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O principal Antônio da Costa Marapirão: políticas indígenas e políticas indigenistas na Amazônia Portuguesa (século XVII)

The principal Antônio da Costa Marapirão: indigenous policies and policies on Indians in the Amazônia Portuguesa (17th Century)

RESUMO

Pretendemos analisar a trajetória de um chefe indígena chamado Antônio da Costa Marapirão, habitante da capitania do Maranhão, durante o século XVII. A escolha do personagem, além da sua aparição em variadas fontes portuguesas (base empírica de nossa pesquisa), explica-se por sua participação nos eventos que ajudaram a formar, consolidar e/ou executar a legislação indigenista. Procuraremos demonstrar que se o índio, por um lado, buscou alianças junto a agentes externos à sua comunidade (elites locais, autoridades diversas e, sobretudo, a monarquia), por outro, o vínculo entre o líder e sua família, nação e/ou aldeamento era elemento indispensável de sua atuação política.

Palavras-chave:
Amazônia colonial; lideranças indígenas coloniais; mercês régias; políticas indígenas; políticas indigenistas

ABSTRACT

We intend to analyze the trajectory of an indigenous leadership named Antônio da Costa Marapirão, inhabitant of the captaincy of Maranhão, during the 17th century. The choice of the character, in addition to his appearance in various Portuguese sources (empirical basis of our research), is explained by his participation in the events that helped to form, consolidate and/or execute the indigenous legislation. We will try to demonstrate that if the Indian, on the one hand, seeks alliances with external agents to his community (local elites, diverse authorities and, above all, the monarchy), on the other, the bond between the leader and his family, nation and/or community was a indispensable element of his political performance.

Keywords:
Colonial Amazon; colonial indigenous leaders; king’s benefits; indigenous policies; policies on Indians

Em 1648, o índio Antônio da Costa estava no reino para, segundo uma petição debatida no Conselho Ultramarino, solicitar do monarca “de propriedade” o cargo de principal da nação tabajara e a mercê do hábito da Ordem de Cristo. Conforme o requerimento, o pedido se justificava por via das atuações de Antônio e seu pai, Marcos da Costa, em favor dos portugueses durante a chamada restauração do Maranhão - a expulsão dos holandeses que ocuparam, sobretudo, a Ilha do Maranhão entre 1641 e 1644; além de garantir que o mencionado pai possuía a mesma mercê do hábito de Cristo (AHU MaranhãoArquivo Histórico Ultramarino (AHU): Avulsos do Maranhão e Pará., cx. 3, doc. 268).

Em consulta sobre o caso, o conselho solicitou a opinião do recém-nomeado governador do Estado do Maranhão e Grão-Pará (composto por capitanias reais, Maranhão e Pará, e donatariais) Luís de Magalhães, que, antes de embarcar, para satisfazer o pedido do conselho interrogou alguns “práticos” do Maranhão ainda no reino, já que desconhecia a conquista para a qual fora designado. Segundo a mesma consulta, o governador - assim como posteriormente o conselho e o próprio rei, que acataria a sugestão dos conselheiros - considerava as justificativas plausíveis e, portanto, recomendava a satisfação do pedido atribuído a Antônio e a sucessão do comando do aldeamento de seu pai - Cojupe, localizado na Ilha do Maranhão - “para si e seus descendentes”, pois, conforme as informações coletadas, tratava-se de um fiel vassalo que conduziu índios à causa portuguesa durante os confrontos contra os holandeses. Em meio aos conflitos, completava Luís de Magalhães, o índio e seu pai foram presos pelos flamengos e enviados à capitania de Pernambuco, que esteve sob posse batava entre 1630 e 1654, mas conseguiram escapar na altura da capitania do Ceará. Assim, retornavam para o Maranhão quando, durante a travessia de um rio, morreu Marcos da Costa - substituindo-o Antônio no comando do mencionado aldeamento (posto, agora, à espera da confirmação régia). Por fim, ainda segundo Magalhães, Antônio da Costa conduziu seis prisioneiros portugueses que também estavam sendo remetidos a Pernambuco pelos holandeses (AHU MaranhãoArquivo Histórico Ultramarino (AHU): Avulsos do Maranhão e Pará., cx. 3, doc. 268).

Em 1650, governando o Estado desde 1649, Luís de Magalhães inverteu completamente a sua antiga avaliação sobre os dois índios. Por essa, Marcos da Costa era, na verdade, “um dos maiores traidores que aqui havia em tempo dos holandeses”, pois delatara os planos lusos de iniciar um levante contra os flamengos instalados em São Luís (capital da capitania do Maranhão e cabeça do Estado), motivo pelo qual dez ou doze portugueses foram mortos. Por tais ações, Marcos e seu filho Antônio da Costa foram enviados a Pernambuco pelos batavos para receber gratificações (os “honrar”) do governador Maurício de Nassau. No meio do caminho, conforme Magalhães, “eles se enfadaram de ir no barco” e decidiram retornar ao Maranhão, ocasião na qual o pai de Antônio foi devorado por um tubarão (AHU MaranhãoArquivo Histórico Ultramarino (AHU): Avulsos do Maranhão e Pará., cx. 3, doc. 292). Como explicar, enfim, essas imagens opostas (ora fiel vassalo, ora inegável traidor de S. Majestade) projetadas pelo governador? Acreditamos que essa inversão está relacionada aos conflitos que, a partir do Estado, influíram na formação e condução da política e legislação indigenista voltadas à região.

Nesse sentido, conforme a documentação portuguesa, para adquirir mercês régias o chefe esteve em dois momentos na Corte lusitana, nos anos de 1648 e 1649 e entre 1661 e 1662, períodos considerados chaves para a formação e a consolidação da legislação indigenista. Portanto, nesses casos, a aquisição de mercês pelos indígenas e a elaboração da legislação eram medidas articuladas numa mesma conjuntura, como se verá, não raro com o apoio das elites locais das capitanias do Maranhão e Pará. Assim sendo, por um lado, foi especificamente a partir do ano de 1647 que diversos pontos acerca do trabalho indígena livre foram regulados: o tratamento apropriado à condição de forros, a remuneração mensal mínima, o tempo de serviço, a isenção de certos trabalhos (considerados penosos), a escolha de seus patrões, a proibição da administração dos aldeamentos por particulares (os chamados capitães de aldeias), dentre outros temas. Por outro lado, durante a década de 50 dos seiscentos, os jesuítas conquistaram da monarquia exclusividade para administrar os aldeamentos (o poder temporal), iniciando efetivamente a obra missionária, e as normas para o cativeiro dos índios foram detalhadamente reguladas - definindo restritivas regras para a condução das guerras justas e dos resgates.

Contudo, a consolidação da legislação indigenista, além do interesse imperial, possuía profunda relação com a realidade e a sociedade coloniais, pois, como observaremos, era também a partir dos conflitos ocorridos localmente que as leis ganhavam corpo - ocasiões nas quais a monarquia visava sanar esses embates. Dentre esses, destacam-se a guerra contra os holandeses, que ocuparam o Maranhão entre 1641 e 1644 e o norte do Brasil entre 1630 e 1654, como e os conflitos que, envolvendo o controle sobre a força de trabalho indígena, opuseram as elites locais e outras autoridades ao novo governador Luís de Magalhães e, posteriormente, aos missionários jesuítas - culminando em um motim e na expulsão destes últimos, em 1661, e em novo regulamento, de 1663, sobre a administração dos aldeamentos, que, não obstante o retorno dos jesuítas, concedia aos colonos e aos principais indígenas maior gerência sobre esses povoados.

Também chamado de Antônio da Costa Marapirão em outras fontes, o chefe em estudo participou desses eventos, pois, estando na Corte portuguesa em 1648, solicitou e foi agraciado com as referidas mercês pela atuação (sua e de seu pai) na guerra contra os holandeses, retornou com o novo governador Luís de Magalhães em 1649, que foi incumbido de aplicar a nova legislação sobre os índios livres, e, em seguida, conflitou contra a mesma autoridade pela aplicação efetiva da mencionada legislação (supostamente desrespeitada pelo próprio governador). Posteriormente, com a chegada dos jesuítas nos anos 1650, Marapirão participou de um novo embate, dessa vez contra essa ordem missionária - na pessoa do famoso padre Antônio Vieira - e o poder temporal (administração) que a Companhia de Jesus passou a deter sobre os aldeamentos. Após o motim de 1661, o índio esteve pela segunda vez na Corte, como se disse, para a um só tempo solicitar nova mercê e justificar aquela revolta, da qual fora acusado de participar. Em ambos os casos, a documentação portuguesa apresentava o chefe como aliado a membros das referidas elites locais e/ou outras autoridades - os “inimigos” de Magalhães e Vieira.

Gerada em meio a conflitos ocorridos no seio da sociedade colonial, essa documentação - grosso modo, correspondências, petições, pareceres e representações debatidos no Conselho Ultramarino - apresentava informações contraditórias sobre o chefe. Nesse sentido, diante da monarquia, duas imagens conflitantes sobre o índio eram apresentadas: para seus aliados, Marapirão representava um fiel servidor de Sua Majestade e testemunha a ser ouvida para o entendimento das motivações ou justificativas dos referidos embates; e, segundo seus detratores, um traidor (ou possível traidor) dos portugueses e um indivíduo facilmente influenciável ou manipulável - o que inviabilizava seu testemunho enquanto “verdade” objetiva. O próprio Conselho Ultramarino estava ciente do desencontro de opiniões, pois classificava as informações sobre o índio remetidas por Vieira e por um representante da elite local como “ambas suspeitosas” (ABAPEP, 1981, p. 385).

Contudo, essas diferentes e conflitantes opiniões apresentavam um ponto de convergência: a capacidade de mobilizar muitos indígenas, isto é, somente a liderança sobre muitos índios permitia a Marapirão servir com lealdade ou trair a monarquia portuguesa (se quisesse, de fato, representar uma ameaça considerável). Nesse último ponto, a presença holandesa constituía fator importante, que, como se verá, percorreu a trajetória do chefe. Essa liderança, e dessa vez as fontes concordavam, dependia do vínculo entre Marapirão e sua nação, sua família e outros índios. Enfim, não somente os consentimentos, mas também as contradições presentes na documentação, ao invés de inviabilizar a análise, destacavam a chave dos conflitos - a capacidade de liderança do chefe - e constituem um poderoso instrumento para o estudo da vida política colonial e do protagonismo indígena. Portanto, objetivamos demonstrar que a estratégia de atuação na sociedade colonial adotada por Antônio da Costa Marapirão estabelecia uma rede de reciprocidade - definida a partir de interesses convergentes e alianças políticas - entre o principal, a monarquia, as autoridades leigas e eclesiásticas, a elite local e, fundamentalmente, os demais índios - sejam eles parentes, integrantes de sua nação tabajara, outras lideranças indígenas e/ou quaisquer outros.

As elites indígenas coloniais

Em relação às elites indígenas do Brasil colonial, alguns estudos destacam verdadeiras linhagens conquistadoras e/ou restauradoras que, atuando nesses embates em favor dos portugueses contra “estrangeiros”, galgaram patentes militares, sesmarias e/ou mercês como hábitos de cavaleiro de Ordem Militar (Cristo, Santiago e Avis) por décadas ou, mesmo, séculos. Constituem exemplos conhecidos os temiminós do Rio de Janeiro, a partir da atuação da família Sousa contra os franceses no século XVI, os potiguaras do norte do Estado do Brasil, em função da participação dos Camarão na conquista do Maranhão e na guerra da restauração contra os holandeses no Brasil seiscentista, e os tabajaras da Serra da Ibiapaba (capitania do Ceará), por via dos Sousa e Castro desde fins do século XVII.

