco, embora tenha sido o motivador. Os debates excederam essa ocorrência e trouxeram à tona questões profundas a respeito de como essa sociedade compreendia a prática de duelos, reivindicando sua validade a despeito da legislação vigente e evidenciando a existência de outros códigos morais que tinham peso real ao lado das leis formais.

A primeira constituição do Uruguai data de 1830, mas as leis penais permaneceram dispersas e baseadas na legislação colonial (Leyes de Indias, Recopilación Castellana, Siete Partidas de Don Alfonso, Reglamento de la Capitanía General y del Virreinato, etc), nos usos e costumes regionais aplicados como lei e nas disposições inorgânicas do Governo Provisório de 1825. Nesse contexto, os magistrados utilizavam indistintamente qualquer referência - tornando-se legisladores e deixando vulnerável o princípio do equilíbrio dos poderes. Ao longo da década de 1870, várias comissões foram formadas a fim de redigirem um Código Penal, o qual foi aprovado em 1889, ficando vigente até 1934, baseado no modelo italiano de cunho liberal apesar de manter a pena de morte, abolida em 1907 (ALLER, 2008ALLER, Germán. Reseña histórica de la ley penal uruguaya. In: ALLER, Germán.Dogmática de la acción y praxis penal. Buenos Aires: B de F, 2008, p. 7-22.). Esse código de 1889 reafirmou a criminalização dos duelos, embora seguisse a voga de outros países da Europa e da América, como Argentina, por exemplo, de considerar o duelo como um delito especial, distinguindo o duelo dos conflitos ordinários, fazendo um reconhecimento implícito dos códigos morais vigentes. Apesar das penas moderadas, o descumprimento da lei se manteve, o que, de certa forma, já era esperado pelos autores do Código que se contentavam com a esperança de que a lei seria aplicável um dia (PARKER, 1999PARKER, David S. La Ley Penal y las “leyes caballerescas”: hacia El duelo legal em El Uruguay, 1880-1920. In: Anuario IEHS, Instituto de Estudios Históricos Sociales, Facultad de Ciencias Humanas, Universidad Nacional del Centro, Tandil, Argentina, nº 14, 1999, pp.295-330.).

Essa inadimplência permanente da lei que criminalizava o duelo não configurava obrigatoriamente um ambiente transgressor em nenhum dos três países abordados nesse texto. Havia um respaldo moral e legal buscado nos códigos cavalheirescos que embasavam a prática do duelo atribuindo-lhes status de lei, conforme referiam-se os duelistas a estas normas. Na realidade, o que parecia estar em desacordo não era a prática clandestina dos duelos, mas a vigência de uma lei que ninguém obedecia, incompatível com a moral cavalheiresca da classe política.

Há a referência a vários códigos, na maioria europeus, aos quais os duelistas se remetiam: Essay sur duel (1890), do francês Conde Chateauvillard; Les lois du duel (1912), de Bruneau de Laborie, El Duelo en los nuevos estudios y en las nuevas ideas (1907), do italiano Carlos Lessona, entre outros. Encontra-se também a produção de escritos de autoria uruguaia e argentina de manuais de esgrima e teses de jurisprudência sobre duelos, como a tese argentina intitulada El Duelo (1898), de Juan Carlos Gallo; e Filosofia del Arte de la Esgrima (1883), do militar uruguaio Marianao Sábat y Fargas.

Referir-se a esses códigos como “leis” não era mera expressão, de fato constituíam uma legalidade paralela, baseavam-se em textos redigidos como códigos legais, com artigos e incisos, que traziam preceitos explícitos e eram largamente difundidos. Com algumas variantes entre si, partilhavam de uma base doutrinária comum. Parecendo-se a livros de etiqueta, em formato codificado, versavam sobre os procedimentos do desafio, padrinhos, graus de ofensa e direitos do ofendido, escolha das armas e disposição dos contendores no momento do lance. A adesão ao protocolo era a garantia de um lance leal e legítimo, assegurando igualdade e prevenindo assassinatos. Eram proibidos, em geral, duelos entre devedor e credor, por exemplo, e, por vezes, duelos a morte ou em condições disso. Os códigos, por tanto, cumpriam a função de “civilizar” o duelo e amortizar possíveis desenlaces fatais, sem chegar a tornar-se uma farsa.

Segundo os códigos cavalheirescos só estava permitido entrar em polêmicas, ofensas ou fazer acusações (normalmente veiculadas através da imprensa) àqueles que garantissem que aceitariam o desafio a um duelo caso fossem chamados a dar satisfação. De certa forma, aceitava-se o uso desse expediente como meio para manter a civilidade e a responsabilidade na imprensa e no debate político. Aceitar um duelo, por tanto, significava contrair um compromisso solene, o duelista implicitamente declarava aceitar o opositor como um homem digno - um igual - acatando o acordo dos padrinhos sobre as condições do lance ou a decisão dos mesmos sobre não ser necessário o duelo dando por terminada a contenda que levou ao desafio. O duelo poderia ser recusado no caso de uma das partes não reconhecer o opositor como um cavalheiro ou quando uma das partes não estava apta a enfrentar o desafio, por idade ou incapacidade física.

