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Indicações da vacina contra o papilomavirus humano

Indications for human papillomavirus vaccination

Resumos

Estima-se que 20% da população adulta esteja contaminada pelo Papilomavírus humano (HPV) e que anualmente surjam 500 mil novos casos de câncer da cérvix uterina, 70% deles em países em desenvolvimento, além de inúmeros casos de carcinoma anal, quase todos relacionados ao vírus em questão. Esses dados indicam a necessidade de reforçar a prevenção desses tumores e suas lesões precursoras, e as vacinas oferecem essa oportunidade. Dispomos de produtos que imunizam contra os tipos virais 16 e 18, mais freqüentes nos carcinomas, e 6 e 11, relacionados às verrugas anogenitais. Estão indicados em mulheres dos 11 aos 25 anos de idade desde que não tenham contato prévio com a infecção viral. Conferem imunidade superior à da imunização naturalmente adquirida, embora o tempo de duração dessa imunidade não está bem estabelecido. Por enquanto, não é indicada para homens. A vacinação não afasta a necessidade dos exames periódicos para rastreamento do câncer anogenital.

Infecções pelo Papilomavírus; Neoplasia intra-epitelial; prevenção e controle; Papilomavirus, vacina; Carcinoma de células escamosas


Many studies estimate that 20% of people are infected by human papillomavirus (HPV) worldwide, and 500.000 new cases of cervical carcinoma appear yearly, 70% in developing countries, almost all associated to this virus, as so several cases of anal carcinoma. These data indicate the necessity of reinforced screening for anogenital carcinomas and their precursors, and vaccines offer this opportunity. Nowadays, there is vaccination against viral types 16/18, the most associated to neoplasia, and 6/11 that provoke condylomas. Vaccines are indicated to women among 11 and 25 years old since they did not have previous contact with HPV. Vaccines induce immunization superior to that naturally acquired, although, its duration period is not well established. They are not yet indicated to males. Vaccination does not exclude necessity for periodical screening tests for anogenital cancer.

Papillomavirus infections; Intra-epithelial neoplasia; prevention and control; Papillomavirus, vaccine; Carcinoma, squamous cell


DOENÇAS SEXUALMENTE TRANSMISSÍVEIS

Indicações da vacina contra o papilomavirus humano

Indications for human papillomavirus vaccination

Luis Roberto Manzione NadalI; Sidney Roberto NadalII

IAcadêmico da Liga de Coloproctologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

IISupervisor de Equipe Técnica de Proctologia do Instituto de Infectologia Emílio Ribas

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: SIDNEY ROBERTO NADAL Rua Dr. Virgilio de Carvalho Pinto, 381 — Apto. 23 São Paulo (SP) — Brasil — CEP 05415-030 Tel./Fax (+55 11) 3337-4282 E-mail: srnadal@terra.com.br

RESUMO

Estima-se que 20% da população adulta esteja contaminada pelo Papilomavírus humano (HPV) e que anualmente surjam 500 mil novos casos de câncer da cérvix uterina, 70% deles em países em desenvolvimento, além de inúmeros casos de carcinoma anal, quase todos relacionados ao vírus em questão. Esses dados indicam a necessidade de reforçar a prevenção desses tumores e suas lesões precursoras, e as vacinas oferecem essa oportunidade. Dispomos de produtos que imunizam contra os tipos virais 16 e 18, mais freqüentes nos carcinomas, e 6 e 11, relacionados às verrugas anogenitais. Estão indicados em mulheres dos 11 aos 25 anos de idade desde que não tenham contato prévio com a infecção viral. Conferem imunidade superior à da imunização naturalmente adquirida, embora o tempo de duração dessa imunidade não está bem estabelecido. Por enquanto, não é indicada para homens. A vacinação não afasta a necessidade dos exames periódicos para rastreamento do câncer anogenital.

Descritores: Infecções pelo Papilomavírus. Neoplasia intra-epitelial; prevenção e controle. Papilomavirus, vacina. Carcinoma de células escamosas.

