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Perfil imunoistoquímico das proteínas p53 e Ki67 em pacientes com retocolite ulcerativa inespecífica

Imunohistochemical profile of p53 and Ki67 from patients with unspecific ulcerative colitis

Resumos

Objetivos: O presente estudo avaliou, através da imunohistoquímica e estudo histopatológico, as principais alterações na mucosa intestinal de pacientes acometidos pela retocolite ulcerativa crônica idiopática (RCUI) apenas tratada clinicamente (n=30) ou subseqüentemente tratada com Proctocolectomia total e construção de bolsa ileal (n=30). Métodos: Desta forma, foram selecionados fragmentos de tecido intestinal submetidos à imunomarcação para as proteínas p53 e Ki67 e coloração por hematoxilina-eosina para análise histopatológica comparativa. Resultados: Os resultados obtidos indicam importantes diferenças no perfil inflamatório e presença de áreas de erosão/desgate da mucosa colônica de ambos os grupos estudados. Quanto a imunoexpressão, observou-se uma maior reatividade de padrão nuclear principalmente nos tecidos inflamados dos pacientes com RCUI tratados clinicamente. Conclusões: Estes resultados sugerem que, de acordo com o perfil histopatológico e imunohistoquímico, a mucosa colônica de pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico apresenta menos alterações que os pacientes tratados clinicamente. Assim, os dados sugerem que estes métodos podem auxiliar no diagnóstico e monitoramento de pacientes sob diferentes rotinas terapêuticas.

Retocolite ulcerativa; imunoistoquimica; p53; Ki63; perfil inflamatório


Objectives: The present study evaluated, trough immunohistochemistry and histopatologic analysis, the main alterations in intestinal mucous from patients with unspecific ulcerative colitis (IUC) clinically (n=30) or surgically treated (n=30) with ileal J-pouch and permanent ileostomy. Methods: Thus, tissue slices from intestinal mucous were submitted to imunostains for p53 and Ki67 proteins, and Haematoxilin-eosin staining for comparative histopathological evaluation. Results: The results indicated important differences in inflammatory profile and erosion/necrosis sites on the both investigated groups. Related to imunoexpression was observed a higher reactivity with nuclear pattern, mainly in inflammatory tissues from IUC patients clinically treated. Conclusions: Those results showed that, according to histopathological and imunohistochemical parameters, the colonic mucous from IUC patients submitted to surgical treatment exhibited less alterations than IUC patients clinically treated. The data suggest that those methods could be helpful to diagnosis and assist the accompaniment of patients under different therapeutic routines.

Ulcerative colitis; immunohistochemistry; p53; Ki63; inflammatory profile


ARTIGOS ORIGINAIS

Perfil imunoistoquímico das proteínas p53 e Ki67 em pacientes com retocolite ulcerativa inespecífica

Imunohistochemical profile of p53 and Ki67 from patients with unspecific ulcerative colitis

Marcos Cezar de Paula MachadoI; Mario Ribeiro Melo-JúniorI; Nicodemos Teles de Pontes-FilhoI,II; Consuelo Antunes Barreto LinsIII; Francisco Eduardo de Alburquerque LimaIV; Adriana Maria da Silva TellesI,II

ISetor de Patologia - Laboratório de Imunopatologia Keizo Asami (LIKA) - Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Brasil;

IIDepartamento de Patologia, Centro de Ciências da Saúde - UFPE;

IIIHospital Oswaldo Cruz - Universidade de Pernambuco, UPE, Brazil;

IVDepartamento de Cirurgia, Centro de Ciências da Saúde - UFPE.

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Mario Ribeiro de Melo-Junior Laboratório de Imunopatologia Keizo Asami, LIKA, Universidade Federal de Pernambuco, UFPE Av. Morais Rêgo s/n, Campus Universitário CEP 50670-910 E-mail: mariormj@gmail.com