Este argumento podemos observar na notícia veiculada no jornal A Capital, de Porto Alegre em 1909, em que

O dr. Antônio Bravo Mendez, médico hespanhol residente nesta capital, levou hontem parte à Chefatura de Polícia de que havia recebido em sua casa a visita dos srs. Carlos Fontoura e Oscar Machado, os quaes, como testemunhas do sr. Alfredo Porto Alegre, tinham por fim desafia-lo para um duello com este cidadão. O dr. Mendez disse a um nosso companheiro que declarara não aceitar o desafio por não ter o sr. Porto Alegre hierarchia suficiente para se bater com elle (JORNAL A CAPITAL. DUELLO, 1909DUELLO. A Capital, Porto Alegre, 1909, p. 3, p. 3).

Evidente que, ao final das contas, os códigos eram a produção de seus autores, sem os rigores e sanção de ninguém nem de qualquer instituição que cobrasse ou reprimisse o cumprimento ou não das normas (embora o opróbrio social tivesse seu peso), mas havia procedimentos para dirimir questões de interpretação entre os padrinhos, tribunais de honra (cortes informais) e jurisprudência.

Os duelos, portanto, não se destinavam propriamente a ferir e matar o oponente - até porque, a princípio, o risco estava colocado para os dois lados - mas funcionavam como ritual de desagravo não se reduzindo a simples vingança. Era como se houvesse um acordo tácito entre os contendores de que nenhuma das partes queria sair ferida, muito menos morta, então o ato em si não deveria ter intenção letal de nenhuma das partes. Eram comuns que os duelos com arma de fogo ocorressem com tiros disparados para cima, bem como, os duelos de espada fossem de “primeiro sangue”, que dizer, considerados resolvidos ao primeiro ferimento de um dos lados. Mas nem por isso os duelos se traduziam em mera formalidade ou encenação. Era preciso coragem, desejo de reparação da honra, para enfrentar um duelo porque nada garantia que a outra parte cumpriria de fato o referido acordo tácito. Além disso, sempre havia o risco de imperícia de alguma das partes por falta de familiaridade com a arma branca ou de fogo ou por nervosismo.

Em 6 de agosto de 1920, no entanto, as normas que orbitavam no terreno da infrajustiça (MANTECÓN, 2002MANTECÓN, Tomás A. El peso de la infrajuducialidad en el control de crímen durante laEdad Moderna. Estudis. Revista de Historia Moderna, Universitat de Valencia, nº. 28, p. 43.75, 2002.) foram incorporadas à esfera oficial, no Uruguai, redundando na aprovação da Ley del Duelo que descriminalizava tal prática. Em 1934, o novo Código Penal aprovado no Uruguai (ALLER, 2008ALLER, Germán. Reseña histórica de la ley penal uruguaya. In: ALLER, Germán.Dogmática de la acción y praxis penal. Buenos Aires: B de F, 2008, p. 7-22.) incorporou a Ley del Duelo mantendo-a vigente até 1992. Que mudança de percepção se procedeu para que os duelos de crime, ou delito especial, passassem a figurar como formalmente legais entre um Código Penal e outro, distantes apenas poucas décadas entre si e conferindo ao Uruguai uma característica única no universo legal ocidental?

Embora o duelo seja um ato anticatólico e, por isso, sua descriminalização relacione-se com a política batllista, ainda assim, segundo Parker (1999)PARKER, David S. La Ley Penal y las “leyes caballerescas”: hacia El duelo legal em El Uruguay, 1880-1920. In: Anuario IEHS, Instituto de Estudios Históricos Sociales, Facultad de Ciencias Humanas, Universidad Nacional del Centro, Tandil, Argentina, nº 14, 1999, pp.295-330., cabe refletir a respeito do paradoxo de se aprovar uma lei aparentemente bárbara e conservadora num contexto de um governo que se identificava como moderno. Mesmo que houvesse parlamentares contra a aprovação da referida lei, argumentando que, mesmo os duelos sendo um mal necessário, era importante manter a proibição dos mesmos porque este era o papel dos legisladores e o papel da lei - quer dizer, se os legisladores consideravam que o critério público estava equivocado, era seu dever colocar-se a frente do erro para tratar de corrigi-lo - todos eram do acordo que a cumplicidade que prevalecia entre duelistas ou não de guardar silêncio sobre os lances relaciona-se ao fato de que ninguém via nos duelistas pessoas criminosas ou imorais, não havendo uma condenação moral da prática dos duelos em geral.

A década de 1910 marcou no Uruguai o apogeu do positivismo, com a ascensão de uma classe política com formação maciça em direito, combinado aos anos de “disciplinamento” identificados por Barrán (2014)BARRÁN, José P. Historia de la sensibilidad en el Uruguay. La cultura “bárbara” (1800-1860). El disciplinamiento (1860-1920). Montevideo: Banda Oriental, 2014., quer dizer, a prática dos duelos, envolta por toda uma codificação e normativa própria, paradoxalmente trazia uma civilidade à resolução privada de conflitos e configurava um expediente cada vez mais recorrente, sobretudo, entre homens públicos, (políticos, periodistas, etc). Dessa forma, a criminalização dos duelos, levava os duelistas a procederem na clandestinidade em explícito descumprimento da legislação, o que ia de encontro a esse contexto positivista que pressupõe o triunfo da lei. A preocupação em harmonizar o código com a prática cotidiana para que a lei não fosse letra morta foi o que deu à lei do duelo o toque de modernidade que permite compreende-la nesse contexto (PARKER, 1999PARKER, David S. La Ley Penal y las “leyes caballerescas”: hacia El duelo legal em El Uruguay, 1880-1920. In: Anuario IEHS, Instituto de Estudios Históricos Sociales, Facultad de Ciencias Humanas, Universidad Nacional del Centro, Tandil, Argentina, nº 14, 1999, pp.295-330.).