ABSTRACT

Many studies estimate that 20% of people are infected by human papillomavirus (HPV) worldwide, and 500.000 new cases of cervical carcinoma appear yearly, 70% in developing countries, almost all associated to this virus, as so several cases of anal carcinoma. These data indicate the necessity of reinforced screening for anogenital carcinomas and their precursors, and vaccines offer this opportunity. Nowadays, there is vaccination against viral types 16/18, the most associated to neoplasia, and 6/11 that provoke condylomas. Vaccines are indicated to women among 11 and 25 years old since they did not have previous contact with HPV. Vaccines induce immunization superior to that naturally acquired, although, its duration period is not well established. They are not yet indicated to males. Vaccination does not exclude necessity for periodical screening tests for anogenital cancer.

Key words: Papillomavirus infections. Intra-epithelial neoplasia; prevention and control. Papillomavirus, vaccine. Carcinoma, squamous cell.

As estimativas mundiais indicam que 20% dos indivíduos sadios estão contaminados com papilomavirus humano (HPV).1 A maior parte das infecções é assintomática2, e o principal ônus dessa infecção é o câncer cervical. Estima-se, ainda, que surjam 500.000 casos novos por ano, dos quais 70% ocorrem em países em desenvolvimento,1 e que está associado a 90% dos carcinomas espinocelulares (CEC) anais.3,4 Além disso, acredita-se que tenha provocado 260 mil mortes ao redor do mundo, em 2005,2 sendo a causa mais comum da letalidade por câncer em países em desenvolvimento.2,5 Também, imagina-se haver entre 10 a 20 lesões precursoras para cada um desses tumores, o que confirma haver contingente muito grande de indivíduos afetados pelo HPV.1 Essas condições fazem dessa infecção um problema de saúde pública mundial, tornando obrigatória a sua prevenção.

A contaminação só pode ser efetivamente evitada com abstinência sexual completa para todas as práticas sexuais, porque os preservativos não garantem proteção total e o HPV pode ser transmitido mesmo por atividades sexuais sem penetração.6 É relatado que os métodos atuais de prevenção, uso de preservativos e os métodos de rastreamento, venham diminuindo a incidência do câncer genital e que mais de 90% das lesões detectadas no colo uterino são removidas ao longo de dois anos.2

Entretanto, é necessário conter de forma na eficaz o alastramento da infecção pelo HPV e das suas seqüelas, incluindo as verrugas anogenitais e o câncer genital e seus precursores, e a imunização preventiva oferece essa oportunidade.7 As vacinas contra o HPV atualmente disponíveis cobrem os sorotipos 16 e 18 e, no caso da quadrivalente, também os 6 e 11.2,3,8 Esses tipos são responsáveis por 90% das verrugas, por 70% dos carcinomas e lesões pré-cancerosas de alto grau, e 35-50% das lesões anogenitais de baixo grau.9 São elaboradas a partir das cápsulas protéicas vazias produzidas por tecnologia recombinante, as partículas vírus-like (VLP), que não contêm DNA ou produtos biológicos, sendo por isso não-infectantes.2,3

Diretrizes publicadas recentemente pelo Center for Disease Control (CDC), de Atlanta, estabeleceram, como rotina, a vacina quadrivalente, atualmente a única aprovada pelo Food and Drugs Administration (FDA) americano.3 Ela não alterou o curso da doença pré-existente, mas protegeu o indivíduo das cepas as quais não foi exposto.10 Uma vez que a infecção é geralmente adquirida logo após o início da vida sexual, a vacina é recomendada para mulheres que ainda não iniciaram essa atividade.11 A idade sugerida para vacinação é aos 11 e 12 anos, podendo ter início a partir dos 9 anos. São aplicadas três doses intramusculares com intervalos de dois e seis meses após a primeira.3 Mulheres de 13 a 26 anos de idade que não tenham sido previamente vacinadas ou que não tenham recebido as três doses durante o período de um ano, quando tinham entre 11 e 12 anos, também podem ser imunizadas. Mulheres mais velhas que ainda não tenham experiências sexuais podem ser beneficiadas. Embora a duração da imunidade seja desconhecida, as vacinas foram efetivas na prevenção da infecção e das doenças induzidas pelos genótipos virais específicos nas mulheres sem passado ou evidência da infecção pelo vírus, durante pelo menos cinco anos.2,11 Por outro lado, apenas 50 a 60% das mulheres desenvolvem anticorpos contra o HPV naturalmente adquirido.2 Entretanto, estudos planejados pela indústria farmacêutica seguirão as mulheres vacinadas durante pelo menos 14 anos para avaliar a duração da imunização e determinar quando doses de reforço deverão ser feitas.3

