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Evolucionismo darwinista? Contribuições de Alfred Russel Wallace à teoria da evolução

Resumos

Teria sido mesmo Charles Darwin o autor da teoria do processo evolutivo? Em suas pesquisas, Darwin discute mais a origem da seleção natural do que propriamente a origem das espécies. Três anos antes da publicação do artigo de Darwin, outro naturalista, Alfred Russel Wallace, publicou um trabalho propondo que todas as espécies vivas descendiam de um único ancestral comum. Foi Wallace o primeiro a notar que cada margem dos rios amazônicos podia ser habitada por espécies diferentes de macacos. Em 1858, Wallace sintetiza a teoria da seleção natural, mas ao invés de publicar a descoberta, remete-a para Darwin que, pouco tempo depois, publica A Origem das Espécies. Este artigo visa discutir quais seriam as contribuições de Wallace para as teorias evolutivas.

Teoria da Evolução; Seleção Natural; História da Biologia


Was Charles Darwin, the real author of the theory of the evolutionary process? In fact, Darwin discusses in his works, specifically the origin of natural selection, and not the origin of species. Three years earlier from the publication of Darwin's article, another naturalist, Alfred Russel Wallace, published a paper proposing that all living species descended from a single common ancestor. Wallace was the first to perceive that each margin of the Amazonian rivers could be inhabited by different species of monkeys. In 1858, Wallace summarized the theory of natural selection but, instead of immediately send the discovery to publication, he sent it to Darwin that, shortly after, published The Origin of Species. Therefore, this article aims to discuss which would the contributions of Wallace for evolutionary theories.

Theory of Evolution; Natural Selection; History of Biology


ARTIGOS

Evolucionismo darwinista? Contribuições de Alfred Russel Wallace à teoria da evolução

Darwinian evolutionism? Contributions of Alfred Russel Wallace to the theory of evolution

Nelson PapaveroI; Christian Fausto Moraes dos SantosII

IPesquisador do Museu de Zoologia (USP-SP). Pesquisador CNPq. pavotnel@gmail.com

IICoordenador do Laboratório de História, Ciências e Ambiente (LHC-UEM). Pós-Doutorando em História das Ciências (CSIC-Barcelona), Bolsista Capes. chrfausto@gmail.com

RESUMO

Teria sido mesmo Charles Darwin o autor da teoria do processo evolutivo? Em suas pesquisas, Darwin discute mais a origem da seleção natural do que propriamente a origem das espécies. Três anos antes da publicação do artigo de Darwin, outro naturalista, Alfred Russel Wallace, publicou um trabalho propondo que todas as espécies vivas descendiam de um único ancestral comum. Foi Wallace o primeiro a notar que cada margem dos rios amazônicos podia ser habitada por espécies diferentes de macacos. Em 1858, Wallace sintetiza a teoria da seleção natural, mas ao invés de publicar a descoberta, remete-a para Darwin que, pouco tempo depois, publica A Origem das Espécies. Este artigo visa discutir quais seriam as contribuições de Wallace para as teorias evolutivas.

Palavras-Chave: Teoria da Evolução; Seleção Natural; História da Biologia.

ABSTRACT

Was Charles Darwin, the real author of the theory of the evolutionary process? In fact, Darwin discusses in his works, specifically the origin of natural selection, and not the origin of species. Three years earlier from the publication of Darwin's article, another naturalist, Alfred Russel Wallace, published a paper proposing that all living species descended from a single common ancestor. Wallace was the first to perceive that each margin of the Amazonian rivers could be inhabited by different species of monkeys. In 1858, Wallace summarized the theory of natural selection but, instead of immediately send the discovery to publication, he sent it to Darwin that, shortly after, published The Origin of Species. Therefore, this article aims to discuss which would the contributions of Wallace for evolutionary theories.

Keywords: Theory of Evolution; Natural Selection; History of Biology.

O ano de 2009 foi marcado pela comemoração de uma das mais importantes descobertas na história das ciências naturais. Pelo mundo todo, livros, artigos científicos e de divulgação, reportagens, documentários e congressos discutiram, analisaram e comemoraram os 150 anos da obra A origem das espécies de Charles Robert Darwin (1809-1882). Esse ano foi, para muitos, o ano de Darwin, pois, além disso, também se comemorou o bicentenário do nascimento do naturalista.