Por vezes, as patentes concedidas destacavam diretamente o vínculo do oficial à família e nação e, não raro, o termo/título “Dom” antecedia seus respectivos nomes em documentação variada. Os Sousa e os Sousa e Castro talvez perduraram até o início do século XIX, enquanto os Camarão mantiveram cargos e outras mercês até os primeiros anos dos setecentos. Em relação às referidas famílias temiminó e potiguara, suas influências espraiavam-se para outros aldeamentos e/ou capitanias, pois se os Sousa possuíram oficiais em outros aldeamentos do Rio de Janeiro, os Camarão, além da patente de governador dos índios de Pernambuco, galgaram postos oficiais em aldeamentos das capitanias do Rio Grande do Norte e da Paraíba (em relação a esta capitania, em função da aliança, por casamento, com os também potiguaras Arcoverde). Nesse caso, os autores destacam as transformações ocorridas nas estruturas de poder tupi, visto que temiminós e potiguaras integravam esse tronco linguístico, pois uma liderança com poderes supralocais não era comum entre esses grupos indígenas. Em síntese, além de uma possível comenda concedida a D. Antônio Felipe Camarão na década de 1630, analisando os registros das Ordens Militares, Ronald Raminelli identificou nove hábitos de cavaleiros outorgados a indígenas entre 1571 e 1721 (neste último ano, três índios de Ibiapaba) (RAMINELLI, 2009RAMINELLI, Ronald. Honras e malogros: trajetória da família Camarão 1630-1730. In: VAINFAS, Ronaldo; e MONTEIRO, Rodrigo. Império de várias faces. Relações de poder no mundo ibérico da Época Moderna. São Paulo: Alameda, 2009, p. 175-191., 2012RAMINELLI, Ronald. “Índios cavaleiros das ordens militares, 1571-1721”. In: ENCONTRO SOBRE ORDENS MILITARES, VI, 2012. FERNANDES, Isabel Cristina Ferreira (coord.). As Ordens Militares. Freires, Guerreiros, Cavaleiros. Actas do VI Encontro sobre Ordens Militares. vol. 2. Palmela: GEsOs/Município de Palmela, 2012, p. 655-677. e 2015RAMINELLI, Ronald. Nobrezas do Novo Mundo. Brasil e ultramar hispânico, séculos XVII e XVIII. Rio de Janeiro: FGV, 2015. , p. 155-173; e ALMEIDA, 2003ALMEIDA, Maria Regina Celestino. Metamorfoses Indígenas. Identidades e culturas nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2003., p. 156-157; MAIA, 2010MAIA, Lígio. Serras de Ibiapaba. De aldeia à vila de índios: vassalagem e identidade no Ceará colonial (século XVIII). 409 f. Tese (Doutorado em História Social) - Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2010., p. 268-291).

No que se refere ao protagonismo indígena no mundo colonial português, John Monteiro e Beatriz Perrone-Moisés destacam o impacto das políticas indígenas, em especial por meio da “resistência” bélica ou mesmo “aceitação”, sobre as políticas indigenistas. Tratava-se de um impacto sobre a política imperial institucionalizada, isto é, sobre a legislação propriamente dita (MONTEIRO, 1994MONTEIRO, John Manuel. Negros da terra. Índios e bandeirantes nas origens de São Paulo. São Paulo: Companhia das Letras, 1994. p. 35-42; PERRONE-MOISÉS, 2006PERRONE-MOISÉS, Beatriz. Índios livres e índios escravos. Os princípios da legislação indigenista do período colonial (séculos XVI a XVIII). In: CUNHA, Manuela Carneiro da (org.). História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras , 2006, p. 115-132., p. 129). Contudo, historiografia recente ilustra diversificadas formas de atuação. Nesse sentido, em estudo sobre o Rio de Janeiro colonial, Maria Regina Celestino de Almeida destaca que as lideranças indígenas, enquanto agentes intermediários, dificilmente abandonavam as demandas de suas comunidades, pois, assim, detinham maior poder de barganha frente ao mundo colonial, reiterando seu prestígio junto aos demais índios, já que eram reconhecidos pelas autoridades lusitanas como líderes (ALMEIDA, 2003ALMEIDA, Maria Regina Celestino. Metamorfoses Indígenas. Identidades e culturas nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2003., p. 119 e 145-68).

Ronald Raminelli, em relação aos mencionados potiguaras do norte do Brasil, afirma que o reconhecimento, tanto da comunidade quanto de seus aliados portugueses, era almejado. Assim sendo, numa conjuntura de conflitos no Brasil e no próprio reino de Portugal, visto que além da guerra contra os holandeses no Brasil (1630-1654) os lusitanos estavam envolvidos na guerra (1640-1668) que pôs fim à chamada União Ibérica, os estigmas impeditivos para a ascensão a cavaleiro de Ordem Militar averiguados após uma investigação (habilitação ou provanças) - especialmente a limpeza de sangue, isto é, ser e descender de cristãos - não foram levados em consideração para a sagração de Antônio Felipe Camarão, chefe potiguar que, capaz de comandar muitos índios, optou pela aliança com os portugueses. Contudo, a satisfação dos interesses dos demais índios nunca se perdia de vista, pois, conforme o autor, esses líderes só eram importantes para a monarquia enquanto pudessem mobilizar muitos indígenas à guerra (RAMINELLI, 2015RAMINELLI, Ronald. Nobrezas do Novo Mundo. Brasil e ultramar hispânico, séculos XVII e XVIII. Rio de Janeiro: FGV, 2015. , p. 136-154).

Por seu turno, em relação à mesma guerra, sobre os potiguaras que optaram pela aliança com os holandeses Marcus Meuwese destaca o favorecimento da comunidade - especialmente a garantia da liberdade dos índios - como a pedra angular da atuação dos chefes indígenas enquanto intermediários junto aos seus aliados holandeses, pois líderes como Gaspar Paraupaba, seu filho Antônio Paraupaba e Pedro Poti ganharam destaque nas fontes flamengas quando retornaram da Holanda no início da década de 1630, após cerca de cinco anos de permanência na Europa, e se transformaram em interlocutores entre as demandas dos demais índios e os batavos (MEUWESE, 2003MEUWESE, Marcus. “For the Peace and well-being of the country”: intercultural mediators and dutch-india relations in New Netherland and Dutch Brazil, 1600-1664. 507 f. Thesis (Doctor of Philosofy) - Phd Graduate Program in History, University of Notre Dame, Indiana, 2003., p. 171-217).

Antônio Paraupaba rumou à Holanda em mais dois momentos, em 1645 (neste momento, acompanhado por Pedro Poti) e 1654, visando garantir a independência jurídica dos demais índios, liberdade e proteção diante da ameaça portuguesa. Nessa última viagem, que visava convencer os batavos a retomar o Brasil após o fim do Brasil Holandês (1654), o índio desvinculou-se ou foi desvinculado de uma vez por todas de sua família e nação e, assim, perdeu poder junto aos holandeses, que, finalmente, firmaram a paz com os lusitanos. Conforme as cartas tupis trocadas entre Felipe Camarão e Pedro Poti, a liberdade dos índios era um interesse comum para os parentes potiguaras que optaram por alianças contrárias (Camarão ao lado dos portugueses e Poti junto aos flamengos) (MEUWESE, 2003MEUWESE, Marcus. “For the Peace and well-being of the country”: intercultural mediators and dutch-india relations in New Netherland and Dutch Brazil, 1600-1664. 507 f. Thesis (Doctor of Philosofy) - Phd Graduate Program in History, University of Notre Dame, Indiana, 2003., p. 149-217; RAMINELLI, 2015RAMINELLI, Ronald. Nobrezas do Novo Mundo. Brasil e ultramar hispânico, séculos XVII e XVIII. Rio de Janeiro: FGV, 2015. , p. 136-146). Os tabajaras de Ibiapaba também enviaram representantes ao reino (nas décadas de 1650 e 1720) para angariar mercês e/ou resolver conflitos envolvendo os índios da serra e a sociedade colonial (evitar a transferência de indígenas ao Piauí no século XVIII) (MAIA, 2012, p. 192-200; MAIA, 2010MAIA, Lígio. Serras de Ibiapaba. De aldeia à vila de índios: vassalagem e identidade no Ceará colonial (século XVIII). 409 f. Tese (Doutorado em História Social) - Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2010., p. 200-221; RAMINELLI, 2012RAMINELLI, Ronald. “Índios cavaleiros das ordens militares, 1571-1721”. In: ENCONTRO SOBRE ORDENS MILITARES, VI, 2012. FERNANDES, Isabel Cristina Ferreira (coord.). As Ordens Militares. Freires, Guerreiros, Cavaleiros. Actas do VI Encontro sobre Ordens Militares. vol. 2. Palmela: GEsOs/Município de Palmela, 2012, p. 655-677. , p. 676).

No que se refere à segunda metade do século XVIII (o chamado período pombalino), a partir dos trabalhos de Nádia Farage, Bárbara Sommer, Ângela Domingues, Patrícia Sampaio, Mauro Coelho e Rafael Rocha sobre a Amazônia Portuguesa, sabe-se que muitas lideranças indígenas - legitimadas e institucionalizadas no mundo colonial por via de patentes ou provisões - galgaram postos oficiais nas câmaras municipais e tropas das recém-fundadas vilas (erigidas a partir dos antigos aldeamentos) em função dos serviços prestados por si e/ou seus ascendentes à monarquia, como justificavam as cartas patentes que lhes foram concedidas, e legaram a seus descendentes esses cargos (e as honras e os privilégios que os acompanhavam). Em alguns casos, como demonstrou Rocha, esses índios conquistavam a confirmação régia de suas respectivas patentes por meio de viagens realizadas pessoalmente à Corte, mas os vínculos com suas respectivas nações eram reiterados por esses documentos. Essa prática representava medida indigenista importante ou mesmo indispensável para a consecução das políticas portuguesas - ocupação ou posse da terra e desenvolvimento econômico da mesma - durante o contexto marcado pela disputa territorial com a Coroa espanhola definida pelos tratados de limites de Madri (1750) e Santo Ildefonso (1777).

Assim sendo, o poder e a autoridade das lideranças indígenas integradas à vida colonial (os oficiais), enquanto intermediários entre os portugueses e os demais índios, dependia da sua capacidade de articular e/ou equilibrar os intentos da política ou legislação indigenista e os interesses dos índios seus liderados - ora satisfazendo uns, operacionalizando descimentos e induzindo índios ao trabalho, ora outros, ajudando nas fugas e deserções e intercedendo pelos demais indígenas junto às instâncias burocráticas superiores do poder colonial ou da monarquia. A essa altura, em conjunto com o diretor, o vigário e a câmara municipal, o famoso Diretório dos Índios (1758) atribuía legalmente amplas funções, especialmente àquelas relativas à administração da mão de obra, aos chamados principais ou oficiais indígenas (FARAGE, 1991FARAGE, Nádia. As Muralhas dos Sertões. Os povos indígenas do rio Branco e a colonização. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991., p. 156-160; SOMMER, 2000SOMMER, Bárbara A. Negotiated settlements: native Amazonians and portuguese policy in Pará, Brazil, 1758-1798. [folhas] f. Thesis (Doctor of Philosofy) - Phd Graduate Program in History, University of New México, Albuquerque, 2000., p. 189-233; DOMINGUES, 2000DOMINGUES, Ângela. Quando os índios eram vassalos. Colonização e relações de poder no Norte do Brasil na segunda metade do século XVIII. Lisboa: CNCDP, 2000., p. 168-173; SAMPAIO, 2011SAMPAIO, Patrícia Maria Melo. Espelhos Partidos: etnia, legislação e desigualdade na colônia. Sertões do Grão-Pará, c 1755-c. 1823. Manaus: Edua, 2011., p. 193-223; e ROCHA, 2009ROCHA, Rafael Ale. Oficiais índios na Amazônia Pombalina: sociedade, hierarquia e resistência. 142 f. Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2009.).

