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“Traição”, “desobediência”, “indisciplina partidária”: cassações de mandatos e suspensões de direitos políticos de parlamentares da Arena (1968-1969)

“Betrayal”, “disobedience”, “partisan indiscipline”: revocation of mandates and suspension of political rights of members of the Arena (1968-1969)

Resumo

Após mais de 50 anos da edição do Ato Institucional n. 5 (AI-5), ainda não se conhece bem a dimensão das pretensões de repressão às articulações no campo político, principalmente na própria base parlamentar governista. No Fundo Conselho de Segurança Nacional, atualmente sob a guarda do Arquivo Nacional, encontra-se vasta documentação sobre as cassações de mandatos eletivos e as suspensões de direitos políticos de parlamentares. Os dossiês tendo em vista as punições foram preparados a partir de material produzido por assessores parlamentares e agentes de órgãos de informação, a extensão da documentação sobre políticos profissionais mostra um empenho significativo em acompanhar suas atividades. O investimento na produção de documentação relativa aos arenistas mostra a busca pelo controle da circulação das informações na esfera pública e o reconhecimento da importância dos parlamentares, de suas manifestações na tribuna da Câmara dos Deputados e do Senado, nas votações no Congresso Nacional e na imprensa.

Palavras-chave:
Ditadura Militar; Ato Institucional n. 5; Aliança Renovadora Nacional (Arena); Conselho de Segurança Nacional; cassações

Abstract

After more than 50 years of the enactment of Institutional Act no. 5 (AI-5), there’s still little knowledge about the extent of repressive aspirations toward the politicians, even less on the government's party, the Aliança Renovadora Nacional (Arena). In the Fundo Conselho de Segurança Nacional, nowadays under the Arquivo Nacional jurisdiction, there’s vast documentation on the revocation of elective mandates and suspension of congressmen’s political rights. In terms of punishment, the dossiers were prepared from documents produced by parliamentary advisors and by information agents. The extent of this documentation on professional politicians shows a significant effort to monitor their activities. The investment in producing documentation relative to Arena’s politicians expresses a pursuit of control over the circulation of information in the public sphere and the recognition of the importance of congressmen, of their manifestations in Congress’ tribunes, in their National Congress votes and press.

Keywords:
Military Dictatorship; Institucional Act n. 5; Aliança Renovadora Nacional (Arena); Conselho de Segurança Nacional; purges

Não é ele, pelas suas atitudes no Congresso justo merecedor de uma cassação e perda dos direitos políticos por 10 anos? Não foi ele que, apesar de líder do Governo e presidente do partido oficial, sempre procurou no Congresso bancar o “bom moço”, dando cobertura a atitudes de franca rebeldia e não enfrentando com energia que se impunha os congressistas que atacavam não só o Governo como também as nossas forças armadas? (BR_DF_AN_BSB 8.PRO.CSS.71.6, p. 2).

Em 1965, o senador Daniel Krieger tornou-se presidente da Aliança Renovadora Nacional (Arena), “o partido oficial”, formado pelas lideranças entusiastas da “Revolução de 1964”. Após longa trajetória na União Democrática Nacional (UDN), o senador trabalhou pela organização do novo partido; no Congresso Nacional, foi líder do governo, coordenou as articulações entre a bancada arenista e os militares no Palácio do Planalto. De 1965 a 1968, apesar do apoio da Arena ao governo, houve divergências entre parlamentares arenistas e o Poder Executivo, o auge das tensões se deu com o caso Márcio Moreira Alves (MDB-GB). Krieger procurou negociar uma solução alternativa à cassação, sem sucesso. Afinal, na votação da licença para processar Moreira Alves na Câmara dos Deputados, 122 parlamentares do MDB e 94 da Arena votaram contra as diretrizes do governo. No dia seguinte foi editado o Ato Institucional n. 5 (AI-5), em pouco tempo Krieger renunciou à presidência do Diretório Nacional.

Como mostram estudos sobre o parlamento francês em maio de 1968, o fato de as manifestações estudantis nas ruas estarem em primeiro plano não significou que os parlamentares estivessem à margem do processo em curso. Apesar do maio de 1968 entrar para a história como a derrota de um modo tradicional de fazer política, que tem no debate parlamentar a encarnação por excelência, historiadores franceses têm investigado as discussões travadas na Assembleia naquele contexto (AUDIGIER, 2008AUDIGIER, F. Mai 68: le Parlement hors-jeu? Parlement[s& #093;, Revue d'histoire politique, v. 9, n. 1, p. 5-8, 2008). Nos estudos sobre 1968 no Brasil, o caso Márcio Moreira Alves faz uma ligação direta entre a ação dos estudantes nas ruas, a repressão militar e as iniciativas parlamentares no Congresso. No entanto, a gravidade do AI-5 parece ter minimizado o significado das discussões na Câmara dos Deputados, o caso Márcio Moreira Alves será referido sempre como pretexto para a radicalização da Ditadura, de certa maneira, esvaziado de valor como acontecimento.

As manifestações estudantis de 1968 e o impacto do AI-5 nas esquerdas são muito conhecidos, os estudantes foram atingidos em cheio pela repressão às suas entidades e às manifestações públicas de contestação (VALLE, 2008VALLE, M. R. 1968: o diálogo é a violência. Campinas: Editora da Unicamp, 2008.; MULLER, 2016MULLER, A. O movimento estudantil na resistência à ditadura militar. Rio de Janeiro: Garamond/FAPERJ, 2016.). Com a suspensão do habeas corpus, a política de Estado então corrente de prisões arbitrárias e torturas se consolidou (JOFFILY, 2013JOFFILY, M. No centro da engrenagem: os interrogatórios na Operação Bandeirante e no DOI de São Paulo (1969-1975). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional; São Paulo: Edusp, 2013. ). Com a censura, os meios de comunicação e as expressões artísticas mais variadas foram submetidas a vetos e cortes sucessivos (GARCIA, 2014GARCIA, M. Quando a moral e a política se encontram: a centralização da censura de diversões públicas e a prática da censura política na transição dos anos 1960 para os 1970. Dimensões, v. 32, p. 79-110, 2014.). A movimentação dos parlamentares durante o ano de 1968 e os efeitos do AI-5 no Congresso e nas direitas são menos evidentes.

De 13 de dezembro de 1968 até outubro de 1969, enquanto o Congresso esteve fechado, 105 parlamentares foram cassados (FIGUEIREDO, 1978FIGUEIREDO, M. A Política de Coação no Brasil Pós-64. In: KLEIN, L.; FIGUEIREDO, M. Legitimidade e coação no Brasil pós-64. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1978., p. 186). Nas eleições de 1966, foram eleitos 409 deputados federais, 277 da Arena e 132 do MDB (TSE, 1969). No MDB, foram atingidos 6 senadores e 66 deputados federais (Anexo I). Na Arena, foram cassados 33 deputados federais. O Executivo atingiu principalmente o MDB, o partido da oposição, mas um terço dos deputados federais cassados naquela conjuntura eram filiados à Arena. Com base no AI-5, as cassações de parlamentares foram realizadas pelo Conselho de Segurança Nacional, em reuniões sucessivas até a reabertura do Congresso. Após cada reunião, o Executivo emitiu decretos sem número com cassações de mandatos e suspensões de direitos políticos.1 1 Decreto s/n de 30 de dezembro de 1968, Diário Oficial da União - Seção 1 - 30/12/1968, p. 11267. Decreto s/n de 16 de janeiro de 1969, Cassação dos mandatos eletivos federais de parlamentares. Diário Oficial da União - Seção 1 - 17/1/1969, p. 554. Decreto s/n de 16 de janeiro de 1969, Cassação dos mandatos eletivos e suspensão dos direitos políticos de parlamentares. Diário Oficial da União - Seção 1 - 17/1/1969, p. 554. Decreto s/n de 7 de fevereiro de 1969, Diário Oficial da União - Seção 1 - 10/2/1969, p.1331. Decreto s/n de 13 de março de 1969, Diário Oficial da União - Seção 1 - 14/3/1969, p. 2212. Decreto s/n de 29 de abril de 1969, Diário Oficial da União - Seção 1 - 30/4/1969, p. 3661. Decreto s/n de 11 de setembro de 1969, Diário Oficial da União - Seção 1 - 12/9/1969, p.7733. Decreto s/n de 30 de setembro de 1969, Diário Oficial da União - Seção 1 - 1/10/1969, p. 8272. Cf. https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao

Atualmente, no Fundo Conselho de Segurança Nacional, depositado no Arquivo NacionalArquivo Nacional. Fundo Conselho de Segurança Nacional (CSN)., é possível consultar documentação que mostra o empenho de militares na alta hierarquia do Exército em punir Krieger e dezenas de parlamentares da Arena e do MDB.2 2 Nesse artigo vou examinar apenas os casos de arenistas com mandatos federais, as pretensões de cassação nos níveis estaduais e locais extrapolam o escopo pretendido. Mas com certeza ainda resta compreender os usos do AI-5 nos Estados e Municípios. No Fundo CSN, estão depositados os processos dos parlamentares cassados e de visados, parlamentares que tiveram processos preparados, mas cujas punições não foram aprovadas, como o do senador Krieger. Os processos eram sumários e baseados em legislação de exceção e, ainda assim, eram elaboradas “exposições de motivos”, conforme a praxe de tramitação de atos normativos no país.3 3 As datas as exposições de motivos assinadas coincidem com a publicação dos respectivos decretos no Diário Oficial. Como há documentos assinados e minutas, sem a assinatura manuscrita do Secretário-Geral do Conselho de Segurança Nacional junto ao seu nome datilografado, temos não só o registro relativo aos punidos, mas o registro da pretensão de militares em punir um número muito maior de arenistas, inclusive o presidente da Arena. Na subsérie Processos, encontram-se os processos sumários dos 33 arenistas cassados e documentação relativa a, pelo menos, 52 deputados federais e 7 senadores da Arena que não chegaram a ser punidos.

O material encontrado sobre os parlamentares é muito extenso, reúne informações públicas e documentos sensíveis. É uma documentação original que permite várias abordagens. Nesse primeiro artigo, procurei identificar o sentido do conjunto da documentação relativa a parlamentares da Arena, observando a formação e o andamento dos processos sumários, assim como as principais motivações alegadas para as punições no período de dezembro de 1968 a outubro de 1969. Os militares coordenaram o monitoramento sistemático dos parlamentares da Arena (por órgãos de informação e e assessorias parlamentares), organizaram dossiês tendo em vista a criminalização de divergências com o Poder Executivo e o afastamento de muitos desses quadros da vida pública, o que indica a intolerância com iniciativas minimamente críticas às relações de subordinação estabelecidas entre os poderes. Os processos sumários de cassação de mandatos e suspensão de direitos políticos são expressões das disputas por poder no âmbito do Estado entre políticos e militares, agentes públicos de diferentes tipos.