Apesar de muito se escrever sobre a vida e a obra desse descendente da abastada família Darwin, pouca importância foi dada à obscura história desencadeada a partir de uma carta e um manuscrito por ele recebidos em 1858. Mesmo o dia em que tal carta chegou às mãos de Darwin é hoje motivo de discussão.

O autor da carta era Alfred Russel Wallace (1823-1913), um jovem naturalista galês de 35 anos que, da ilha Ternate (atualmente Pulau Ternate, província das Molucas do Norte, Indonésia) enviou para Darwin um manuscrito intitulado Sobre a tendência de as variedades se afastarem indefinidamente do tipo original. Durante um ataque de malária, no delírio da febre, Wallace sonhara com a seleção natural. Ao invés de publicar a descoberta, mandou-a para Darwin.

Em carta escrita por Darwin a seu amigo, o geólogo britânico Charles Lyell (1797-1875), confessava que o conteúdo de tal manuscrito deixou-o atônito:

A Charles Lyell, 18 [de junho de 1858]

Meu estimado Lyell

Cerca de um ano atrás, recomendaste-me a leitura de um artigo de Wallace nos Annals [and Magazine of Natural History]; onde, em 1855, no vol. 16 da segunda série, Wallace havia publicado o trabalho "On the law which has regulated the introduction of new species", em que postula o monofiletismo de todas as espécies vivas, provindas de um único ancestral comum, que lhe havia interessado &, como eu estava escrevendo para ele [Wallace] e sabia que isso lhe daria muito prazer, contei-lhe esse fato. Hoje ele enviou-me o texto anexo & pediu-me que o encaminhasse para o senhor. Parece-me muito digno de ser lido. Suas palavras, quando o senhor disse que alguém se anteciparia a mim, confirmaram-se num grau incomum. Disse isso quando lhe expliquei aqui, muito sucintamente, minhas ideias sobre o fato de a "Seleção Natural" depender da luta pela vida. – Nunca vi coincidência mais impressionante. Se Wallace dispusesse do esboço do manuscrito que escrevi em 1842, não poderia ter feito dele um resumo melhor! Até seus termos figuram agora como títulos de meus capítulos.

Peço-lhe que devolva o MS, pois Wallace não diz que deseja que eu o publique, mas é claro que escreverei de imediato & oferecer-me-ei a enviá-lo a qualquer periódico. Portanto, toda a minha originalidade, importe ela no que importar, estará arruinada, muito embora meu livro, se vier algum dia a ter algum valor, não venha a se deteriorar, uma vez que o trabalho inteiro consiste na aplicação da teoria.

Espero que o senhor aprove o esboço de Wallace, para que eu possa comunicar-lhe o que disse.

Meu estimado Lyell,| Do sinceramente seu,| C. Darwin (Darwin, 2000, p.274)

A carta e o manuscrito Sobre a tendência das variedades de se afastarem indefinidamente do tipo original, remetidos por Wallace, desencadearam uma série de acontecimentos que hoje nos permitem questionar a primazia de Charles Darwin. Pretendemos, neste artigo, apresentar ao leitor alguns importantes pontos das obras de Alfred Russel Wallace e Charles Robert Darwin, tecendo, desta forma, uma leitura comparativa do trabalho de ambos, aquilatando suas respectivas contribuições à teoria da evolução das espécies.

Wallace na Amazônia

No outono de 1847, o Sr. A. R. Wallace ... propôs-me uma expedição conjunta ao rio Amazonas, com o fim de explorar a História Natural de suas margens; o projeto permitir-nos-ia criar uma coleção de objetos para nós mesmos, dispor de duplicatas em Londres para pagar os gastos, e reunir dados, como bem expressa Wallace em uma de suas cartas, "para resolver o problema da origem das espécies", uma matéria sobre a qual havíamos conversado e mantido muita correspondência. (grifo nosso)1 1 A tradução das citações para o português, ao longo do artigo, é nossa.

Estas são as primeiras linhas do prefácio do livro de Henry Walter Bates (1825-1892), O naturalista no rio Amazonas (1863; 1962; 1984). A afirmação de Bates é muito importante, pois demonstra que ele e Wallace estavam buscando a evidência de como se originavam as espécies. A única forma pela qual tal empreitada poderia ser levada a cabo era mediante a análise das relações entre os padrões de afinidade e a distribuição entre as espécies estreitamente relacionadas, com base no estudo da morfologia.