Cabe ressaltar que um dos pontos interessantes do estudo dos duelos de honra é, justamente, as possibilidades de analisar as interseções, trocas e conflitos entre as culturas jurídicas do Estado, as culturas jurídicas das elites (que muitas vezes, erroneamente, são compreendidas como iguais às do Estado) e culturas jurídicas populares (HAY, 2001, p. 415-416HAY, Douglas. Law and Society in Comparative Perspective. In: SALVATORE, Ricardo D.; AGUIRRE, Carlos; JOSEPH, Gilbert M. (Eds.). Crime and Punishment in Latin America: Law and Society since Late Colonial Times. Durham/ London: Duke University Press, 2001, p. 415-430.). O que podemos perceber é que existem múltiplas adaptações e recepções de culturas jurídicas tanto pela elite quanto pelos populares, apesar de não abordarmos suas manifestações nesta análise, para instituir formas de defender a honra ferida.11 11 Nesse sentido, vale a pena referir os diversos trabalhos existentes que abordam variados aspectos de crimes de honra envolvendo populares, os quais levam em consideração o fato de que, apesar da elite crer ser sua exclusividade o sentimento e a legitimidade de defesa e reparo da honra, a rigor populares também tem seus códigos e contendas em função da honra. FAUSTO, Boris. Crime e Cotidiano. A criminalidade em São Paulo (1880-1924). São Paulo: Editora Brasiliense, 1984. CAULFIELD, Sueann. Em defesa da Honra: moralidade, modernidade e nação no Rio de janeiro (1918-1940). Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2000. CHALHOUB, Sidney. Trabalho, lar e botequim: o cotidiano dos trabalhadores no Rio de Janeiro da Belle Époque. São Paulo: Brasiliense, 1986. CARNEIRO, Deivy F. Uma Justiça que seduz? Ofensas verbais e conflitos comunitários em Minas Gerais (1854-1914) Jundiaí-SP: Paco Editorial, 2019. MALLO, S. Hombres, mujeres y honor: injurias, calunias y difamación en Buenos Aires. (1770-1840). Un aspecto de la mentalidad vigente. In: Estudios de Historia Colonial. nº 13, 1993. FERNÁNDEZ, María A. Entre la ley del más fuerte y la fuerza de la ley. Las distintas respuestas frente a los insultos, Buenos Aires. 1750-1810. In: PESAVENTO, Sandra. GAYOL, Sandra. Sociabilidades, justiças e violências: práticas e representações culturais no Cone Sul (séculos XIX e XX). Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008. p.147-172.THOMPSON FLORES, Mariana Flores da Cunha; AREND, J. F. Noções de honra e justiça entre as classes populares da fronteira no Brasil meridional na segunda metade do século XIX - estudo de casos. AEDOS - Revista do Corpo Discente do PPG em História da UFRGS, v. 9, p. 296-315, 2017. VENDRAME, Maíra. O poder na Aldeia: redes sociais, honra familiar e práticas de justiça ente camponeses italianos (Brasil-Itália). São Leopoldo: Oikos, 2016.

Território neutro - os casos de duelos em espaços de fronteira

Os dois casos apontados inicialmente de sujeitos que atravessaram, ou ventilaram atravessar, a fronteira do Brasil rumo ao Uruguai para duelar na legalidade, demonstram, de forma muito bem posta, a dimensão da margem de manobra que os espaços fronteiriços proporcionam ao justaporem distintas legislações. Naqueles casos, o espaço limítrofe possibilitou a realização de determinada ação, considerada ilegal no país de origem dos envolvidos, respaldada pela legislação do outro país. Dessa forma, o aspecto transfronteiriço das relações sociais e culturais compartilhadas nesse espaço, combinado ao elemento da fronteira como um espaço juridicamente heterogêneo, permite-nos compreender o porquê que homens (de elite) se prestaram a atravessar o limite político em busca de um ambiente legal propício para realizar atos violentos de justiça privada.

Contudo, sabemos que o caso da legislação uruguaia de descriminalização dos duelos é singular e sem precedentes e, dessa forma, os referidos casos elucidam uma parte desse uso da fronteira em função da inerente descontinuidade legal que apresenta. Conforme mencionado na parte introdutória, os casos de sujeitos que buscaram espaços fronteiriços para realizar duelos, de outras fronteiras que não necessariamente as do Uruguai, quer dizer, de outros países onde a prática do duelo era igualmente criminalizada, foram muito mais frequentes. Nesses casos, mesmo não procurando amparo legal, vislumbravam na jurisdição de outro país o respaldo de “território neutro”, onde a vigência de outra soberania, da qual não era cidadão, funcionava para colocar-se, se não imune à punição, certamente, mais protegido de qualquer penalização.