Em síntese, portanto, esses autores demonstram que a execução das políticas indigenistas dependia das políticas indígenas e desses importantes intermediários. Nesse sentido, em relação ao suposto “fracasso” do Diretório dos Índios na Amazônia, se atribuída pelas fontes e pela historiografia clássica ao agente de tutela instituído pela lei - o diretor -, atualmente os estudos destacam as ações indígenas, as fugas, as deserções, a resistência bélica, entre outras, como elemento importante para explicar a ineficácia da legislação (SOMMER, 2000SOMMER, Bárbara A. Negotiated settlements: native Amazonians and portuguese policy in Pará, Brazil, 1758-1798. [folhas] f. Thesis (Doctor of Philosofy) - Phd Graduate Program in History, University of New México, Albuquerque, 2000.; SAMPAIO, 2011SAMPAIO, Patrícia Maria Melo. Espelhos Partidos: etnia, legislação e desigualdade na colônia. Sertões do Grão-Pará, c 1755-c. 1823. Manaus: Edua, 2011., p. 193-223; SANTOS, 2002SANTOS, Francisco Jorge dos. Além da Conquista. Guerras e rebeliões indígenas na Amazônia pombalinas. Manaus: Edua , 2002. , p. 54-62). A partir do pioneiro estudo de Celestino de Almeida sobre o Rio de Janeiro (ALMEIDA, 2003ALMEIDA, Maria Regina Celestino. Metamorfoses Indígenas. Identidades e culturas nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2003.), o referido papel de intermediário também é destacado pelas pesquisas sobre as elites indígenas pombalinas em diversas capitanias do Estado do Brasil.

É importante mencionar que, sobre as guerras holandesas no Brasil, os referidos potiguaras eram versados na leitura, escrita e elaboração de documentos - petições, representações, cartas - nas línguas nativa e/ou holandesa (para os aliados dos batavos), de modo que, para atuar politicamente junto ao mundo colonial, em alguns casos escreviam com o próprio punho suas demandas e assinavam seus manuscritos. Sobre a Amazônia Portuguesa, em estudo sobre a segunda metade do século XVIII, poucos documentos elaborados por índios foram encontrados (ROCHA, 2009ROCHA, Rafael Ale. Oficiais índios na Amazônia Pombalina: sociedade, hierarquia e resistência. 142 f. Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2009., p. 74-80), mas esse não parece ser o caso de Antônio da Costa Marapirão e dos demais chefes indígenas coloniais que habitaram a mesma região durante os seiscentos.

Embora inegavelmente apresente semelhanças com as demais elites indígenas da América Portuguesa, como a função de intermediários, a obtenção de postos enquanto remuneração de serviços, a sucessão desses cargos no interior da família, o vínculo com a nação, as viagens à Europa com petições, dentre outras, a trajetória de Antônio da Costa Marapirão e de outros chefes indígenas da Amazônia Portuguesa seiscentista apresentam suas particularidades: 1) mercês como o hábito de cavaleiro não eram, propriamente, vinculadas às instâncias/instituições metropolitanas respectivas; 2) provavelmente não liam ou escreviam; e, talvez derivada desta última característica, 3) foram inseridos ou se inseriram nos conflitos existentes no interior da sociedade colonial (entre autoridades leigas e eclesiásticas diversas) que impactaram a própria política ou legislação indigenista mais geral, isto é, que estava voltada para o Estado como um todo e não para resolver somente problemas pontuais relativos a comunidades indígenas específicas.

Sobre a elite indígena da região, a historiografia e as fontes lusitanas apresentam pelo menos seis índios que estiveram no reino entre 1648 e 1659 para, conforme os requerimentos que lhes foram atribuídos, solicitar mercês régias: três habitavam a capitania do Maranhão - dois principais dos aldeamentos de Tapuitapera e Sergipe, respectivamente, e Marapirão (todos estiveram no reino em 1648); dois habitavam a capitania do Pará - dois parentes de um principal do aldeamento do Maracanã chamado Lopo de Sousa Copaúba, que traziam consigo uma petição atribuída ao mesmo principal (1655); e um era morador do aldeamento do Camuci, localizado na capitania do Ceará, Jorge Tajaibuna (1659). Todos esses índios atuaram na expulsão dos holandeses e almejavam a mercê do hábito da Ordem de Cristo; alguns, como os parentes de Copaúba e Marapirão, supostamente intentavam a sucessão dos hábitos pertencentes aos chefes (os parentes do primeiro carregavam uma petição de Copaúba solicitando a concessão de seu hábito ao filho Francisco e o segundo requisitava pessoalmente herdar o hábito do pai); pais; e o requerimento atribuído a Tajaibuna solicitava a si e a seu pai, Domingos Ticuna - capitão de sua nação e demais aldeias do Camuci -, hábitos da mesma ordem pela expulsão dos holandeses da fortaleza do Ceará.

Além desses, entre 1644 e 1647, alguns oficiais que atuaram na restauração do Maranhão - os capitães Paulo Soares do Avelar, João Vasco e o capitão mor Antônio Teixeira de Melo - e o novo governador Francisco Coelho de Carvalho requisitaram da monarquia mercês a indígenas do Maranhão e, no caso de Vasco, também do Ceará - citando índios de Jericoacoara e da Serra da Ibiapaba. Já o padre Francisco da Costa Araújo, na mesma época, encaminhou um pedido atribuído genericamente a “principais” do Maranhão. Grosso modo, essas solicitações não discriminavam as mercês pretendidas e/ou citavam vestidos e outros utensílios, mas o pedido intermediado pelo padre Araújo e a petição do governador Coelho de Carvalho requisitavam explicitamente “hábitos”. Os oficiais citados (à exceção de Vasco, para quem não se tem informações) possuíam carreiras militares que remontavam à época da conquista (CARVALHO Jr., 2017CARVALHO JR. Almir Diniz de. Índios Cristãos. A conversão dos Gentios na Amazônia Portuguesa (1653-1769). Curitiba: CRV, 2017., p. 191-204; ROCHA, 2013ROCHA, Rafael Ale. A elite militar no Estado do Maranhão: poder, hierarquia e comunidades indígenas (século XVII). 321 f. Tese (Doutorado em História) - Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2013., p 109-119 e 187-201).

Nesses casos, a posição do Conselho Ultramarino e da monarquia era favorável, embora o direcionamento era substituir o hábito por outras honras (vestidos e/ou símbolos diversos) ou os conceder por via dos governadores, o que, após a década de 1640, passou a ser recriminado e, em fins dessa centúria, proibido (CARVALHO Jr. 2017CARVALHO JR. Almir Diniz de. Índios Cristãos. A conversão dos Gentios na Amazônia Portuguesa (1653-1769). Curitiba: CRV, 2017., p. 204-205; ROCHA, 2013ROCHA, Rafael Ale. A elite militar no Estado do Maranhão: poder, hierarquia e comunidades indígenas (século XVII). 321 f. Tese (Doutorado em História) - Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2013., p. 187-201). Pelo menos 18 hábitos foram concedidos nessas condições. Em relação aos índios do Estado do Maranhão e Grão-Pará, as fontes portuguesas acompanham com mais detalhes as trajetórias de Antônio da Costa Marapirão e Lopo de Sousa Copaúba. Este último angariou junto à monarquia isenções aos índios do aldeamento do Maracanã (servir somente nas salinas da região) e conflitou contra o jesuíta Antônio Vieira. Nessa ocasião, a prisão do chefe foi apresentada como um dos motivos (de três) para o início do motim de 1661 (CHAMBOULEYRON, 2005CHAMBOULEYRON, Rafael. Portuguese Colonization of the Amazon region, 1640-1706. Thesis (Doctor of Philosofy) - Faculty of History, University of Cambridge, Cambridge, 2005a., p. 124-124, 255-256; CARVALHO Jr., 2017CARVALHO JR. Almir Diniz de. Índios Cristãos. A conversão dos Gentios na Amazônia Portuguesa (1653-1769). Curitiba: CRV, 2017., p. 96-108 e 201-203). Em conformidade com a sugestão de Luís de Magalhães (acatada pelo Conselho Ultramarino) naquela consulta de 1648, Marapirão recebera, por via de decreto, o hábito de Cristo “cozido” (costurado) no vestido (AHU MaranhãoArquivo Histórico Ultramarino (AHU): Avulsos do Maranhão e Pará., cx. 3, doc. 268; STUDART, 1921STUDART, Barão de (Org.). Documentos para a história do Brasil especialmente do Ceará. Vol. 3a e 4b. Fortaleza: IHGC, 1921.a, p. 180), isto é, a mercê não foi registrada na chancelaria da Ordem e as devidas investigações (habilitação ou provanças) sobre o seu passado não foram realizadas.

Antônio da Costa Marapirão, na verdade, já é um personagem bem conhecido pela historiografia recente. Sobretudo em trabalhos elaborados nas duas últimas décadas, mas também em clássicos como os estudos de Mathias Kiemen e Jonh Hemming (KIEMEN, 1954KIEMEN, Mathias O. F. M. The indian policy of Portugal in the Amazon Region, 1614-1693. Washington D. C.: Catholic University of America Press, 1954., p. 70-75; HEMMING, 2007HEMMING, John. Ouro Vermelho. A Conquista dos Índios Brasileiros. São Paulo: EDUSP, 2007. , p. 425-431 e 490-493), o protagonismo do chefe se faz presente de variadas maneiras (CARDOSO, 2002CARDOSO, Alírio. Insubordinado, mas sempre devotos: poder local, acordos e conflitos no antigo Estado do Maranhão (1607-1653). 263 f. Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade de Campinas, Campinas, 2002., p. 116-120, 302-302 e 210-212; CARDOSO, 2012CARDOSO, Alírio. Maranhão na Monarquia Hispânica: intercâmbio, guerras e navegação nas fronteiras das Índias de Castela (1580-1655). 435 f. Tese (Doutorado em História) - Facultad de Geografía y Historia, Universidad de Salamanca, Salamanca, 2012., p. 292-301; CHAMBOULEYRON, 2005aCHAMBOULEYRON, Rafael. Portuguese Colonization of the Amazon region, 1640-1706. Thesis (Doctor of Philosofy) - Faculty of History, University of Cambridge, Cambridge, 2005a., p. 61, 76-77 e 129-131; CHAMBOULEYRON, 2005bCHAMBOULEYRON, Rafael. Missionários, índios capitães e moradores: relações e conflitos na Amazônia seiscentista. In: FORLINI, Louis Carlos; MURRIETA, Rio Sergio Sereni; VIEIRA, Ima Célia Guimarães (orgs.). Amazônia. Além dos 500 anos. Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi. 2005b, p. 1-22.; CARVALHO JR., 2017CARVALHO JR. Almir Diniz de. Índios Cristãos. A conversão dos Gentios na Amazônia Portuguesa (1653-1769). Curitiba: CRV, 2017., p. 193-211; ROCHA, 2013ROCHA, Rafael Ale. A elite militar no Estado do Maranhão: poder, hierarquia e comunidades indígenas (século XVII). 321 f. Tese (Doutorado em História) - Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2013., p. 209-215).