Wallace observou que o rio Amazonas e seus principais afluentes constituíam fronteiras para vários grupos de animais, em particular, os macacos. O parágrafo final de um artigo por ele publicado pela Sociedade Zoológica de Londres declara:

Durante a minha estada no distrito do Amazonas, determinei, cada vez que pude, os limites das espécies; pois que encontrei no Amazonas, no rio Negro e no Madeira a formação dos limites através dos quais certas espécies nunca passam. Os caçadores nativos conhecem perfeitamente este fato e sempre que querem obter um animal em particular, cruzam o rio, porque sabem que o encontrarão em um lado do rio e nunca ou por nenhum motivo no outro. À medida que se aproxima da nascente dos rios, estes deixam de ser uma fronteira, e muitas das espécies se encontram em ambas as margens. (Wallace, 1852, p.109-110)

Devemos observar neste artigo o quanto Wallace, em suas primeiras viagens, já havia percebido o significado dos rios como fronteiras faunísticas. Realmente ele não havia atentado para tal fato até começar a explorar o rio Negro. Desse modo, a questão das barreiras físicas começa a ser uma constante nos trabalhos publicados de Wallace. Em um artigo sobre a distribuição dos macacos, Wallace parece haver entendido o significado das barreiras físicas enquanto se pergunta:

Da determinação precisa das áreas de distribuição dos animais dependem muitas perguntas interessantes. Estão relacionadas de maneira próxima as espécies mesmo quando estão amplamente separadas? Que características físicas determinam os limites das espécies e dos gêneros? As isotermas podem limitar com precisão a área de distribuição das espécies ou são totalmente independentes delas? (Wallace, 1852, p.110)

Wallace provavelmente concebeu os grandes rios amazônicos como barreiras insuperáveis à dispersão das espécies, ainda que não como uma barreira que houvesse dividido uma população ou biota ancestral em dois descendentes, os quais, com o tempo, haveriam se convertido em espécies distintas. Todavia, esse assunto parece que nunca ficou fora de sua atenção, pois em um artigo sobre mariposas do vale amazônico, apresentado à Sociedade Entomológica de Londres em dezembro de 1853, Wallace argumentou que a diversidade desses insetos estaria diretamente relacionada a fronteiras físicas (Wallace, 1853a). Novas espécies poderiam originar-se quando uma espécie ancestral, vivendo originalmente em terras mais altas (como as que habitam planaltos e montanhas, por exemplo), se dispersasse por terras mais baixas (mais recentes do ponto de vista geológico); as populações das terras mais baixas seriam modificadas pela influência dos novos habitats, gerando variedades e, finalmente, novas espécies. Os dados obtidos sobre a distribuição das mariposas pareciam apontar nessa direção.

Em sua obra Viagens pelos rios Amazonas e Negro (1972), Wallace apresentou uma visão geral da geografia e geologia, vegetação, zoologia e antropologia da região amazônica. Uma das questões mais pertinentes desse livro encontra-se nos capítulos sobre as características gerais da história geológica da bacia amazônica e, consequentemente, dos padrões de distribuição de populações de espécies de terras altas que geraram as espécies das terras baixas, em certos grupos de animais (Wallace, 1853b, p.425-427; 1889, p.294-296).

O Arquipélago Malaio

Ao regressar da América do Sul, Wallace começou a fazer preparativos para outra viagem que lhe compensasse o que a viagem à Amazônia, pelas tragédias ocorridas no seu retorno, não lhe propiciara em termos de material coletado. O navio onde viajava de volta para a Europa incendiou-se e praticamente toda a sua coleção, e quase todas as suas anotações, se queimaram.

Suas indagações sobre lugares inexplorados nos trópicos levaram-no à conclusão de ser o Arquipélago Malaio o lugar mais promissor para efetuar coletas científicas. Um ano e meio após seu regresso da Amazônia, Wallace e Charles Allen, seu assistente de campo durante 3 anos, partiram para o Arquipélago Malaio. Graças à intervenção de Sir Roderick Murchison (1792-1871), presidente da Real Sociedade Geográfica, Wallace conseguiu transporte para ele e seu ajudante em um barco do governo britânico. Chegou a Cingapura em 20 de abril de 1854, depois de 45 dias de viagem. O mesmo Wallace escreveria, em sua autobiografia (1905), muitos anos depois, que essa viagem foi o evento mais importante de sua vida.

