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Amor e gênero em quadrinhas

Love and gender in popular verses

Resumos

O texto analisa a obra Quadrinhas populares, de Áurea Queiroz, a partir da categoria gênero. Identifica nas quadrinhas uma fonte de significação do feminino, do masculino e de suas relações. Do mesmo modo, evidencia que no conjunto de quadrinhas analisado predominam aquelas que dizem respeito aos significados do amor, do namoro e do casamento em suas interfaces com o feminino e o masculino. Os sentidos atribuídos aos verbos namorar, amar e casar ora confirmam concepções que se tornam normativas durante a primeira metade do século XX, ora as rebatem, apontando para o universo plural das relações de gênero no período.

gênero; quadrinhas populares; amor


The text analyses the work Quadrinhas populares [Popular verses], by Áurea Queiroz, from the perspective of gender. It identifies in the scenes a source of meaning of the feminine, the masculine and the relations between them. In the same way, it provides evidence that in the set of scenes analyzed those that deal with the meanings of love, courtship and marriage in their interfaces with the feminine and the masculine predominate. The meanings attributed to the verbs to court, to love and to marry, now confirm conceptions that became the norm during the first half of the 20th century, now rebut them, pointing to the multifarious nature of gender relationships in the period.

gender; popular verses; love


DOSSIÊ: HISTÓRIA E GÊNERO

Amor e gênero em quadrinhas

Love and gender in popular verses

Elizangela Barbosa Cardoso

Doutoranda na Universidade Federal Fluminense (UFF), Centro de Ciências Humanas e Letras, Departamento de Geografia e História Universidade Federal do Piauí (UFPI), Campus Universitário Ministro Petrônio Portela, Bairro Ininga. 64049-550 Teresina – PI – Brasil. elibcardoso@ yahoo.com.br

RESUMO

O texto analisa a obra Quadrinhas populares, de Áurea Queiroz, a partir da categoria gênero. Identifica nas quadrinhas uma fonte de significação do feminino, do masculino e de suas relações. Do mesmo modo, evidencia que no conjunto de quadrinhas analisado predominam aquelas que dizem respeito aos significados do amor, do namoro e do casamento em suas interfaces com o feminino e o masculino. Os sentidos atribuídos aos verbos namorar, amar e casar ora confirmam concepções que se tornam normativas durante a primeira metade do século XX, ora as rebatem, apontando para o universo plural das relações de gênero no período.

Palavras-chave: gênero; quadrinhas populares; amor.

ABSTRACT

The text analyses the work Quadrinhas populares [Popular verses], by Áurea Queiroz, from the perspective of gender. It identifies in the scenes a source of meaning of the feminine, the masculine and the relations between them. In the same way, it provides evidence that in the set of scenes analyzed those that deal with the meanings of love, courtship and marriage in their interfaces with the feminine and the masculine predominate. The meanings attributed to the verbs to court, to love and to marry, now confirm conceptions that became the norm during the first half of the 20th century, now rebut them, pointing to the multifarious nature of gender relationships in the period.

Keywords: gender; popular verses; love.

As quadrinhas são formas de expressão cultural constituintes das sociabilidades femininas e masculinas. Transmitidas pela tradição oral por mulheres e homens mais velhos às novas gerações, as quadrinhas veiculam concepções de mundo, valores e conselhos que atuam na constituição das diferenças de gênero,1 1 Joan Scott argumenta que, numa primeira significação, gênero é "um elemento constitutivo das relações sociais baseadas nas diferenças percebidas entre os sexos", e numa segunda perspectiva é "uma forma primária de dar significado às relações de poder". SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação & Realidade, n.20, v.2, p.86, 1995. ora reforçando hierarquias, ora contestando-as.

No universo de meninas e meninos, comumente os versos surgiam em meio a diversas brincadeiras, como forma de pagamento de prendas. Mediante o processo de escolarização, intensificado no decorrer do século XX, as quadrinhas passaram a fazer parte, também, do universo escolar, na medida em que as meninas, em grupo, passaram a inventar versos, especialmente no horário do recreio. Assim, as quadrinhas figuram nos cadernos juntamente ao conteúdo escolar.

Além desse espaço, as quadrinhas também eram escritas nos diários e em cadernos de questões cuidadosamente enfeitados com inúmeros coraçõezinhos. Nos diários as meninas-moças escreviam versos oferecidos aos namorados reais ou àqueles do desejo, àqueles que faziam parte apenas das expectativas. Nos cadernos, as quadrinhas, muitas vezes, situavam-se em meio aos questionários sobre temas como felicidade, sonhos, padrão de beleza, desejo, beijo, namoro e casamento.

Em geral, a dona do caderno pedia às amigas que respondessem ao questionário e, às vezes, em um dos itens, solicitava que escrevessem um verso. Ao responderem às perguntas, muitas meninas-moças inventavam novos versos ou passavam para o universo escrito um saber que havia sido transmitido oralmente, pelos/as avós, pais, mães, tios/as e conhecidos/as. Dessa maneira, mediante a tradição oral e a escrita compunha-se um universo de saberes sobre assuntos diversos que constituía referências importantes no processo de subjetivação feminina e masculina, na medida em que circulavam concepções de homem, de mulher e de suas relações.

De modo especial, as quadrinhas expressam formas de significação do namoro, do amor e do casamento, com destaque aos modos de significação dos verbos amar, namorar e casar atribuídos pelas mulheres. O que, por sua vez, possibilita destacar como tais significados ora confirmam ora rebatem as concepções dominantes de amor, de namoro e de casamento. O objetivo deste texto, portanto, é analisar o conjunto de quadrinhas publicado na obra Quadrinhas populares, de Áurea Queiroz, a partir da categoria gênero.2 2 QUEIROZ, Áurea. Quadrinhas populares. Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 2006.

É importante ressaltar que os versos em estudo são resultado de uma intensa pesquisa desenvolvida por Áurea Queiroz. Iniciado em sua adolescência pelo prazer de colecionar versos, o conjunto de quadrinhas foi enriquecido, em primeiro lugar, pela realização de entrevistas, predominantemente, com mulheres, do Piauí, de diferentes idades; em segundo lugar, pela consulta a obras relativas à cultura popular. O resultado desse esforço de pesquisa foi a composição de um conjunto de quadrinhas escritas no feminino e no masculino, que remete ao horizonte plural das relações de gênero no século XX.

Considerando o fato de as quadrinhas conservarem-se tanto através da tradição oral quanto da escrita e a maneira como foi composta a obra Quadrinhas populares, é importante ressaltar que não é possível apresentar com precisão o período a que se referem. Aparentemente dizem respeito, notadamente ao século XX, apontando para diferentes temporalidades internas ao período. Em conjunto, as quadrinhas apresentam uma cartografia sentimental3 3 ROLNIK, Suely. Cartografia sentimental. São Paulo: Estação Liberdade, 1989. desse século e indicam suas tensões e ambigüidades.

Remetendo a diferentes temporalidades, as quadrinhas indicam dois processos que marcaram o período compreendido entre as últimas décadas do século XIX e o XX. O primeiro consistiu no enredamento do namoro, do amor, do casamento e da sexualidade, através do qual se buscou restringir a sexualidade feminina legítima ao casamento. O segundo diz respeito ao descentrar da sexualidade das mulheres do âmbito conjugal.

Nas últimas décadas do século XIX, a despeito de o casamento constituir um valor, muitas mulheres pobres viviam em relações consensuais. Inúmeras famílias pobres eram chefiadas por mulheres4 4 SOIHET, Rachel. Condição feminina e formas de violência. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989; SOIHET, Rachel. Mulheres pobres e violência no Brasil urbano. In: PRIORE, Mary Del (Org.). História das mulheres no Brasil. 7.ed. São Paulo: Contexto, 2004. p.362-400. e poucas eram as mulheres escravas casadas.5 5 FALCI, Miridan Knox. Mulheres do sertão nordestino. In: PRIORE, Mary Del (Org.). História das mulheres no Brasil, 2004, p.241-277. Era no universo das mulheres de elite que o casamento dominava. O casamento das mulheres desse segmento social, na realidade, longe estava de ser resultado de escolhas pessoais. Era um compromisso familiar, onde pouco espaço havia para afinidade sexual e afetiva. O casamento era uma oportunidade para que fossem fortalecidos laços familiares e de amizade. Era um contrato social que possibilitava a manutenção do status e a transmissão do patrimônio, uma vez que, em geral, na oportunidade do casamento, os pais costumavam adiantar a herança da filha ao genro.6 6 FALCI, 2004; NAZZARI, Muriel. O desaparecimento do dote: mulheres, famílias e mudança social em São Paulo, Brasil, 1600-1900. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

No Piauí provincial, havia, por parte das famílias de elite, uma grande preocupação em casar as filhas. Logo que as meninas passavam à condição de meninas-moças, os pais procuravam arranjar-lhes casamento, embora nem todas casassem, dadas as limitações do mercado matrimonial. Uma estratégia comumente utilizada era a realização de festas e saraus nas casas de fazenda, bem como piqueniques. Nessas oportunidades, os pais convidavam parentes e filhos das famílias com as quais se relacionavam, em vista a criar condições de contato e namoro entre as jovens e os jovens que esperavam que se casassem.7 7 FALCI, 2004; CASTELO BRANCO, Pedro Vilarinho. Famílias e escritas. 2005. Tese (Doutorado em História) – Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2005a.