A partir de uma visão sociológica da formação das democracias representativas, os políticos profissionais são entendidos como resultado do processo de especialização das sociedades modernas (WEBER, 1996WEBER, Max. Ciência e política: duas vocações. São Paulo: Cultrix, 1996.). Como políticos profissionais se dedicam às atividades de representação política, entendida como um objeto específico de estudo, que se relaciona, mas não pode ser reduzido aos interesses econômicos. Nas democracias representativas, os políticos têm o monopólio da representação política, sendo a sua autoridade profundamente ligada à legitimidade do campo político (BOURDIEU, 1989BOURDIEU, P. “A representação política: elementos para uma teoria do campo político”. In: BOURDIEU, P. O poder simbólico. Lisboa: DIFEL, 1989, p. 163-207). Como Michel Offerlé ressalta, a legitimidade das democracias representativas é resultado de um trabalho político de convencimento realizado principalmente pelos políticos profissionais. No entanto, a legitimidade da representação política não é um resultado inevitável, nem assegurado de maneira permanente. Em conjunturas críticas, como a instauração de uma ditadura, o monopólio da representação política é contestado por movimentos apolíticos ou antiparlamentares (OFFERLÉ, 1987OFFERLÉ, M. Les parties politiques. Paris: PUF, 1987. ). No período estudado, políticos e militares estão em franca disputa.

Militares e políticos

Durante a presidência João Goulart, muitos políticos trabalharam pela desestabilização do governo, combateram seus projetos de lei no Congresso Nacional e procuraram emplacar a pecha de “comunista” no mandato trabalhista. Afinal, lideranças da UDN conspiraram com militares, apoiaram o golpe de Estado e permaneceram à sombra das Forças Armadas. Os militares tomaram o Poder Executivo com a anuência dos parlamentares que reconheceram a vacância do cargo de presidente da República e elegeram o marechal Castello Branco. Quer dizer, militares e políticos conservadores procuraram legitimar a intervenção militar com ritos no Legislativo. Nesse processo não participaram apenas parlamentares da UDN, mas também do Partido Social Democrático (PSD) e de outros partidos. A maioria dos parlamentares participou de um processo eleitoral resultado de um golpe que minava suas próprias bases de legitimidade conforme a Constituição de 1946 - o sistema democrático representativo, baseado no pluralismo partidário e no sufrágio universal. Eram políticos profissionais, parlamentares com trajetória política em seus Estados e que se organizavam em partidos nacionais havia cerca de 20 anos, desde o fim da Ditadura do Estado Novo (1937-1945).

Na ocasião do Golpe de 1964 não havia propostas de modificar completamente o sistema político. Ao preservar os partidos e o Congresso Nacional, o novo regime manteve as elites políticas conservadoras ao seu lado, construindo uma continuidade nas relações de poder em Municípios e Estados por todo o território nacional. No entanto, ainda em abril de 1964, os “revolucionários” consentiram com as primeiras cassações de mandatos e suspensões de direitos políticos de parlamentares em todos os níveis, de governadores e de prefeitos. É notório que foram afastadas autoridades eleitas principalmente por partidos reformistas, como o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e o Partido Socialista Brasileiro (PSB) (DOU, 1964). Em Estado e oposição no Brasil, Maria Helena Moreira Alves considera o recurso ao poder de cassação uma demonstração de que o Legislativo e os partidos políticos constituíam alvos importantes, o objetivo era intimidar o Congresso Nacional e reduzir as possibilidades de coalização parlamentar entre PTB e PSD (ALVES, 1984ALVES, M.H.M. Estado e oposição no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1984., p. 63)

De dezembro de 1968 até outubro de 1969, foram cassados mais parlamentares no Congresso do que em 1964. Maria Helena Moreira Alves reconhece que o MDB e a Arena foram enfraquecidos pelos sucessivos expurgos, mas chega a afirmar que os “parlamentares da Arena que votaram com o MDB foram sumariamente privados de seus mandatos eleitorais, passando a integrar o campo do ‘inimigo interno’” (ALVES, 1984ALVES, M.H.M. Estado e oposição no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1984., p. 141). Na verdade, a maioria dos deputados federais arenistas que votou contra a concessão da licença para processar Márcio Moreira Alves não foi atingida pelo AI-5, nem se desfiliou do partido. De um total de 277 parlamentares da Arena, 183 apoiaram o governo e 94 votaram contra a licença. Apenas 33 foram cassados, o que sugere uma solução de compromisso, o Executivo se eximiu de punir muitos arenistas, preservando seus mandatos.

Na interpretação de alguns pesquisadores, os conflitos entre militares e políticos tiveram peso importante na decisão pelo AI-5. Para o historiador Carlos Fico, a motivação para o decreto do AI-5 está relacionada aos “anseios punitivos do grupo radical”, à “decisão de Costa e Silva de completar a ‘operação limpeza’” (FICO, 2001FICO, C. Como eles agiam. Rio de Janeiro: Record, 2001., p. 65). Para o cientista político João Roberto Martins Filho, “a presença de divisões dentro do campo militar é secundária em relação à reiterada união dessas forças na defesa da ‘Revolução de 1964’ e no ataque a qualquer tentativa de rearticulação autônoma do campo ‘político’” (MARTINS FILHO, 1993MARTINS FILHO, J.R. O palácio e a caserna: a dinâmica militar das crises políticas na ditadura (1964-1969). Tese (Doutorado em História) - Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Campinas, 1993., p. 115). Logo após o AI-5, as cassações de parlamentares da Arena e do MDB parecem ter sido o principal instrumento de repressão à tentativa de rearticulação autônoma do campo político. Para Martins Filho, o motor da nova etapa de militarização estaria no Gabinete Militar da Presidência da República, órgão diretamente envolvido nas cassações.

De acordo com o historiador Daniel Aarão Reis Filho, na ocasião do AI-5, apesar das referências às

ameaças de subversão da ordem, o que de fato os preocupava era a questão das dissidências no próprio interior das direitas, que ameaçavam fugir ao controle, como se evidenciou na tentativa de abertura de um processo contra o deputado Márcio Moreira Alves, proposta pelo governo militar e recusada pela maioria no Congresso Nacional. (REIS FILHO, 2004REIS FILHO, D.A. Ditadura e sociedade: as reconstruções da memória. In: REIS FILHO, D.A.; RIDENTI, M.; MOTTA, R. P. S. (org.) O golpe e a ditadura militar: 40 anos depois (1964-2004). Bauru: EDUSC, 2004., p. 41).

Entre os desdobramentos imediatos do AI-5, estão as cassações de mandatos eletivos e a suspensão de direitos políticos que têm início logo no dia 30 de dezembro. Em 1978, em estudo pioneiro, o cientista político Marcus Figueiredo analisou as chamadas “punições políticas”: cassação de mandatos, suspensão de direitos políticos, aposentadoria compulsória, reforma, demissão, destituição. Com o objetivo de entender a dinâmica da repressão ao sistema político ao longo da Ditadura, Figueiredo realizou um primeiro levantamento quantitativo. No período de abril de 1964 até março de 1974, ocorreram 540 cassações de mandatos eletivos e suspensão de direitos políticos de 1.040 pessoas (FIGUEIREDO, 1978FIGUEIREDO, M. A Política de Coação no Brasil Pós-64. In: KLEIN, L.; FIGUEIREDO, M. Legitimidade e coação no Brasil pós-64. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1978., p. 156).

No caso das cassações de mandatos políticos eletivos, Figueiredo identificou três ciclos políticos punitivos: 1964-1965, 1966-1967 e 1968-1971. No terceiro ciclo, a novidade é o afastamento da vida política e pública de oposições formadas pela própria dinâmica do processo político pós-64, tendo essas lideranças participado ou não da “revolução”. Para Figueiredo, as punições consistiam em atos de repressão e de “efeito-demonstração da prática de punir”, no terceiro ciclo “cria-se uma situação dramática para as oposições, [...] diante da amplitude do escopo da coerção [...] ninguém mais tem segurança do que pode ser feito” (FIGUEIREDO, 1978FIGUEIREDO, M. A Política de Coação no Brasil Pós-64. In: KLEIN, L.; FIGUEIREDO, M. Legitimidade e coação no Brasil pós-64. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1978., p. 150).

Nessa pesquisa, ao investigar apenas os membros do Congresso Nacional, percebi que o período de dezembro de 1968 até setembro de 1969 se destaca como uma conjuntura específica. Do AI-5 até setembro de 1969, foram cassados 105 parlamentares, o Executivo voltou a cassar deputados federais, posteriormente, apenas no governo Geisel, em 1974 e em 1976. Nunca mais naquelas proporções. A concentração das cassações após o AI-5, enquanto o Congresso esteve fechado, indica o auge das tensões entre militares e políticos, da Arena e do MDB.

Em 1979, o cientista político Gláucio Soares avançou no tema específico das punições de parlamentares ao identificar uma “política das cassações”, padrões definidos e explicações coerentes para um número relativamente grande de cassações (SOARES, 1979SOARES, G.A.D. As políticas de cassações. Dados, Rio de Janeiro, n. 21, 1979. p. 69-85., p. 69-85). Nos anos 1970, Soares procurou compreender as determinações das cassações, se as informações e as decisões eram centralizadas, regionais ou estaduais; se as cassações se deviam a iniciativas dos parlamentares no Legislativo ou fora dele, “como tentativas de mobilização da classe trabalhadora, incitação à greve, participação em sindicatos, entidades estudantis, etc” (SOARES, 1979, p. 77). Soares também considerou a hipótese das cassações:

como resultado de uma apreciação global das atividades dos parlamentares, dentro e fora do parlamento, antes e depois do mandato, dos prós e dos contras, à semelhança da maneira pela qual o Serviço Nacional de Informações organiza, segundo se afirma, as informações a respeito de todos nós. (SOARES, 1979SOARES, G.A.D. As políticas de cassações. Dados, Rio de Janeiro, n. 21, 1979. p. 69-85., p. 77).

Para Figueiredo, a principal motivação para as cassações após o AI-5 foi a participação na Frente Ampla, por significar “um retorno ao estilo político ‘populista’, antielitista e antimilitarista, atuando dentro e fora do Congresso, e trazia de volta a influência de líderes punidos na condução da política nacional” (FIGUEIREDO, 1978FIGUEIREDO, M. A Política de Coação no Brasil Pós-64. In: KLEIN, L.; FIGUEIREDO, M. Legitimidade e coação no Brasil pós-64. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1978., p. 185). Com certeza, o engajamento na Frente Ampla aparece como uma variável de peso. No entanto, o que isso significava pode ser discutido. No caso dos parlamentares da Arena, não podem ser considerados “populistas”, antielitistas ou antimilitaristas. Eram “revolucionários de 1964”. A pesquisa no Fundo CSN, confirma as duas explicações no sentido de uma política repressiva às oposições, especialmente aos parlamentares que se engajaram na Frente Ampla e votaram contra o governo com frequência em temas relativos a direitos políticos, concentração de poderes no Executivo e perda de autonomia do Legislativo devido às sucessivas intervenções dos militares no campo político. A partir dos processos sumários, é possível voltar ao tema da “política das cassações” e investigar a especificidade da reação militar às iniciativas de parlamentares da Arena face às divergências com Executivo.