Sendo assim, podemos compreender porque se buscava a fronteira uruguaia para duelar mesmo antes da Ley del Duelo, de 1920. Em 1856, no município rio-grandense de Santana do Livramento, fronteiriço com o Uruguai, o capitão José de Mello Pacheco de Rezende, registrou em correspondência ao Tenente Israel Rodrigues que a continuidade das provocações do Capitão Francisco da Fontoura “me forçarão a chamalo a Paiz Estrangeiro, donde livre do rigor das leis do meu Paiz, lhe podesse impor silencio com a ponta do meu gladio”12 12 Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul (AHRGS). Alegrete. Justiça. Maço 1. Ano 1856.

Em termos mais gerais, mas sem dúvida inserido nessa mesma ideia, vale referir a análise já consagrada de Chasteen (1990)CHASTEEN, J.C. Violence for show: knife dueling on a nineteenth-century. Cattle Frontier. In: The problem of order in changing societies: essays on crime and policing in Argentina and Uruguay, 1750-1949. JOHNSON, L.L. (ed.) Albuqyerques: University of New Mexico Pres, 1990. a respeito dos duelos com faca travados por gaúchos, na fronteira do Brasil-Uruguai, no período após a Guerra da Cisplatina, os quais demonstram a importância da defesa da honra na cultura desses homens de fronteira, representando um dos bens mais importantes no universo destes indivíduos.

No mesmo sentido, mas no contexto das décadas finais do século XIX, Parker informa o caso do duelo ocorrido entre Enrique Romero Giménez, jornalista espanhol-argentino, diretor do El Correo Español, e José Paul y Angulo, diretor de La España Moderna, em agosto de 1880, quando os jornalistas dirigiram-se de Buenos Aires a Montevideu “específicamente para batirse en duelo” (1999, p.301PARKER, David S. La Ley Penal y las “leyes caballerescas”: hacia El duelo legal em El Uruguay, 1880-1920. In: Anuario IEHS, Instituto de Estudios Históricos Sociales, Facultad de Ciencias Humanas, Universidad Nacional del Centro, Tandil, Argentina, nº 14, 1999, pp.295-330.).

Conforme mencionamos anteriormente, os enfrentamentos em defesa da honra adquiriam, em finais do século XIX e inícios do século XX, um aspecto modernizador para a construção do ideal de masculinidade burguesa (GAYOL, 2004). Fazia parte do repertório de rituais que legitimavam um determinado sujeito reivindicar e fazer parte da elite social, política e cultural. O caso recém mencionado envolvendo dois jornalistas não só não surpreende, como demonstra-se bastante apropriado ao contexto no qual ocorre. Nesse período, chama a atenção a forma como a informação sobre os duelos de honra circulava de maneira acelerada em mundo que se conectava, via os modernos cabos submarinos, que tornavam a imprensa brasileira, e latino-americana, uma propagadora de um ideário burguês de honradez.13 13 Sobre o tema dos efeitos do cabeamento submarino na circulação e aceleração das notícias ver os trabalhos de Lila Caimari, em especial CAIMARI, Lila. Noticias del mundo. Los diarios de Buenos Aires en la era del cable submarino (1866 - 1900). In: Hispanic American Historical Review.96: 4, p.607-640, 2016. Mais do que avanços tecnológicos, “supõe-se que há a criação de um imaginário e uma memória coletiva de que ambos (imaginário e memória) são o resultado da intensa troca de representações do mundo contemporâneo nas páginas dos jornais” (GUIMARÃES, 2012, p. 149GUIMARÃES, Valéria. Du paquebot au télégraphe: la presse populaire étrangère au Brésil au tournant du XXe siècle. In: COOPER-RICHET, Diana; MOLLIER, Jean Yves (orgs.). Le Commerce Transatlatique de Librairie: un des fondaments de la mondialisation culturelle (France, Portugal, Brésil, XVIII - ‐ XX siècle). Campinas, SP: Instituto de Estudos da Linguagem - IEL/ Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP, 2012, p. 149-162.).

A respeito dos novos interesses do público leitor e da variedade de temas presente na imprensa da época, Pereira afirma que

O resultado da tensão entre a proposta editorial dos grupos empresariais que patrocinavam cada folha e as expectativas dos diversos grupos de leitores que podiam ter por elas algum interesse se expressa, em primeiro lugar, na polifonia que caracterizava os jornais do período. No intuito de chamar o interesse do leitor, os jornais comerciais que se afirmam a partir das últimas décadas do século XIX haviam se aberto para diferentes seções e colunas que tentavam contemplar o interesse de certos grupos de leitores. Estas tanto se voltavam para temas e questões específicas, como os crimes, o esporte ou a vida suburbana, quanto incorporavam colaboradores que nem sempre faziam parte das redações ou comungavam dos mesmos ideais de seus diretores, como os responsáveis pelas crônicas literárias e seções teatrais.(2016PEREIRA, Leonardo Affonso de Miranda. Negociações Impressas: a imprensa comercial e o lazer dos trabalhadores no Rio de Janeiro da Primeira República. História, Franca, v. 35, e99, 2016. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/2GtN5Qg . Acesso em: 19 fev. 2019.
https://bit.ly/2GtN5Qg...
, p. 9)

Nesse profuso noticiário, o interesse público por consumir notícias e outros tipos de publicações sobre crimes e criminosos (revistas policiais, romances, etc), entre as décadas finais do século XIX e as iniciais do século XX, já está bem demonstrado por autores como Cancelli (2001, p.101-105)CANCELLI, Elizabeth. A cultura do crime e da lei, 1889-1930. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 2001., Gayol (2008a)GAYOL, Sandra. Honor y Duelo en la Argentina Moderna. Buenos Aires: Siglo XXI Editores, 2008. , Galeano e Bretas (2016)GALEANO, Diego; BRETAS, Marcos Luiz. (coords.).Policías escritores, delitos impresos. Revistas policiales em América del Sur. La Plata: Tesseo Press, 2016.. Desse modo, as notícias sobre duelos ocorridos em diversas partes do mundo ganham páginas quase que diariamente em todos os jornais, sendo copiadas e recopiadas, reunindo os elementos de uma imprensa de variedades que contempla um público interessado em crimes e contendas violentas (nas quais os duelos se incluem), e a construção de um ideário burguês de honradez.