Os galanteios e a conquista deveriam partir do rapaz. Os enamorados não deveriam ser deixados a sós para que não houvesse contatos sexuais, posto que a virgindade feminina era considerada um valor fundamental no pacto matrimonial.

O futuro marido poderia ser um primo sem grandes atrativos, um tio velho ou, às vezes, um jovem estudante de Direito ou de Medicina. O certo é que o rapaz desejado como marido nem sempre era aquele imposto pela família. As moças, por sua vez, deveriam aceitar, resignadamente, essa forma de arranjo matrimonial. O que, de fato, nem todas fizeram, pois muitas jovens, ao escolherem rapazes fora da família e dos laços oligárquicos, fugiam para casar.

Diferentemente das mulheres de elite, as mulheres pobres tinham maior liberdade de escolha, pois o casamento nem envolvia dote, nem era arranjado. Nesse universo, o que se esperava era que o pretendente, antes de pedir a moça em casamento, tivesse pelo menos um cavalo e uma modesta casa de palha, para iniciar a vida a dois (Falci, 2004).

No final do século XIX, no âmbito da literatura, o padrão matrimonial da elite baseado no dote e nos interesses familiares passa a ser objeto de críticas. Começa a ser delineada uma nova sensibilidade, em que o amor irrompe como base ideal do matrimônio, onde se deveria considerar a correspondência de sentimentos dos futuros cônjuges. No universo das práticas, estudos indicam, por um ângulo, a persistência do casamento como negócio familiar;8 8 PRIORE, Mary Del. História do amor no Brasil. São Paulo: Contexto, 2005. por outro ângulo, o declínio do dote (Nazzari, 2001).

O declínio do dote relaciona-se ao processo de urbanização, industrialização e configuração do mercado de trabalho. Isto porque em face dessas mudanças, homens dos grupos médios e altos puderam ingressar em profissões liberais e em outras carreiras, tornando-se aptos a sustentar suas futuras esposas, prescindindo de seus dotes. Por conseguinte, esse acontecimento estabeleceu meios para que alguns homens rompessem com os interesses familiares e fizessem escolhas matrimoniais centradas na afetividade.

Paralelamente, o casamento vai sendo redefinido, uma vez que deixa de ser uma instituição cujo objetivo é o sustento dos filhos e filhas, em que contribuem mulheres e homens, para ser uma instituição igualmente voltada ao sustento das esposas. Conseqüentemente, aumenta o poder de negociação do noivo em relação à noiva e a sua família, bem como o controle do marido em relação à esposa. Ademais, começam a se redefinir os lugares de homens e de mulheres na dinâmica familiar. Por um lado, cresce o poder das mulheres na família, à medida que se enaltece a mãe em detrimento do pai, em decorrência da mudança de estatuto da infância, que passa a ser vista como uma idade especifica da vida. No mesmo movimento, procura-se limitar o feminino aos papéis de mãe, esposa e dona-de-casa. Por outro lado, reforça-se o papel do homem como chefe de família e provedor familiar. A capacidade de prover, portanto, passa a ser considerada um elemento fundamental na constituição da masculinidade.9 9 A respeito desse processo, ver: RAGO, Margareth. Do cabaré ao lar. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985; RAGO, Margareth. Os prazeres da noite. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991; SOIHET, 1989; SOIHET, 2004; ESTEVES, Martha de Abreu. Meninas perdidas. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989; BESSE, Susan K. Modernizando a desigualdade. São Paulo: Edusp, 1999; ALBUQUERQUE JR., Durval Muniz. Nordestino: uma invenção do falo. Maceió: Catavento, 2003.

Delineadas em fins do século XIX, essas mudanças espraiam-se nas primeiras décadas do século XX. Paulatinamente, a idéia de que o casamento deve ser realizado com base na livre escolha dos cônjuges e em sentimento mútuo ganha respaldo. A ampliação do acesso dos homens das famílias abastadas ao ensino secundário e superior e, posteriormente, ao mercado de trabalho cria condições para que possam desempenhar o papel de provedor familiar, que cada vez mais a sociedade instituía como masculino. Isto, por sua vez, estabelece meios para aumentar o poder de escolha individual, assim minimizando as interferências familiares no pacto matrimonial.

Nas primeiras décadas do século XX, namorar e amar são práticas que, paulatinamente, convergem para o casamento, na medida em que o amor e a sexualidade realizada são considerados bases da felicidade conjugal e passam a orientar as escolhas matrimoniais femininas e masculinas (Priore, 2005). Essa irrupção do amor e da sexualidade no universo conjugal rompe o padrão de casamento dos membros da elite, vivenciado, no Brasil, desde o período colonial, e estabelece, em confluência com fatores econômicos e sociais, uma nova configuração que vai predominar durante o século XX.

Em face às condições de vida urbana, ampliam-se as possibilidades de contato, de aproximação e de namoros entre homens e mulheres. Essa nova situação desencadeia em muitos homens a necessidade de definir o modo como deveriam ser as sociabilidades femininas e masculinas, bem como os contatos e o namoro.

Em Teresina, cidade que nas primeiras décadas do século XX integrou-se perifericamente à dinâmica capitalista, o reordenamento das relações de gênero no período torna-se objeto de reflexão dos intelectuais. Abdias Neves, por exemplo, no romance Um manicaca, ao narrar a história de Júlia critica o modelo de casamento arranjado pelo pai, o enlace matrimonial de uma mulher jovem com um homem velho e a ausência de uma educação feminina em vista ao desenvolvimento do autocontrole. Clodoaldo Freitas, por sua vez, em parte de sua produção literária critica o controle direto dos pais sobre as filhas, por considerá-lo inadequado às condições de vida moderna. Isto porque, em sua concepção, ao falhar o controle, os encontros de jovens enamorados tornam-se perigosos, pois os corpos encontram-se, uma vez que não há intermediação. Fato considerado lastimável, seja por macular a mulher, seja por antecipar o intercurso, que no caso das mulheres, deveria ocorrer somente após o casamento. Buscando intervir nesse quadro, propõe uma educação sentimental a partir do ideário do amor romântico.10 10 CASTELO BRANCO, 2005a; CASTELO BRANCO, Pedro Vilarinho. Masculinidades plurais. Unisinos, São Leopoldo, n.2, v.9, p.85-95, 2005b.

Na escrita de Clodoaldo Freitas, amar significa idealizar o ser amado, ter-lhe cortesia e respeito. Amar é saber manter os corpos castos; saber manter a sutileza e a pureza dos encontros; saber resguardar o corpo, em vista à entrega na noite de núpcias, espaço considerado legítimo para a vivência da sexualidade.

Quanto ao consumo cultural do ideário romântico, acentua Castelo Branco que foi incorporado, sobretudo, pelas mulheres. Isto porque poucos foram os homens sensibilizados por essa forma de significar o amor. Nesse sentido, parece que a educação dos sentidos11 11 GAY, Peter. A experiência burguesa da Rainha Vitória a Freud: a educação dos sentidos. São Paulo: Companhia das Letras, 1988. no universo masculino delineou-se, predominantemente, na aprendizagem da classificação das mulheres em casadouras e não casadouras e, ao mesmo tempo, na elaboração de códigos de postura diferenciados para um modelo e outro de mulher.

Essa aprendizagem remete à forma distinta como se concebem, no período, as sexualidades feminina e masculina. Os homens são classificados como sexualmente ativos, e até mesmo o exercício da sexualidade é um dado fundante na construção da identidade masculina.12 12 NOLASCO, Sócrates. O mito da masculinidade. Rio de Janeiro: Rocco, 1995. Em outros termos, para se constituírem enquanto homens, os homens deveriam investir sexualmente sobre as mulheres, demonstrando possuir uma sexualidade incontida e potente. Esse modo de significar a aprendizagem da masculinidade, por sua vez, leva à polarização das mulheres em direitas e prostitutas. As mulheres direitas são aquelas encaminhadas a vivenciar o casamento e a maternidade, são aquelas sexualmente controladas, cuja sexualidade limita-se ao universo conjugal, são aquelas que devem ser virgens, se solteiras; fiéis aos maridos, se casadas. Às prostitutas, consideradas sexualmente ativas, possibilita-se, em termos normativos, viver a sexualidade, mas nega-se a respeitabilidade e o casamento.