RESUMO

Objetivos: O presente estudo avaliou, através da imunohistoquímica e estudo histopatológico, as principais alterações na mucosa intestinal de pacientes acometidos pela retocolite ulcerativa crônica idiopática (RCUI) apenas tratada clinicamente (n=30) ou subseqüentemente tratada com Proctocolectomia total e construção de bolsa ileal (n=30). Métodos: Desta forma, foram selecionados fragmentos de tecido intestinal submetidos à imunomarcação para as proteínas p53 e Ki67 e coloração por hematoxilina-eosina para análise histopatológica comparativa. Resultados: Os resultados obtidos indicam importantes diferenças no perfil inflamatório e presença de áreas de erosão/desgate da mucosa colônica de ambos os grupos estudados. Quanto a imunoexpressão, observou-se uma maior reatividade de padrão nuclear principalmente nos tecidos inflamados dos pacientes com RCUI tratados clinicamente. Conclusões: Estes resultados sugerem que, de acordo com o perfil histopatológico e imunohistoquímico, a mucosa colônica de pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico apresenta menos alterações que os pacientes tratados clinicamente. Assim, os dados sugerem que estes métodos podem auxiliar no diagnóstico e monitoramento de pacientes sob diferentes rotinas terapêuticas.

Descritores: Retocolite ulcerativa; imunoistoquimica; p53; Ki63; perfil inflamatório.

ABSTRACT

Objectives: The present study evaluated, trough immunohistochemistry and histopatologic analysis, the main alterations in intestinal mucous from patients with unspecific ulcerative colitis (IUC) clinically (n=30) or surgically treated (n=30) with ileal J-pouch and permanent ileostomy. Methods: Thus, tissue slices from intestinal mucous were submitted to imunostains for p53 and Ki67 proteins, and Haematoxilin-eosin staining for comparative histopathological evaluation. Results: The results indicated important differences in inflammatory profile and erosion/necrosis sites on the both investigated groups. Related to imunoexpression was observed a higher reactivity with nuclear pattern, mainly in inflammatory tissues from IUC patients clinically treated. Conclusions: Those results showed that, according to histopathological and imunohistochemical parameters, the colonic mucous from IUC patients submitted to surgical treatment exhibited less alterations than IUC patients clinically treated. The data suggest that those methods could be helpful to diagnosis and assist the accompaniment of patients under different therapeutic routines.

Key words: Ulcerative colitis; immunohistochemistry; p53; Ki63; inflammatory profile.

INTRODUÇÃO

Na sua conceituação mais ampla, as doenças inflamatórias intestinais correspondem a qualquer processo inflamatório envolvendo o trato gastrintestinal, seja ele agudo ou crônico, na sua maioria, são afecções de etiologia desconhecida e de grande importância em saúde pública, cujo tratamento envolve custos extremamente altos, incluindo aqueles relacionados à perda de produtividade1, 2.

A retocolite ulcerativa idiopática (RCUI) constitui uma das doenças inflamatórias intestinais (DII) mais frequentes da atualidade3. A doença pode iniciar em qualquer idade, sendo homens e mulheres igualmente afetados. O pico de incidência ocorre dos 20 aos 40 anos e um segundo pico nos idosos4.

A RCUI, tem despertado a atenção pelo aumento crescente da frequência, demosntrado em casuística com números significativamente maiores de doentes acometidos pela doença nos últimos anos5.

O curso clínico da RCUI, cujas manifestações principais são diarréia, dor abdominal e sangramento retal, é caracterizado por períodos de remissão e exacerbação6.

O diagnóstico da RCUI é principalmente baseado na colonoscopia e nos achados histopatológicos. A RCUI invariavelmente afeta o reto e estende-se proximalmente a uma distância variável. A inflamação é caracteristicamente confluente, com o aparecimento de hemorragia e irritação da mucosa. Os sinais mais precoces tendem a ser perda sutil de padrões vasculares com hiperemia e edema da mucosa. Com inflamação mais ativa, a mucosa fica granular com presença de muco e hemorragia de contato. Em estado avançado encontra-se intensas ulcerações7. No diagnóstico da RCUI teremos duas características críticas influentes na prescrição terapêutica; a extensão e a severidade da doença.

Neste sentido Rutter e colaboradores8 dão ênfase ao processo inflamatório estabelecido a longo prazo como sendo fator determinante da carcinogênese colorretal envolvida na RCUI. Contudo, existem indícios de que a carcinogênese oriunda da inflamação crônica poderia estar relacionada com um dano causado pela ativação prolongada das vias de sinalização responsáveis pela renovação celular continuada9, 10. Apesar destes achados, um estudo retrospectivo11 demonstrou que a severidade da inflamação é o fator que ofereceria um maior risco para o surgimento de uma neoplasia, com destaque, o tempo da doença e a extensão da mesma (pancolite).