Quanto à última ordem de pesquisas citada, os estudos destacam as mercês que Marapirão recebeu da monarquia portuguesa, a sucessão das mesmas (“herdadas” de seu pai Marcos da Costa), o fato de uma mercê específica - o hábito da Ordem de Cristo, em posse de pai e filho - não corresponder exatamente à honraria (mas à substituição da mesma por outros brindes e benesses) e, por fim, os conflitos que envolveram o índio na política cotidiana do mundo colonial. Nesses embates, destacam-se duas cartas atribuídas a Marapirão elaboradas em setembro de 1649 (que visavam denunciar ao monarca os abusos ou maus-tratos cometidos pelos colonos, especialmente as autoridades, contra os índios do Estado) e a atuação de Antônio da Costa durante os conflitos que culminaram na expulsão dos inacianos em 1661 - ocasiões nas quais o indígena estabelecia redes de aliança com a elite local e outros segmentos e se apresentava como vassalo cristão para obter benefícios a si e aos demais índios, como, por exemplo, a garantia da condição de forros. Alírio Cardoso destaca, sobretudo a partir de uma das citadas correspondências atribuída ao tabajara, o vínculo entre o chefe, seus parentes e sua nação durante o embate que empreendera contra uma confederação formada por índios e holandeses no Ceará (CARDOSO, 2002CARDOSO, Alírio. Insubordinado, mas sempre devotos: poder local, acordos e conflitos no antigo Estado do Maranhão (1607-1653). 263 f. Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade de Campinas, Campinas, 2002., p. 116-120 e 210-212).

Afirmamos que ambas as correspondências, remetidas ao monarca, foram “atribuídas” ao chefe porque a própria historiografia apresenta dúvidas acerca da autoria das assinaturas de Marapirão e outros índios (CHAMBOULEYRON, 2005CHAMBOULEYRON, Rafael. Portuguese Colonization of the Amazon region, 1640-1706. Thesis (Doctor of Philosofy) - Faculty of History, University of Cambridge, Cambridge, 2005a., p. 129; CARDOSO, 2012CARDOSO, Alírio. Maranhão na Monarquia Hispânica: intercâmbio, guerras e navegação nas fronteiras das Índias de Castela (1580-1655). 435 f. Tese (Doutorado em História) - Facultad de Geografía y Historia, Universidad de Salamanca, Salamanca, 2012., p. 295). Complicando a situação, as assinaturas indígenas eram realizadas com cruzes (AHU Pará, cx. 1, docs. 75 e 76). De qualquer forma, com base principalmente nessas cartas, esses estudos destacam a suposta mudança de opinião em relação aos jesuítas por parte de Marapirão - visto que o chefe supostamente solicitou inacianos do soberano e posteriormente conflitou contra os mesmos em 1661 - ou mencionam a crítica do índio ao governador Luís de Magalhães, mas a oscilação de imagens apresentadas por este governador sobre o chefe (leal ou traidor), com a qual introduzimos este artigo, não é mencionada pelos trabalhos levantados, destacando-se somente a figura de fiel súdito de Sua Majestade. Portanto, a contribuição que agora oferecemos, apresentando a traição de Antônio da Costa Marapirão como uma possibilidade, pretende: 1) iluminar a imbricação entre a política indígena (especificamente aquela adotada pelo chefe tabajara em estudo) e as políticas indigenistas de Portugal, no Estado do Maranhão e Grão-Pará, e Holanda, no chamado Brasil Holandês; e 2) reiterar a aliança, por parte do índio, com sua família, nação e outros indígenas enquanto empreendimento duradouro e supracapitanias - destacando-se, ainda, outras evidências desse fato, como a sua centralidade nos argumentos que detratavam ou defendiam o chefe tabajara durantes os conflitos ocorridos no interior da sociedade colonial.

O Estado do Maranhão e Grão-Pará e o Brasil Holandês

Cientes da necessidade do apoio indígena, fato antes ignorado e que em parte explica a derrota flamenga em Salvador (ver nota 1), já em 1629 a política oficial holandesa proibia o cativeiro dos índios, isto é, antes mesmo da capitulação de Olinda, ocorrida em 1630. O próprio Maurício de Nassau, que comandou o Brasil Holandês entre 1637 e 1644, investiu na amizade dos índios, trocando cartas com eles, libertando pessoalmente alguns escravizados e reconhecendo a importância indispensável dos mesmos para a defesa da colônia. Em dada ocasião, era referido como “irmão” em carta elaborada por tupis da região (MELLO, 2007MELLO, José Antônio G. de. Tempo dos Flamengos. Influência da ocupação holandesa na vida e na cultura do norte do Brasil. Rio de Janeiro: Topbooks, 2007. , p. 210-211). De qualquer forma, em 1645, eclodiu a revolta luso-brasileira, culminando na restauração em 1654.

Charles Boxer, Antônio Gonçalves de Mello e Marcus Meuwese (BOXER, 1957BOXER, Charles. The Dutch in Brazil, 1624-1654. Oxford: Claredon Press, 1957. , p. 137; MELLO, 2007MELLO, José Antônio G. de. Tempo dos Flamengos. Influência da ocupação holandesa na vida e na cultura do norte do Brasil. Rio de Janeiro: Topbooks, 2007. , p. 216-220; MEUWESE, 2003MEUWESE, Marcus. “For the Peace and well-being of the country”: intercultural mediators and dutch-india relations in New Netherland and Dutch Brazil, 1600-1664. 507 f. Thesis (Doctor of Philosofy) - Phd Graduate Program in History, University of Notre Dame, Indiana, 2003., p. 192-195), contudo, afirmam que nem sempre a política indigenista oficial foi capaz de impedir o uso compulsório da força de trabalho indígena ou mesmo a própria escravidão; especialmente em regiões mais afastadas como, notadamente, o Maranhão, onde, por um breve momento, permitiu-se aquele cativeiro (imediatamente revogado). Dada a preocupação com a quantidade insuficiente de homens para a manutenção da conquista, a documentação holandesa, conforme o estudo de Alírio Cardoso, destaca a importância dos índios - enquanto força bélica e devido à sua disposição ao comércio - para os projetos flamengos voltados à região, pois antes e durante a ocupação os “relatórios ou descrições sobre a Amazônia reforçam a ideia geral de que os índios da região tinham um ânimo favorável à conquista holandesa” (CARDOSO, 2017CARDOSO, Alírio. Berschrijving van Maranhão: a Amazônia nos relatórios holandeses na época da Guerra de Flandres (1621-1644). Topoi, Rio de Janeiro, UFRJ, v. 18, n. 35, p. 406-428, maio/ago. 2017. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/2237-101X01803508. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/topoi/v18n35/2237-101X-topoi-18-35-00406.pdf. Acesso em: 18 abr. de 2020.
http://dx.doi.org/10.1590/2237-101X01803...
, p. 420). Um censo de 1642, que apresentava a população instalada no entorno do forte de São Luís, identificava a existência 3.820 pessoas, dos quais 1.823 eram índios aldeados potencialmente aliados (CARDOSO, 2017CARDOSO, Alírio. Berschrijving van Maranhão: a Amazônia nos relatórios holandeses na época da Guerra de Flandres (1621-1644). Topoi, Rio de Janeiro, UFRJ, v. 18, n. 35, p. 406-428, maio/ago. 2017. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/2237-101X01803508. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/topoi/v18n35/2237-101X-topoi-18-35-00406.pdf. Acesso em: 18 abr. de 2020.
http://dx.doi.org/10.1590/2237-101X01803...
, p. 420).

Contudo, alegando falta de escravos, os holandeses no Maranhão e no Ceará (onde, no caso desta última capitania, se estabeleceram entre 1637-1644 e 1649-1654) procederam ao cativeiro dos indígenas, o que culminou, em 1642, no cerco do forte de São Luís por parte de portugueses unidos a grupos tupis anteriormente aliados aos flamengos - resultando, em 1644, na expulsão definitiva dos mesmos (a restauração). Não obstante a confirmação da abolição da escravidão dos índios dessas mesmas capitanias, a mando do governo de Pernambuco, pelo mesmo motivo (especialmente em função dos serviços nas salinas), em 1644 os índios do Ceará também rebelaram-se contra os holandeses, que, desde 1637, ocupavam a região (MEUWESE, 2003MEUWESE, Marcus. “For the Peace and well-being of the country”: intercultural mediators and dutch-india relations in New Netherland and Dutch Brazil, 1600-1664. 507 f. Thesis (Doctor of Philosofy) - Phd Graduate Program in History, University of Notre Dame, Indiana, 2003., p. 293-314; MAIA, 2017MAIA, Lígio. Cultores de uma vinha sagrada: índios e jesuítas na missão da Serra de Ibiapaba (século XVII). Natal: EDUFRN, 2017., p. 142).

Tem-se notícia, inclusive, de índios presos no Maranhão e enviados como escravos aos engenhos de Pernambuco, que, por solicitação de Antônio Paraupaba, foram postos em liberdade. Em seu requerimento ao conselho holandês, de 1645 (isto é, no contexto do levante luso-brasileiro), “exigiu que todos os índios do Maranhão e todos os Tapoijers mantidos como escravos fossem libertados e colocados com eles para morar nas aldeias” (apudMEUWESE, 2003MEUWESE, Marcus. “For the Peace and well-being of the country”: intercultural mediators and dutch-india relations in New Netherland and Dutch Brazil, 1600-1664. 507 f. Thesis (Doctor of Philosofy) - Phd Graduate Program in History, University of Notre Dame, Indiana, 2003., p. 193). Ora, acredita-se que os tapijaras (provavelmente os mesmos “tapoijers”), talvez uma corruptela do etnônimo tabajara, eram descendentes de antigos grupos tupis que, entre fins do século XVI e início dos seiscentos, empreenderam migrações em massa ao Maranhão e Pará - dentre eles, os tabajaras, os potiguaras, os tupinambás e os caetés (CARVALHO JR., 2017CARVALHO JR. Almir Diniz de. Índios Cristãos. A conversão dos Gentios na Amazônia Portuguesa (1653-1769). Curitiba: CRV, 2017., p. 209-211). De qualquer forma, após a restauração portuguesa de Pernambuco, com a capitulação de Olinda em 1654, o Ceará ainda era atrativo para os potiguaras aliados aos holandeses, visto que, novamente ocupado pelos batavos em 1649, para lá rumaram alguns desses índios naquele mesmo ano de 1654 - no que foi conhecido como o último reduto dos flamengos no Brasil (MEUWESE, 2003MEUWESE, Marcus. “For the Peace and well-being of the country”: intercultural mediators and dutch-india relations in New Netherland and Dutch Brazil, 1600-1664. 507 f. Thesis (Doctor of Philosofy) - Phd Graduate Program in History, University of Notre Dame, Indiana, 2003., p. 312-314).

Quanto à política indigenista portuguesa no Estado do Maranhão e Grão-Pará, conforme a historiografia sobre o tema, estava em fase de construção e consolidação de suas diretrizes básicas. Se Beatriz Perrone-Moisés afirma que pelo menos duas linhas mestras conduziam a política indigenista lusitana, distinguindo os índios aliados daqueles passíveis de escravidão (PERRONE-MOISÉS, 2006PERRONE-MOISÉS, Beatriz. Índios livres e índios escravos. Os princípios da legislação indigenista do período colonial (séculos XVI a XVIII). In: CUNHA, Manuela Carneiro da (org.). História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras , 2006, p. 115-132.), foi justamente após a expulsão dos holandeses do Maranhão (1644) que a consolidação dessas balizas ganharam impulso significativo (pelo menos do ponto de vista da política indigenista oficial, isto é, da legislação indigenista). Nesse sentido, foi sobretudo nos anos de 1647, 1648 e 1649 que a legislação relativa ao trabalho indígena livre normatizou os salários, o tempo de serviço, a possibilidade de escolher o empregador por parte do índio, a isenção do trabalho na penosa produção de tabaco, a proibição da administração dos aldeamentos por parte de particulares ou dos chamados capitães de aldeias, dentre outras questões (KIEMEN, 1954KIEMEN, Mathias O. F. M. The indian policy of Portugal in the Amazon Region, 1614-1693. Washington D. C.: Catholic University of America Press, 1954., p. 65-71).