Essa forma de classificação da sexualidade feminina e masculina embasa-se, especialmente, no discurso médico. Em ascensão a partir da terceira década do século XIX, a medicina social produziu um saber considerado científico e verdadeiro que prescreveu padrões de feminino e de masculino e instituiu uma nova norma familiar. Atuando a princípio nas famílias de elite, o poder médico propiciou a passagem da família colonial à nuclear, conjugal e regulada, sinônimo de família burguesa. Nesse processo, a mulher foi significada como mãe e esposa, cujas características demarcadas por razões biológicas seriam a fragilidade, o recato, o predomínio da afetividade sobre as faculdades intelectuais e a subordinação da sexualidade à maternidade. O homem, além de definido como pai, era considerado detentor de uma sexualidade sem freios e, ao mesmo tempo, mais racional, autoritário e inteligente, que amoroso e sentimental.13 13 COSTA, Jurandir Freire. Ordem médica e norma familiar. 3.ed. Rio de Janeiro: Graal, 1989; SOIHET, 1989; SOIHET, Rachel. Cem anos de violência simbólica: saberes masculinos e representações femininas (1850-1950). Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v.5, n.1, p.7-29, 1997.

Exaustivamente enfatizada durante o século XIX e as primeiras décadas do século XX, essa concepção de feminino e de masculino configurou condutas e restringiu a sexualidade feminina ao universo conjugal. Com efeito, na constituição da moça casadoura o controle da sexualidade era fundamental. A virgindade era considerada um valor que deveria ser mantido a qualquer custo, pois da manutenção do controle da sexualidade das mulheres de uma família dependia a honra familiar. As moças de família, portanto, deveriam sempre lembrar que qualquer deslize colocaria em xeque sua reputação e a de sua família.14 14 A respeito desse assunto, ver PEDRO, Joana Maria. Mulheres honestas e mulheres faladas: uma questão de classe. Florianópolis: Ed. UFSC, 1994.

Dada a importância da atividade sexual na construção da identidade masculina e, simultaneamente, da manutenção da virgindade feminina para a honra familiar, delineiam-se mecanismos que limitam a sexualidade feminina legítima ao casamento e fomenta-se a dominação masculina. Basta lembrar o ditado popular: "segurem suas cabritas, pois meus bodes estão soltos".

Assim, o mesmo movimento que impulsiona o amor para o âmbito do casamento reforça a dupla moral sexual, pois se espera que as moças casadouras mantenham-se puras e castas; quanto aos rapazes, as aventuras sexuais são consideradas parte do processo de aprendizagem da masculinidade hegemônica.15 15 Para Robert W. Connell, a masculinidade é uma configuração complexa e contraditória, que diz respeito tanto às relações sociais quanto aos corpos. Isto porque, em um mesmo contexto histórico, apresentam-se diferentes masculinidades e, ao mesmo tempo, cada forma de masculinidade caracteriza-se internamente por contradições e conflitos. No jogo das masculinidades, a hegemonização de um modelo faz-se a partir de várias formas de masculinidade periféricas, pois, em uma estrutura de gênero, para além das relações de poder e de dominação características da relação homem/mulher, processam-se relações de poder, de dominação, de marginalização e de cumplicidade entre os homens. Assim, a hegemonização de um modelo de masculinidade é transitória. Isto ocorre porque um padrão de masculinidade é objeto de contestações, o que leva à sua transformação no decorrer do tempo. CONNELL, Robert W. Políticas da masculinidade. Educação & Realidade, n.20, v.2, p.185-206, 1995.

Nessa forma de significação das relações entre os homens e as mulheres, cruzam-se as categoria gênero e classe, pois as mulheres com as quais os homens deveriam se iniciar sexualmente eram as mulheres pobres. Eles deveriam saber diferenciar as moças de família, das outras, o que implica estabelecer e manter comportamentos diferentes. Com as mulheres que iniciavam e mantinham uma vida sexual, não deveriam se envolver afetivamente. Deveriam lembrar que não eram mulheres para casar. Com aquelas que mantinham intenções de casamento deveriam evitar os contatos sexuais e todo e qualquer ato que maculasse a reputação da escolhida.

Para os homens, essa forma de classificação das mulheres desencadeia, muitas vezes, uma separação entre afetividade e sexualidade, que gerava situações ambíguas: amar a quem não deseja, desejar a quem não ama e amar e desejar a quem não se deve casar. Enquanto às mulheres se impunha, por um lado, o enredar do amor, do sexo e do casamento que implicava seguir um conjunto de normas, cujo objetivo era controlar o corpo e a sexualidade feminina, em vista a limitá-la ao casamento. Por outro lado, àquelas que não seguiam os preceitos normativos, restava esconder sua condição de desonrada ou a prostituição discreta, dependendo da condição social. E, nesses casos, procurava-se não permitir o casamento.

Na tessitura dessa rede, nas décadas de 1940 e 1950 o namoro foi significado como o momento de formação do par, como uma das etapas do processo de seleção dos cônjuges, em que o sentido era dado pela possibilidade de casamento. O namoro começava como os primeiros olhares, os primeiros sorrisos, os primeiros contatos entre moças e rapazes. O passo seguinte era a individualização do par, momento em que através da iniciativa de aproximação e dos insistentes galanteios do rapaz, a moça deixava-se, paulatinamente, enamorar-se. Em um terceiro momento, ocorreria a oficialização do par, através do noivado que, por sua vez, culminaria no casamento. Quem namorava, deveria namorar para casar. O sentido do namoro era dado, portanto, pela expectativa de casamento.

Assim, namoro sem perspectiva de casamento causava tristeza, como expressa esta quadrinha:

Estava na beira do rio

Pra ver os peixinhos nadar

Não há coisa mais triste

Que namorar pra não casar

Embora namorar para casar constitua a norma e o desejo de muitas jovens, no período em estudo, no conjunto de quadrinhas em análise um dado que chama a atenção é a existência de poucos versos que, como esses, estabelecem a relação direta entre namoro e casamento. As quadrinhas são, portanto, indícios importantes para pensar a diferença entre o ser e o dever ser. Nesse sentido, se o dever era namorar para casar, na prática, poder-se-ia namorar porque namorar é bom!

Lá em cima daquela serra

Tem duas pedras de amolar

Uma amola outra desamola

Coisa boa é namorar

O gosto do namoro poderia ser dado também por competição ou por pirraça, como expressa esta quadrinha:

Atravessei um rio

Nas asas de um besouro

Namoro aquele menino

Por pirraça e desaforo

Ademais, as meninas além de namorarem por pirraça, poderiam fazê-lo aos doze anos sem conhecimento do pai e da mãe, tal qual se diz no verso:

Plantei cebola branca

Na cacimba de beber

Namorei com doze anos

Sem papai, mamãe saber

Namorar por outras finalidades que não o casamento era uma possibilidade que atormentava aos pais e mães de família, bem como a sociedade, posto que o ato de namorar apresentava significados diferentes quando se considera o feminino e o masculino. As moças teriam que fazer tudo para não ser intituladas de namoradeiras, pois as que muito namoravam, lembrava o saber popular, não casavam!