Permaneceu 8 anos no arquipélago, viajando mais de 22 mil quilômetros; somente o tamanho dessa área é equivalente ao da América do Sul. Wallace mudou de residência pelo menos oitenta vezes, quase uma por mês. Durante esse período, coletou mais de 125 mil espécimes, muitos das quais estudou no seu regresso à Grã-Bretanha.

Aproveitando o tempo que acabou passando recluso, por conta das condições climáticas ou pelas várias enfermidades que o atacaram, Wallace escreveu alguns de seus artigos mais importantes, especialmente os relacionados com a teoria da Evolução. O livro relativo a essa viagem, intitulado The Malay Archipelago (1962; 1986), surgiria 6 anos depois do regresso do naturalista, em 1869. O livro está ordenado geograficamente, o que gera alguma confusão em termos cronológicos. Os 31 capítulos estão escritos quase que com a mesma narrativa constante de seu diário de campo; em cada seção há um capítulo que resume a história natural de cada grupo de ilhas. O autor também preparou um capítulo introdutório com a descrição completa da geografia do arquipélago e um capítulo final em que resumiu suas observações antropológicas sobre as diferentes raças dos habitantes do arquipélago. Na introdução da obra, definiu os limites da distribuição da biota de Bornéu, Sumatra e Java (de afinidade asiática) e de Célebes [atual Sulawesi] e outras ilhas (de afinidade australiana). Essa linha imaginaria é denominada atualmente Linha de Wallace.

Pouco menos de um ano após sua chegada a Cingapura, Wallace escreveu sua primeira contribuição à teoria da evolução orgânica. Em sua autobiografia (Wallace, 1905, p.354-355) recordava-se desse dado sucedido 50 anos antes:

Tendo sempre estado interessado na distribuição geográfica de animais e plantas, tendo estudado Swainson e Humboldt e tendo agora uma impressão vívida das diferenças fundamentais entre os trópicos do Ocidente e Oriente; havendo também lido livros tais como o "Conspectus" de Bonaparte ... e vários catálogos de insetos e répteis do Museu Britânico (que quase conhecia de memória) que brindam um grande volume de dados sobre a distribuição dos animais em todo o mundo, ocorreu-me que tais dados nunca haviam sido utilizados propriamente como indicadores da maneira pela qual as espécies haviam chegado a existir. A grande obra de Lyell havia-me brindado com os principais aspectos da sucessão das espécies no tempo e, combinando as duas coisas, pensei que poderia chegar a alguma conclusão valiosa. Em consequência, coloquei meus dados e ideias no papel, e o resultado – que parecia ter alguma importância –, enviei-o para os Annals and Magazine of Natural History, onde apareceu em setembro seguinte. (Wallace, 1855b)

Esse resultado que Wallace, em sua imensa modéstia, disse que parecia ter alguma importância, é o trabalho intitulado Sobre a lei que regula a introdução de novas espécies, onde expôs clara e sucintamente a teoria da Evolução. Tal artigo estava tão bem escrito, tão claro e transparente que Sir Charles Lyell, em carta dirigida a Wallace em 4 de abril de 1867, declarou:

Estive lendo, outra vez, seu trabalho publicado em 1855 nos Annals, sobre "A lei que regula a introdução de novas espécies", pois quero citar algumas de suas passagens, não em referência a sua prioridade de publicação, mas simplesmente porque há alguns pontos expressos mais claramente que na própria obra de Darwin, em relação à importância de evidências geológicas e zoológicas para a distribuição geográfica e a origem das espécies. (Marchant, 1916, p.279-280, grifo nosso)

Uma importante fonte de inspiração para Wallace, que merece destaque, foi o trabalho do geólogo, ornitólogo e sistemata inglês Hugh Edwin Strickland (1811-1853). De todas as ideias de Strickland (1841), talvez a que mais tenha influenciado o pensamento de Wallace foi a que sugeria o esquema de uma árvore como analogia útil para um sistema de classificação:

Novamente, se considerarmos que só teremos fragmentos deste vasto sistema, estando o tronco e os ramos principais representados por espécies extintas, das quais não teremos conhecimento, enquanto uma vasta massa de membros e ramos, diminutos raminhos e folhas dispersas é tudo o que teremos para colocar em ordem e determinar a posição verdadeira que cada um ocupava em relação aos outros, toda a dificuldade do Sistema Natural de classificação se nos faz manifesta. (Wallace, 1855b, p.187)

A analogia da ordenação das espécies dentro de um sistema que lembrava os galhos e ramos de uma árvore foi muito bem observada e descrita por Wallace, entretanto, na história, essa descoberta é, na grande maioria das vezes, creditada somente a Charles Darwin.