A associação entre RCUI e câncer colorretal tem sido confirmada em vários estudos, segundo os quais o risco de câncer é variável e dependente de fatores como tempo de evolução da doença e extensão da mesma. As chances de ocorrer câncer na retocolite ulcerativa são maiores nos pacientes com mais de dez anos de doença e nos casos de pancolites12, 13.

Protocolos experimentais para análise imunohistoquímica de diversas proteínas como a p53 e Ki67 em tecido parafinizado estão sendo testados para marcação de lesões displásicas na colite ulcerativa14. Embora não se saiba ainda qual a verdadeira influência da resposta inflamatória na expressão de proteínas relacionadas ao câncer intestinal, estudos como este se tornam importantes no entendimento dos vários aspectos relacionados as DII.

A partir disso, este trabalho objetivou avaliar as repercussões teciduais quanto aos aspectos histológicos e a imunoexpressão das proteínas Ki67 e p53 de pacientes diagnosticados com RCUI e tratados clinicamente ou através de cirurgia com a proctocolectomia total com a construção de uma bolsa ileal.

MATERIAL E MÉTODOS

Seleção dos casos

Foram selecionados blocos de parafina contendo fragmentos de tecido intestinal anteriormente diagnosticados com retocolite ulcerativa idiopática (n=30) de pacientes em tratamento clínico com a administração de corticóides e imunomoduladores, bem como, amostras teciduais de pacientes já tratados cirurgicamente com proctocolectomia com anastomose íleo-anal com bolsa ileal (n=30). Para controle foram selecionados e analisados a contra parte normal da biópsia.

Todas as amostras foram oriundas de pacientes com idades entre 19 e 72 anos (média 38,5 anos), de ambos os sexos.

Foram utilizados como critérios de inclusão, a realização de exame colonoscópico entre os anos de 2000 e 2008, diagnóstico de RCUI acima de 7 anos baseados na sintomatologia, radiologia endoscopia, e exame histopatologico. Como fatores de exclusão foram desconsiderados os pacientes submetidos a tratamento cirúrgico para câncer do cólon e portadores de doença de Crohn ou colite indeterminada.

O protocolo experimental foi aprovado pelo Comitê de Ética de Pesquisas Envolvendo Seres Humanos da Universidade Federal de Pernambuco (CCS/UFPE sob nº. 198/2008).

Análise imunoistoquímica

Para a técnica de imunohistoquímica, foi utilizado um anticorpo primário monoclonal de camundongo da marca DAKO Corporation p53 (Clone Pab240) e um anticorpo monoclonal primário antiproteína Ki-67 (Clone MIB-1) da marca DAKO Corporation.

Para cada anticorpo foi utilizado um controle positivo que apresentava marcação quase na totalidade das células lesionadas. Para o anticorpo p53, utilizou-se um caso de carcinoma coloretal e um fragmento de pele normal para o anti-Ki-67.

Para a recuperação antigênica foi empregada a incubação das preparações histológicas em tampão citrato (3,84g de ácido cítrico, 48ml de hidróxido de sódio 1M, completando para 2000ml de água destilada, pH 6), Com o objetivo de inibir as ligações inespecíficas colocou-se uma solução de leite nas preparações histológicas sob calor úmido (Vaporeto®), durante 20 minutos . A solução de leite foi preparada no dia, utilizando-se 30ml TRIS (hidroxi-metil-aminometano) + 0,30g de albumina bovina. Homogenizou-se esta solução com o auxílio de um agitador magnético e adicionou 0,30g de leite desnatado em pó Molico. Em seguida, filtrou-se essa solução em filtro milipore. Os anticorpos primários foram diluídos em uma solução comercial (Antibody diluent, with background reducing components, código: S3022, DAKO Cytomation - Carpinteria - USA) numa diluição de 1:50.

Posteriormente, foram incubadas com o anticorpo primário (solução contendo anticorpo monoclonal anti-Ki67 ou anti-p53 na diluição 1:50, por 30 min, em temperatura ambiente de 25°C).

Logo após as preparações histológicas foram imersas em tampão de lavagem TBS (800ml de ácido clorídrico 1N, 116g de cloreto de sódio, 122g de TRIS, 10ml de tween 20, completando para 20ml de água destilada) em dois banhos de cinco minutos. Em seguida pingou-se o anticorpo secundário (LSAB).