Moça que muito namora

Não ajusta casamento

Um amor de hora em hora

É uma chuva com vento

Dei um nó na fita verde

Tá custando a desatar

Tantos homens que namoro

Tô custando a me casar

Ora, se à moça que tinha muitos namorados, na perspectiva normativa, não ajustava casamento ou isso demorava a acontecer, situação semelhante não ocorria ao rapaz, pois essa era uma possibilidade que exaltava sua condição de conquistador, vista como parte do processo de constituição da masculinidade. O rapaz que obtinha o rótulo de namorador impunha-se no universo dos pares, pois demonstrava sua superioridade em relação aos demais. No universo das práticas, a ação do conquistador poderia incidir até mesmo sobre as colegas da namorada, como nos diz esta quadrinha:

Meu amor comeu pimenta

Pensando que não ardia

Namorou com minha amiga

Pensando que eu não sabia

Mas se o ato de namorar mais de uma moça fazia parte da aprendizagem da masculinidade, não era prática bem aceita por todas as jovens, pois em muitas quadrinhas escritas no feminino se critica o rapaz namorador. Um dos argumentos ressaltados era o de que o homem para ser homem não precisava de dois amores. Em alguns versos, enfatiza-se, também, o desejo da moça de ser a única namorada, como neste exemplo:

Queria ser tudo

Queria ser nada

Queria ser apenas

Sua única namorada

Para parte das mulheres que viveram a juventude na primeira metade do século XX, o desejo de ser a única namorada além de ser impossibilitado pelas práticas de muitos rapazes era, igualmente, vedado pelo fato de muitos pais proibirem suas filhas de namorar. A esse respeito, eis o que diz o verso:

Os pais não devem privar

Suas filhas de querer bem

Amor de pai é forçoso

Como o de rapaz não tem

Em uma perspectiva, essa quadrinha denota o desejo das filhas de namorar; em outra, expressa um conselho aos pais que privam suas filhas de tal prática, lembrando que assim agindo, em vez de manterem o controle sobre as filhas, impulsionavam-lhes a resistência, na medida em que algumas moças namoravam escondidas dos pais, especialmente aqueles rapazes não aprovados:

Menino fala baixo

Que as paredes têm ouvidos

Eu não quero que ninguém saiba

Do nosso amor escondido

Tendo um amor escondido, dada a interdição familiar, algumas moças fugiam para casar com seus escolhidos, como foi o caso da jovem Nazaré, enteada de Lili Castelo Branco.16 16 CASTELO BRANCO, Lili. Fases do meu passado. Teresina: [s.n.], 1983. Contudo, nem todos os pais proibiam as filhas de namorar, desde que o namoro vislumbrasse o casamento e seguisse as normas e a moral dominante. Como, então, se firmava um namoro segundo a moral dominante?

Em geral, o namoro era iniciado a partir de um encontro casual ou não, onde ocorriam as primeiras trocas de olhares e, cautelosamente, as primeiras insinuações de interesse mútuo. Entre o final do século XIX e o início do século XX, os bailes familiares eram lugares privilegiados para o início dos namoros. Eram uma das poucas oportunidades em que rapazes e moças poderiam gozar de certa liberdade vigiada, da possibilidade de trocar olhares, sorrisos, de conversar e de dançar.17 17 CASTELO BRANCO, Pedro Vilarinho. Mulheres plurais: a condição feminina na Primeira República. 2.ed. Recife: Bagaço, 2005c.

Segundo Thales de Azevedo, um marco na transformação do namoro foi a modernização das grandes cidades, com a respectiva institucionalização do footing, passeio das jovens e dos jovens da elite pelas ruas e avenidas modernizadas, como a avenida Rio Branco, no Rio de Janeiro e também em praças, jardins, sorveterias e cafés. Isto porque o footing era o momento ideal para o flerte, "um primeiro comércio de olhares aparentemente casuais, de sorrisos, de gestos significativos. Seria a primeira vez que as moças se expunham deliberadamente, ainda que de modo dissimulado, à conquista em vista do namoro". Esse "primeiro comércio de olhares", para usar expressões de Thales de Azevedo, tanto poderia constituir uma finalidade em si mesmo, quanto ser uma etapa do namoro.18 18 AZEVEDO, Thales. As regras do namoro à antiga. São Paulo: Ática, 1986. p.15-16.

Em Teresina, o espaço do footing elegante era a praça Rio Branco, onde foi inaugurado, em 1914, um passeio público. Além de tornar-se um dos principais pontos de convívio social, essa praça também se configurou em lugar privilegiado do moderno flerte. Acompanhadas por responsáveis ou em grupos, as moças tornaram-se assíduas freqüentadoras do local, especialmente às quintas-feiras e aos domingos, oportunidade em que o passeio era animado por uma banda de música.

Em pesquisa realizada a respeito do acesso das mulheres ao ensino superior em Teresina, pude constatar que, nas décadas de 1940 e 1950, o flerte também era largamente praticado nas instituições de ensino e em seu entorno. Algumas instituições adotavam até mesmo mecanismos disciplinares no intuito de evitar o contato entre os jovens e as jovens. No Ginásio Leão XIII, por exemplo, o recreio ocorria em horários diferentes, para evitar o contato sem a supervisão do professor ou da professora. As freiras do Colégio Sagrado Coração de Jesus, popularizado como Colégio das Irmãs, costumavam expulsar os meninos-rapazes que teimavam em se exibir às meninas-moças nas calçadas dessa instituição.19 19 CARDOSO, Elizangela Barbosa. Múltiplas e singulares: história e memória de estudantes universitárias em Teresina (1930-1970). Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 2003.

Nessas décadas, o espaço privilegiado para o flerte era a praça Pedro II. Para moças e rapazes, o passeio por essa praça era a principal oportunidade para se oferecerem no mercado sentimental. No caso das moças era momento, também, para burlar as regras dominantes do namoro, uma vez que o flerte era significado como uma etapa inicial do namoro, assim não se deveria flertar com mais de um rapaz, nem com aqueles que fossem comprometidos. Na prática, algumas moças aproveitavam o momento em que podiam circular na praça, em geral, das 7 às 9 horas da noite, para flertar com mais de um rapaz ao mesmo tempo, não se preocupando em firmar um namoro.

Àquelas que desejavam um namoro firme, mandava o bom senso que buscassem informações a respeito do rapaz com o qual estavam flertando, comumente obtidas através da rede de comunicação composta pelas amigas. As moças deveriam buscar dados, especialmente, a respeito da origem familiar e do tipo de comportamento do rapaz, pois nem todos os rapazes serviam para namorar e casar. Para namorar, as moças deveriam escolher alguém que tivesse certo grau de estudo, preferencialmente o jovem formado, que tivesse emprego ou boas perspectivas de tê-lo no futuro. Deveriam escolher alguém que pudesse desempenhar a contento o papel de provedor familiar e que procedesse de boa família. O que significava dizer, um rapaz que possuísse situação social no mínimo compatível com a da moça e um futuro promissor, filho de pais devidamente casados, cujo lar fosse estruturado. Recomendava-se, também, que as moças procurassem rapazes um pouco mais velhos. Era preciso observar, igualmente, se o rapaz escolhido não era namorador e se tinha boas intenções, isto é, se pretendia casar, pois sobre os rapazes pairava o fantasma do aproveitador, daquele que, na verdade, queria apenas desonrar as filhas alheias. Repetir essas recomendações era tido como fundamental, uma vez que os tempos eram considerados outros e muitas moças e rapazes alegremente recitavam:

Se amar fosse crime

Se beijar fosse pecado

O céu estaria vazio

E o inferno estaria lotado

Dizem que beijo na boca

É um pecado horroroso

Não sei por que Deus deixou

Este pecado tão gostoso

Os critérios ideais nem sempre coincidiam com os parâmetros usados pelas moças no momento de escolha do namorado. Algumas, ao escolherem um rapaz para namorar, observavam se era bonito, simpático, alegre e bem vestido, e se sabia dançar. Assim, diante da conquista amorosa uma moça poderia enfatizar:

Gosto da rosa branca

Porque nasce no sereno

Gosto do meu benzinho

Porque é lindo e moreno

Outra moça, por sua vez, poderia ressaltar que gosta de seu benzinho porque é lindo, moreno e possui uma bela boca. Isto porque segundo o que se observa nas quadrinhas, a boca era e continua sendo uma parte do corpo considerada sedutora e objeto de desejo de rapazes e de moças. São muitos os versos que a erotizam e expressam o prazer do beijá-la. Eis alguns exemplos:

Beijo na boca

É dado com emoção

Não deixa sinal nos lábios

Mas deixa no coração

É triste ver uma estrela

E não poder pegar

É triste ver sua boca

E não poder beijar

Amor é sempre mistura

De sentimento e desejo

Trazendo a gente a ventura

De unir as amas num beijo

Toda vez que te vejo

Fico louca para te beijar

O sangue corre nas veias

O coração sai do lugar

Ora, se beijo na boca era dado com emoção, fazendo o sangue correr rapidamente nas veias, nas décadas de 1940 e 1950 as moças que desejavam casar não deveriam se deixar beijar com facilidade, muito menos em público, pois isso maculava sua imagem. E os rapazes, assim como as moças, ao se interessarem por alguém, costumavam investigar sua vida sentimental. As informações obtidas serviam de parâmetro inicial ao desenvolvimento do relacionamento. Isto porque os jovens deveriam classificar as jovens a partir das intimidades que, supostamente, permitiam. Para namorar com vista ao casamento a expectativa dos rapazes era a de que as moças obedecessem ao padrão normativo. Um rapaz que desejava firmar namoro consideraria desde a imagem da moça aos mínimos comportamentos, observando a maneira de ser da escolhida a partir do flerte. Caso o flerte levasse ao namoro, deveria lembrar que uma moça direita não se deixa convencer rapidamente, mostrando-se sempre cautelosa e reservada. A respeito desse jogo amoroso, eis o que diz a quadrinha:

Menina que diz que sim

E ao mesmo tempo que não

Anda cá perto de mim

Te quero pegar na mão

A posição das moças era extremamente delicada, pois ao mesmo tempo em que articulavam códigos e condutas para conquistar um namorado, tinham que demonstrar, desde o flerte, que eram dignas de respeito. Isso implicava não fazer uso do corpo, não expor abertamente os desejos e sentimentos, equilibrar-se na tênue linha entre a oferta e a reserva, para que pudessem se tornar noivas e, posteriormente, esposas. Essa posição ambígua requeria que as moças fossem reticentes, que soubessem elaborar uma política de valorização pessoal, uma vez que seus comportamentos eram constantemente avaliados e dependiam de aprovação masculina. Afinal de contas, comumente se repetia que, somente aquelas cujos comportamentos fossem aprovados, poderiam ouvir esta quadrinha:

Gostei muito dos seus modos

E do seu procedimento

Vou pedir para seus pais

Sua mão em casamento

Assim, para que futuramente sua mão fosse pedida em casamento, a moça casadoura deveria observar mais dois preceitos básicos. Em primeiro lugar, ao se deixar acompanhar pelo rapaz após o flerte, não aceitar o namoro imediatamente. Em segundo lugar, em momento posterior, quando o namoro estivesse firmado e, mesmo durante o noivado, resistir às investidas mais ousadas do pretendente, lembrando-se de que ao rapaz cabia insistir; à moça, resistir! Isto porque as que muito cediam, pensando agradar, na verdade, muito perdiam! Esse jogo de insistência e resistência é ilustrado nesta quadrinha:

Eu queria, ela queria

Eu pedia, ela não dava

Eu chegava, ela fugia

Eu fugia, ela chorava

Àquelas que diante da insistência cediam, os rapazes diziam:

As meninas me incriminam

Por eu ser muito pidão

Eu peço porque careço

Mas elas por que me dão?

Na tessitura da resposta, aparentemente, um raciocínio muito comum aos rapazes era este: "se ela me deu, dará aos outros, também! Não serve para casar! Não é digna de meu nome e de minha família!". Na resposta, portanto, não se considerava que as moças também poderiam estar "festejando seus corpos", para usar expressões de Rachel Soihet.20 20 SOIHET, Rachel. A sensualidade em festa: representações do corpo feminino nas festas populares no Rio de Janeiro na virada do século XIX para o XX. In: MATOS, Maria Izilda Santos de; SOIHET, Rachel (Org.). O corpo feminino em debate. São Paulo: Ed. Unesp, 2003. p.177-197.

É certo que no jogo amoroso as moças situavam-se em terreno movediço. Para trilhá-lo, os laços de amizade eram de fundamental importância, pois a formação de uma rede de solidariedade feminina criava condições para que, paralelamente, as moças se oferecessem no mercado matrimonial e mantivessem a reserva. Em muitos casos, uma amiga intermediava o contato entre os futuros enamorados, sondando o rapaz acerca de seus interesses, levando bilhetes e possibilitando encontros. Além disso, a integração de uma jovem a um grupo de moças possibilitava sua circulação nos espaços públicos, uma vez que moças de família não deveriam andar sozinhas, mas sempre acompanhadas por responsáveis ou em grupo.

Contudo, as solidariedades femininas poderiam ser rompidas quando um mesmo rapaz se tornava o alvo do desejo de mais de uma moça pertencente ao mesmo grupo. Nesse caso, a amiga de ontem, diante das maiores possibilidades de contato com o rapaz, poderia aproveitar-se da situação para firmar namoro, transmutando-se na rival. Essa situação era fomentada, aparentemente, pela maior oferta de moças no mercado matrimonial.

As rivalidades femininas podem ser compreendidas como estratégia de dominação masculina, na medida em que, na competição pelo rapaz, uma moça se valoriza em detrimento da outra. Nesse procedimento, significa-se a partir dos preceitos dominantes, em termos de beleza, padrão de moralidade e códigos de sexualidade. Assim, uma se qualifica como moça de família, bela, casta e contida, enquanto a outra é intitulada de mal falada. Nesse movimento, contribuem para acentuar a divisão entre moças casadouras e não casadouras. Isto em um universo no qual o casamento era significado, segundo preceitos dominantes, como o futuro feminino, o grande ideal de todas as mulheres, uma maneira de manter o status e uma forma de ascensão social.

Nesse contexto, tanto por ação masculina quanto por aceitação feminina dos valores dominantes é criado um sistema normativo que visa assegurar que as mulheres não façam uso de seus corpos, desde as pequenas explorações à vivência da sexualidade, fora dos laços do matrimônio.

As relações entre os gêneros, entretanto, são mais complexas que o previsto na perspectiva normativa. No que diz respeito às representações femininas, por exemplo, a mal falada pode ser vista, também, como um deslocamento, por situar-se entre a moça direita e a prostituta. A mal falada é uma representação que permite indicar a pluralidade dos comportamentos femininos nos segmentos sociais mais abastados e, simultaneamente, insinuar a diferença entre os papéis prescritos e as vivências, uma vez que a mal falada é aquela que ousa, é aquela que através de suas práticas contesta os preceitos dominantes. A mal falada é aquela que flerta com vários rapazes; aceita o namoro rapidamente; namora por namorar, sai sozinha com o namorado; troca constantemente de namorado; deixa-se asfixiar nos bailes; beija em público, entra no carro do namorado sozinha; não respeita horários; concede intimidades ao namorado, dentre outros comportamentos. Em outros termos, a mal falada é aquela que atua nas brechas da dominação masculina e por meio de suas ínfimas ações corrói a ordem por dentro.21 21 A respeito do conceito de representação, ver CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel; Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990; acerca das brechas na invenção do cotidiano, ver CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: 1. artes de fazer. 5.ed. Petrópolis (RJ): Vozes, 2000.

A família e a sociedade, estrategicamente, procuram produzir moças e rapazes que apresentem comportamentos ideais e que saibam escolher, no âmbito do mercado sentimental, aqueles e aquelas que melhor se ajustam aos preceitos dominantes. Paralelamente, configuram-se experiências individuais que se situam para além da norma, como é o caso das moças que foram intituladas de mal faladas.

A possibilidade de as jovens e os jovens vivenciarem experiências que fugiam à norma, ao que parece, além de impulsionar a constante disciplinarização dos corpos,22 22 A respeito da incidência do poder disciplinar nos corpos, ver FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. 23.ed. Petrópolis (RJ): Vozes, 2000. via instituição do autocontrole, também justificava o controle direto dos enamorados pela família e pela sociedade. Isso ocorria na trajetória que ia do flerte ao casamento. Iniciava-se com o reconhecimento ou não do par, visto que a família, os amigos e as amigas, os conhecidos e as conhecidas criam mecanismos que ora fortalecem, ora minam o vínculo estabelecido pelos enamorados. Em segundo momento, o namoro que, em geral, surgia na rua, nos lugares em que o flerte era possível, ao tornar-se reconhecido pela família da moça passa a ocorrer, sobretudo, em sua casa. Nesse espaço, os enamorados deveriam ser constantemente vigiados. O rapaz e a moça não deveriam ficar completamente à vontade, com vista a evitar contatos sexuais antes do casamento.

Os cuidados deveriam ser redobrados quando do noivado, pois essa etapa era significada como um período difícil, um momento em que os noivos passavam a estar mais sujeitos às tentações da carne. O maior perigo para a honra da moça, portanto, não vinha de fora, mas de alguém próximo da casa, o noivo. Sobre ele recaía a suspeita de ser um aproveitador, de ser alguém que se insinuava no seio da família com proposta de casamento quando, na verdade, objetivava trazer desonra ao seio familiar.

Por conseguinte, os pais e mães de família procuravam evitar que suas filhas recitassem estes versos:

Meu bem me deu um beijo

Que o chão estremeceu

Depois de nove meses

Um bebê apareceu

Além do risco de nascimento de um fruto nove meses depois do beijo, as moças que exploravam a sexualidade fora do casamento estavam sob as ameaças de abandono e desamor. Isto porque, constantemente, os rapazes se desinteressavam por suas namoradas ou noivas após contatos sexuais. Em uns casos, as abandonavam; em outros, casavam sob pressão familiar.