Darwin e o arquipélago de Galápagos

Uma das primeiras obras a lançarem o nome de Charles Darwin foi o resultado de sua viagem a bordo do HMS Beagle. Publicada em 1839, a obra Viagem de um naturalista ao redor do mundo (1937) era uma versão em livro dos diários e anotações que Darwin fizera no decurso de 3 anos e 3 meses em terra e 18 meses no mar a bordo daquela que era uma viagem de levantamento cartográfico das costas da parte sul da América do Sul. O Beagle, um brigue comandado pelo capitão Robert FitzRoy (1805-1865), um jovem oficial da marinha inglesa de caráter rígido, zarpou do porto de Plymouth em 27 de dezembro de 1831, só retornando à Grã-Bretanha em 20 de fevereiro de 1836.

Nesse diário, Darwin fez observações sobre as ilhas do Cabo Verde, o Rio de Janeiro, Maldonado, Bahía Blanca, Buenos Aires, Patagônia, Terra do Fogo, Estreito de Magalhães, Chile, Peru, Galápagos, Taiti, Nova Zelândia, Austrália, Ilha Maurício e, finalmente, Inglaterra. De todos os lugares visitados por Darwin, talvez o que tenha ficado mais famoso (graças a sua visita) foi o arquipélago de Galápagos, hoje pertencente ao Equador. Muitos autores afirmam que as ilhas Galápagos forneceram a Darwin considerável gama de informações para formular sua teoria da evolução.

Entretanto, para ele, os jabutis gigantes (galápagos) teriam sido trazidos ao arquipélago por piratas, para servirem como fonte de alimento. Na colônia penal da Ilha de Santa Maria, uma autoridade local disse-lhe que esses jabutis apresentavam pequenas diferenças de ilha para ilha, sendo que os nativos chegavam a saber de qual ilha era cada espécie, somente observando seu casco. Darwin não deu importância a essa informação, tanto que nem se preocupou em coletar espécimes desses quelônios nas diversas ilhas que compõem o arquipélago de Galápagos.

Com relação aos iguanas de Galápagos, chegou a pensar que tais répteis (únicos) eram mais uma das inúmeras espécies encontradas na América do Sul. Em relação às aves, principalmente as canoras, Darwin notou que cada ilha era habitada por uma espécie única, diferente. Entretanto, quando da coleta desses animais, Darwin não etiquetou precisamente as várias espécies de tentilhões que habitavam cada uma das ilhas do Arquipélago de Galápagos. Curiosamente, eram os tentilhões e suas variadas formas de bicos que apresentavam as maiores provas de como uma espécie, a partir de um ancestral comum, pôde diversificar-se e gerar novas espécies (Darwin, 1937, p.355-380).

Em 1839 Darwin publicou a primeira edição de seu Journal of Researches into the Geology and Natural History of various Countries visited by H. M. S. Beagle (1839), e 6 anos depois saiu a lume a segunda edição, na qual Darwin declarou:

Vendo esta graduação e diversidade de estrutura em um grupo pequeno e intimamente relacionado de aves, realmente pode-se imaginar que, a partir de uma pobreza original de aves neste arquipélago, uma espécie foi tomada e modificada para diferentes finalidades. (Darwin, 1845, p.345-356)

Também nessa segunda edição do Journal, ao terminar sua discussão sobre as ilhas Galápagos, Darwin indicou o aspecto dessas ilhas que mais o intrigou, com relação à biota:

A distribuição dos ocupantes deste arquipélago não seria tão maravilhosa se, por exemplo, uma ilha tivesse um tordo e uma segunda ilha algum outro gênero mui-to distinto: – se uma ilha tivesse um gênero de lagarto e uma segunda ilha outro gênero distinto, ou nenhum –, ou se diferentes ilhas fossem habitadas não por espécies representativas dos mesmos gêneros de plantas, mas por gêneros totalmente diferentes ... Entretanto, o que ocorre é que várias das ilhas possuem sua própria espécie de jabuti [galápago], tentilhão e de numerosas plantas; estas espécies têm os mesmos hábitos gerais, ocupam lugares análogos e, obviamente, ocupam o mesmo lugar na economia natural deste arquipélago, o que me enche de espanto. Pode-se supor que algumas destas espécies representativas, pelo menos no caso dos cágados e de algumas das aves podem considerar-se posteriormente somente raças bem marcadas; porém isso seria, igualmente, de grande interesse para o naturalista filósofo. (Darwin, 1845, p.362, grifo nosso)