Como demonstra o estudo de Mathias Kiemen, e posteriormente Rafael Chambouleyron, os diversos agentes que atuavam na colônia participavam dos “debates” junto à Corte que, em seguida, culminavam em leis sobre a questão indígena - emitindo pareceres a pedido do monarca ou do Conselho Ultramarino, elaborando representações, requerimentos ou petições, participando de juntas para tal fim, dentre outras formas de atuação (KIEMEN, 1954KIEMEN, Mathias O. F. M. The indian policy of Portugal in the Amazon Region, 1614-1693. Washington D. C.: Catholic University of America Press, 1954.; CHAMBOULEYRON, 2005aCHAMBOULEYRON, Rafael. Portuguese Colonization of the Amazon region, 1640-1706. Thesis (Doctor of Philosofy) - Faculty of History, University of Cambridge, Cambridge, 2005a., p. 254-257). O trabalho de Kiemen é particularmente minucioso nesse sentido e destaca que, para a elaboração das mencionadas leis promulgadas entre 1647 e 1649, apresentaram suas respectivas opiniões autoridades leigas e eclesiásticas que atuaram no Estado do Maranhão e Grão-Pará e as elites locais da mesma região (KIEMEN, 1954KIEMEN, Mathias O. F. M. The indian policy of Portugal in the Amazon Region, 1614-1693. Washington D. C.: Catholic University of America Press, 1954., p. 60-71). De forma muito generalizada, se o donatário da capitania do Caeté e a câmara de São Luís sugeriam a abertura do sertão ao cativeiro, os demais agentes destacavam a imprescindível amizade dos índios, ameaçada pelo esvaziamento dos aldeamentos em função da escravização abusiva - isto é, não raro cativando os próprios índios aliados - praticada pelos lusitanos, para a restauração e a defesa da colônia. É nessa conjuntura, especificamente entre os anos de 1644 e 1648, que Kiemen apresenta os pedidos de mercês atribuídos a Antônio da Costa Marapirão e outros índios do Estado (KIEMEN, 1954KIEMEN, Mathias O. F. M. The indian policy of Portugal in the Amazon Region, 1614-1693. Washington D. C.: Catholic University of America Press, 1954., p. 57-70).

Sabe-se que a estratégia utilizada pelos portugueses durante a restauração dependia de contingentes indígenas e da chamada guerra brasílica, isto é, uma tática baseada em constantes assaltos ou emboscadas que envolviam escoltas reduzidas espalhadas pelo território (CARDOSO, 2012CARDOSO, Alírio. Maranhão na Monarquia Hispânica: intercâmbio, guerras e navegação nas fronteiras das Índias de Castela (1580-1655). 435 f. Tese (Doutorado em História) - Facultad de Geografía y Historia, Universidad de Salamanca, Salamanca, 2012., p. 271-282). Entende-se porque, na conjuntura dos debates que gerariam a mencionada legislação indigenista dos anos 1640, os contemporâneos atribuíam aos indígenas (como parte importante ou principal) o sucesso da empreitada (a restauração) (AHU Maranhão, cx. 2, doc. 191; AHU Maranhão, cx. 2, doc. 210; AHU Maranhão, cx. 2, doc. 213).

Dentre esses contemporâneos constava o governador Francisco Coelho de Carvalho. Por carta de 1647, descrevia o comércio praticado entre holandeses e índios do Cabo Norte, da Ilha de Joanes e do rio Amazonas, o conflito empreendido pelos portugueses contra esses índios ocorridos naquelas partes e a ação dos indígenas na restauração do Maranhão e Ceará. Portanto, defendia a proibição do cativeiro, em função da indispensável aliança com os índios, enquanto importante mercê: “se este gentio têm servido e serve à V. Majde. com tanta fidelidade que causa haverá a tantos serviços pagar-lhes V. Majde. com cativeiro [?]” (AHU Maranhão, cx. 2, doc. 213). No ano seguinte, lembremos, o governador solicitou do monarca hábitos de cavaleiro para índios que combateram na restauração do Maranhão a favor dos lusos. Em outras palavras, o governador entendia como mercês, devidas por esse importante serviço, tanto a liberdade dos índios como hábitos de Ordem Militar.

Contudo, assim como aos holandeses, naquela década de 1640 as denúncias sobre o uso compulsório da força de trabalho indígena livre ou escravidão abusiva foram dirigidas, em alguns casos configurando verdadeiras trocas de acusações, contra as principais autoridades do Estado - governadores, capitães-mores do Pará, o vigário geral, entre outros (AHU Pará, cx. 1, doc. 46; AHU Maranhão, cx. 2, doc. 2018; AHU Maranhão, cx. 3, doc. 284; AHU Pará, cx. 1, doc. 46; AHU Pará, cx. 1, doc. 63). É difícil saber, com base na historiografia e nas fontes, se a essa altura alguma modalidade de escravidão indígena era legal. Provavelmente o cativeiro - sobretudo por resgates - era um costume arraigado na sociedade colonial. É nesse sentido que a documentação caracteriza as atuações dos capitães-mores do Pará, Sebastião Lucena de Azevedo (em 1647) e Inácio do Rego Barreto (em 1650), quando foram denunciados por praticar resgates abusivos (isto é, violentando inclusive índios aliados), respectivamente, no Cabo Norte (Amapá) e na Ilha de Joanes (Marajó) (AHU Maranhão, cx. 3, doc. 243 e 284).

Quanto aos índios livres, a julgar pela citada legislação promulgada na década de 40 dos seiscentos, parece que a administração dos aldeamentos por particulares ou pelos chamados capitães de aldeias, em meio ao conflito entre franciscanos e jesuítas pelo controle dessas comunidades, era particularmente aplicada. Sobre as duas referidas ordens missionárias, conforme as informações existentes, a monarquia concedeu aos jesuítas, em 1638, e posteriormente aos franciscanos, em 1649, essa prerrogativa (administração dos aldeamentos), mas nenhuma das duas ordens conseguiu enviar missionários a contento em função de desavenças ocorridas na Corte e/ou da ocupação holandesa no Maranhão. A missão jesuíta só seria retomada, com Antônio Vieira, na década de 1650 (KIEMEN, 1954KIEMEN, Mathias O. F. M. The indian policy of Portugal in the Amazon Region, 1614-1693. Washington D. C.: Catholic University of America Press, 1954., p. 53, 72 e 43). Em síntese, conforme Mathias Kiemen, a escassez de missionários naqueles anos “testemunhou pouco esforço organizado para estabelecer aldeias e expandir a atividade missionária”, pois, em 1652, por exemplo, só existia um missionário franciscano e nenhum jesuíta (desde pelo menos 1649) em todo o Estado (KIEMEN, 1954KIEMEN, Mathias O. F. M. The indian policy of Portugal in the Amazon Region, 1614-1693. Washington D. C.: Catholic University of America Press, 1954., p. 78).

Voltemos, finalmente, a Antônio da Costa Marapirão. Conforme o exposto, provavelmente naqueles anos o seu aldeamento - Cojupe, localizado na Ilha do Maranhão - gozava de certa independência em relação aos missionários (dada a quase inexistência física dos mesmos). Não se tem notícias, da mesma forma, da existência de um capitão de aldeia na comunidade. Sobre a viagem de Marapirão a Pernambuco, seja como enviado preso pelos flamengos, seja como traidor dos portugueses em busca de mercês e aliança junto a Maurício de Nassau, devemos pensar na conjuntura acima esboçada para entendermos as opções ofertadas ao índio. Primeiramente, cabe destacar que não se sabe a data exata de sua partida rumo a Pernambuco. Conforme as informações referidas, embarcara para essa capitania entre fins de 1642 (início da rebelião lusa em São Luís) e 1648 (quando esteva na Corte portuguesa pela primeira vez).

Nesses anos, se a política indigenista oficial holandesa claramente proibia o cativeiro indígena, a legislação indigenista portuguesa voltada ao Maranhão e Grão-Pará estava em fase de reestruturação, consolidação ou, mesmo, formação. Por outro lado, tanto flamengos como lusitanos eram acusados de, no que se refere ao uso da força de trabalho indígena, praticar abusos ou o próprio cativeiro. Mas se os holandeses o faziam no Maranhão e Ceará, os portugueses destinavam tais ações usualmente ao Cabo Norte, Ilha de Joanes e arredores, isto é, principalmente na capitania do Pará. Delineavam-se, portanto, as opções de Antônio da Costa Marapirão: apostar numa política oficial que lhe era favorável, embora nem tanto a sua prática (holandeses); ou avaliar a política oficial em construção, cuja indefinição ameaçava os índios, sobretudo, nas partes do Pará e circunvizinhanças (portugueses).

Ambas as opções eram plausíveis, embora a conjuntura que imediatamente se seguiu valorizasse inegavelmente a segunda. Para esta isso parece evidente, pois os holandeses acabariam por abandonar o Maranhão em fevereiro de 1644. No que se refere à primeira opção, logo após a restauração do Maranhão, Maurício de Nassau partiu de Pernambuco (maio de 1644) e os luso-brasileiros iniciaram o levante contra os holandeses nessa capitania (julho de 1645), dificultando a proteção que os flamengos não raro garantiam aos indígenas - especialmente em Pernambuco, a exemplo dos mencionados índios enviados como escravos do Maranhão (os tapijaras) e postos em liberdades naquela capitania. A situação da ocupação holandesa no Ceará provavelmente pendeu a balança à aliança com os portugueses, pois os flamengos, que ocupavam a região desde 1637, foram expulsos após a citada rebelião indígena de 1644 naquelas partes (MEUWESE, 2003MEUWESE, Marcus. “For the Peace and well-being of the country”: intercultural mediators and dutch-india relations in New Netherland and Dutch Brazil, 1600-1664. 507 f. Thesis (Doctor of Philosofy) - Phd Graduate Program in History, University of Notre Dame, Indiana, 2003., p. 293-3014; MAIA, 2017MAIA, Lígio. Cultores de uma vinha sagrada: índios e jesuítas na missão da Serra de Ibiapaba (século XVII). Natal: EDUFRN, 2017., p. 142).

Como veremos, mesmo com o fim da ocupação holandesa no Maranhão (1644), durante toda a centúria a política indigenista portuguesa dirigida ao Estado não ignorou a ameaça batava, especialmente porque, por um lado, os holandeses permaneceram no Brasil até 1654 e, por outro, nos anos 50 dos seiscentos, os nheengaíbas e outros índios que habitavam a Ilha de Joanes, o Cabo Norte e arredores, continuaram praticando constante comércio com os flamengos. De qualquer forma, findando a ocupação flamenga no Maranhão, será no interior da sociedade colonial lusitana que Antônio da Costa Marapirão participará de novos embates, relativos, num primeiro momento, à nova aplicação da legislação indigenista e, posteriormente, ao poder temporal dos jesuítas sobre os aldeamentos.