Esse comportamento pode ser parcialmente explicado pela aceitação dos valores dominantes a respeito das sexualidades feminina e masculina, uma vez que, recorrentemente, afirma-se a clivagem entre sexo e amor no universo masculino, incitando-os a iniciarem-se, sexualmente, com as mulheres com as quais não deviam casar. E, ao mesmo tempo, argumenta-se que a moça casadoura deve ser pura, que seu corpo deve ser conhecido em momento certo – a noite de núpcias. Ademais, reforça-se que a felicidade conjugal depende em grande medida do fato de a moça ter sabido se resguardar para o casamento. Assim, mesmo nos casos em que houve casamento, após a vivência sexual no namoro ou noivado, enfatiza-se que tal prática é danosa ao casamento, por trazer infelicidade ao casal.

A despeito do conjunto de preceitos normativos, ao se considerar o conjunto de quadrinhas organizado por Áurea Queiroz, irrompem afirmações de desejo e de sentimentos femininos, que ora reforçam o dever ser, ora expressam outra forma de ser ou, mesmo, denotam paralelamente o que deve e o que não deve acontecer. Neste último caso, várias quadrinhas cujo tema é o casamento constituem exemplos, uma vez que querer casar e namorar para casar é um dever, mas expressar o desejo, ao contrário, não é considerado um bom procedimento. E eis o que dizem as quadrinhas:

Gosto da cor verde

Porque é a cor da esperança

Quero me casar com você

Pra ter uma linda criança

Da minha casa pra sua

Tem duas ramas de abóbora

Tenho muita fé em Deus

De chamar sua mãe de sogra

Mandei fazer uma casa

No alto da ventania

Pra mostrar para minha sogra

Como entro na família

Diga pra sua mãe

Que entre nós não há perigo

Quero ela como sogra

E você como marido

Quero ser sua companheira

Quero ser sua namorada

Quero sentir seu calor

Em sua boca beijada

Além de beijar, namorar e casar, nos versos de Quadrinhas populares o desejo que emerge com mais força talvez seja o desejo de amar. O amor é um assunto recorrente, atravessando os diversos temas sobre os quais abordam as quadrinhas. Aparece ao lado da amizade, da esperança, da paixão e da saudade.

Repetidas vezes os versos dizem que da amizade pode nascer o amor.

Amizade é muito bela

Mas às vezes faz sofrer

De uma simples amizade

O amor pode nascer

E, ao nascer, a esperança é o sentimento que conforta a quem só quer e só pensa em namorar. É sentimento que fortalece e conforta, diante da espera do Outro. É uma forma de dar significado ao futuro. O fato de se ter esperança faz esperar a chegada de alguém que satisfará o desejo de amar, mesmo que o amado pertença a outra, como enfatizam estes versos:

Mesmo que você goste de outra

Não deixo de te amar

Pois quem ama de verdade

Não se cansa de esperar.

A saudade, por sua vez, é a companheira de quem ama:

Ontem éramos três

Eu, você e a felicidade

Hoje somos dois

Eu e saudade

Situando o amor ao lado da amizade, da esperança e da saudade, as quadrinhas que tratam desse sentimento são plurais e apresentam conselhos, concepções de mundo, formas ideais de homens e mulheres se portarem diante do amor, bem como formas alternativas de significá-lo. O amor surge como sentimento que nomeia o mundo subjetivo feminino, como sentimento através do qual o futuro ganha significado, uma vez que o amor é um meio para se alcançar a felicidade:

A paz traz harmonia

Harmonia traz bondade

A bondade traz amor

O amor a felicidade

O amor é também um sentimento que marca a vida, que serve de parâmetro para situar o passado e o futuro. É sentimento que vence o tempo, posto que, se o tempo traz mudanças, o amor ajuda a permanecer. Como dizem os versos,

O tempo passa

O mundo envelhece

Mas de um grande amor

A gente nunca esquece

O amor é um sentimento

Difícil de entender

Quanto mais o tempo passa

Mais desejo amar você

Minha vida são duas vidas

E hoje entendo por que

Uma em tempos passados

Outra depois de você

É um sentimento que promete e cobra exclusividade!

Perante o crime

Eu sou inocente

Perante o amor

Sou sua somente

Amor te quero amar

Como nunca amei na vida

Só quero que tu me deixes

Ser sempre tua querida

É, ainda, uma forma de ressignificar aprendizagens, pois

Se amar for pecado

Nunca serei inocente

Há no mundo um rapaz

Que amo loucamente

É, também, sentimento atravessado pelo gênero, ao se dizer que

Mulher não é aquela

Que ama cem homens

Mas sim aquela que ama

Cem vezes o mesmo homem

O amor é, igualmente, substantivo que requer adjetivos plurais, dada a existência de amores novos, velhos, verdadeiros, impedidos, falsos, fingidos e sinceros. A respeito dessa pluralidade, vejamos o que dizem os versos:

Só corto bananeira

Quando o cacho está maduro

Só deixo amor velho

Quando o novo está seguro

A flor sem perfume

Uma flor sem qualidade

O amor sem ciúmes

Não é amor de verdade

O amor quando é sincero

Merece consideração

Mas quando é fingido

Merece uma traição

Nas diversas quadrinhas que abordam o amor predominam faces do amor romântico. Essa forma de amor, segundo alguns historiadores, teria emergido na Europa entre os séculos XVIII e XIX. Para outros, trata-se de especificidade cultural presente na Inglaterra, desde a Idade Média, que se generalizou como padrão de significação das relações amorosas, no Ocidente, a partir do advento da industrialização, da urbanização e das relações capitalistas. Isto porque essas mudanças teriam rompido os laços que prendiam os indivíduos à comunidade e, em lugar desses liames, teria emergido o amor romântico como forma de compensação e refúgio para a solidão.23 23 MACFARLANE, Alan. Amor: amor e capitalismo. In: _______. A cultura do capitalismo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1987. p.158-189.

Os indícios presentes nas quadrinhas sugerem que o amor romântico incidiu, no período estudado, especialmente sobre as mulheres, ora reforçando os preceitos normativos, ora contestando-os, uma vez que o amor poderia ser bastante subversivo. Para Giddens, "o ethos do amor romântico teve um impacto duplo sobre a situação das mulheres. Por um lado, ajudou a colocar as mulheres 'em seu lugar' – o lar. Por outro, entretanto, o amor romântico pode ser encarado como um compromisso ativo e radical com o 'machismo' da sociedade moderna".24 24 GIDDENS, Anthony. A transformação da intimidade: sexualidade, amor e erotismo nas sociedades modernas. 2.reimpr. São Paulo: Ed. Unesp, 1993. p.10.

Essas afirmações podem ser compreendidas ao se ressaltar que, no entrelaçar do amor, da sexualidade e do casamento, procurou-se limitar a sexualidade feminina ao universo conjugal e, ao mesmo tempo, elegeu-se o casamento como espaço de realização e a maternidade como obrigatória. O que, por sua vez, serviu de justificativa para tolher aquelas que buscavam delinear identidades femininas alternativas, descentradas do casamento e da maternidade, nesse movimento, reforçando a dominação masculina.

Os versos de Quadrinhas populares também apontam para outra transformação estudada por Giddens, a transformação da intimidade no mundo contemporâneo, decorrente em grande medida da mudança de posição feminina diante do corpo e da sexualidade, cujo marco cronológico é a década de 1960.

Nesses anos, o usufruto da sexualidade feminina torna-se uma possibilidade. A esse respeito, Teresinha Queiroz sugere a hipótese de que o intercurso não seria o dado mais relevante no período, mas a possibilidade de sensualização do corpo, de exploração erótica, de usufruir a sensualidade sem o aprisionamento do casamento.25 25 QUEIROZ, Teresinha. Do singular ao plural. Teresina: Halley, 2006. Com intercurso ou não, os novos usos do corpo das jovens corroboram a invenção de uma nova maneira de significar a sexualidade feminina, desligando-a do casamento e da procriação.