Os procedimentos

Com o AI-5 em vigor e o Congresso Nacional fechado, políticos e jornalistas permaneceram em compasso de espera. Nas palavras de Carlos Castello Branco, prestigiado jornalista político, não havia nada a fazer (CASTELLO BRANCO, 1969CASTELLO BRANCO, C. Coluna do Castello. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 11 nov. 1969. http://www.carloscastellobranco.com.br/sec_coluna_view.php?id=6957
http://www.carloscastellobranco.com.br/s...
). No ministério da Justiça e na Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional, por outro lado, houve muito trabalho. De dezembro de 1968 a outubro de 1969, foram examinadas centenas de dossiês de políticos, magistrados, militares, sindicalistas, estudantes e professores, tendo em vista a cassação de mandatos eletivos, suspensão de direitos políticos e aposentadorias compulsórias.

Em 20 de dezembro de 1968, o Executivo instituiu normas relativas às punições políticas. De acordo com o Ato Complementar n. 39, a representação solicitando a suspensão de direitos políticos e cassação de mandatos eletivos era competência do ministro da Justiça. Ministros e autoridades com estatuto de ministros, como os chefes dos gabinetes Militar e Civil, assim como o chefe do SNI, encaminhariam as recomendações ao ministro da Justiça. Nos Estados e Municípios, governadores e prefeitos poderiam solicitar punições de indivíduos em atividade nos seus respectivos territórios. Não estava prevista a solicitação de punições por membros do Legislativo, nem do Judiciário, apenas autoridades do Poder Executivo. Os procedimentos indicam um certo sentido e uma cadeia de comando hierárquica para a consecução das punições.

A partir do AI-10, de 16 de maio de 1969, as representações do ministro da Justiça deveriam ser encaminhadas por meio do secretário-geral do Conselho de Segurança Nacional. Os dois cargos eram estratégicos. Durante todo o período analisado, o ministro da Justiça e o secretário-geral do Conselho de Segurança Nacional foram os mesmos, o jurista Luiz Antônio da Gama e Silva e o general Jayme Portella de Mello, respectivamente. No início das cassações, o SNI era chefiado pelo general Emílio G. Médici e, a partir de abril de 1969, pelo general Carlos Alberto da Fontoura.

Na documentação conservada no Fundo CSN, é possível observar práticas e discursos dos envolvidos nas cassações, há indícios do processo decisório, do monitoramento das atividades dos parlamentares e da produção de dossiês. Como os processos são formados por documentos juntados ao longo de seu andamento, é possível acompanhar as sucessivas autoridades que participaram das cassações de mandatos e de suspensões de direitos políticos.

A partir das representações ao ministro da Justiça, o secretário-geral do Conselho de Segurança Nacional supervisionava a elaboração da documentação e encaminhava os processos ao presidente da República, para apreciação das punições sugeridas. De 30 dezembro de 1968 até 30 de setembro de 1969, o Conselho de Segurança Nacional se reuniu em sete ocasiões para promover cassações. No final de dezembro de 1968 e, em 1969, em janeiro, fevereiro, março, abril e duas vezes em setembro (BR_DF_AN_BSB N8.0.ATA). Em 6 de outubro de 1969, o ministro da Justiça ainda remeteu ofício aos ministros militares, então respondendo pela Presidência da República, com uma extensa lista de nomes tendo em vista a aplicação das sanções previstas no AI-5.

Em reuniões do Conselho de Segurança Nacional, apenas os nomes aprovados pelo general-presidente eram levados para exame: “o Senhor Ministro da Justiça terá algumas surpresas, porque alguns dos nomes por ele indicados não apareceram, uma vez que, o Presidente da República entendeu de excluí-los da relação” (BR_DF_AN_BSB N8.0.ATA.5.44), afirmou o próprio Costa e Silva, de acordo com a transcrição. Nas atas não foram registradas discussões significativas sobre as cassações, há poucas intervenções sobre o tema. Em suas memórias, o general Portella de Mello destaca o sigilo em torno das representações e da preparação da documentação na época e mantém a discrição sobre os políticos indicados para serem punidos com base no AI-5, mesmo 10 anos depois (MELLO, 1979MELLO, J.P. A Revolução e o Governo Costa e Silva. Rio de Janeiro: Guavira, 1979.). Ao se referir aos processos que não foram levados ao CSN, menciona apenas que o presidente teria recomendado aprofundarem as investigações, como se não houvesse divergências sobre os parlamentares que deveriam ser cassados.

Em alguns processos, encontramos registros da origem das indicações do ministro da Justiça: ofícios e avisos de ministros militares encaminhando nomes de deputados federais e de senadores. De acordo com a documentação consultada, o ministro da Justiça recebeu solicitações dos três ministros das Forças Armadas, do chefe do SNI, do presidente da Comissão Geral de Inquérito Policial Militar e do Secretário-Geral do Conselho de Segurança Nacional. No âmbito das Forças Armadas, a maior parte das solicitações foram encaminhadas pelo ministro do Exército.

No Exército, a documentação encontrada sugere que as iniciativas relativas às cassações foram centralizadas na figura do comandante do I Exército, general Syseno Sarmento. O comandante do I Exército expediu ofícios de dezembro de 1968 a setembro de 1969, com sugestões de nomes de autoridades de todas as regiões do país, e não só da área do I Exército. Inicialmente, os ofícios foram endereçados ao ministro do Exército; a partir de fevereiro, à Comissão de Investigação Sumária do Exército (CISEx). Conhecida como a “CGI do exército” era destinada à investigação de crimes de corrupção e irregularidades administrativas cometidos por militares, mas também denunciou civis (KNACK, 2019KNACK, D. Ditadura e corrupção: a Comissão Geral de Investigações e o confisco de bens de acusados de enriquecimento ilícito no Brasil 1968-1978. Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019.; MOTTA, 2014MOTTA, R.P.S. As universidades e a ditadura militar. Rio de Janeiro: Zahar, 2014.).

Os membros da CISEx eram nomeados pelo ministro do Exército, general Aurélio de Lira Tavares. Entre 1968 e 1969, a comissão teve duas formações. Inicialmente, foi composta pelos generais José Canavarro Pereira (presidente), então comandante do II Exército, Sílvio Frota e Francisco Estelliano Bastos de Aguiar (relatores). Posteriormente, Bastos de Aguiar foi substituído pelo general Celso de Azevedo Daltro Santos e Sílvio Frota assumiu a presidência. Na CISEx, eram formados processos sumários, o colegiado decidia a partir de um relatório e encaminhava o processo ao ministro do Exército, conforme a hierarquia militar. Com a aprovação do ministro do Exército, os processos eram enviados ao gabinete do ministro da Justiça. As reuniões da CISEx, de acordo com a documentação, eram realizadas na Sala dos Generais do Ministério do Exército (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_1014, p. 154).

Cerca de duas semanas após o AI-5, em 31 de dezembro de 1968, o general Syseno Sarmento enviou ao ministro do Exército o Ofício n. 30/Plan D, Cmt I Ex - 31 Dez 68, como consta no processo de Krieger:

1. Este Comando, considerando a importância da aplicação imediata do Art. 9 do Ato Institucional no 5, de 13 Dez 68, referida a elementos do Congresso Nacional notoriamente contrários à causa revolucionária, apresenta a V Exa as relações anexas, nas quais constam os primeiros nomes de congressistas cujos mandatos propõe sejam cassados e seus direitos políticos suspensos por 10 (dez) anos. (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0071).

No ponto seguinte, prometia mais: “2. Completando a presente relação, seguirão outras cujos estudos este Comando ainda realiza”. Nos processos individuais não constam reproduções das listas enviadas em anexo, mas pelo número de dossiês contendo o ofício de 31 de dezembro, essa primeira relação de nomes pode ter sido também a mais extensa.

Em 6 de janeiro de 1969, o general enviou pelo menos mais dois ofícios relativos à “Aplicação do AI-5” relativos a “pessoas (diversas)” (Ofício n. 16 / Plan D, Comt I Ex - 6 Jan 69. BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0993) e deputados federais (Ofício n. 5/Plan D, Comt I Ex - 6 Jan 69. BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0232, p. 65). Em poucos dias e no mês de fevereiro foram enviados ofícios com novas listas. Em 26 de junho de 1969, o ministro da Justiça enviou ofício ao presidente da República com uma lista elaborada pelo chefe do SNI (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_1272, pp.15-17). Não era o padrão, mas também há solicitações de cassações redigidas em cartas manuscritas, como a do comandante do II Exército, general José Canavarro, sugerindo a punição do deputado Arnaldo Cerdeira (Arena - SP) (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0047, p. 99).

Nem todos os processos contêm ofícios registrando a origem da indicação para a punição, também não encontrei indícios da maneira como as listas eram elaboradas. O que se destaca é que os principais generais à frente da dinâmica das cassações são identificados como “radicais” ou “linha-dura” em memórias de militares contemporâneos (D´ARAÚJO, CASTRO, 1997D´ARAÚJO, M. C.; CASTRO, C. (org.) Ernesto Geisel. Rio de Janeiro: FGV , 1997. , p. 203 e 208-9). Os generais Jayme Portella de Mello, Syseno Sarmento e Sílvio Frota eram homens de confiança do presidente Costa e Silva, (D´ARAÚJO, CASTRO, SOARES, 1995D´ARAÚJO, M.C.; CASTRO, C.; SOARES, G. (org.) A volta aos quartéis: a memória militar sobre a abertura. Rio de Janeiro: FGV , 1995., p. 94) pertenciam ao chamado “Grupo dos Onze” (GASPARI, 2003GASPARI, E. A ditadura derrotada. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. , p. 284). De acordo com as memórias do general Gustavo Moraes Rego: “Todos serviam no Rio ou São Paulo. Portella ainda coronel chefe do gabinete do ministro em Brasília, fazia as ligações com o Congresso a favor da candidatura Costa e Silva” (D´ARAÚJO, CASTRO, SOARES, 1995D´ARAÚJO, M.C.; CASTRO, C.; SOARES, G. (org.) A volta aos quartéis: a memória militar sobre a abertura. Rio de Janeiro: FGV , 1995., p. 57). A partir de 1964, ocuparam cargos estratégicos e participaram ativamente da política. O general Syseno Sarmento era lembrado tanto pela preeminência na área de segurança (D´ARAÚJO; CASTRO; SOARES, 1994D´ARAÚJO, M.C.; CASTRO, C.; SOARES, G. (org.) Os anos de chumbo: a memória militar sobre a repressão. Rio de Janeiro: FGV , 1994., p. 204), como candidato à sucessão de Costa e Silva (p. 266). O ministro do Exército, general Aurélio de Lyra Tavares, por sua vez, mesmo não sendo considerado um “linha dura” (CHIRIO, 2012CHIRIO, M. A política nos quartéis. Rio de Janeiro: FGV, 2012., p. 100), participou dessa dinâmica, aprovou e encaminhou todos os ofícios e processos sumários da CISEx atualmente no Fundo CSN.