Os registros na imprensa sobre duelos reportam enfrentamentos em diversos países europeus e latino-americanos e através deles é possível verificar que a elite fazia uso do recurso aos territórios neutros, ou além fronteira nacional, para engendrar seus combates em defesa da honra. Como, por exemplo,

Santiago, 1 (A.A.) - O duelo entre os senadores Arturo Alessandri e Guilhermo Rivera não poude effectuar-se, apesar de haver os contendores procurado bater-se na fronteira chileno-argentina. Acredita-se, porém, que esse encontro se verificará, talvez em alguma quinta particular, não obstante os esforços que os amigos desses dois políticos têm empregado para evita-lo (JORNAL O PAIZ, Duello entre senadores, 23/01/1920DUELLO entre senadores. O Paiz, Rio de Janeiro, 23 de janeiro de 1920, p. 2., p. 2).

Em 3 de abril de 1920, o Jornal do BrasilDUELLO em perspectiva. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 03 de abril de 1920, p. 4., do Rio de Janeiro, publica uma matéria com o seguinte título, em caixa alta, “Duello em perspectiva. O Director do “O Paiz” quer bater-se com o senador Saguier da Argentina”, logo após seguia o seguinte texto:

A capital uruguaya, que hontem foi theatro de uma scena de duello, com desenlace trágico e deplorável, parece que vae ser de novo o ponto escolhido para um outro encontro, pelas armas, entre dous contendores estrangeiros. Desde ante-hontem que a nossa reportagem tivera conhecimento do desafio que ao Senador Saguier, da Alta Câmara Argentina, enviou o Sr. João Lage, director do “Paiz”.A princípio, suppuzemos tratar-se de um inocente “Poisson d´Avril”, mas hontem chegamos a apurar, com toda a segurança, a veracidade das informações que colhêramos dias atraz, em boa fonte.

O caso se prende aos artigos que o director do “Paiz” publicou no seu jornal, de regresso de Buenos Aires, acerca da personalidade do presidente Irigoyen. Os comentários feitos pelo Sr. Lage, parece, não ecoaram sympathicamente nos círculos radicais portenhos, e o Senador Saguier, em cuja residência se encontrou aquelle jornalista com o chefe do Estado argentino, dirigiu uma carta à “Nacion”, estranhando a conducta de seu hospede.O director do “Paiz” telegraphou ao Sr. Saguier, dizendo não acreditar que elle houvesse escripto semelhante carta. Em resposta, o parlamentar argentino telegraphou-lhe, afirmando que a confirmava em todos os seus tópicos. Nada tinha a retirar. Era expressão fiel da verdade e dos seus sentimentos o quanto escrevera.Replicando, é que o Sr. Lage lhe enviou a promessa de desafio, para duello, em território neutro, que no caso é o Uruguay.

Ao que sabemos, uma das testemunhas do director do “Paiz” irá daqui do Rio, a fim de desafiar o Senador Saguier, em Buenos Aires. Dizia-se hontem, na Avenida, que essa testemunha seria o Conselheiro Camelo Lampreia (JORNAL DO BRASIL, DUELLO, 03/04/1920, p. 4DUELLO em perspectiva. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 03 de abril de 1920, p. 4.).

A longa citação nos apresenta um rumoroso caso de defesa da honra pelo duelo em que estão envolvidas pessoas da elite da imprensa e da política de dois países, tratava-se de um senador da república argentina e de um diretor de importante jornal da capital federal brasileira. A polêmica durou vários dias e gerou páginas de matérias e debates na imprensa dos três países envolvidos, Brasil, Argentina e Uruguai. Em território brasileiro um amplo espectro de jornais do país replicou as matérias, da grande imprensa da capital federal aos jornais das capitais de província, passando por jornais católicos e operários. Todos eles, além de noticiar o caso específico, de alguma forma posicionavam-se sobre a prática dos duelos de honra. Mas, o que mais chama a atenção, além das posições favoráveis ou contrárias, é como esse assunto estava presente no cotidiano da imprensa e como a honorabilidade de uma certa elite e a sua defesa pelos duelos de honra ainda mobilizava o debate público na imprensa.

Por outro lado, há um relativo silêncio das autoridades policiais locais, uma explicação plausível é que afinal o duelo que se divulga trata de assuntos extraterritoriais e não envolve autoridades brasileiras. Nesse caso, a ideia que perpassou todo esse texto volta à evidência: a diferenças entre as legislações penais dos Estados envolvidos indica que transpor limites políticos era um recurso utilizado pelos duelistas para fugirem da perseguição da lei.