As preparações histológicas receberam inicialmente o Link (anticorpo secundário de porco anti-camundongo, cabra e coelho) por trinta minutos e depois o Estreptavidina por mais trinta minutos, na câmara umidificada em temperatura ambiente.

Para revelação das lâminas utilizou-se o substrato cromógeno diaminobenzidina (Liquid DAB + substrate, Chromogen System, código: K3468, DAKO - USA) preparado conforme instruções do frabicante e com tempos previamente estabelecido para cada anticorpo, onde o p53 (45 min) e o Ki-67 (3 min).

Lavagens em água destilada foram feitas para retirada do excesso do cromógeno e posteriormente os cortes foram contracorados com hematoxilina de Harris por 30 segundos e lavados em cinco banhos de água destilada, sendo que o terceiro banho continha hidróxido de amônia para conferir a coloração azulada da Hematoxilina.

Finalmente procedeu-se a desidratação dos cortes em dois banhos de álcool (um minuto cada) seguido por quatro banhos de xilol (um minuto cada). As lâminas foram montadas com Enthelam (código: 107961, Merck - Alemanha) para fixação das lamínulas em resina e avaliadas no microscópio oóptico (Olympus BH-2, Japão).

As imagens das preparações histológicas foram capturadas utilizando um sistema de vídeo-câmera acoplado a um microscópio óptico (Olympus BH-2), já utilizado com sucesso em análises diagnósticas (15). O sistema interativo de análise de imagens utiliza o Software OPTIMAS® 6.1 e Câmera digital CCBBW 410 (Sansung).

Avaliação morfométrica computadorizada

A partir da captura das imagens das lâminas histológicas de RCUI, e após digitalização, padronizou-se a margem de variação (threshold range). Os perfis de marcação da imunohistoquímica dos cortes histológicos (magnificação 200x) foram captados pelo ajuste do contraste do nível de cinza (gray value).

Foram realizadas as contagens de células com padrão nuclear de marcação em marron. Todas as células captadas foram contadas por dois analistas isoladamente sendo avaliados cinco campos por lâmina (perfazendo um total de 150 campos analisados).

O parâmetro morfométrico adotado foi a área média total (ìm2) composta pelo somatório das estruturas citoplasmáticas marcadas (perfil de marcação da imuno-histoquímica para o p53 e o Ki-67) por campo captado (área de 12.234 ìm2) da preparação histológica.

Para minimizar distorções nos valores das medições devido à presença de células não-marcadas, aplicou-se um fator de correção (FC) de acordo com a equação FC = s/S, onde "s" é o valor da área superficial marcada e "S", a área total medida. Os dados obtidos foram analisados estatisticamente utilizando o teste t de Student pareado, considerando-se um nível de significância, p < 0,05.

Para o estudo do padrão de marcação dos anticorpos foi aplicada uma escala semiquantitativa (DxI) levando-se em consideração a intensidade da coloração (I), foi calculada a área média de células por campo captado (área de 12.234 ìm2) em porcentagem (%) onde a marcação fraca = 15-20%, moderada = 25-55% e forte = 60-95%, e a distribuição (D) variando entre fraca (+), moderada (++) e intensa (+++), conforme metodologia utilizada (16, 17).

Os dados obtidos foram analisados estatisticamente utilizando o teste t de Student, para um nível de significância (p< 0,05).

RESULTADOS

Aspectos histopatológicos

Na avaliação histológica dos casos de RCUI estudados foi observada uma diferença no perfil de resposta inflamatória entre os pacientes portadores de RCUI tratados cirurgicamente quando comparados aos pacientes tratados clinicamente.

Foi observado nos pacientes tratados clinicamente um maior infiltrado inflamatório predominantemente linfo-plasmocitário associado a áreas de desgaste da mucosa colônica (erosões/ulcerações), entremeado por regiões com fibrose intersticial (Figura 1). No grupo tratado cirurgicamente a arquitetura glandular estava mais bem preservada e com ausência de infiltrações por células inflamatórias (Tabela 1).

Nas amostras analisadas pode-se observar em pacientes tratados cirurgicamente uma área de tecido apresentando um infiltrado linfoplasmocitário. Além disso, pode-se observar a ausência de fibrose com a presença de raros fibrócitos.