Marapirão e Luís de Magalhães

Observamos que, chegando ao Estado, o governador Luís de Magalhães inverteu completamente a sua opinião acerca da lealdade de Antônio da Costa Marapirão. Além dessa estratégia, como se verá, procurou apresentar o chefe como um indivíduo facilmente influenciável ou manipulável. A mudança de opinião referida parecia estar relacionada aos conflitos que Magalhães enfrentaria a partir de então. É que diversas autoridades, o capitão-mor do Pará, Inácio do Rego Barreto, o provedor-mor do Estado, Manuel Pita da Veiga (primo daquele), o vigário geral, Matheus de Sousa Coelho, o vigário de Tapuitapera, Roque Martins, e a câmara de Belém, travaram um embate, junto ao Conselho Ultramarino, contra o isolado governador (AHU Maranhão, cx. 3, docs. 283, 284, 292, 295 e 300). Além das denúncias contra este último por parte do citado grupo, de roubo de cargas, promoção de conflitos contra os tremembés do Ceará (cuja aliança era indispensável naquela conjuntura), resgates indevidos, destituições do capitão-mor do Pará e do provedor-mor do Estado, e a nomeação de um irmão para ambos os cargos, constavam as acusações contidas nas já mencionadas cartas, datadas de 2 e 6 de setembro de 1649, atribuídas a Marapirão (AHU Pará, cx. 1, docs. 75 e 76). No mesmo ano de 1649, o índio aportou no Maranhão em companhia de Luís de Magalhães, que fora incumbido de aplicar as recentes leis sobre os índios livres, quando posteriormente sofreu um desterro à capitania do Pará por ordem do próprio governador.

As duas cartas possuíam pontos em comum, como a solicitação de um governador perito na língua indígena - e que “dê execução às ordens e mandados de V. Maj.”, completava a carta do dia 6 - e o elogio ao antigo capitão-mor do Pará, Sebastião Lucena de Azevedo, em relação ao bom trato destinado aos índios e ao respeito às leis indigenistas recentemente promulgadas, ainda que, lembrava a correspondência do dia 6, fora destituído pelo povo e câmara de Belém “por verem que em tudo dava execução da ordem de V. Maj. em nosso favor”. Particularmente, assinada por lideranças tabajara (o próprio Marapirão), tupinambás, nheengaíbas, de nações não identificadas e por dois capitães, essa última carta informava que os índios eram tratados “piores que escravos” por parte dos governadores do Estado e capitães-mores do Pará, em desobediência à legislação indigenista recente, e criticava as “ambições” do vigário geral Matheus de Sousa Coelho e do cônego Manuel Teixeira - referentes à administração de aldeamentos e ao tratamento destinado aos índios, qual seja, à semelhança de escravos (AHU Pará, cx. 1, doc. 76). Quanto à correspondência do dia 2, indicava que o índio conhecia as leis indigenistas recentes (“ordens e favores que S. Magde. nos faz e tem feito”) e descrevia o “desterro” que Marapirão sofrera ao Pará, onde os índios “estão muito mais queixosos”, a mando de Luís de Magalhães. Para tanto, a justificativa para a reclamação do indígena (o “que me tem malquistado com o governador do Estado”) era “a arraigada posse”, por parte dos portugueses, “de os tratarem como cativos”, não obstante “sejam forros” (AHU Pará, cx. 1, doc. 75). Ambas as cartas foram destinadas ao monarca, debatidas no Conselho Ultramarino e assinadas (com cruzes) no Pará, isto é, após o referido desterro do chefe.

Em correspondências enviadas ao rei no ano seguinte (1650), Luís de Magalhães procurava acusar os seus contrários e se defender das mencionadas denúncias. Nomeava diretamente os que chamava de “inimigos”, o provedor do Estado, Manuel Pita da Veiga, o capitão-mor do Pará, Inácio do Rego Barreto (primo do provedor), e o vigário de Tapuitapera, Roque Martins, e dirigia ao referido capitão-mor e a outros agentes, o vigário geral, Matheus de Sousa Coelho, o vigário da matriz do Pará, Manuel Teixeira, e frades das ordens carmelita e franciscana, acusações semelhantes às que lhes foram anteriormente imputadas. Nesse sentido, segundo o governador, as práticas referentes à administração dos aldeamentos e ao cativeiro indígena adotadas por seus inimigos eram caracterizadas pela indistinção entre escravos e forros, o que causava repulsa, por parte dos índios, aos religiosos que administravam essas povoações e/ou ao cativeiro realizado pelo “homem” de Rego Barreto em um aldeamento da Ilha de Joanes (AHU Maranhão, cx. 3, docs. 292, 284 e 283).

Além do mais, Magalhães assinalava a sua condição de obediente à legislação indigenista - o que, assegurava, não praticava a câmara do Pará - e se apresentava como perito no bom trato com os índios. Em relação a Marapirão e seu pai, tratou de inverter a sua antiga posição sobre os dois índios, como se disse, e desmerecer o primeiro enquanto agente político autônomo, pois afirmava que Inácio do Rego “ditava” a carta do índio, além deste último “abrasar” tudo o que a câmara de Belém escrevia (AHU Maranhão, cx. 3, doc. 292). Lembramos, nesse sentido, que a autoria dessas cartas indígenas era duvidosa, o que, como observamos, não impediu a defesa das leis favoráveis aos índios por via das mesmas. De qualquer forma, o conflito gerou uma extensa devassa, elaborada pelo desembargador Manuel Gameiro de Barros, findando, sem punições, com o retorno do governador ao reino, posto que o seu triênio de governo acabaria, convenientemente, no ano subsequente (AHU Maranhão, cx. 3, docs. 295 e 300). Nesse conflito, como pretendemos demonstrar a seguir, a relação de Marapirão com sua família e nação, extrapolando os limites da capitania do Maranhão, explicava a sua capacidade de ação política.

Ao que parece, o vínculo entre Antônio da Costa Marapirão, seus parentes e sua nação tabajara era a pedra angular da sua atuação política. Como já destacou Alírio Cardoso, conforme a solicitação por mercês de 1648 atribuída ao chefe, para garantir a sucessão do pai ao filho do comando do aldeamento de Cojupe, do posto de principal da nação tabajara e do hábito da Ordem de Cristo, Marapirão se apresentava como o elo que tornava possível a mobilização de seus parentes e dos tabajaras à causa portuguesa - no caso, a restauração ou expulsão dos holandeses de São Luís (CARDOSO, 2002CARDOSO, Alírio. Insubordinado, mas sempre devotos: poder local, acordos e conflitos no antigo Estado do Maranhão (1607-1653). 263 f. Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade de Campinas, Campinas, 2002.; AHU Maranhão, cx. 3, doc. 268).

Conforme a citada correspondência atribuída a Marapirão, de 2 de setembro de 1649, o chefe informava que, retornando do reino, malograra seu intento de tomar todo o Ceará, mas conquistara Jericoacoara por via da “prática dos índios tabajaras meus parentes”. Na ocasião, como “vassalos leais que são de V. Majestade e inimigos capitais dos holandeses”, expulsaram os flamengos do Camocim e da fortaleza do Ceará, que, em retirada, instalaram-se “na serra donde hoje estão” - talvez, como se verá, a Serra da Ibiapaba. Por fim, sugeria ocupar a fortaleza (“para castigar os insultos que os confederados dos holandeses têm feito aos portugueses”) e, atestando lealdade, afirmava que a partir do Ceará rumaram consigo e Luís de Magalhães ao Maranhão cinco principais tabajaras (enviando o governador, posteriormente, quatro para Jericoacoara), que, garantiam esses índios, mataram o aparentemente exagerado número de 800 holandeses. A carta parecia relacionar a obediência às novas leis (ao citar, como se viu, o desrespeito das mesmas por parte de alguns portugueses) e a proximidade física com seus liderados à sua capacidade de instruí-los no serviço real, pois, visto que “V. Majestade me encarregou da conservação dos poucos índios desta nação que há neste Maranhão”, atuava “animando-os para os instruir no melhor modo e via no serviço de V. Majestade”. Contudo, uma vez no Pará, afirmava que “os poucos índios de minha geração ficaram distantíssimos” e os “da minha nação” faltosos do “meu amparo” (AHU Pará, cx. 1, doc. 75).

Ora, na ocasião dos mencionados conflitos que envolveram Luís de Magalhães, Antônio da Costa Marapirão e diversas autoridades, o governador afirmava que o índio em questão andava “pelas aldeias dizendo que cada vez que quisesse se iria com a sua aldeia para Jericoacoara onde estavam seus parentes tabajaras com quem havia falado quando viera do reino” (STUDART, 1921STUDART, Barão de (Org.). Documentos para a história do Brasil especialmente do Ceará. Vol. 3a e 4b. Fortaleza: IHGC, 1921.a, p. 189). Segundo a referida devassa elaborada pelo desembargador Gameiro de Barros, quando a embarcação que transportava Luís de Magalhaes do reino para o Maranhão passou pelo Ceará, não o podendo tomar (conforme estipulavam determinadas ordens régias), arribou em Jericoacoara e “ali [Magalhães] fez logo pazes com o gentio da terra e resgates de trinta índios como ele mesmo confessou”, apesar de ter sido encarregado pelo rei de garantir “a liberdade dos gentios e que não houvesse cativeiro por serem injustos” (AHU Maranhão, cx. 3, doc. 300). Quem sabe o chefe tabajara que vinha do reino consigo, Marapirão, não teria atuado de alguma forma nesse empreendimento, visto que conhecia os índios da região.

Marapirão e Antônio Vieira

Uma nova série de debates, centrados no Conselho Ultramarino (mas não só), resultaram em diversas leis indigenistas que procuraram, de uma vez por todas, distinguir juridicamente os índios livres dos escravos. Nessa empreitada, além da apreciação das representações dos procuradores das capitanias do Pará e Maranhão e da atuação do governador André Vidal de Negreiros, Mathias Kiemen destaca o peso dos jesuítas - especialmente por meio do padre Antônio Vieira, que desembarcou no Estado com outros inacianos em janeiro 1653 para reiniciar a obra missionária.

Nesse sentido, se em 1652 uma lei régia proibia incondicionalmente o cativeiro indígena, após protestos dos moradores na colônia e no reino (por via dos procuradores do Pará e Maranhão), a escravidão do indígena por resgates e guerras justas passou a ser permitida por leis de 1653 e 1655. É importante mencionar, também, a concessão com exclusividade aos jesuítas do poder temporal sobre os aldeamentos pelo regimento, de 1655, do governador André Vidal de Negreiros (KIEMEN, 1954KIEMEN, Mathias O. F. M. The indian policy of Portugal in the Amazon Region, 1614-1693. Washington D. C.: Catholic University of America Press, 1954., p. 79-100). Como asseguram as diversas correspondências escritas por Antônio Vieira, algumas delas enviadas diretamente ao monarca, às leis de 1655 (principalmente a relativa à escravidão) eram atribuídos o aumento da missão (descimentos e estabilidade dos aldeamentos) e a paz com os nheengaíbas da Ilha de Joanes, firmada em 1658, após uma malograda guerra justa contra esses índios empreendida pelos portugueses em 1655, para a qual foi movimentado um expressivo corpo de tropa (VIEIRA, 2008VIEIRA, Antônio. Cartas. Organização de João Lúcio de Azevedo. Tomo I. São Paulo: Editora Globo, 2008., p. 338-424).