A historiografia sobre as crises político-militares reconhece na edição do AI-5 a existência de um consenso relativo à aposta em uma nova fase de militarização (MARTINS FILHO, 1993MARTINS FILHO, J.R. O palácio e a caserna: a dinâmica militar das crises políticas na ditadura (1964-1969). Tese (Doutorado em História) - Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Campinas, 1993.) e a instauração definitiva de um “regime de generais” (CHIRIO, 2012CHIRIO, M. A política nos quartéis. Rio de Janeiro: FGV, 2012., p. 94). A investigação sobre a repressão aos parlamentares contribui com um novo aspecto da problemática, nem todas as propostas radicais foram ouvidas. No Fundo CSN, no levantamento realizado até agora, foram encontrados processos sumários de 92 parlamentares da Arena, apenas 33 arenistas foram cassados. A diferença entre o número de minutas de atos punitivos e o de cassações realizadas mostra que a Presidência da República limitou o ímpeto punitivo de comandantes do Exército, que era aprovado inclusive pelo ministro. Quer dizer, houve restrições à aplicação do AI-5 no campo das direitas, o que mostra a escolha política deliberada por preservar a Arena.

A criminalização de iniciativas parlamentares

A partir de 1964, o governo incrementou políticas de segurança e informação sob a coordenação do SNI. A preparação de relatórios para a presidência da República e autoridades do primeiro escalão, o levantamento de dados biográficos, a elaboração de um perfil ideológico e das atividades políticas desenvolvidas pelo indivíduo sob investigação, era uma das atividades regulares. Muitas pesquisas mostram que o SNI estava à frente de “um sistema leviano de inculpação de pessoas, orientado pela suspeição generalizada, já que partia da pressuposição de que todos podiam ser culpados de subversão ou de corrupção” (FICO, 2003FICO, C. Espionagem, polícia política, censura e propaganda: os pilares básicos da repressão. In: FEREIRA, J.; DELGADO, L.A.N. (org.). O Brasil republicano. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. v. 4, p.167-205., p. 179-180). Os parlamentares da Arena também foram alvo dessas práticas.

Para justificar a punição de parlamentares, os militares recorreram às informações produzidas, de maneira sistemática, por diferentes órgãos da administração pública, principalmente pelo SNI. Em menor número, há documentos produzidos pelos serviços de informação dos ministérios militares (CIE, CISA, Cenimar), ministério da Justiça, Polícia Federal, secretarias de Segurança Pública, DOPS, assessorias parlamentares e Justiça Eleitoral. Na Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional, eram formados os processos e elaboradas as minutas das “exposições de motivos”. Apesar de identificados como processos, cabe sempre ressaltar que não são processos judiciais, mas processos sumários, não eram constituídos advogados, nem havia qualquer possibilidade de defesa. Era vetada qualquer participação do Judiciário nas decisões e nas investigações. De fato, a documentação reunida se assemelha a dossiês, preparados com o sentido de incriminar, perseguir e justificar punições arbitrárias (TEIXEIRENSE, 2017TEIXEIRENSE, P. I. Reinventando o inimigo: história, política e memória na montagem dos dossiês e contra-dossiês da ditadura militar brasileira (1964-2001). Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.).

Os processos sumários eram identificados como “Documentação organizada com vistas à aplicação do artigo 4º do ato institucional n. 5”, que autorizava o Executivo cassar mandatos eletivos e suspender direitos políticos. Como historiadores e cientistas sociais vêm mostrando, documentos produzidos pelo Estado constituem fontes primárias ricas para conhecer os envolvidos em dinâmicas repressivas, suas visões de mundo e práticas institucionais (JOFFILY, 2013JOFFILY, M. No centro da engrenagem: os interrogatórios na Operação Bandeirante e no DOI de São Paulo (1969-1975). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional; São Paulo: Edusp, 2013. ). No caso, os agentes de Estado empenhados no monitoramento do cenário político institucional tendo em vista políticas de intervenção no campo político e os parlamentares da em atividade no Congresso Nacional.

Em geral, os processos sumários dos parlamentares seguiam um padrão: 1) “Ficha individual”; 2) “Exposição de Motivos”; 3) “Informações do SNI e de outros órgãos” e 4) “Anexos”, formados por cópias reprográficas de documentos recolhidos por vários órgãos, identificados pelos respectivos carimbos. Na “Ficha individual” era construído um perfil biográfico, em tópicos, com destaque para a trajetória política, muitas vezes baseada em prontuários do SNI. No caso dos parlamentares da Arena, há poucas referências à vida privada, quando havia tinham o sentido de desqualificar o indivíduo do ponto de vista de uma moral conservadora com insinuações em relação a costumes. Com o intuito de reforçar a suspeição, também eram incluídos registros de processos judiciais por crimes comuns e de inquéritos policiais-militares (IPMs) instaurados na conjuntura do golpe de 1964.

No início das exposições de motivos e dos prontuários era comum a adjetivação com palavras de ordem, não havia propriamente uma argumentação, mas a defesa da punição por meio de uma linguagem de combate. Para efeitos de retórica, o padrão das acusações era agregar as bandeiras mobilizadoras do golpe de 1964, os parlamentares eram denunciados por atos de “corrupção”, “subversão” e “antirrevolucionários”.

Apesar do julgamento sumário de supostos corruptos ser considerado um dos pilares da repressão (FICO, 2004FICO, C. Versões e controvérsias sobre 1964 e a ditadura militar. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 24, n. 47, p. 29-60, 2004.), na maior parte dos processos arquivados no Fundo CSN, não há documentação coletada de maneira sistemática com o objetivo de comprovar denúncias de corrupção, as acusações de enriquecimento ilícito eram atribuições da CGI (KNACK, 2019KNACK, D. Ditadura e corrupção: a Comissão Geral de Investigações e o confisco de bens de acusados de enriquecimento ilícito no Brasil 1968-1978. Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019.). No entanto, havia muitas acusações de corrupção e, com frequência, os parlamentares eram qualificados nos prontuários como corruptos ou “corrupto e corruptor”, uma adjetivação com forte conotação moral. Nessa conjuntura, nenhum deputado federal foi cassado apenas por corrupção, o que sugere o sentido político das acusações de corrupção com o objetivo de atingir a honra dos parlamentares.

Por mais estranho que pareça, os arenistas também foram acusados de “subversão”. No caso, eram caracterizadas como subversão a participação no governo João Goulart, na Frente Parlamentar Nacionalista e articulações com sindicatos de trabalhadores e iniciativas de oposição à Ditadura, mesmo se ocorressem por meio de canais institucionais. Na exposição de motivos do suplente de deputado Bezerra Leite (Arena-PE), egresso do PTB, a cassação era justificada:

em face das atividades subversivas desenvolvidas pelo indiciado, através de pronunciamentos públicos e pela imprensa, participação em atos de entidades comunistas e incitamento a greves e subversão, além de atos de corrupção desenfreada levada a termo em órgãos governamentais, durante o governo deposto pela Revolução.

Durante o governo JOÃO GOULART, foi uma das expressões máximas do “peleguismo” no Nordeste, dominando por vários anos o IAPI, que transformou em um verdadeiro antro de subversão e corrupção.

Oportunista e político sem escrúpulos, aderiu à Revolução e ingressou na ARENA, apenas para ver-se a salvo das medidas saneadoras da Revolução de Março que, até à presente data, inexplicavelmente, ainda não o atingiram. (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0083).

O nome do ex-governador Aluízio Alves (Arena-RN), egresso da UDN, por sua vez, era indicado:

em face das características de corrupção que marcaram seu Governo e das atividades subversivas desenvolvidas pelo indiciado, através de pronunciamentos, lançamento de manifestos, entrevistas, agitações de rua, bem como de articulações e reuniões conspiratórias. (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0018).

Também foram considerados subversivos os encontros com lideranças políticas cassadas (no país ou no exílio) e com parlamentares do MDB, tendo em vista as articulações pela Frente Ampla. É o caso das acusações ao deputado José Carlos Guerra (Arena-PE), egresso da UDN:

Assumiu posição antirrevolucionária desde abril de 1964 tendo posteriormente ocupado posição de destaque no movimento ilegal e de natureza subversiva denominado ‘Frente Ampla’, tendo inclusive atacado as Forças Armadas da Tribuna da Câmara dos Deputados e participado da intensa e sistemática campanha de agressão e provocação à autoridade constituída pregando a mudança do regime, a desobediência às leis, o antagonismo entre as Forças Armadas e as classes civis, a luta pela violência entre as classes sociais.

Após o ato legal que extinguiu o citado movimento espúrio, prosseguiu em suas atividades antirrevolucionárias não somente através de pronunciamentos públicos como, particularmente, através de reuniões e atividades conspiratórias. (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0071, p. 8).

O deputado federal Oliveira Brito (Arena-BA), egresso do PSD, ministro da Educação e depois de Minas e Energia no governo João Goulart, então na Arena, foi acusado:

em face das características de corrupção e das atividades subversivas desenvolvidas pelo indiciado, através de pronunciamentos, apoio a agitações de toda ordem, ligações com elementos cassados e comunistas atuantes, pregando o fechamento do Congresso, a dissolução do regime e a implantação de uma República Sindicalista.

Embora pertencente ao Partido do Governo, esteve sempre ligado aos corruptos e subversivos da situação anterior à 31 de março, e têm-se mantido coerente com o seu passado de corrupto, corruptor, oportunista e agitador.

Usando de posições de mando e Chefia como instrumento de corrupção e agitações, o indiciado, político formado sob os velhos hábitos de ausência absoluta de moral no trato dos bens públicos, jamais poderá se coadunar com os ideais revolucionários constituindo-se ao contrário, forte obstáculo à consecução destes. (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0034).

