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Leiomiossarcoma perineal: relato de caso e revisão da literatura

Perineal leiomyosarcoma: case report and literature review

Resumos

Lemiossarcomas são neoplasias malignas que se originam no músculo liso. Quando presentes na região perineal são agressivos e o tratamento cirúrgico mais adequado ainda não está bem definido. Os autores relatam o caso de uma paciente jovem, sexo feminino, com sintomatologia de nodulação perineal há oito meses. Ao exame físico apresentava abaulamento em região perineal esquerda, onde palpava-se massa fibroelástica de aproximadamente 10 cm de diâmetro. Ressonância nuclear magnética mostrava volumosa formação sólida de contornos regulares em região perineal à esquerda sem sinais de infiltração perilesional. O tratamento realizado foi a excisão com margens amplas. A paciente encontra-se em acompanhamento ambulatorial, sem sinais de recidiva local.

Leiomiossarcoma; Tumores retais; Períneo; Cirurgia; Radioterapia


Leiomyosarcomas are malignant tumors that originate of the smooth muscle. When presents in the perineal region are aggressive and the suitable surgical treatment is not well defined. The authors report the case of a young patient, feminine sex, that presents a perineal nodulation for eight months. At the physical examination was noticed bulging in left perineal region, where a fibroelastic mass of approximately 10 cm of diameter was palpable. Magnetic nuclear resonance showed voluminous left-sided solid formation of regular contours in perineal region, without signals of perilesional infiltration. The chosed treatment was the excision with ample margins. The patient is currently in ambulatorial accompaniment, without signals of local recurrence.

Leiomyosarcoma; Rectal Tumors; Perineo; Surgery; Radiotherapy


RELATO DE CASOS

Leiomiossarcoma perineal: relato de caso e revisão da literatura

Perineal leiomyosarcoma: case report and literature review

Meyline Andrade LimaI; Bárbara Heloisa Zanchetta PozzobonI; Marcus Fabio Magalhães FonsecaII; Sérgio Henrique Couto HortaII; Galdino José Sitonio FormigaIII

IResidente de Coloproctologia do Hospital Heliópolis

IIMédico Assistente do Serviço de Coloproctologia do Hospital Heliópolis

IIIChefe do Serviço de Coloproctologia do Hospital Heliópolis

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Galdino José Sitonio Formiga Rua Cônego Xavier, 276 Vila Heliópolis 04231-030 São Paulo/SP E-mail: gformiga@ig.com.br

RESUMO

Lemiossarcomas são neoplasias malignas que se originam no músculo liso. Quando presentes na região perineal são agressivos e o tratamento cirúrgico mais adequado ainda não está bem definido. Os autores relatam o caso de uma paciente jovem, sexo feminino, com sintomatologia de nodulação perineal há oito meses. Ao exame físico apresentava abaulamento em região perineal esquerda, onde palpava-se massa fibroelástica de aproximadamente 10 cm de diâmetro. Ressonância nuclear magnética mostrava volumosa formação sólida de contornos regulares em região perineal à esquerda sem sinais de infiltração perilesional. O tratamento realizado foi a excisão com margens amplas. A paciente encontra-se em acompanhamento ambulatorial, sem sinais de recidiva local.

Descritores: Leiomiossarcoma, Tumores retais, Períneo, Cirurgia, Radioterapia.

ABSTRACT

Leiomyosarcomas are malignant tumors that originate of the smooth muscle. When presents in the perineal region are aggressive and the suitable surgical treatment is not well defined. The authors report the case of a young patient, feminine sex, that presents a perineal nodulation for eight months. At the physical examination was noticed bulging in left perineal region, where a fibroelastic mass of approximately 10 cm of diameter was palpable. Magnetic nuclear resonance showed voluminous left-sided solid formation of regular contours in perineal region, without signals of perilesional infiltration. The chosed treatment was the excision with ample margins. The patient is currently in ambulatorial accompaniment, without signals of local recurrence.

Key words: Leiomyosarcoma, Rectal Tumors, Perineo, Surgery, Radiotherapy.

INTRODUÇÃO

Leiomiosarcomas (LMS) são neoplasias malignas que se originam do músculo liso(1). São tumores raros, responsáveis por 0,7% de todas as neoplasias dos adultos(2), constituindo 0,7 - 1% de todos os tumores malignos do reto e 1% dos da vulva(3).