Conforme os dados do estudo FUTURE II, a vacinação não modificou a história natural da infecção pelos HPVs pré-existentes, mas protegeu contra as cepas aos quais não havia exposição prévia.10 Essa observação ressaltou a necessidade da imunização antes do início da atividade sexual. Dessa forma, avaliando sobre a ótica dos sistemas de saúde pública das regiões mais pobres, a prioridade deve ser vacinar pré-adolescentes, embora a imunização das meninas mais velhas e das mulheres mereça atenção.10

Não há estudos conclusivos sobre a sua eficácia em maiores de 26 anos. Todavia, a vacina bivalente mostrou-se eficaz em mulheres com até 45 anos.12 Além disso, as diretrizes destacam a possibilidade da vacinação daquelas que estejam contaminadas pelo HPV, ou que já tenham tido um resultado anormal ou indefinido de exames citológicos ou histológicos. No entanto, deverão ser alertadas de que os dados dos estudos clínicos não indicaram efeito terapêutico sobre lesões cervicais, verrugas genitais ou infecção por HPV já existente.3 Por ser uma vacina não-infectante, a quadrivalente poder ser aplicada na vigência de imunossupressão fármaco-induzida, porém, a resposta imune e a eficácia vacinal serão menores.3 Sua aplicação em gestantes está contra-indicada pela possibilidade de alterações no desenvolvimento do feto.3 Exames de Papanicolaou ou para detecção do DNA viral ou de anticorpos contra o HPV não são necessários antes da vacinação em qualquer idade.3

Apesar de existir comprovação sobre a imunogenicidade e segurança da vacina em meninos entre 9 e 15 anos, não há ainda dados a respeito da eficácia em homens de qualquer idade, não sendo recomendada para indivíduos do sexo masculino.13 Entretanto, acredita-se que a mulher é contaminada pelos homens com lesões penianas e estima-se que a vacinação possa reduzir 10% das consultas das clínicas de doenças sexualmente transmissíveis (DST), o que justificaria sua indicação no sexo masculino.14 Também não foi testada nos portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV), de desnutrição, de malária intercorrente e de infecção por helmintos.2

A vacina, porém, tem outras restrições. Deve ser evitada na vigência de afecções febris, sendo postergada até a resolução do quadro.3 Há contra-indicação para indivíduos com antecedentes de hipersensibilidade ao levedo, uma vez que se comprovou risco mínimo de anafilaxia em pessoas com história de reação alérgica a Saccharomyces cerevisiae3 ou a qualquer outro componente do produto.3 Somado a isso, foi relatada síncope após vacinação, principalmente entre adolescentes e adultos jovens, sendo recomendada a observação durante 15 minutos após a aplicação3.

Ainda são necessários estudos que determinem a idade ideal para iniciar a vacinação, qual o tempo de imunização, a eficácia em homens e nos indivíduos já infectados pelo HPV e naqueles contaminados pelo HIV. É importante ressaltar que a vacinação não afasta a necessidade dos exames de rotina para rastreamento do câncer cervical.

Trabalho realizado pela Liga de Coloproctologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

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  • Endereço para correspondência:
    SIDNEY ROBERTO NADAL
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Maio 2008
    • Data do Fascículo
      Mar 2008
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