As novas vivências femininas quanto ao corpo e à sexualidade surgem em um período caracterizado por um intenso desarranjo existencial, diante do impacto da condição pós-moderna nos marcos identitários tradicionais, conforme enfatiza Edwar de Alencar Castelo Branco. Para esse autor, na década de 1960 o poder jovem e o corpo irrompem no cenário político, assim como são delineadas novas experiências de tempo e de espaço. Com efeito, fragmentam-se, aceleradamente, as paisagens culturais tradicionais, especialmente, concepções de gênero e de sexualidade. No universo masculino, segundo o autor, a configuração de novos padrões de uso do corpo e da sexualidade foi um papel histórico da geração de jovens tropicalistas. Isto porque, se "hoje é relativamente tranqüilo pensar – e testemunhar – opções homoeróticas feitas por homens e mulheres, isto se deve, em grande medida, às intervenções deliberadas daquela geração nesta temática".26 26 CASTELO BRANCO, Edwar de Alencar. Todos os dias de Paupéria: Torquato Neto e a invenção da tropicália. São Paulo: Annablume, 2005; CASTELO BRANCO, Edwar de Alencar. Ele é o homem. Eu sou apenas uma mulher: corpo, gênero e sexualidade entre as vanguardas tropicalistas. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL FAZENDO GÊNERO, 7: GÊNERO E PRECONCEITOS, 2006, Florianópolis. Anais... Florianópolis: Ed. Mulheres, 2006. 1CD-ROM. p.5.

No mesmo contexto, o tema sexualidade feminina vai deixando de ser assunto interditado às mulheres, passando a ser enunciado e problematizado. Isso ocorre de maneira notória quando da configuração e desenvolvimento do movimento feminista. Rachel Soihet, que estudou a emergência desse movimento e a luta das mulheres pela cidadania no Rio de Janeiro entre o final da década de 1960 e o ano de 1980, afirma que o movimento feminista, dentre outras demandas, abordou o tema da mulher sexualizada e defendeu que as mulheres assumissem o corpo e a sexualidade em sentido pleno. Além disso, buscou quebrar os padrões patriarcais de família, as normas de beleza, o tabu da virgindade obrigatória das mulheres e a legítima defesa da honra. Um impacto desse movimento foi a ampliação das culturas políticas vigentes, conforme acrescenta a autora.27 27 SOIHET, Rachel. Feminismo x antifeminismo de libertários: a luta das mulheres pela cidadania durante o regime autoritário. In: SOIHET, Rachel; BICALHO, Maria Fernanda Baptista; GOUVEA, Maria de Fátima (Org.). Culturas políticas: ensaios de história cultural, história política e ensino de história. Rio de Janeiro: Mauad, 2005. v.1. p.307-332.

Na confluência do feminismo e de práticas cotidianas que fraturaram a limitação da sexualidade feminina à conjugalidade, durante as três últimas décadas do século XX, ainda que a experiência sexual feminina se configure em termos plurais, pode-se sugerir que de possibilidade a sexualidade feminina passou a ser considerada pelas mulheres como um direito.

Nas quadrinhas analisadas, alguns versos apontam para essa mudança, como também para outras situações contemporâneas tais como: a clivagem entre sexo e amor, ao insinuar diferenças entre práticas sexuais e práticas amorosas; as novas formas de namoro, que incluem as práticas sexuais; as ambigüidades e tensões inerentes a essas novas práticas e, por último, o fosso sentimental que se instalou dentre os homens e as mulheres.

Esse fosso sentimental, de difícil compreensão, uma vez que diz respeito às virtualidades do nosso tempo, aparentemente relaciona-se com a coexistência, no mundo contemporâneo, de homens e mulheres que significam suas vidas a partir de valores distintos. No mesmo espaço figuram mulheres que passaram a significar a sexualidade como um direito e homens que continuam classificando as mulheres em "para casar" e "para usufruir prazer sexual".

Diante das demandas de nosso tempo, as quadrinhas analisadas nos falam do passado e do presente, delineando uma cartografia sentimental do século XX, expressa no feminino e no masculino. Em conjunto, nos ajudam a refletir a respeito das formas pelas quais as teias da cultura nos capturam e nos transformam em mulheres e em homens.

NOTAS

Artigo recebido em novembro de 2007.

Aprovado em dezembro de 2007.