Eles constituem um grupo extremamente diverso de tumores, com variações histológicas, comportamentais e de localização(4). Quando presentes na região perineal são agressivos e o tratamento cirúrgico mais adequado ainda não está bem definido.

Os autores relatam o caso de uma paciente jovem, sexo feminino, que apresentou leiomiosarcoma perineal e foi tratada com excisão local ampla. Discutem opções terapêuticas baseadas na revisão da literatura.

RELATO DO CASO

APF, 28 anos, sexo feminino, admitida no Serviço de Coloproctologia do Hospital Heliópolis com queixa de nodulação perineal há oito meses, de crescimento lento e indolor. Negava perda ponderal, hematoquezia, mucorréia e alterações do hábito intestinal. Queixava-se de dispareunia. Era previamente hígida.

Apresentava, ao exame físico, abaulamento em região perineal à esquerda, onde se palpava massa fibroelástica, móvel, de contornos bem delimitados, medindo aproximadamente 10 cm de diâmetro (Figura 1). Ao toque retal sente-se massa perineal à esquerda por transmissão. Anuscopia e retosigmoidoscopia sem lesões de mucosa. Exame ginecológico com mucosa vaginal íntegra, abaulamento lateral extrínseco no terço distal.


Ressonância nuclear magnética de pelve mostrava volumosa formação sólida (Figura 2) de contornos regulares em região perineal esquerda de aproximadamente 9 x 7,5 x 4,5 cm, apresentando hipossinal em T1 e sinal intermediário em T2 com realce importante pelo meio de contraste paramagnético. A lesão rechaçava o reto e a vagina. Não se observava sinais de infiltração peri-lesional. Ao estadiamento, não apresentava sinais de lesões à distância, exame radiográfico do tórax normal e fígado sem alterações pela ultrassonografia de abdome.


Em janeiro de 2009, a paciente foi submetida à excisão local da lesão com margens amplas por via perineal sob raquianestesia. Esse procedimento foi realizado utilizando incisão longitudinal paralela à linha média sobre a lesão, com fechamento, após a exérese, por planos; não havendo necessidade de drenagem da região. O resultado do exame anátomo-patológico da peça cirúrgica revelou sarcoma de baixo grau compatível com leiomiossarcoma grau I.

A peça apresentava bordas regulares, discreta anaplasia, ausência de necrose e a presença de uma mitose por 10 campos de grande aumento. A pesquisa imuno-histoquímica (Figura 3) demonstrou a presença dos anticorpos: S100 – negativo, AML 1A 4 – positivo, AML HH F35 – positivo focal, CD- – negativo, desmina – inconclusivo, miogenina – positivo, CD 117 – positivo e AE1/AE3 – negativo; quadro imuno-histoquímico compatível com o diagnóstico de LMS.


A paciente apresentou boa evolução, recebendo alta no segundo dia de pós-operatório e encontra-se em acompanhamento ambulatorial há três meses, sem sinais de recidivas locais.

DISCUSSÃO

Os leiomiossarcomas são tumores raros que podem ocorrer em qualquer tecido muscular liso, sendo mais freqüentes no estômago, intestino delgado, útero e retroperitôneo(4). No entanto, também podem ocorrer no reto e região perineal. Acomete igualmente homens e mulheres, sendo mais comum em brancos(5).

São classificados como superficiais (pele e tecido celular subcutâneo) e profundos (abaixo das fáscias musculares), sendo os superficiais mais comuns(6). A apresentação típica dos LMS superficiais é de tumoração solitária, arredondada, que eleva a pele(1), dando a impressão de serem tumores benignos ou císticos, semelhante a nossa paciente.

Se o diagnóstico de LMS é suspeitado pela história e exame físico, a tomografia computadorizada ou ressonância nuclear magnética da pelve devem ser realizadas para avaliar a extensão e invasão do tumor(2). O diagnóstico histológico deve ser feito por biópsia, seja ela excisional para lesões pequenas (menos de 2-3 cm de diâmetro) ou incisional para grandes lesões. No caso em questão, não foi realizada biópsia incisional por haver suspeita de lesão benigna.