Em ambos os grupos (cirúrgico e clínico) não foram observadas áreas de ectasia vascular, hiperemia ou hemorragias, porém no grupo tratado clinicamente foi encontrado um maior número de agregados linfóides reativos.

Perfil imunoistoquímico das proteínas p53 e Ki67

No estudo imunohistoquímico foi constatada uma reatividade, pincipalmente de padrão nuclear de marcação, para ambas as proteínas p53 e Ki67 nas áreas com RCUI (Tabela 2).

A análise de imagem da imunorreatividade tecidual da proteína Ki-67 (Figura 2) demonstrou um aumento estatisticamente significativo na sua expressão no grupo de pacientes portadores de RCUI tratados clinicamente quando comparados àqueles pacientes tratados cirurgicamente.

Comparativamente, a expressão tecidual para a proteína p53 também evidenciou no grupo de pacientes tratados clinicamente (66,6%), onde a imunoreatividade foi mais intensa nos tecidos inflamados.

DISCUSSÃO

Atualmente, aconselha-se que o estudo histopatológico da mucosa retal deve sempre ser realizado e se constitui no método diagnóstico mais importante, embora não-patognomônico para o esclarecimento da etiologia da colite, este exame serve como parâmetro complementar para o curso terapêutico a ser empregado, além disso, a análise das amostras teciduais obtidas por endoscopia é essencial e crucial para determinação do tratamento18, 19.

Nos pacientes em que a cirurgia não é o tratamento de escolha é fundamental a utilização de outros fatores prognósticos para melhor compreender a evolução da RCUI e definir melhor a terapia20.



Em outros estudos, apartir de uma análise comparativa observa-se a existência de muito pouca concordância entre as interpretações histopatológicas o que justifica a necessidade de aprofundar os estudos sobre esse aspecto. Neste sentido, os achados histopatológicos deste estudo convergem com as conclusões de Eaden e colaboradores21.

Em relação às características histológicas da RCUI, a avaliação da arquitetura tecidual através de métodos rotineiros não são suficientes para evidenciar fatores importantes como a natureza do infiltrado inflamatório e estágio de displasia que as células colônicas estão apresentando. Os termos "idiopático", "indeterminado", "inespecífico", às vezes mencionados, referem-se à ausência de características mais precisas que indicariam o tipo exato de inflamação, bem como a o nível da distorção da arquitetura tecidual do revestimento mucoso do cólon22.

Segundo nosso estudo, o quadro inflamatório demonstrou ser bastante característico em ambos os grupos estudados, o que evidencia ser isto um fator de averiguação e também fator de risco adicional para progressão neoplásica, gerando o câncer de cólon8, 23.

Poucas medidas na medicina diagnóstica tiveram tanto impacto em anos recentes quanto a introdução, nas práticas de laboratório clínico, dos imunoensaios para determinação de proteínas relacionadas a tumores, também classificadas como marcadores tumorais24.

Os marcadores tumorais, em sua maioria, são proteínas ou frações de proteínas25, incluindo antígenos de superfície celular, proteínas citoplasmáticas, enzimas e hormônios26.

Embora a RCUI seja uma doença inflamatória de origem não-neoplásica, o câncer coloretal ainda é a principal causa de morte nos pacientes acometidos com essa DII27. Vários marcadores de prognóstico atualmente são testados, como o IL-6, ICAM, a-TNF, Dehydro-epiandrosterona (DHEA), ciclooxigenase-228, 29, além das proteínas p53 e Ki6727, 30, 31.

Dentre os marcadores de prognóstico avaliados no presente estudo, podemos destacar o perfil da resposta inflamatória e a imunorreatividade às proteínas Ki-67 e p53.

A p53 regula a expressão de genes envolvidos na apoptose, angiogênese, ciclo celular e manutenção do genoma. Mutações no gene p53 são encontradas em cerca de 50% dos cânceres colo retal, com a maioria das mutações que ocorrem em exons 5-832.

Estudos indicam, ainda, que a superexpressão da proteína p53 em outros tumores (por exemplo, carcinomas de mama, cólon e bexiga) correlaciona-se com diminuição da diferenciação histológica, comportamento biológico mais agressivo e redução da sobrevida dos pacientes33-35.

Alteração no gene p53 pode ser detectada tanto pelo sequenciamento direto do gene quanto pela superexpressão imunohistoquímica da sua proteína. A superexpressão da proteína p53 pode ser um indicador de mutação desse gene36.