Arena e MDB eram partidos muito recentes. Entre os parlamentares não havia consenso sobre o funcionamento de apenas dois partidos, uma limitação imposta por força do Ato Institucional n. 2 (AI-2) e do Ato Complementar n. 4 (AC-4), de 1965. Muitos políticos se engajaram na Frente Ampla, considerada ilegal em abril de 1968, entre eles, vários egressos da UDN e do PSD que apoiaram o golpe e depois se filiaram à Arena. As articulações entre filiados à Arena, ao MDB e cassados sem filiação partidária mostra os interesses em comum dos políticos profissionais, a capacidade de negociar e de construir alianças entre si. Na perspectiva dos militares era inadmissível. Nos processos, os militares procuravam desqualificar a filiação na Arena desses parlamentares que divergiam do Executivo, eram considerados “adesistas”, “oportunistas”, acusados de agir por interesses eleitorais ou “para não ficar afastado da vida pública do país” (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_012 _004).

A maior parte dos arenistas visados foi acusada de praticar atos “antirrevolucionários” e “antimilitaristas”, considerados como “traição” ou “indisciplina partidária”. Após a forte adjetivação nas exposições de motivos e nos prontuários, as trajetórias dos parlamentares eram apresentadas com informações que articulavam, de maneira coerente, aspectos da conjuntura política nacional e a atuação dos políticos. Nos perfis biográficos ou em informações sobre eventos específicos sob vigilância, os relatórios registram as ações dos indivíduos no contexto de suas organizações e rede de sociabilidades. Com o objetivo de criminalizar os parlamentares, predominam os registros de iniciativas em que os arenistas divergiram do governo, em declarações à imprensa, reuniões, discursos e votações no Congresso Nacional. De fato, há uma série de divergências em comum, culminando com a votação da licença para processar Márcio Moreira Alves, registrada em quase todos os processos.

De 1964 a 1968, com muitas limitações, o Congresso continuava funcionando. Nos processos, encontramos o acompanhamento das atividades institucionais: transcrições de discursos, registros de envio de emendas e declarações de votos. Os relatórios, informes e informações mostram o acompanhamento das iniciativas políticas dos parlamentares, indicam familiaridade com os procedimentos legislativos e a pesquisa nas publicações oficiais, como os Anais da Câmara dos Deputados. Os comentários se dedicam às matérias relevantes para o governo no Legislativo, muitos em linguagem comum a análises políticas. Em menor quantidade, há relatos obtidos por informantes sobre encontros de parlamentares em gabinetes funcionais, residências e hotéis.

No SNI, o objetivo de acompanhar a atuação dos parlamentares levou à elaboração de fichas específicas para a sistematização das iniciativas de deputados e senadores. No processo do deputado Gilberto Azevedo (Arena-PA), encontra-se a ficha: “Resumo dos principais pronunciamentos do _____ no Congresso Nacional” (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0713_d0001de0001). A lacuna era preenchida não só com o nome, mas com uma identificação completa do representante: cargo, partido e Estado.

No processo do deputado Britto Velho (Arena-RS), há uma ficha específica para a análise de candidaturas, os principais campos: nome, candidato a, partido, atividade, função ou cargo que ocupa; atividade, funções ou cargos que ocupou; partido (s) a que pertenceu; capacidade de liderança; grau de penetração no meio (estudantil, sindical, população em geral); bases eleitorais (rural, urbana, suburbana); ligações (grupos econômicos, grupos culturais; outros); grau de integração na revolução (apegado às tradições, apoia o governo porque cumpre o programa de seu partido, está disposto a apoiá-lo dentro de um programa mínimo de reivindicações legislativas, apoia o governo de forma incondicional, oportunista), pertenceu ou pertence a organizações, ligas e movimentos para políticos e grupos de pressão em geral (Líder, CAMDE, etc); inteligência; caráter; responde ou respondeu a processo; conceito; outros dados. O último campo “informantes”, foi preenchido com a indicação dos órgãos TRE/RS e APA/SNI (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0335, p. 68). A ficha mostra a preocupação em monitorar não só os candidatos do MDB, mas os membros da base governista, indicando o interesse em preservar aliados e monitorar a “integração na revolução”.

Com o sentido de construir uma trajetória condenável, foram reunidas principalmente informações sobre iniciativas que contestavam o Executivo. No processo de Flores Soares (Arena-RS), consta a transcrição de requerimento de informações sobre IPMs:

1. Quantos inquéritos policiais militares (IPM) foram instaurados durante a vigência do Governo Revolucionário? 2. Quantos desses processos chegaram ao termo final e quantos ainda estão tramitando? 3. Os nomes e a identificação e domicílio de todos os acusados? 4. Se existe algum acusado sob prisão. E no caso afirmativo nomes e locais? 5. Quantos e quais desses IPMs foram encaminhados à Justiça? [...]-6 - Quantos IPM já foram julgados pela Justiça? E quantos e quais os condenados e quais as penas. 7 - Por que o Governo não tem dado publicidade desses processos e das suas conclusões? como satisfação opinião pública? Sala das Sessões, 8 de março de 1967. (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_012 _004, p. 86).

No processo de José Carlos Guerra (Arena-PE), encontra-se a cópia de publicação da Câmara dos Deputados com o requerimento de informações n. 3.947, de 1968, “Solicita ao Poder Executivo, através do Ministério do Exército, informações sobre prontidão militar”:

1) Quais as razões que recomendaram a prontidão militar realizada pelo I e II Exércitos, nos dias 27, 28 e 29 de janeiro? 2) Se os objetivos da prontidão foram satisfatoriamente atingidos? 3) Quanto representaram as despesas para a realização dessa prontidão? 4) A conta de que dotações orçamentárias? (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0071, p. 48).

No Gabinete Civil, na Subchefia de Assuntos Parlamentares, conforme esperado, os funcionários acompanhavam as articulações no Congresso, mantinham o presidente e seus ministros a par das negociações no Legislativo, elaboravam cenários e consolidavam os resultados de votações chave. Entre os eventos registrados com frequência estão os debates e as votações relativos às emendas ao anteprojeto de constituição enviado ao Congresso pelo Executivo em dezembro de 1966. O senador Filinto Muller havia orientado a bancada da Arena a não votar em emendas do MDB (GRINBERG, 2009GRINBERG, L. Partido político ou bode expiatório: um estudo sobre a Aliança Renovadora Nacional (Arena), 1965-1979. Rio de Janeiro: Mauad X; FAPERJ, 2009.).

Em divergência com o Executivo, vários arenistas apoiaram o projeto de emenda apresentado pelo MDB para o restabelecimento do eleições diretas para presidente e vice-presidente da República.4 4 Cf. Fundo CSN: Teófilo Ribeiro Pires, Flores Soares, Atlas Cantanhede, Jorge Curi, José Carlos Guerra, Brito Velho, Yukishigue Tamura, Harry Normaton, Edilson Melo Távora, Francelino Pereira, Francisco Accioly, Juvencio Dias, Osni Régis, Raimundo Bogéa, Teófilo Ribeiro Pires, Wilson Falcão. No processo de Marcos Kertzman (Arena-SP) consta o registro de que era “defensor ardoroso das eleições diretas [...], chegando até a colher assinaturas para projeto de emenda constitucional”, em janeiro de 1967 (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0217). No final do ano, em novembro, a Subchefia de Assuntos Parlamentares preparou o documento: “Projeto de Emenda à Constituição n. 4. Relação dos senhores deputados da Arena que votaram pelas eleições diretas” (BR_DFANBSB_N8_0_PSN_EST_0101).

No processo de Roberto Cardoso Alves (Arena-SP), egresso do Partido Democrata Cristão (PDC), o deputado era acusado de “atividades subversivas [...] através de pronunciamentos, além de visíveis tomadas de posições e votações contra-revolucionárias”. Nas transcrições de discursos, críticas às relações de subordinação ao Executivo: “o parlamento votou, bem ou mal, em pé ou de joelhos, uma Constituição” (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0281), entre outras. Cardoso Alves não estava sozinho. Em janeiro de 1967, arenistas assinaram uma nota crítica ao anteprojeto, amplamente divulgada na imprensa.5 5 Jornal do Brasil, 21 jan 1967, p. 3. Nos dossiês de vários parlamentares consta o registro: “signatário da ‘declaração de voto’ de 106 deputados da Arena, repudiando o texto da carga magna” (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0126).

Em 1968, os parlamentares discutiram várias iniciativas relativas à intervenção no sistema político e ao exercício de direitos políticos. Em abril, o decreto relativo ao fim da autonomia de Municípios e instituições de áreas de interesse de segurança nacional provocou reação de parlamentares do MDB e da Arena. Na exposição de motivos para punir Cunha Bueno (Arena-SP), egresso do PSD, o deputado foi acusado por “pronunciamentos e articulações que o caracterizam como opositor sistemático do Governo”, entre os quais:

Em 1968

Protestou na Câmara contra o projeto governamental que considerou 68 municípios como de interesse para a segurança Nacional;

Colheu assinaturas para a formação de uma CPI destinada a investigar os atentados terroristas ocorridos em S. Paulo, admitiu que tais atos poderiam ser de iniciativa de grupos radicais, vinculados ao Governo, principalmente os da “linha dura”;

Manifestou-se contrário ao ato do Governo confinando o senhor Jânio Quadros. (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0042).

No processo de Paulo Freire de Araújo (Arena-MG), egresso do PTB, acusado por apresentar “proposições de reivindicações em causa própria e antirrevolucionárias e pela caracterizada indisciplina partidária” (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0263):

23 Mai 68

• Dará voto contrário ao projeto de cassação dos municípios. E para que não haja dúvida alguma, para que ninguém me peça que vote contra ou que saia do plenário, quero reafirmar que estarei aqui. Fique ou saia a bancada da ARENA, aqui permanecerei e farei questão de que meu voto seja consignado.

• Jamais daria um voto, com a consciência democrática que tenho, a um projeto discriminatório, que trate brasileiros de modo diferente. Não acredito que só militares amem o Brasil. (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0263).

Em 1968, o movimento estudantil organizou grandes manifestações em repúdio à Ditadura e à violência policial. Em abril, após a morte do estudante Edson Luiz no Rio de Janeiro, houve mobilizações significativas em várias cidades. No Congresso Nacional, os parlamentares travaram debates sobre as manifestações e as prisões de estudantes. Em maio, o deputado federal Paulo Macarini (MDB-SC) apresentou projeto de lei tendo em vista conceder anistia aos estudantes e trabalhadores envolvidos nos acontecimentos que se sucederam à morte de Edson Luiz.

Na ficha de Yukishigue Tamura, elaborada pelo Cenimar, anotaram:

Pertenceu ao ex-PSD,

SET/59 - Apoiava iniciativas do governo JK,

MAI/61 - Foi um dos signatários do ‘Manifesto de Ação Democrática’ (bloco formado para se opor às manobras comunistas, de alguns parlamentares ditos nacionalistas).

AGO/68 - Defendeu o projeto de anistia aos estudantes e trabalhadores envolvidos nos acontecimentos posteriores a morte de EDSON LUIZ, declarando “quem não sabe perdoar, dificilmente saberá governar”. (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0316_0003).