O critério mais importante para o diagnóstico dos LMS é a presença de mitoses. Haque e Dean(7) notaram em sua série que a taxa de cinco ou mais mitoses por 50 campos de grande aumento confere potencial maligno para os tumores estromais, sendo este um dos critérios utilizados para o diagnóstico da nossa paciente. Além deste detalhe, os LMS também apresentam normalmente aderência à musculatura própria, atipia celular freqüente, e no geral são maiores que a variante benigna.

Existem poucas informações sobre a história natural e tratamento dos LMS. Segundo Rice e col(3), o tratamento desses tumores deve ser similar ao dos sarcomas retroperitoneais, ou seja, tratamento cirúrgico agressivo. Isso pode incluir exanteração pélvica, hemipelvectomia ou amputação abdomino-perineal do reto. Dissecção linfonodal não é necessária, a menos que haja linfonodomegalia clinicamente suspeita ou biópsia linfonodal positiva.

Fields e Helwig(8) trataram 59 pacientes com LMS cutâneo usando ressecção conservadora ou ressecção local e encontraram taxa de recorrência de 42%. Entretanto, lesões recorrentes ou residuais que foram totalmente excisadas, geralmente não apresentaram recidiva local nem metástases, ou estavam relacionadas à causa da morte desses pacientes. Já para LMS subcutâneos, eles descreveram série de 12 pacientes, onde a taxa de recidiva local foi de 50% e a taxa de metástase ou tumores relacionados à morte do paciente eram de 33%, o que demonstrou uma maior agressividade para este tipo de tumor.

Khalifa e col(9) encontraram 67,5% de recidiva local após excisão local de LMS do reto e 19,5% após ressecção abdomino-perineal do reto. No entanto a sobrevida em cinco e dez anos foi similar. No caso da nossa paciente foi optado pela ressecção local ampla pelo fato da lesão não acometer o reto.

Radioterapia pré-operatória pode reduzir a extensão da lesão e permitir a excisão de algumas lesões previamente irressecáveis(10). No entanto a maioria dos estudos mostram que não há aumento do controle local ou da sobrevida em pacientes que são submetidos à radioterapia adjuvante, se o tumor primário for completamene ressecado(11). Todavia, em lesões não completamente excisadas, Karakousis e col acreditam que a radioterapia aumente o índice de controle local(12).

Devido à natureza infiltrativa das lesões, muitas vezes uma ressecção com margens livres é difícil durante a cirurgia, nesses casos o tratamento quimioterápico tem sido proposto. Stones e col(13) relataram o caso de uma paciente com resposta completa após recidiva tumoral, com um esquema que associava vincristina, adriamicina e ifosfamida. Já Choi e col(14), usando regime com adriamicina, DTIC, vincristina e ciclofosfamida encontraram taxa de resposta de 33%. Esses resultados têm encorajado o uso da quimioterapia para os pacientes com lesões recidivantes e metastáticas.

Quanto ao prognóstico, observamos que os LMS superficiais têm um melhor prognóstico que os profundos(1). Dahl e col(15) demonstraram que a cirurgia inicialmente realizada é o principal fator de prognóstico para os LMS superficiais. Em seu estudo, nenhum dos 14 pacientes tratados com excisão com margens amplas desenvolveu recidiva local ou metástase, enquanto 75% dos que foram tratados com excisão simples ou enucleação apresentaram recidivas.

A sobrevida em cinco anos varia de 20-74%(16) e em 10 anos pode atingir 50%(17, 18).

Concluímos então que a excisão com margens amplas é um tratamento adequado para os leiomiosarcomas superficiais. O tratamento radioterápico e quimioterápico está reservado para tumores localmente avançados, persistência ou recidiva.

Recebido em 05/04/2010

Aceito para publicação em 08/07/2010

Trabalho realizado no Serviço de Coloproctologia do Hospital Heliópolis. São Paulo/SP.

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  • Endereço para correspondência:

    Galdino José Sitonio Formiga
    Rua Cônego Xavier, 276
    Vila Heliópolis
    04231-030 São Paulo/SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Nov 2010
    • Data do Fascículo
      Set 2010

    Histórico

    • Recebido
      05 Abr 2010
    • Aceito
      08 Jul 2010
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