  • 1 Joan Scott argumenta que, numa primeira significação, gênero é "um elemento constitutivo das relações sociais baseadas nas diferenças percebidas entre os sexos", e numa segunda perspectiva é "uma forma primária de dar significado às relações de poder". SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação & Realidade, n.20, v.2, p.86, 1995.
  • 2 QUEIROZ, Áurea. Quadrinhas populares Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 2006.
  • 3 ROLNIK, Suely. Cartografia sentimental São Paulo: Estação Liberdade, 1989.
  • 4 SOIHET, Rachel. Condição feminina e formas de violência Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989;
  • SOIHET, Rachel. Mulheres pobres e violência no Brasil urbano. In: PRIORE, Mary Del (Org.). História das mulheres no Brasil 7.ed. São Paulo: Contexto, 2004. p.362-400.
  • 5 FALCI, Miridan Knox. Mulheres do sertão nordestino. In: PRIORE, Mary Del (Org.). História das mulheres no Brasil, 2004, p.241-277.
  • 6 FALCI, 2004; NAZZARI, Muriel. O desaparecimento do dote: mulheres, famílias e mudança social em São Paulo, Brasil, 1600-1900. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
  • 7 FALCI, 2004; CASTELO BRANCO, Pedro Vilarinho. Famílias e escritas 2005. Tese (Doutorado em História) Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2005a.
  • 8 PRIORE, Mary Del. História do amor no Brasil. São Paulo: Contexto, 2005.
  • 9 A respeito desse processo, ver: RAGO, Margareth. Do cabaré ao lar Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985;
  • RAGO, Margareth. Os prazeres da noite Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991;
  • SOIHET, 1989; SOIHET, 2004; ESTEVES, Martha de Abreu. Meninas perdidas Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989;
  • BESSE, Susan K. Modernizando a desigualdade. São Paulo: Edusp, 1999;
  • ALBUQUERQUE JR., Durval Muniz. Nordestino: uma invenção do falo. Maceió: Catavento, 2003.
  • 10 CASTELO BRANCO, 2005a; CASTELO BRANCO, Pedro Vilarinho. Masculinidades plurais. Unisinos, São Leopoldo, n.2, v.9, p.85-95, 2005b.
  • 11 GAY, Peter. A experiência burguesa da Rainha Vitória a Freud: a educação dos sentidos. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.
  • 12 NOLASCO, Sócrates. O mito da masculinidade Rio de Janeiro: Rocco, 1995.
  • 13 COSTA, Jurandir Freire. Ordem médica e norma familiar 3.ed. Rio de Janeiro: Graal, 1989;
  • SOIHET, 1989; SOIHET, Rachel. Cem anos de violência simbólica: saberes masculinos e representações femininas (1850-1950). Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v.5, n.1, p.7-29, 1997.
  • 14 A respeito desse assunto, ver PEDRO, Joana Maria. Mulheres honestas e mulheres faladas: uma questão de classe. Florianópolis: Ed. UFSC, 1994.
  • 15 Para Robert W. Connell, a masculinidade é uma configuração complexa e contraditória, que diz respeito tanto às relações sociais quanto aos corpos. Isto porque, em um mesmo contexto histórico, apresentam-se diferentes masculinidades e, ao mesmo tempo, cada forma de masculinidade caracteriza-se internamente por contradições e conflitos. No jogo das masculinidades, a hegemonização de um modelo faz-se a partir de várias formas de masculinidade periféricas, pois, em uma estrutura de gênero, para além das relações de poder e de dominação características da relação homem/mulher, processam-se relações de poder, de dominação, de marginalização e de cumplicidade entre os homens. Assim, a hegemonização de um modelo de masculinidade é transitória. Isto ocorre porque um padrão de masculinidade é objeto de contestações, o que leva à sua transformação no decorrer do tempo. CONNELL, Robert W. Políticas da masculinidade. Educação & Realidade, n.20, v.2, p.185-206, 1995.
  • 16 CASTELO BRANCO, Lili. Fases do meu passado Teresina: [s.n.], 1983.
  • 17 CASTELO BRANCO, Pedro Vilarinho. Mulheres plurais: a condição feminina na Primeira República. 2.ed. Recife: Bagaço, 2005c.
  • 18 AZEVEDO, Thales. As regras do namoro à antiga São Paulo: Ática, 1986. p.15-16.
  • 19 CARDOSO, Elizangela Barbosa. Múltiplas e singulares: história e memória de estudantes universitárias em Teresina (1930-1970). Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 2003.
  • 20 SOIHET, Rachel. A sensualidade em festa: representações do corpo feminino nas festas populares no Rio de Janeiro na virada do século XIX para o XX. In: MATOS, Maria Izilda Santos de; SOIHET, Rachel (Org.). O corpo feminino em debate São Paulo: Ed. Unesp, 2003. p.177-197.
  • 21 A respeito do conceito de representação, ver CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel; Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990;
  • acerca das brechas na invenção do cotidiano, ver CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: 1. artes de fazer. 5.ed. Petrópolis (RJ): Vozes, 2000.
  • 22 A respeito da incidência do poder disciplinar nos corpos, ver FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir 23.ed. Petrópolis (RJ): Vozes, 2000.
  • 23 MACFARLANE, Alan. Amor: amor e capitalismo. In: _______. A cultura do capitalismo Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1987. p.158-189.
  • 24 GIDDENS, Anthony. A transformação da intimidade: sexualidade, amor e erotismo nas sociedades modernas. 2.reimpr. São Paulo: Ed. Unesp, 1993. p.10.
  • 25 QUEIROZ, Teresinha. Do singular ao plural Teresina: Halley, 2006.
  • 26 CASTELO BRANCO, Edwar de Alencar. Todos os dias de Paupéria: Torquato Neto e a invenção da tropicália. São Paulo: Annablume, 2005;
  • CASTELO BRANCO, Edwar de Alencar. Ele é o homem. Eu sou apenas uma mulher: corpo, gênero e sexualidade entre as vanguardas tropicalistas. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL FAZENDO GÊNERO, 7: GÊNERO E PRECONCEITOS, 2006, Florianópolis. Anais... Florianópolis: Ed. Mulheres, 2006. 1CD-ROM. p.5.
  • 27 SOIHET, Rachel. Feminismo x antifeminismo de libertários: a luta das mulheres pela cidadania durante o regime autoritário. In: SOIHET, Rachel; BICALHO, Maria Fernanda Baptista; GOUVEA, Maria de Fátima (Org.). Culturas políticas: ensaios de história cultural, história política e ensino de história. Rio de Janeiro: Mauad, 2005. v.1. p.307-332.
  • 1
    Joan Scott argumenta que, numa primeira significação, gênero é "um elemento constitutivo das relações sociais baseadas nas diferenças percebidas entre os sexos", e numa segunda perspectiva é "uma forma primária de dar significado às relações de poder". SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil de análise histórica.
    Educação & Realidade, n.20, v.2, p.86, 1995.
  • 2
    QUEIROZ, Áurea.
    Quadrinhas populares. Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 2006.
  • 3
    ROLNIK, Suely.
    Cartografia sentimental. São Paulo: Estação Liberdade, 1989.
  • 4
    SOIHET, Rachel.
    Condição feminina e formas de violência. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989; SOIHET, Rachel. Mulheres pobres e violência no Brasil urbano. In: PRIORE, Mary Del (Org.).
    História das mulheres no Brasil. 7.ed. São Paulo: Contexto, 2004. p.362-400.
  • 5
    FALCI, Miridan Knox. Mulheres do sertão nordestino. In: PRIORE, Mary Del (Org.).
    História das mulheres no Brasil, 2004, p.241-277.
  • 6
    FALCI, 2004; NAZZARI, Muriel.
    O desaparecimento do dote: mulheres, famílias e mudança social em São Paulo, Brasil, 1600-1900. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
  • 7
    FALCI, 2004; CASTELO BRANCO, Pedro Vilarinho.
    Famílias e escritas. 2005. Tese (Doutorado em História) – Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2005a.
  • 8
    PRIORE, Mary Del.
    História do amor no Brasil. São Paulo: Contexto, 2005.
  • 9
    A respeito desse processo, ver: RAGO, Margareth.
    Do cabaré ao lar. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985; RAGO, Margareth.
    Os prazeres da noite. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991; SOIHET, 1989; SOIHET, 2004; ESTEVES, Martha de Abreu.
    Meninas perdidas. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989; BESSE, Susan K.
    Modernizando a desigualdade. São Paulo: Edusp, 1999; ALBUQUERQUE JR., Durval Muniz.
    Nordestino: uma invenção do falo. Maceió: Catavento, 2003.
  • 10
    CASTELO BRANCO, 2005a; CASTELO BRANCO, Pedro Vilarinho. Masculinidades plurais.
    Unisinos, São Leopoldo, n.2, v.9, p.85-95, 2005b.
  • 11
    GAY, Peter.
    A experiência burguesa da Rainha Vitória a Freud: a educação dos sentidos. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.
  • 12
    NOLASCO, Sócrates.
    O mito da masculinidade. Rio de Janeiro: Rocco, 1995.
  • 13
    COSTA, Jurandir Freire.
    Ordem médica e norma familiar. 3.ed. Rio de Janeiro: Graal, 1989; SOIHET, 1989; SOIHET, Rachel. Cem anos de violência simbólica: saberes masculinos e representações femininas (1850-1950).
    Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v.5, n.1, p.7-29, 1997.
  • 14
    A respeito desse assunto, ver PEDRO, Joana Maria.
    Mulheres honestas e mulheres faladas: uma questão de classe. Florianópolis: Ed. UFSC, 1994.
  • 15
    Para Robert W. Connell, a masculinidade é uma configuração complexa e contraditória, que diz respeito tanto às relações sociais quanto aos corpos. Isto porque, em um mesmo contexto histórico, apresentam-se diferentes masculinidades e, ao mesmo tempo, cada forma de masculinidade caracteriza-se internamente por contradições e conflitos. No jogo das masculinidades, a hegemonização de um modelo faz-se a partir de várias formas de masculinidade periféricas, pois, em uma estrutura de gênero, para além das relações de poder e de dominação características da relação homem/mulher, processam-se relações de poder, de dominação, de marginalização e de cumplicidade entre os homens. Assim, a hegemonização de um modelo de masculinidade é transitória. Isto ocorre porque um padrão de masculinidade é objeto de contestações, o que leva à sua transformação no decorrer do tempo. CONNELL, Robert W. Políticas da masculinidade.
    Educação & Realidade, n.20, v.2, p.185-206, 1995.
  • 16
    CASTELO BRANCO, Lili.
    Fases do meu passado. Teresina: [s.n.], 1983.
  • 17
    CASTELO BRANCO, Pedro Vilarinho.
    Mulheres plurais: a condição feminina na Primeira República. 2.ed. Recife: Bagaço, 2005c.
  • 18
    AZEVEDO, Thales.
    As regras do namoro à antiga. São Paulo: Ática, 1986. p.15-16.
  • 19
    CARDOSO, Elizangela Barbosa.
    Múltiplas e singulares: história e memória de estudantes universitárias em Teresina (1930-1970). Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 2003.
  • 20
    SOIHET, Rachel. A sensualidade em festa: representações do corpo feminino nas festas populares no Rio de Janeiro na virada do século XIX para o XX. In: MATOS, Maria Izilda Santos de; SOIHET, Rachel (Org.).
    O corpo feminino em debate. São Paulo: Ed. Unesp, 2003. p.177-197.
  • 21
    A respeito do conceito de representação, ver CHARTIER, Roger.
    A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel; Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990; acerca das brechas na invenção do cotidiano, ver CERTEAU, Michel de.
    A invenção do cotidiano: 1. artes de fazer. 5.ed. Petrópolis (RJ): Vozes, 2000.
  • 22
    A respeito da incidência do poder disciplinar nos corpos, ver FOUCAULT, Michel.
    Vigiar e punir. 23.ed. Petrópolis (RJ): Vozes, 2000.
  • 23
    MACFARLANE, Alan. Amor: amor e capitalismo. In: _______.
    A cultura do capitalismo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1987. p.158-189.
  • 24
    GIDDENS, Anthony.
    A transformação da intimidade: sexualidade, amor e erotismo nas sociedades modernas. 2.reimpr. São Paulo: Ed. Unesp, 1993. p.10.
  • 25
    QUEIROZ, Teresinha.
    Do singular ao plural. Teresina: Halley, 2006.
  • 26
    CASTELO BRANCO, Edwar de Alencar.
    Todos os dias de Paupéria: Torquato Neto e a invenção da tropicália. São Paulo: Annablume, 2005; CASTELO BRANCO, Edwar de Alencar. Ele é o homem. Eu sou apenas uma mulher: corpo, gênero e sexualidade entre as vanguardas tropicalistas. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL FAZENDO GÊNERO, 7: GÊNERO E PRECONCEITOS, 2006, Florianópolis.
    Anais... Florianópolis: Ed. Mulheres, 2006. 1CD-ROM. p.5.
  • 27
    SOIHET, Rachel. Feminismo x antifeminismo de libertários: a luta das mulheres pela cidadania durante o regime autoritário. In: SOIHET, Rachel; BICALHO, Maria Fernanda Baptista; GOUVEA, Maria de Fátima (Org.).
    Culturas políticas: ensaios de história cultural, história política e ensino de história. Rio de Janeiro: Mauad, 2005. v.1. p.307-332.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Maio 2008
    • Data do Fascículo
      Dez 2007

    Histórico

    • Aceito
      Dez 2007
    • Recebido
      Nov 2007
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