Disso decorre outra evidência importante, a de que diferentes substratos de culturas jurídicas dos grupos sociais que defendem e participam dos duelos, proporcionaram conflitos interpretativos jurídicos-legais, disputas e apropriações do direito de defender a honra entre setores da elite e setores populares, além da discussão do papel, ora de atraso/ grotesco, ora modernizador/ moralizador, que a prática dos duelos provocava em diferentes grupos sociais, redundando na questão da regulação e codificação do campo de defesa da honra.

A transição de uma sociedade aristocrática e monárquica para as sociedades burguesas e republicanas não significou o fim da honra, e de seus sistemas de defesa, mas uma reconfiguração de seus significados e uma reestruturação de suas definições sociais, como é possível ver nas ascendentes classes burguesas brasileiras, e latino-americanas, e seus usos dos duelos de honra. Embora a diversidade de tópicos que existem sob o conceito de “honra” torne o seu estudo uma tarefa complexa, é possível entendê-lo como uma forma de “sacralidade mundana” que une esta sociedade burguesa através de uma série de crenças e valores, necessários para a criação de laços entre indivíduos (UNDURRAGA, 2018UNDURRAGA, Verónica. Honor. In: BURNARD, Trevor (ed.). Oxford Bibliographies in Atlantic History. New York: Oxford University Press, 2018. Disponível em:Disponível em:http://www.oxfordbibliographies.com/obo/page/atlantic-history . Acesso em 19 fev. 2019.
http://www.oxfordbibliographies.com/obo/...
). Dessa forma, é preciso ter em conta que é central a questão da masculinidade nos estudos da honra, ou da honra nos estudos da masculinidade, sem deixar de perceber que tanto a construção da honra como da masculinidade tem a ver, também, com diferenças raciais, de classe, religiosas e nacionais, quanto com a diferença de sexo. Por fim, o estudo dos duelos de honra abre um amplo campo de intersecções possíveis para análises da historiografia contemporânea.