No processo do Secretário Geral da Arena, João Roma (Arena-PE), registraram:

• Em declarações à imprensa, garantiu que o projeto de anistia seria derrubado em plenário, e acrescentou: “Baderneiro não vai ter anistia. Continuamos fiéis aos ideais da Revolução e ao Governo do Presidente COSTA E SILVA”.

• Embora fazendo parte da Comissão de [Constituição e] Justiça, deixou de votar na discussão do projeto de anistia, retirando-se da sala momentos antes. (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0156, p. 18).

Em julho, o projeto de emenda constitucional instituindo o parlamentarismo apresentado pelo deputado Brito Velho (Arena-RS), egresso do Partido Libertador (PL), teve o apoio de, pelo menos, 19 arenistas como anotado em seus processos.6 6 Cf. Fundo CSN: Flores Soares, Israel Dias Novaes, José Carlos Guerra, Osmar Cunha, Roberto Cardoso Alves, Yukishigue Tamura, Machado Rollemberg, Alde Feijó Sampaio, Arruda Câmara, Antonio Guedes, Arnaldo Nogueira, Feu Rosa, José Monteiro de Castro, José Monteiro de Castro, Juvencio Dias, Rubem Nogueira, Rachid Saldanha Derzi, Tabosa de Almeida, Erivan França. Em fevereiro, o deputado Raimundo Bogéa (Arena-MA), egresso do PSD, apresentou emenda convocando uma Assembleia Nacional Constituinte, restabelecendo o pluripartidarismo e a anistia geral dos cassados. Em outubro, começou a coletar assinaturas e questionava:

Que espécie de democracia é esta em que um dos Poderes da República vai sobreviver e funcionar por consentimento e tolerância do Presidente da República, para quem se recorre contra ameaças de grupos interessados na desordem e no golpismo?. (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_1612).

Naquela conjuntura, o governo saiu vitorioso em todas as votações no Congresso Nacional, as iniciativas parlamentares de conceder anistia geral, convocar constituinte e instituir o parlamentarismo são praticamente desconhecidas. A maioria dos parlamentares da Arena que divergiram do governo não se identificavam como oposição, nem como “antirrevolucionários”, como denunciavam os militares interessados em atingi-los. Não havia interesse em deixar de ser governo, os arenistas apenas discutiam as sucessivas restrições aos direitos políticos.

Afinal, a única derrota significativa do governo no Congresso foi na votação da licença para processar Márcio Moreira Alves. Em agosto, a Universidade de Brasília (UnB) foi invadida, muitos estudantes foram presos e agredidos. No dia seguinte à invasão, parlamentares do MDB, e alguns nomes da Arena, denunciaram as violências cometidas, uma faísca nas sensíveis relações entre políticos e militares (PITTS, 2014PITTS, B. “O sangue da mocidade está correndo”: a classe política e seus filhos enfrentam os militares em 1968. Revista Brasileira de História, v. 34, n. 67, p. 39-65, 2014). O discurso em que Moreira Alves denunciou as Forças Armadas como “valhacouto de torturadores”, ocorreu nesse contexto de discussão sobre a repressão aos estudantes. Nos meses seguintes, houve muitas manifestações públicas sobre a fala de Moreira Alves, o princípio da inviolabilidade parlamentar e a intenção do Poder Executivo de punir o deputado.

No perfil biográfico de quase todos os parlamentares da Arena visados, estão os registros de declarações e votos sobre o tema. Nos dossiês, há reproduções dos debates parlamentares e de notícias publicadas na grande imprensa, os assessores parlamentares e os agentes de informação se dedicaram ao acompanhamento da repercussão do episódio, das posições de cada deputado federal e das articulações no Congresso.

Nas exposições de motivos, o empenho nas articulações para a votação foi arrolado em vários casos. No processo do deputado Britto Velho (Arena-RS), consta a cópia de uma convocação assinada de próprio punho aos seus correligionários:

Prezado companheiro da Arena:

Rejeitando o pedido de licença para o processo que visa à cassação do mandato do Deputado Márcio Moreira Alves estará defendendo a principal prerrogativa do parlamentar que é a sua inviolabilidade na tribuna da Câmara.

Não se trata de problema de natureza partidária, mas de questão que diz respeito à própria sobrevivência da instituição legislativa.

O ciclo das cassações deve encerrar-se, definitivamente, para que o Congresso possa preservar-se perante a Nação, com a autoridade e a firmeza que o povo saberá reconhecer e aplaudir.

Britto Velho (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0335, p. 108-109).

A reprodução da folha de papel com a nota acima consta do Encaminhamento n. 214/16 dez 1968, do DOPS. De acordo com o documento, a convocação foi encontrada no apartamento do deputado Maurílio Ferreira Lima (MDB-PE) no Hotel Nacional, não há registro sobre como conseguiram o material. Na Informação n. 2957/68/S-102-CIE, foi registrado o apoio do então ministro do Exterior, ex-governador de Minas Gerais pela UDN, uma das lideranças políticas nacionais de peso que apoiaram o golpe: “MAGALHÃES PINTO mandou dizer ao Deputado MARCIO MOREIRA ALVES que poderia contar com 22 votos da bancada da Arena de Minas Gerais” (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_1088, p. 31).

No dossiê de Flores Soares (Arena-RS), registraram: “No episódio MÁRCIO ALVES, não só votou contra o Governo, como também estimulou outros deputados a assim procederem” (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_012 _004, p. 6). No dossiê do monsenhor Arruda Câmara (Arena-PE), acentuaram a posição de comando no Diretório Estadual:

Teve destacada atuação no Congresso contra a orientação do partido governamental no caso da cassação do ex-deputado MÁRCIO MOREIRA ALVES. Por várias vezes se pronunciou contra a licença e influiu, decisivamente, no seio da bancada arenista para que essa tomasse posição contrária aos interêsses do Govêrno Revolucionário. A sua atuação é mais grave quando se sabe ser Presidente do Diretório Estadual da ARENA, em Pernambuco. (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0072, p. 12).

Em 10 de dezembro, a Subchefia de Assuntos Parlamentares do Gabinete Civil elaborou relatório para a Presidência da República com os resultados da votação na CCJ: a maioria dos membros da comissão aprovou a licença para processar Moreira Alves; o presidente da CCJ, Djalma Marinho, renunciou ao cargo em solidariedade aos deputados afastados anteriormente. Em 1968, Brasília era muito recente e o Hotel Nacional era o mais importante da nova capital, apesar da derrota na CCJ vários parlamentares se reuniram na mesma noite para homenagear Djalma Marinho. Nos dossiês encontramos informes e informações da Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional, do DOPS-DF e do CIE sobre o assunto.

Em 12 de dezembro, dia da votação, a Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional preparou o Informe Especial n. 96/SG-1/68 com informações de um oficial da própria Secretaria Geral, presente em uma recepção no Clube do Congresso na véspera (BR DF AN BSB N8 0 PSN EST 0101). Após a votação, os agentes documentaram a repercussão da derrota do governo, a cobertura jornalística e as comemorações. Em 14 de dezembro, dois dias após a votação, no dia seguinte à edição do AI-5, a assessoria parlamentar enviou um balanço do resultado: “Atitude da Arena na votação do pedido de licença para processar o deputado Márcio Moreira Alves”. Como a votação foi secreta, a assessoria consolidou as manifestações públicas de arenistas e as informações obtidas pelo líder da Arena na Câmara dos Deputados, deputado Geraldo Freire (Arena-MG):

CONCLUSÃO

1.Bancadas na Câmara

ARENA - 282

MDB - 127

409

2. Comparecimento à Votação

ARENA - 247

MDB - 122 (exclusive MÁRCIO)

TOTAL 369

3. Resultado da Votação

3.1 Favorável à concessão 141

3.2 Contra a concessão 216

3.3 Em branco 12

3.4 TOTAL 369

4. Votação do Diretório da ARENA

4-.1 Favoráveis à concessão:

- ARNALDO PRIETO

- TEODULO DE ALBUQUERQUE

4-.2 Contra a concessão:

- todos os demais, inclusive o Dep. JOÃO ROMA, Secretário-Geral do Partido do Governo.

5. Votação Nominal do Colégio de Vice-Líderes

5.1 Favoráveis à concessão:

- GERALDO FREIRE

- CANTIDIO SAMPAIO

- FLAVIO MARCILIO

- AURINO VALOIS

- HAROLDO LEON PERES

- AMÉRICO DE SOUZA

- LUIZ GARCIA

- ALVES MACEDO

- RUY SANTOS

5.2 Contra a concessão:

- GILBERTO AZEVEDO

- FLAVIANO RIBEIRO

- ULTIMO DE CARVALHO

5.3 Ausentes:

- EUCLIDES TRICHES

- ANIZ BADRA

6. Atuações Destacadas da ARENA

6.1 Favoráveis à concessão:

- GERALDO MESQUITA - AC

- JOSÉ LINDOSO - AM

- ARMANDO CORRÊA - PA

- AMÉRICO DE SOUZA - MA

- FLAVIO MARCILIO - CE

- HEITOR DIAS - BA

- RAIMUNDO DE BRITO - BA

- RUY SANTOS - BA

- CARLOS QUINTELA - RJ

- RAIMUNDO PADILHA - RJ

- ELIAS CARMO - MG

- GERALDO FREIRE - MG

- ARNALDO CERDEIRA - SP

- BROCA FILHO - SP

- CANTIDIO SAMPAIO - SP

- BENEDITO FERREIRA - GO

- ALIPIO CARVALHO - PR

- CLOVIS STENZEL - RS

- ARY ALCÂNTARA - RS

- NUNES LEAL - RO

6.2. Contra a concessão:

- MONTENEGRO DUARTE - PA

- RAIMUNDO BOGEA - MA

- EDILSON MELO TAVORA - CE

- DJALMA MARINHO - RN

- PEDRO GONDIM - PB

- JOÃO ROMA - PE

- GERALDO GUEDES - PE

- ARRUDA CÂMARA - PE

- JOSÉ CARLOS GUERRA - PE

- JOSÉ PENEDO - BA

- LUIZ ATHAIDE - BA

- RUBEM NOGUEIRA - BA

- RAFAEL DE ALMEIDA MAGALHÃES - GB

- FRANCELINO PEREIRA - MG

- GUILHERME MACHADO - MG

- MURILO BADARO - MG

- MARCOS KERTZMANN - SP

- CUNHA BUENO - SP

- GARCIA NETO - MT

- OSNI REGIS - SC

- BRITO VELHO - RS

- FLORES SOARES - RS

9. OBSERVAÇÕES

Impressões colhidas junto aos deputados RAIMUNDO PADILHA, GERALDO FREIRE e outros, após a votação, resultam nas seguintes observações:

- Não houve a mínima cobertura do Diretório Nacional da ARENA ao Líder GERALDO FREIRE.