Destacamos, com Chambouleyron, que se na carta atribuída a Marapirão, de 6 de setembro de 1649, o tabajara teria solicitado a presença de jesuítas, mudara de opinião com a presença dos padres. Nesse sentido, com a atuação dos inacianos no Estado, a partir de 1653, bons relacionamentos (visto que Marapirão provavelmente conhecia a ordem jesuíta, conforme indícios apontados pelo autor) poderiam se transformar em conflitos e/ou novos embates fatalmente surgiriam (a exemplo da oposição entre colonos e jesuítas na ocasião do levante de 1661) (CHAMBOULEYRON, 2005bCHAMBOULEYRON, Rafael. Missionários, índios capitães e moradores: relações e conflitos na Amazônia seiscentista. In: FORLINI, Louis Carlos; MURRIETA, Rio Sergio Sereni; VIEIRA, Ima Célia Guimarães (orgs.). Amazônia. Além dos 500 anos. Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi. 2005b, p. 1-22.). Observamos que o recurso à escrita era uma possibilidade aos potiguaras do Brasil, mas que, provavelmente, Marapirão não sabia escrever. Nesse caso, além das referidas cartas atribuídas ao chefe (talvez escritas ou “ditadas” por não indígenas, mas em defesa da legislação favorável aos índios), a aliança com um grupo em detrimento de outro poderia ser uma opção.

No início da década seguinte (1660), portanto, Antônio da Costa Marapirão retornaria ao reino para, segundo um requerimento atribuído ao índio, requisitar novas mercês. Na ocasião, apoiara-o o procurador do Estado, Jorge de Sampaio Carvalho, que estava na Corte para justificar a expulsão, ocorrida em 1661, dos jesuítas das capitanias do Maranhão e Pará. O apoio do procurador, ao que parece, possuía relação com a adesão do índio ao levante, organizado pelos colonos, que resultaria naquela expulsão. Assim sendo, dentre os diversos motivos que o procurador apresentou ao monarca para justificar o motim, em um extenso documento composto por 25 capítulos, constava especialmente o dilatado e abusivo poder temporal dos inacianos sobre os aldeamentos e, também, o conflito que Antônio Vieira empreendera contra Marapirão, que, ao fim e ao cabo, provava o desgosto dos índios frente à concessão daquele poder aos jesuítas (CHAMBOULEYRON, 2005bCHAMBOULEYRON, Rafael. Missionários, índios capitães e moradores: relações e conflitos na Amazônia seiscentista. In: FORLINI, Louis Carlos; MURRIETA, Rio Sergio Sereni; VIEIRA, Ima Célia Guimarães (orgs.). Amazônia. Além dos 500 anos. Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi. 2005b, p. 1-22.). É importante informar que, se o hábito do chefe fora concedido em desacordo com os padrões da Ordem (dado pelo governador), como já informamos, Sampaio Carvalho apresentava o tabajara como “Principal Dom Antonio Marapirão, muito abalizado e grande servidor de V. Magde., Cavaleiro do hábito de Christo” (STUDART, 1921STUDART, Barão de (Org.). Documentos para a história do Brasil especialmente do Ceará. Vol. 3a e 4b. Fortaleza: IHGC, 1921.b, p. 113).

Vieira, expulso com os demais padres da Companhia de Jesus, respondeu um a um os capítulos de Sampaio Carvalho, apresentando o chefe tabajara como um índio dado a levantes e traições contra os portugueses, motivo pelo qual foi desterrado em três ocasiões - em 1649, caso já citado, em 1658, ocasião na qual uniu-se a índios que possuíam “trato com os holandeses”, e em 1659. Nos dois primeiros casos, segundo o padre, o índio também foi preso após escapar da penalidade (CIDADE, 1951CIDADE, Hernani (Org.). Padre Antônio Vieira. Obras escolhidas. Lisboa: Livraria Sá Costa/Editora Lisboa, 1951., p. 211-212). Isso porque conforme os informantes contemporâneos, uma das cartas atribuídas a Marapirão, Luís de Magalhães e o próprio Vieira, o que chamavam de desterro, na verdade, constituía um ato dissimulado, pois, à exceção do último degredo, para tanto o tabajara foi enviado como líder de indígenas que integravam tropas de entrada (AHU Pará, cx. 1, doc 75; STUDART, 1921STUDART, Barão de (Org.). Documentos para a história do Brasil especialmente do Ceará. Vol. 3a e 4b. Fortaleza: IHGC, 1921.a, p. 189; CIDADE, 1951CIDADE, Hernani (Org.). Padre Antônio Vieira. Obras escolhidas. Lisboa: Livraria Sá Costa/Editora Lisboa, 1951., p. 212). Nesses eventos, conforme Vieira, os inacianos sempre o amparavam e auxiliavam, mas, “como tão costumado a levantar-se, se deixou persuadir facilmente dos portugueses levantados, para que ele também o fizesse contra os padres a quem tantas obrigações tinha” (CIDADE, 1951CIDADE, Hernani (Org.). Padre Antônio Vieira. Obras escolhidas. Lisboa: Livraria Sá Costa/Editora Lisboa, 1951., p. 211-212). À semelhanças de Luís de Magalhães, portanto, diminuía a capacidade indígena de atuar em prol de seus interesses.

Assim como no embate envolvendo Luís de Magalhães, na ocasião do motim de 1661 o vínculo de Marapirão com sua família e nação era destacado na mencionada justificativa do levante de elaborada por Sampaio Carvalho e na resposta a esta apresentada por Vieira. O procurador alertava que a prisão do índio a mando do governador D. Pedro de Melo, em 1658 (o segundo desterro), foi influenciada pelos jesuítas porque o tabajara, em recusa às tentativas inacianas de lhe “senhorear”, “lhes respondeu que era livre e senhor de sua família, e nação, e que não havia de estar às suas ordens” (STUDART, 1921STUDART, Barão de (Org.). Documentos para a história do Brasil especialmente do Ceará. Vol. 3a e 4b. Fortaleza: IHGC, 1921.b, p. 113). Por seu turno, Vieira afirmava que o governador resolveu desterrar o tabajara ao rio Amazonas, “com o pretexto de levar alguma gente sua” em uma tropa, porque “se publicou na cidade de São Luís que o dito Marapirão se queria levantar com os índios e estava unido com os da serra de Ibiapaba, que são de sua própria nação, e que outrossim tinha trato com os holandeses” (o que, reconhecia o padre, “não houve cousa provada”). “E este é o abalizado D. Antônio da Costa Marapirão, grande servidor de Sua Majestade”, concluía, ironicamente, sua análise sobre o índio (CIDADE, 1951CIDADE, Hernani (Org.). Padre Antônio Vieira. Obras escolhidas. Lisboa: Livraria Sá Costa/Editora Lisboa, 1951., p. 211-212).

Estando no reino desde 1661, em companhia de Sampaio Carvalho, no ano seguinte (1662) o Conselho Ultramarino deliberava sobre petições por mercês atribuídas a Antônio da Costa Marapirão e a um tupinambá chamado Alexandre de Sousa, além de avaliar uma carta de Antônio Vieira e outra, em resposta a esta, do mesmo procurador do Estado. Primeiramente, apesar de não discriminar as mercês solicitadas, o conselho reconhecia que os dois índios desejavam retornar às suas terras, eram “poucos favorecidos pelos padres da Companhia” e, além das “matalotagens”, vestidos e sustento ordinário durante a estadia em Portugal, sugeriu ofertar “uma medalha” no lugar do hábito de Cristo e a “provisão de principal da sua nação” a Alexandre de Sousa. Sobre Marapirão, posto que não convinha facilitar a concessão da referida mercê do hábito, o conselho sugeria a reforma da provisão “que se lhe passou de capitão-mor de gente de sua nação”, “a quem Sua Magde.”, informava o mesmo conselho, “fez mercê de mandar lançar o hábito”, o que provava a condição (aos dois indígenas) de beneméritos e descendentes de bons servidores (ABAPEP, 1981Anais da Biblioteca e Arquivo Público do Pará (ABAPEP). Belém: SECDET, 1983, tomo XIII., p. 386). Nesse sentido, analisadas pelo Conselho Ultramarino, as petições atribuídas aos referidos índios informavam que os pais de ambos chegaram ao Maranhão, em 1615, incorporados à tropa, comandada por Jerônimo de Albuquerque, que combatera os franceses instalados na região. Embora apresentassem informações contrárias sobre os referidos índios, as cartas de Vieira e Sampaio Carvalho destacavam a família, a nação e, sobretudo, a capacidade dos dois chefes de comandar muitos índios como os elementos centrais dessa contradição.

Em síntese, Antônio Viera destacava o diminuto aldeamento comandado por Marapirão, sua tentativa (frustrada, insinuava o jesuíta) de amotinar os demais índios a mando dos colonos - isto é, uma vez mais, reduzia o protagonismo indígena - e apontava possíveis desavenças entre o chefe e os demais índios. Acusações que o procurador prontamente rebatia, destacando a autoridade do chefe sobre muitos indígenas e sua condição de leal servidor. Sobre o vínculo de Marapirão com sua nação, o padre afirmava que, em relação ao terceiro desterro sofrido pelo índio (1659), o chefe intentou “passar aos tabajaras da serra, que haviam tido trato com os holandeses”; e, posteriormente, amotinou “principalmente os de sua nação a que fossem dizer à Câmara que não queriam os padres, e que depusessem e jurassem contra eles tudo o que lhes fosse perguntado” (ABAPEP, 1981Anais da Biblioteca e Arquivo Público do Pará (ABAPEP). Belém: SECDET, 1983, tomo XIII., p. 379-381). Sobre a capacidade de mobilizar muitos índios enquanto elementos de destaque, as respectivas posições de Antônio Vieira e Sampaio Carvalho são claras:

[Vieira:] e não só é falso, mas ridículo dizerem que pela sua retenção em Portugal deixará de ir por diante o aumento daquele Estado, como se fossem os ditos Marapirão e Alexandre pessoas de muita conta no Maranhão, e de alguma autoridade, ou séquito com os índios, ou de alguma utilidade ao serviço de Deus, e de V. Majestade.

[Carvalho:] E no particular de os índios não fazerem falta em suas aldeias como o dito padre diz é engano porque como ele não ia perder nada não sentiria o que podia resultar na retenção dos ditos índios em razão à qualidade desta gente, que com qualquer coisa se alteram, e se irritam de tal sorte, que resultaria em um geral dano daquele Estado porque deles dependem a conservação e aumento do Estado, e esta é a verdade, e o que conheço da natureza, e qualidade desta gente por haver 18 anos que tenho conhecimento deles (ABAPEP, 1981Anais da Biblioteca e Arquivo Público do Pará (ABAPEP). Belém: SECDET, 1983, tomo XIII., p. 381, 382 e 389).

Observe que Sampaio Carvalho reconhece claramente certo apreço indígena por “alterações”. Em conclusão, considerava importante não enviar jesuítas ao Estado, para garantir a “quietação dos índios”, e conceder as mercês requisitadas aos dois chefes (sugestão apoiada pelo Conselho Ultramarino). Inversamente, se Antônio Vieira se esforçava para apresentar ambos os índios como dispensáveis à condução de seus liderados, em suas sugestões sobre o destino de Marapirão não deixava de reconhecer o perigo representado pelas alianças que esse chefe estabelecia com os indígenas da região, pois, visando destacar a proteção régia aos ministros da igreja frente a “qualquer outro poder e violência dos portugueses com que eles [os dois índios] se uniram”, considerava necessário o desterro do tabajara ao Rio de Janeiro “e não para Pernambuco ou para a Bahia porque daí se podem passar facilmente por terra à serra da Ibiapaba, onde vivem os índios mais rebeldes de toda aquela costa, e de quem o Marapirão é parente”. Lembrava que, “como tão inquietos, maus e ladinos”, os dois chefes (Marapirão e Alexandre) poderiam malograr a missão que os jesuítas iniciaram naquela serra, “onde chegam navios de todas as nações do norte, e sobretudo consta que estes índios tratam de se embarcar ocultamente para Pernambuco, com que fica mais confirmada essa presunção, e receio”. Mais uma vez diminuindo a “agência” indígena (enquanto “gente de menos entendimento”, “neles tem mais lugar toda a razão de clemência”), assegurava que a pena era branda porque “o desterro fica sendo dentro da mesma província e clima donde são naturais os dois índios e vão viver nas aldeias da sua mesma nação” (ABAPEP, 1981Anais da Biblioteca e Arquivo Público do Pará (ABAPEP). Belém: SECDET, 1983, tomo XIII., p. 383). Lembramos que, sobre as informações de Vieira e Carvalho, o conselho as julgava “ambas suspeitosas” (ABAPEP, 1981Anais da Biblioteca e Arquivo Público do Pará (ABAPEP). Belém: SECDET, 1983, tomo XIII., p. 383).