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  • 1
    Para Rui Cunha Martins, o Estado torna-se “facto notório” através do estabelecimento de marcos fronteiriços e das cerimônias que os envolvem (MARTINS, 2008, p. 113MARTINS, Rui Cunha. O método da fronteira: radiografia histórica de um dispositivo contemporâneo (matrizes ibéricas e americanas). Coimbra: Edições Almedina, 2008.), pelo exercício das funções burocráticas do Estado levadas a cabo pelos poderes locais que se mostram, surpreendentemente, conservadores e não tendem a mostrar grande desalinho com o centro, já que acabam sendo os grandes beneficiários dos estímulos econômicos proporcionados pela fronteira (MARTINS, 2008, p. 35MARTINS, Rui Cunha. O método da fronteira: radiografia histórica de um dispositivo contemporâneo (matrizes ibéricas e americanas). Coimbra: Edições Almedina, 2008.) .
  • 2
    Mesmo que os Estados Nacionais ainda não estejam devidamente estabelecidos e, respectivamente, nem as identidades nacionais, estaremos falando de múltiplas relações de identidade possíveis, como as provinciais, por exemplo, que se demarcam de um lado e outro da fronteira. Sobre esse aspecto, a noção de “estrangeiridade”, cunhada pelo antropólogo Alejandro Grimson, é fundamental e consiste no fato de que habitar um espaço de fronteira sugere, de forma recíproca e incontornável, o fato de ser estrangeiro diante dos habitantes do outro lado (GRIMSON, 2003, p. 24GRIMSON, Alejandro. La nación en sus límites: contrabandistas y exiliados en la frontera Argentina-Brasil. Barcelona: Gedisa, 2003.).
  • 3
    Para a autora, os circuitos desterritorializados na fronteira platina do Rio Grande do Sul começaram a se formar a partir da invasão da Banda Oriental (1811-1816), que contou com forças rio-grandenses (CHINDEMI, 1999, p. 7-35CHINDEMI, Julia Valeria. Las tradiciones de frontera internacional en Rio Grande delSur: un análisis en la larga duración. Dissertação de Mestrado - UNB, Brasília, 1999.).
  • 4
    Esse mote constitui o argumento central desenvolvido no texto “O duelo e a defesa da honra viril” de FrançoisGuillet, In: CORBIN, COURTINE, VIGARELLO, 2013CORBIN, Allan; COURTINE, Jean-Jacques; VIGARELLO, Georges. (Org.) História da Virilidade. Petrópolis: Vozes, 2013. Vol. 2. O triunfo da virilidade - O século XIX., p. 97-152.
  • 5
    A complexa formulação de regras e a constituição de sociedades de duelistas como mecanismos de distinção são temas abordados por Norbert Elias a respeito da elite alemã do século XIX. Ver: ELIAS, 1997ELIAS, Norbert. Os alemães: a luta pelo poder e a evolução do habitus nos séculos XIX e XX. Rio de Janeiro: J. Zahar, 1997..
  • 6
    Lembremo-nos que os duelos ocorriam secretamente devido sua criminalização (embora saibamos da condescendência com o qual a legislação penal os tratava), por isso, esses números além de não serem exatos devem subregistrar o total real das ocorrências.
  • 7
    Os estudos sobre duelos ainda são, proporcionalmente a outros temas historiográficos, reduzidos na América Latina. Mesmo assim, temos estudos, a partir da década de 1990, que abrangem do século XVI à primeira metade do século XX, que tratam de duelos entre membros das elites e dos setores populares, em comum enfrentam a dificuldade de acesso às fontes que descrevam práticas que eram em grande parte discretas ou secretas. Podemos citar, entre os trabalhos que abordam o tema para a América Latina, CHASTEEN, 1990CHASTEEN, J.C. Violence for show: knife dueling on a nineteenth-century. Cattle Frontier. In: The problem of order in changing societies: essays on crime and policing in Argentina and Uruguay, 1750-1949. JOHNSON, L.L. (ed.) Albuqyerques: University of New Mexico Pres, 1990.; PICCATO, 1999PICCATO, Pablo. Politics and the Technology of Honor: Dueling in Turn-of-the-Century Mexico. Journal of Social History, Vol. 33, nº 2, 1999, p. 331-354.; PARKER, 1999PARKER, David S. La Ley Penal y las “leyes caballerescas”: hacia El duelo legal em El Uruguay, 1880-1920. In: Anuario IEHS, Instituto de Estudios Históricos Sociales, Facultad de Ciencias Humanas, Universidad Nacional del Centro, Tandil, Argentina, nº 14, 1999, pp.295-330., 2000PEREIRA, Leonardo Affonso de Miranda. Negociações Impressas: a imprensa comercial e o lazer dos trabalhadores no Rio de Janeiro da Primeira República. História, Franca, v. 35, e99, 2016. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/2GtN5Qg . Acesso em: 19 fev. 2019.
    https://bit.ly/2GtN5Qg...
    ; GAYOL, 1999GAYOL, Sandra. Duelos, honores, leyes y derechos: Argentina 1887-1923. Anuario IEHS, Instituto de Estudios Históricos Sociales, Facultad de Ciencias Humanas, Universidad Nacional del Centro, Tandil, Argentina, nº 14, 1999, p. 313-330., 2004, 2008GAYOL, Sandra. Honor y Duelo en la Argentina Moderna. Buenos Aires: Siglo XXI Editores, 2008. ; AGUILERA PEÑA, 2000AGUILERA PEÑA, Mario. Ofensas al honor y Duelos a Muerte. Credencial Historia, Bogotá, Nº 132, dic. 2000, p. 8-12.; para o Brasil temos, REMEDI, 2003REMEDI, José M. R. Discussões acerca do estudo sobre Duelos de Honra no Rio Grande do Sul. Artcultura - Revista do Nehac, Uberlândia - MG, v. 5, nº. 6, p. 115-122, 2003., 2009REMEDI, José M. R. Intelectuais e honorabilidade: O papel dos duelos como forma de pertencimento ao campo social. Métis: História e Cultura, vol. 8,nº. 15, 2009, p. 167-84., 2011REMEDI, José M. R. Um lance cavalheiresco: Duelo e representação da honra na literatura. Delaware Review of Latin American Studies, vol. 10,nº. 2, 2009. Disponível em: Disponível em: http://www.udel.edu/LAS/Vol10-2RodriguesRemedi.html . Acesso em 23 fev. 2019.
    http://www.udel.edu/LAS/Vol10-2Rodrigues...
    ; BRAGA-PINTO, 2014BRAGA-PINTO, César. Journalists, Capoeiras, and the Duelin Nineteenth-Century Rio de Janeiro. Hispanic American Historical Review 94:4, January 2014, p. 581-614.; THOMPSON FLORES, 2016THOMPSON FLORES, Mariana F. da C . Prática de duelos no Prata: um estudo das leis penais e dos códigos cavalheirescos. In: ENCONTRO ESTADUAL DE HISTÓRIA DA ANPUH RS, 12, 2016. Anais... Santa Cruz do Sul, RS: UNISC, 2016 , p. 1-13.; e, THOMPSON FLORES, AREND, 2017THOMPSON FLORES, Mariana Flores da Cunha ; AREND, J. F. Noções de honra e justiça entre as classes populares da fronteira no Brasil meridional na segunda metade do século XIX - estudo de casos. AEDOS - Revista do Corpo Discente do PPG em História da UFRGS, v. 9, p. 296-315, 2017..