Em pacientes com RCUI a avaliação dos níveis de p53 tem sido considerado como teste complementar para displasia e fator prognóstico para o câncer intestinal27, 37.

Freqüentemente a proteína Ki67 é utilizada como um marcador para a proliferação celular em cortes teciduais38, sendo importante ressaltar que a sua positividade não é exclusiva nas neoplasias malignas, mas sim predominante em relação às benignas nos tecidos glandulares, sendo o melhor marcador de transformação maligna, como, por exemplo, do carcinoma versus adenoma pleomórfico39. Em outros trabalhos demonstrou-se através da imunohistoquímica que a ausência de marcação em biópsias de pacientes com colite ulcerativa é um indicador do grau de displasia14, 33, 40.

No presente estudo, a imunoreatividade para ambas as proteínas investigadas foi mais intensa nos tecidos inflamados, aspecto este que corrobora o resultado observado por Sato & Machinami41 ao reportarem que a reatividade das células em condições não-neoplásicas correlaciona-se com severidade da inflamação.

Nossos resultados confirmam estudo mais recente que afirma que, quando ocorrem mutações e alta expressão do gene p53 ocorre o surgimento de mais de 75% cânceres coloretais. Além disso, o aumento da frequência de alelos mutantes do p53 em tecidos intestinais pode conferir susceptibilidade para o desenvolvimento de neoplasias em um microambiente inflamatório42.

Protocolos experimentais para análise imunohistoquímica da proteína Ki-67 em tecido parafinizado estão sendo testados para marcação de lesões displásicas na colite ulcerativa14. Embora não se saiba ainda qual a verdadeira influência da resposta inflamatória na expressão de proteínas relacionadas ao câncer intestinal, estudos como este se tornam importantes no entendimento dos vários aspectos relacionados as doenças inflamatórias intestinais.

Neste presente trabalho, a expressão das proteínas Ki-67 e p-53 foi observada no núcleo e/ou citoplasma nas células de todos os tipos de lesão examinados, este padrão de marcação encontrado neste estudo assemelha-se a outros trabalhos realizados em nossos laboratórios que avaliaram a expressão tecidual de outras proteínas, como a galectina 3 em câncer de próstata43, e mais recentemente, em pacientes portadores de RCUI44.

Com o intuito de descrever parâmetros qualitativos e quantitativos mais confiáveis sobre alterações histopatológicas nosso grupo de pesquisas tem desenvolvido metodologias morfométricas diversas45-47.

Desta forma, o conhecimento do maior número de variáveis diretamente associadas ao prognóstico para evolução de tumores intestinais torna-se necessário para a melhor identificação de pacientes que poderão se beneficiar de ferramentas diagnósticas complementares, como o uso de marcadores biológicos como o caso de algumas, proteínas específicas que desempenham importantes funções no desenvolvimento de doenças neoplásicas e inflamatórias.

CONCLUSÕES

A partir dos resultados obtidos, pode-se constatar uma diferença no perfil da resposta inflamatória nas amostras de pacientes com RCUI tratados cirurgicamente e clinicamente, nestes últimos há presença mais acentuada de infiltrado linfo-plasmocitário, fibrose intersticial e agregados linfóides reativos.

Também foi observada diferença significativa na reatividade tecidual da proteína p53 entre as amostras estudadas quando comparados os pacientes tratados clinicamente com aqueles submetidos a cirurgia, visto que os tratados cirurgicamente não apresentavam áreas inflamadas tão frequentes e intensas, por outro lado, ocorreu aumento significativo no número médio de células com reatividade para a proteína Ki-67 nas amostras teciduais de pacientes tratados clinicamente.

Recebido em 01/02/2010

Aceito para publicação em 17/03/2010

Trabalho realizado no Setor de Patologia do Laboratório de Imunopatologia Keizo Asami (LIKA), órgão suplementar da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) - Recife - Pernambuco - Brasil.

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  • Endereço para correspondência
    Mario Ribeiro de Melo-Junior
    Laboratório de Imunopatologia Keizo Asami, LIKA, Universidade Federal de Pernambuco, UFPE
    Av. Morais Rêgo s/n, Campus Universitário
    CEP 50670-910
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Ago 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 2010

    Histórico

    • Recebido
      01 Fev 2010
    • Aceito
      17 Mar 2010
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