- As atitudes do Senador DANIEL KRIEGER e do Deputado JOÃO ROMA constituíram-se em fator decisivo para o resultado negativo da votação.

- A posição contrária do Presidente e do Secretário-Geral da ARENA fragmentou a bancada, totalmente.

- Os interesses estaduais e de grupos políticos regionais prevaleceram sobre os interesses do conjunto do Partido”. (BR DF AN BSB N8 0 PSN EST 0101, p. 554).

Nas folhas seguintes, foram anexados documentos com a discriminação de votos de deputados federais da Arena contrários às diretrizes do governo em seis votações, quase todas relacionadas ao exercício de direitos políticos e à concentração de poderes no Executivo. Há registros elaborados pela assessoria parlamentar e cópias de listas de presença da Câmara dos Deputados relativos às seguintes matérias: a) projeto de emenda constitucional por eleições diretas (22 nov 1967); b) recurso interposto pelo deputado Mário Covas (MDB) relativo sobre a votação de emendas constitucionais (22 nov 1967); c) Decreto-Lei n. 348 relativo à organização do Conselho de Segurança Nacional, conhecido por tornar a Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional uma espécie de “superministério” (GASPARI, 2002GASPARI, E. A ditadura escancarada. São Paulo: Companhia das Letras , 2002., p. 82-84); d) projeto de emenda constitucional que suprime Inciso I do Artigo 60 da Constituição de 1967 (21 mai 1968), relativo à competência para legislar em matéria financeira; e) projeto CN de aumento do funcionalismo (votação 28 nov 1967); f) pedido de licença para processar Márcio Moreira Alves.

Os relatórios sobre a votação da licença são os mais detalhados. Há dois quadros datilografados com os nomes dos deputados federais da Arena por Estado e os respectivos votos ou “votação provável”. De acordo com o levantamento dos processos de arenistas no Fundo CSN, os parlamentares que articularam contra a concessão da licença para cassar Moreira Alves e a maioria dos que votaram, tiveram seus nomes indicados para a cassação e/ou suspensão de direitos políticos. Entre os arenistas cujas atuações contrárias à votação foram consideradas destacadas no relatório citado, não encontrei processos de apenas dois deputados. Os principais membros da Comissão Executiva do Diretório Nacional da Arena foram indicados para a cassação e suspensão de direitos políticos: o presidente, senador Krieger, e o secretário-geral, deputado federal João Roma. Também foram preparados dossiês e minutas para a punição de parlamentares que ocupavam posições estratégicas na Câmara dos Deputados e agiram contra a orientação do governo na CCJ, como o deputado Djalma Marinho.

É notório que o senador Krieger tentou negociar uma solução de compromisso com a Presidência da República e não foi bem-sucedido, a documentação tendo em vista a sua cassação traz registros das tensões inerentes ao arranjo institucional então vigente, uma Ditadura Militar com Legislativo e partidos políticos em atividade. Como todos os dossiês, reúne documentos de origens variadas, como o extrato de prontuário elaborado pelo SNI e uma ficha arquivada no processo da CISEx. O extrato de prontuário apresenta a trajetória política do senador a partir dos registros coletados pelo SNI de 1964 a 1968, uma cronologia de manifestações públicas, no Congresso e na grande imprensa. Traz resumos e transcrições com as respectivas anotações da origem das informações, um volume de 87 folhas.

Desde o golpe, Krieger sempre apoiou o governo. Em 1967, defendeu a aprovação de decreto-lei no Senado concedendo crédito especial para o SNI, condenou a participação de arenistas na Frente Ampla, afirmou que o governo não permitiria eleições diretas para presidente da República, nem concessão de anistia aos políticos cassados. Em 1968, passou a considerar a Frente Ampla um “movimento subversivo”, negou boatos sobre o fechamento do Congresso e propostas de “endurecimento político”, defendeu o projeto de transformação de 68 Municípios em área de segurança nacional e condenou o projeto de anistia a estudantes envolvidos em manifestações. Na imprensa, circulavam informações de que não considerava os votos dos arenistas favoráveis à emenda por eleições diretas como indisciplina e entendia que o parlamentarismo poderia ser uma “solução” para a crise política. No entanto, no final de maio de 1968, chegou a renunciar à presidência da Arena, argumentando que era crescente a dificuldade de articulação da própria bancada governista devido às imposições do Executivo. Para Krieger, o Executivo precisava governar com o partido, no mínimo incluir parlamentares da Arena na discussão prévia de projetos de lei, conforme proposta de conciliação com o general Costa e Silva (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0071).

Muito diferente era a ficha de Krieger no processo sumário da CISEx. Como em todos os processos de parlamentares originários da CISEx, as fichas eram carimbadas: “República do Brasil. I Exército. EM. 2ª Seção”. Os textos trazem apenas acusações, curtas e diretas. No caso do senador, apenas três parágrafos:

Não há uma voz discordante entre os militares sôbre a atuação dêste Senador, presidente do Partido do Govêrno, líder do Govêrno no Senado e que, na hora mais decisiva e importante, da batalha do processo de MARCIO MOREIRA ALVES, desertou, viajando para o Rio Grande do Sul. Com esta sua atitude, deu provas de traição ao partido, deslealdade ao amigo, omissão do Chefe.

Figura em tôdas as listas de cassações como elemento de traição ao Govêrno e que, verdadeiramente, deu a “luz verde” para os 91 traidores da ARENA no recente episódio de MARCIO MOREIRA ALVES.

Não merece nem deve mais presidir partido algum, nem ser líder, pois, seu conceito hoje, entre os militares é o de um traidor, amigo desleal e de um homem sem caráter e político desmoralizado. (BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0071).

Eram denúncias eminentemente políticas, o mote principal era a atuação no caso Márcio Moreira Alves, os militares não aceitavam o resultado da votação e pretendiam interferir, mais uma vez, em quem poderia atuar na política institucional. A documentação também mostra que as pretensões de intervenção não eram recentes, a carta sugerindo a cassação do senador, conforme transcrição na abertura do presente artigo, é de janeiro de 1968, bem anterior à crise relacionada com a invasão à Unb.

Nos argumentos para fundamentar as cassações de arenistas se destacam as divergências com o governo especialmente sobre a configuração política imposta paulatinamente a partir do Golpe de 1964. Não há condenação da política partidária, ao contrário, há reconhecimento do significado das trajetórias em partidos políticos, da atuação no Congresso Nacional, da participação em governos, instituições e movimentos políticos considerados adversários da “revolução de 1964”. Os processos indicam que as divergências eram registradas ao longo do tempo e foram usadas como argumentos para punir. No entanto, a comparação entre as trajetórias dos parlamentares cassados e dos visados, mas não atingidos, indica que, apesar de muitos votarem contra a licença para cassar Márcio Moreira Alves, o que parece ter pesado foram as participações no governo João Goulart e na Frente Ampla.

Considerações finais

Entre as ditaduras instauradas em países do Cone Sul nas décadas de 1960 a 1980, o caso brasileiro se destaca pela manutenção das instituições de representação política. Com a intervenção dos militares no campo político, os partidos e o Legislativo perdem autonomia e sucessivas prerrogativas legais, mas continuam em atividade. Na historiografia, essa configuração é interpretada como uma “fachada democrática” (MAUD, 2012; RIDENTI, 2014RIDENTI, M. As oposições à ditadura: resistências e integração. In: MOTTA, R. P. S .; REIS, D, A.; RIDENTI, M . (org.). A ditadura que mudou o Brasil: 50 anos do golpe de 1964. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2014. p. 30-47.), uma metáfora que nem sempre deixa claro a relevância da manutenção do Congresso e dos partidos. Entendo, como o sociólogo Marcelo Ridenti, em artigo sobre as oposições à ditadura, que o funcionamento do Congresso e dos partidos era uma das bases de legitimidade do regime. O que significa que havia reconhecimento das oposições e que houve “negociação, ou ao menos concessões aos adversários, sem as quais não se constrói uma base de legitimidade” (RIDENTI, 2014RIDENTI, M. As oposições à ditadura: resistências e integração. In: MOTTA, R. P. S .; REIS, D, A.; RIDENTI, M . (org.). A ditadura que mudou o Brasil: 50 anos do golpe de 1964. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2014. p. 30-47., p. 30). Nesse artigo, procurei avançar na pesquisa sobre a configuração do regime, especificamente na problemática das relações entre militares e políticos da base governista. No caso dos arenistas, procuro mostrar que também havia reconhecimento, os militares buscaram uma solução de compromisso. As iniciativas de criminalização de parlamentares por meio da produção de dossiês e a intenção de atingir um número muito expressivo de membros do Congresso indicam que as instituições de representação política, apesar de marginalizadas dos processos decisórios, não eram apenas uma aparência externa sem relações significativas com o que acontecia na política brasileira.

Em 1968, as reações de militares na presidência da República e no comando das Forças Armadas às iniciativas de parlamentares da Arena no Congresso mostram que consideravam significativo o que ocorria no Legislativo. O Congresso era visto como uma instituição que proporcionava legitimidade pelos próprios militares ou não seria considerado adequado para os rituais institucionais do regime, como a eleição indireta do presidente da República. Apesar dos atos institucionais editados de 1964 a 1968, o Executivo enviou projetos de lei sobre assuntos variados para o Legislativo, buscando governar com a sua participação. Com o AI-5 e o recesso do Congresso por tempo indeterminado, estava aberta a possibilidade de maior intervenção na configuração do sistema político. No entanto, o número limitado de cassações e a reabertura do Congresso reafirmaram a decisão de manter aquele sistema híbrido (KINZO, 1988KINZO, M.D.G. Oposição e autoritarismo: gênese e trajetória do MDB. São Paulo: IDESP/Vértice, 1988.), sendo a casa reaberta justamente para referendar a posse do general Médici na Presidência da República.

A experiência histórica da Arena ressalta que não se pode pensar nos partidos fora das configurações sociais e políticas em que trabalham. Inclusive, a articulação de alianças com suas rotinas e incertezas, de como e quando as alianças se desfazem e em que conjunturas se sai de sistemas competitivos (OFFERLÉ, 1987OFFERLÉ, M. Les parties politiques. Paris: PUF, 1987. ). Em 1968, houve uma disputa pelos rumos da “revolução”, aliados desde 1964, militares no governo e um conjunto de parlamentares da Arena divergiram sobre a configuração do regime. Do ponto de vista da direção da Arena e de muitos parlamentares, o caso Márcio Moreira Alves era um caso exemplar, o auge das divergências de arenistas em relação às perdas de suas prerrogativas de políticos profissionais. A documentação reunida nos dossiês mostra que o problema-chave para os arenistas que divergiram do Executivo era a continuidade da intervenção no campo político, com sucessivas medidas distintas sempre no sentido de avançar sobre a autoridade dos políticos. O que os militares acusaram como “traição”, “desobediência” e “indisciplina partidária” por parte de arenistas era a busca pela afirmação da autonomia do partido e do Legislativo, fundamentos do poder dos políticos profissionais. Nesse embate, os parlamentares da Arena exploraram justamente as práticas do modo tradicional de fazer política: reuniões entre pares, pronunciamentos e votos no Congresso, elaboração de notas, busca por articulações com lideranças do MDB e participação em movimentos como a Frente Ampla, entrevistas na grande imprensa.