  • 8
    As argumentações apresentadas em defesa desse projeto de lei eram idênticas as que foram defendidas no contexto da descriminalização do duelo no Uruguai anos depois. Ver: GAYOL, 1999, p. 313-330GAYOL, Sandra. Duelos, honores, leyes y derechos: Argentina 1887-1923. Anuario IEHS, Instituto de Estudios Históricos Sociales, Facultad de Ciencias Humanas, Universidad Nacional del Centro, Tandil, Argentina, nº 14, 1999, p. 313-330..
  • 9
    Jornal A Razão. Entrevista com Alcântara Machado. 4/7/1939ENTREVISTA com Alcântara Machado. Jornal A Razão, Santa Maria, 04 de julho de 1939, p. 3..
  • 10
    Há teorias de que o desfecho do duelo entre Batlle e Beltrán teve contornos de assassinato, teria desrespeitado os códigos cavalheirescos já que os primeiros tiros foram para cima, das duas partes, mas o seguinte foi, por parte de Batlle, em direção a parte superior do corpo de Beltrán, visando claramente atingi-lo. Essa descrição do duelo é respaldada por uma autopsia histórica realizada pelo médico legista Guido Berro em 2011 com base na autópsia descrita no processo crime do duelo. Outra fonte que defende a hipótese do assassinato é o jornalista Diego Fischer, que defende que a descrição da autópsia do processo indica o uso de “bala marcada” por parte de Batlle (artifício empregado no projétil para que tenha maior letalidade). Ver: BERRO, 2011BERRO, Guido; TURNES, Antônio L. Autopsia histórica: la muerte de Washington Beltrán Barbat em 1920. Revista Médica Uruguaya, nº. 27, p. 112-119, 2011.; FISCHER, 2010FISCHER, Diego. Qué tupé, Batlle-Beltrán, ¿duelo o asesinato? Montevideo: Debolsillo, 2010..
  • 11
    Nesse sentido, vale a pena referir os diversos trabalhos existentes que abordam variados aspectos de crimes de honra envolvendo populares, os quais levam em consideração o fato de que, apesar da elite crer ser sua exclusividade o sentimento e a legitimidade de defesa e reparo da honra, a rigor populares também tem seus códigos e contendas em função da honra. FAUSTO, Boris. Crime e Cotidiano. A criminalidade em São Paulo (1880-1924FAUSTO, Boris. Crime e Cotidiano. A criminalidade em São Paulo (1880-1924). São Paulo: Editora Brasiliense, 1984.). São Paulo: Editora Brasiliense, 1984. CAULFIELD, Sueann. Em defesa da Honra: moralidade, modernidade e nação no Rio de janeiro (1918-1940)CAULFIELD, Sueann. Em defesa da Honra: moralidade, modernidade e nação no Rio de janeiro (1918-1940). Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2000. . Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2000. CHALHOUB, SidneyCHALHOUB, Sidney. Trabalho, lar e botequim: o cotidiano dos trabalhadores no Rio de Janeiro da Belle Époque. São Paulo: Brasiliense, 1986.. Trabalho, lar e botequim: o cotidiano dos trabalhadores no Rio de Janeiro da Belle Époque. São Paulo: Brasiliense, 1986. CARNEIRO, Deivy FCARNEIRO, Deivy F. Uma Justiça que seduz? Ofensas verbais e conflitos comunitários em Minas Grais (1854-1914) Jundiaí-SP: Paco Editorial, 2019.. Uma Justiça que seduz? Ofensas verbais e conflitos comunitários em Minas Gerais (1854-1914) Jundiaí-SP: Paco Editorial, 2019. MALLO, SMALLO, S. Hombres, mujeres y honor: injurias, calunias y difamación en Buenos Aires. (1770-1840). Un aspecto de la mentalidad vigente. In: Estudios de Historia Colonial. nº 13, 1993.. Hombres, mujeres y honor: injurias, calunias y difamación en Buenos Aires. (1770-1840). Un aspecto de la mentalidad vigente. In: Estudios de Historia Colonial. nº 13, 1993. FERNÁNDEZ, María A. Entre la ley del más fuerte y la fuerza de la ley. Las distintas respuestas frente a los insultos, Buenos Aires. 1750-1810FERNÁNDEZ, María A. Entre la ley del más fuerte y la fuerza de la ley. Las distintas respuestas frente a los insultos, Buenos Aires. 1750-1810. In: PESAVENTO, Sandra, GAYOL, Sandra. Sociabilidades, justiças e violencias: práticas e representações culturais no Cone Sul (séculos XIX e XX). Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008. p.147-172.. In: PESAVENTO, Sandra. GAYOL, Sandra. Sociabilidades, justiças e violências: práticas e representações culturais no Cone Sul (séculos XIX e XX). Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008. p.147-172.THOMPSON FLORES, Mariana Flores da Cunha; AREND, J. F. Noções de honra e justiça entre as classes populares da fronteira no Brasil meridional na segunda metade do século XIX - estudo de casos. AEDOS - Revista do Corpo Discente do PPG em História da UFRGS, v. 9, p. 296-315, 2017THOMPSON FLORES, Mariana Flores da Cunha ; AREND, J. F. Noções de honra e justiça entre as classes populares da fronteira no Brasil meridional na segunda metade do século XIX - estudo de casos. AEDOS - Revista do Corpo Discente do PPG em História da UFRGS, v. 9, p. 296-315, 2017.. VENDRAME, Maíra. O poder na Aldeia: redes sociais, honra familiar e práticas de justiça ente camponeses italianos (Brasil-Itália). São Leopoldo: Oikos, 2016VENDRAME, Maíra. O poder na Aldeia: redes sociais, honra familiar e práticas de justiça ente camponeses italianos (Brasil-Itália). São Leopoldo: Oikos, 2016..
  • 12
    Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul (AHRGS). Alegrete. Justiça. Maço 1. Ano 1856Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul (AHRGS).Alegrete. Justiça. Correspondências. Maço 1. Ano 1856. .
  • 13
    Sobre o tema dos efeitos do cabeamento submarino na circulação e aceleração das notícias ver os trabalhos de Lila Caimari, em especial CAIMARI, Lila. Noticias del mundo. Los diarios de Buenos Aires en la era del cable submarino (1866 - 1900). In: Hispanic American Historical Review.96: 4, p.607-640, 2016CAIMARI, Lila. Noticias del mundo. Los diarios de Buenos Aires en la era del cable submarino (1866 - 1900). In: Hispanic American Historical Review. 96: 4, p.607-640, 2016..

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    14 Maio 2019
  • Aceito
    07 Nov 2019
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