Observe que a importância dos tabajaras e parentes de Marapirão, do ponto de vista do conflito político, migrara de Jericoacoara para a Serra da Ibiapaba entre as décadas de 40 e 50 dos seiscentos. Nesse ponto, faz-se necessário descrever a importância desse último espaço, durante o século XVII, para as políticas indígenas e indigenistas. Sabe-se que a partir da região atualmente conhecida como Nordeste do Brasil (especialmente Pernambuco e proximidades), grupos tupis como tupinambás, potiguaras, caetés e tabajaras, com o advento da colonização, migraram em diversas ocasiões - entre fins do século XVI e início do seguinte - e povoaram regiões do Maranhão e Pará. Alguns desses, durante as travessias, permaneceram na Serra da Ibiapaba, então fronteira entre o Ceará e o Maranhão, onde também residiam alguns grupos tapuias. Esses tupis eram tabajaras, ou assim passaram a ser conhecidos. Lígio Maia, acompanhando a análise de Florestan Fernandes, descarta uma provável proveniência do Rio de Janeiro. A mesma serra foi visitada pela tropa do português Pero Coelho, em 1603, que encontrou franceses habitando e comerciando com os tabajaras naquelas partes, ocasião na qual um conflito logo tivera lugar. Em 1607, os jesuítas Francisco Pinto e Luiz Figueira missionaram na região e conviveram com os tabajaras, quando, no ano seguinte, o primeiro foi morto por tapuias contrários (MAIA, 2017MAIA, Lígio. Cultores de uma vinha sagrada: índios e jesuítas na missão da Serra de Ibiapaba (século XVII). Natal: EDUFRN, 2017., p. 12, 13 e 35; MAIA, 2010MAIA, Lígio. Serras de Ibiapaba. De aldeia à vila de índios: vassalagem e identidade no Ceará colonial (século XVIII). 409 f. Tese (Doutorado em História Social) - Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2010., p. 49-51 e 64).

Na ocasião da ocupação holandesa do Ceará (1637-1644 e 1649-1654), informamos que os índios revoltaram-se contra os flamengos em 1644, como resposta aos abusos praticados pelos últimos, no que foi considerado uma traição por parte dos batavos. Quanto à Serra da Ibiapaba, abrigou tabajaras e potiguaras, dentre eles Antônio Paraupaba, que partiram de Pernambuco e arredores, em 1654, após a restauração. Nesse sentido, como se disse, o Ceará foi o último reduto holandês no Brasil, mas caíra ainda naquele ano de 1654, quando Paraupaba rumou à Holanda visando retornar com tropas para ajudar os índios da serra. Com os padres Antônio Ribeiro e Pedro Pedrosa, uma nova missão jesuíta à região foi realizada, nos anos de 1656 e 1657, sob a supervisão do próprio Antônio Vieira, que, em 1660, visitaria pessoalmente a serra. Em retorno ao Maranhão, Ribeiro e Pedrosa trouxeram consigo alguns dos chamados “índios de Pernambuco”, alocando-os no aldeamento de São José. Considerados por Vieira como um dos principais obstáculos da missão, ao lado da dificuldade natural de transitar pela região, o jesuíta tencionava afastar de Ibiapaba a influência desses “índios de Pernambuco”. Com o mencionado motim de 1661, a missão na serra foi novamente abandonada e, somente na virada do século, a região passou a integrar, de fato, um aldeamento jesuíta. Os números apresentados por Maia, no que se refere à densidade populacional do aldeamento, dão o tom da importância da serra para os índios e a missão catequética, pois, apesar do caráter fragmentário dos dados, ao que parece correspondia à uma região de alta densidade demográfica ou ao mais populoso aldeamento do Brasil - integrando grupos tupis e tapuias - durante pelo menos os séculos XVII e primeira metade do XVIII (MAIA, 2017MAIA, Lígio. Cultores de uma vinha sagrada: índios e jesuítas na missão da Serra de Ibiapaba (século XVII). Natal: EDUFRN, 2017., p. 142-171).

No que se refere à ação política de Marapirão, a avaliação que Vieira elaborou sobre os índios da serra explica porque, por um lado, Ibiapaba substituiu Jericoacoara e, por outro, a ameaça holandesa - ou calvinista, com os “índios de Pernambuco” - ainda pairava no horizonte. Aliás, a presença desses indígenas, que chegaram à serra naquele ano de 1654, contribuía para consolidar a classificação de Ibiapaba, conforme avaliação de Vieira, como uma “composição infernal, ou mistura abominável de todas as seitas e de todos os vícios, formada de rebeldes, traidores, ladrões, homicidas, adúlteros, judeus, hereges, gentios, ateus” (apudMAIA, 2017MAIA, Lígio. Cultores de uma vinha sagrada: índios e jesuítas na missão da Serra de Ibiapaba (século XVII). Natal: EDUFRN, 2017., p. 152). Não era à toa que, se a referida carta atribuída a Marapirão de 6 de setembro de 1649 foi assinada (com cruzes) por chefes tabajara (o próprio Marapirão), tupinambás e nheengaíbas, o padre considerava os nheegaíbas da Ilha de Joanes e do Cabo Norte e os tabajaras de Ibiapaba como os bastiões que assegurariam o Estado. Após descrever a paz estabelecida com os nheengaíbas de Joanes, em carta de 1660 ao rei D. Afonso VI, afirmava que o Estado “estava como sitiado de dois poderosos inimigos”: os “tabajaras da serra” e os nheengaíbas do Cabo Norte, isto é, os “extremos do mesmo Estado”. “E como ambas as nações tinham comunicação com os holandeses e viviam de seus comércios”, concluía que os “danos que desta união se podiam temer [...] não era menos do que a total ruína (VIEIRA, 2008VIEIRA, Antônio. Cartas. Organização de João Lúcio de Azevedo. Tomo I. São Paulo: Editora Globo, 2008., p. 422).

Por fim, a presença e a atuação jesuíta no Estado desencadearam conflitos que culminariam na expulsão dos inacianos, em 1661, e no retorno dos mesmos, em 1663, apesar da mencionada sugestão de Sampaio Carvalho (impedir a presença jesuíta no Estado). Contudo, Antônio Vieira foi proibido de retornar à região e os inacianos acabariam por perder parte o poder temporal sobre a mão de obra indígena livre aldeada e o monopólio da missão (passou a partilhar o poder espiritual com as outras as ordens missionárias), pois, por lei do mesmo ano de 1663, considerada por Kiemen como resultado da ação dos procuradores do Maranhão e Pará junto ao rei, os aldeamentos seriam comandados pelos seus próprios chefes ou principais e a distribuição dos índios forros estaria a cargo do padre do aldeamento junto com um repartidor nomeado pela câmara de São Luís ou Belém (KIEMEN, 1954KIEMEN, Mathias O. F. M. The indian policy of Portugal in the Amazon Region, 1614-1693. Washington D. C.: Catholic University of America Press, 1954., p. 118-119).

Considerações finais

Se antigas e longas migrações não foram suficientes para acabar com arcaicos vínculos familiares e étnicos, novas alianças com grupos não tupis eram almejadas (nheengaíbas e outros), isto é, liames envolvendo extensa faixa de território - de Pernambuco ao Pará. Para tanto, o retorno de Antônio da Costa Marapirão ao Estado nos anos 1640, nomeado cavaleiro do hábito da Ordem de Cristo e principal de seu aldeamento e nação pelo monarca, era um indicativo, pois regressou com o governador que fora incumbido pelo rei de aplicar a nova legislação sobre os índios livres. Nesse sentido, se possivelmente não escrevia cartas, petições ou representações, como os potiguaras do Brasil, aproveitava os conflitos existentes no mundo colonial, seja em relação à ameaça holandesa ou contendas no interior da sociedade colonial. Aliás, dentre as semelhanças com os demais chefes indígenas coloniais do Brasil (o tratamento de Dom, a sucessão das mercês, o papel de intermediário, as viagens à Europa, dentre outras), o grau de inserção na política colonial parece constituir uma das particularidades do chefe em questão, pois, ao invés de solucionar problemas específicos (relativos a determinados grupos ou aldeamentos), os eventos dos quais participou influíram junto à própria formação, consolidação e/ou aplicação da política ou legislação indigenista em todo o Estado do Maranhão e Grão-Pará.

Nesse sentido, unido aos colonos, opôs-se a um governador (Magalhães) e ao poder temporal jesuíta sobre os aldeamentos (Vieira), ou seja, agentes recém-chegados àquela sociedade colonial. Assim, diante dos conflitos que subiam à monarquia, os agentes da elite local referiam-se a Marapião como abalizado cavaleiro, bom servidor, indispensável liderança e/ou importante testemunha dos fatos; e Magalhães e Vieira, por seu turno, tratavam de inverter todas essas virtudes. Se a sua mercê de cavaleiro não seguiu os trâmites necessários (habilitações e registro nas chancelarias das ordens), uma segunda distinção em relação aos cavaleiros indígenas do Brasil, integrantes da elite local e o próprio Conselho Ultramarino (no caso da década de 1660) de fato o representavam como cavaleiro. No interior dos referidos conflitos ocorridos na colônia, identificamos as estratégias do chefe: a extensão de sua rede de alianças e, finalmente, a garantia de benefícios aos demais índios. Assim sendo, o chefe valia-se de sua extensa rede de reciprocidades para garantir a aplicação de leis favoráveis aos índios, o que, provavelmente, explicava a sua liderança ou vínculo sobre seu aldeamento e nação. Laços, portanto, reforçados no ambiente colonial. Não parece coincidência a sua aquisição de mercês no reino e a reestruturação da legislação indigenista, ocorridas simultaneamente (seja na década de 1640 ou na de 1660). E o governador Francisco Coelho de Carvalho, na década de 1640, claramente atrelou essa legislação a uma mercê régia e posteriormente solicitou remunerações - hábitos - a indígenas. E quando Marapirão retornou do reino com Magalhães e posteriormente foi desterrado ao Pará, certamente conhecedor das leis em questão, tratou de atuar junto aos índios da região (especialmente os nheengaíbas), que, com os tabajaras aliados da Serra de Ibiapaba, eram reconhecidos como os baluartes do Estado. A insistência em manter-se como intermediário - o poder temporal - diante dos jesuítas (conforme a lei de 1663) parece ter sido uma conquista e um desejo, mas a partir de então o chefe tabajara desapareceu da documentação. Será que o fim, de fato, da ameaça holandesa explicaria esse fato? De qualquer forma, manter velhas e novas alianças era o ponto nevrálgico de sua ação política e do seu poder.

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  • Organizadoras:

    Juciene Ricarte Apolinário e Maria Adelina Amorim

Editado por

Editores:

Karina Anhezini e André Figueiredo Rodrigues

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Nov 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    11 Out 2020
  • Aceito
    05 Jul 2021
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