Com a derrota do governo no Congresso, houve uma reação militar propondo dezenas de cassações na Arena. O grande número de arenistas visados corrobora os argumentos de que, entre as motivações para a elaboração do AI-5 estavam o interesse na retomada da “operação limpeza”, a reação às tentativas de rearticulação autônoma do campo político e a preocupação com as dissidências nas direitas. Na Presidência, Costa e Silva selecionou as propostas organizadas na Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional, sob a chefia do general Jayme Portella de Mello, a partir de indicações principalmente do comandante do I Exército, general Syseno Sarmento. A maioria dos parlamentares da Arena não teve seus mandatos cassados, nem direitos políticos suspensos. Apenas 33 deputados foram punidos, senadores e governadores não foram atingidos, os nomes mais importantes foram preservados, a maioria não se afastou da Arena.

A análise dos processos sumários de parlamentares da Arena permite observar a complexidade das decisões sobre a manutenção do Congresso e das relações com os parlamentares da base governista. Há registros das tensões geradas pelas iniciativas eminentemente políticas dos parlamentares, da intolerância dos militares com as dissidências e o recurso à repressão, próprio de ditaduras. Na Arena, houve manifestações públicas das divergências, assim como tentativas de negociação entre parlamentares, a presidência do Diretório Nacional e os militares. Nas Forças Armadas, foram observadas as lógicas da corporação, as indicações para as punições políticas seguiram trâmites de acordo com a hierarquia. Afinal, as decisões foram tomadas apenas entre militares na alta hierarquia do Exército, no palácio e na caserna. Para combater os parlamentares, recorreram à violência das punições políticas, arbitrárias, sem direito à defesa, impedindo a rearticulação do campo político.

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NOTAS

  • Declaração de financiamento: A pesquisa que resultou nesse artigo contou com financiamento do Programa de Iniciação Científica/UNIRIO e da FAPERJ/Processo E-26/010.001736/2019.
  • 1
    Decreto s/n de 30 de dezembro de 1968, Diário Oficial da União - Seção 1Atos do Comando Supremo da Revolução. Ato n. 1. Diário Oficial da União, Seção 1, 10 abr, 1964. - 30/12/1968, p. 11267. Decreto s/n de 16 de janeiro de 1969, Cassação dos mandatos eletivos federais de parlamentares. Diário Oficial da União - Seção 1Atos do Comando Supremo da Revolução. Ato n. 2. Diário Oficial da União, Seção 1, 10 abr, 1964. - 17/1/1969, p. 554. Decreto s/n de 16 de janeiro de 1969, Cassação dos mandatos eletivos e suspensão dos direitos políticos de parlamentares. Diário Oficial da União - Seção 1Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Boletim Eleitoral, Brasília, Jul - 1969. http://bibliotecadigital.tse.jus.br/xmlui/bitstream/handle/bdtse/2249/1969_boletim_eleitoral_a18_n216.pdf?sequence=1&isAllowed=y
    http://bibliotecadigital.tse.jus.br/xmlu...
    - 17/1/1969, p. 554. Decreto s/n de 7 de fevereiro de 1969, Diário Oficial da União - Seção 1 - 10/2/1969, p.1331. Decreto s/n de 13 de março de 1969, Diário Oficial da União - Seção 1 - 14/3/1969, p. 2212. Decreto s/n de 29 de abril de 1969, Diário Oficial da União - Seção 1 - 30/4/1969, p. 3661. Decreto s/n de 11 de setembro de 1969, Diário Oficial da União - Seção 1 - 12/9/1969, p.7733. Decreto s/n de 30 de setembro de 1969, Diário Oficial da União - Seção 1 - 1/10/1969, p. 8272. Cf. https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao
  • 2
    Nesse artigo vou examinar apenas os casos de arenistas com mandatos federais, as pretensões de cassação nos níveis estaduais e locais extrapolam o escopo pretendido. Mas com certeza ainda resta compreender os usos do AI-5 nos Estados e Municípios.
  • 3
    As datas as exposições de motivos assinadas coincidem com a publicação dos respectivos decretos no Diário Oficial.
  • 4
    Cf. Fundo CSN: Teófilo Ribeiro Pires, Flores Soares, Atlas Cantanhede, Jorge Curi, José Carlos Guerra, Brito Velho, Yukishigue Tamura, Harry Normaton, Edilson Melo Távora, Francelino Pereira, Francisco Accioly, Juvencio Dias, Osni Régis, Raimundo Bogéa, Teófilo Ribeiro Pires, Wilson Falcão.
  • 5
    Jornal do Brasil, 21 jan 1967, p. 3.
  • 6
    Cf. Fundo CSN: Flores Soares, Israel Dias Novaes, José Carlos Guerra, Osmar Cunha, Roberto Cardoso Alves, Yukishigue Tamura, Machado Rollemberg, Alde Feijó Sampaio, Arruda Câmara, Antonio Guedes, Arnaldo Nogueira, Feu Rosa, José Monteiro de Castro, José Monteiro de Castro, Juvencio Dias, Rubem Nogueira, Rachid Saldanha Derzi, Tabosa de Almeida, Erivan França.

Anexo I.

Trajetória dos deputados federais da Arena cassados (1968-1969).

Estado Nome Trajetória Alagoas Aloísio Nôno Deputado Federal (UDN, PTB) Oséas Cardoso Deputado Estadual (PSD, PTN) Deputado Federal (UDN) Ação Democrática Parlamentar (ADP) Deputado Federal mais votado em Alagoas (Arena) Jornalista Bahia Oliveira Brito Deputado Estadual (PSD) Prefeito Juiz de Direito na Bahia Secretário de Segurança Pública (gov. Octávio Mangabeira) Ministro da Educação e Cultura (gov. João Goulart, 1961) Ministro das Minas e Energia (gov. João Goulart, 1963) Secretário de Minas e Energia do Estado da Bahia (gov. Luiz Vianna Filho, 1967) Advogado Goiás Jayme Câmara (suplente) Secretário de Agricultura e de Viação e Obras Públicas Prefeito de Goiânia (PSD, 1959) Jornalista Minas Gerais Paulo Freire D´Araujo Deputado Federal (PTB) Pastor Metodista Professor Antônio Luciano (suplente) Deputado Federal (PSD) Médico Marcial do Lago (suplente em exercício) Auxiliar de Gabinete governo JK (PSD) Presidente da Fundação Casa Popular (MG) Funcionário IAPETC Contador Pará Gilberto Azevedo (suplente em exercício) Deputado Federal (PTB, 1962) Oficial de Gabinete do Presidente do Conselho de Ministros, Tancredo Neves Vice-líder da Arena Membro da Comissão de Constituição e Justiça (1968) Camilo Silva Montenegro Duarte Advogado Epílogo de Campos (suplente) Deputado Federal (1945, 1950, UDN) Suplente Senador (1962, UDN) Professor UFPA Médico Paraíba Pedro Gondim Deputado Estadual (1947, PSD) Vice-Governador (1955, PSD) Governador (1960, PDC) Consultor Jurídico do Estado da Paraíba Advogado Antonio Vital do Rego Deputado Federal (UDN) Advogado Paraná Jorge Curi Deputado Federal (UDN) Pernambuco José Carlos Guerra Deputado Federal (UDN) Membro da Comissão de Constituição e Justiça (1968) Advogado Mouri Fernandes Deputado Estadual (Frente Popular Democrática) (PSD, UDN) Secretário de Estado de Educação (gov. Paulo Guerra) Procurador do INPS Advogado Ney Maranhão Prefeito (PL, 1951, Moreno-PE) Deputado Federal (1954, 1958, 1962) Souto Maior Deputado Federal (PTB) Frente Parlamentar Nacionalista Movimento Popular Autonomista Ministro da Saúde (gov. João Goulart) Bezerra Leite (suplente) Delegado Regional do Trabalho (PE) Delegado do IAPI/PE, nomeado por João Goulart Deputado Estadual (PTB) Deputado Federal (PTB, 1958, 1962) Engenheiro químico, jornalista Rio Grande do Norte Aluízio Alves Deputado Federal (1945, 1950, 1954, 1958 UDN) Governador Deputado Federal (Arena) Erivan França (suplente) Deputado Estadual (1962, PDC) Chefe da Casa Civil (Governo Aluízio Alves) Rio Grande do Sul Flores Soares Deputado Federal (UDN) Presidente UDN-RS Deputado Estadual (1951) Presidente da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul (1951) 1955 - Secretário da Fazenda do Governo do Rio Grande do Sul (1955-1957) Ministro do Tribunal de Contas (1958) Diretor do Banco do Brasil (1961-1962) Professor PUC-RS Advogado Roraima Atlas Cantanhede Pecuarista e aviador civil Santa Catarina Osmar Cunha Deputado Federal (PSD) Membro da Comissão de Segurança Nacional (Câmara dos Deputados) Osmar Dutra Deputado Federal (UDN) Frente Parlamentar Nacionalista São Paulo Arnaldo Cerdeira Deputado Federal (PSP) Secretário de Agricultura do Estado de São Paulo Roberto Cardoso Alves Deputado Estadual (PDC) Advogado Procurador do Estado de São Paulo Celso Fortes Amaral Deputado Federal (1962, PTB) Cunha Bueno Deputado Federal (PSD) Procurador do Estado de São Paulo Harry Normaton Vereador (1952, 1956, Jundiaí-SP) Deputado Federal (1958, coligação PSB-PTN), (1962, coligação PTN-MTR), (PSP) Israel Novaes Deputado Federal Deputado Estadual (UDN) Jornalista Marcos Kertzmann Deputado Federal Vereador da Cidade de São Paulo (MTR) Advogado Yukishigue Tamura Deputado Federal (PSD) Membro da Comissão de Constituição e Justiça (Câmara dos Deputados) Sergipe Machado Rollemberg Secretário da Fazenda do governo Luiz Garcia (UDN, 1959-1963) Deputado Federal (1962, coligação UDN-PTB-PST) Engenheiro Fontes: Diário Oficial da União; Dicionário Histórico Bio-Bibliográfico Brasileiro, atualmente disponível no endereço: http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/arquivo.

Editado por

Editores:

Karina Anhezini e André Figueiredo Rodrigues

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    03 Ago 2021
  • Aceito
    11 Nov 2021
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