Por outro lado, no seu trabalho de 1855, Wallace sustentou claramente que sua lei da modificação gradual das espécies era a resposta ao problema da fauna e da flora das ilhas Galápagos, como vemos na seguinte passagem:

Fenômenos tais como os que exibem as ilhas Galápagos, as quais contêm poucos grupos de plantas e animais que lhes são particulares, ainda que mais intimamente relacionados com aqueles da América do Sul, não receberam sequer uma explicação conjetural. As Galápagos são um grupo de ilhas vulcânicas muito antigas e, provavelmente, nunca estiveram mais próximas do continente do que estão no presente. Devem ter sido povoadas primeiramente, assim como outras ilhas recém-formadas, pela ação dos ventos e correntes, em um período suficientemente remoto para que as espécies desaparecessem, só permanecendo os protótipos modificados. Do mesmo modo, podemos explicar as ilhas separadas que têm, cada uma, suas espécies próprias, por meio da suposição de que a mesma emigração original povoou a ilha em seu conjunto com as mesmas espécies, a partir das quais se criaram protótipos modificados de distintas maneiras, ou que as ilhas foram povoadas sucessivamente umas a partir das outras, ainda que as novas espécies se tenham criado, cada uma, a partir do desenho das espécies preexistentes. (Wallace, 1855b, p.188, grifos nossos)

As percepções de Wallace, acerca da diversidade e parentesco entre as espécies encontradas nas ilhas Galápagos, eram bem mais profundas e próximas de uma explicação que caminhava em direção a um entendimento da origem e diversidade das espécies do que as de Darwin, quando este discutiu o mesmo fenômeno.

Wallace e as variedades de borboletas

A busca de evidências que confirmassem a teoria da evolução foi coroada com êxito por Wallace, no arquipélago Malaio. Vários casos indicavam que, de maneira muito geral, as distribuições disjuntas de espécies se devia à extinção de formas intermediárias. Assim, por exemplo, em relação aos lepidópteros2 2 Borboletas e mariposas. do gênero Euploea, Wallace notou, desde sua chegada a Cingapura, que As Euploea aqui ocupam o lugar dos Heliconidae3 3 Subfamília Heliconiinae (família Nymphalidae), dotadas de asas escuras com manchas alaranjadas ou amarelas. da Amazônia e se assemelham a elas exatamente em seus hábitos (Wallace, 1854a, p.4396). Ao resumir, posteriormente, a entomologia de Cingapura e Malaca, ele comparou vários grupos de mariposas da região Oriental com as da América, concluindo que As Euploea, apesar de serem muito belas, não podem competir com os estranhos Heliconidae, com os quais estão intimamente relacionados... (Wallace, 1854b, p.4637).

Porém, Wallace necessitava de uma prova mais contundente para comprovar sua teoria. Essa prova surgiu em 1855, quando ele teve a possibilidade de descrever uma nova espécie de Ornithoptera4 4 Borboletas da família Papilionidae, de belos coloridos e de tamanho relativamente grande, muito estimadas por colecionadores. totalmente distinta de todas as outras. O exemplar provinha do extremo noroeste de Bornéu, e Wallace chamou-a Ornithoptera brookiana:

Este magnífico inseto é uma adição muito interessante ao gênero Ornithoptera. As espécies marcadas com verde até agora haviam sido encontradas no norte da Austrália, Nova Guiné e Molucas, e todas elas se assemelham tanto umas a outras em seu aspecto, que em sua maioria foram consideradas como variedades do Pipilio priamus de Linnaeus. Portanto, nossa nova espécie é notável por duas razões: primeiro, por oferecer um padrão de coloração completamente novo no gênero a que pertence; segundo, por ampliar a distribuição das Ornithoptera marcadas de verde até o extremo noroeste de Bornéu. Como nunca foi encontrada pelos naturalistas holandeses, que têm explorado a maior parte do sul e do sudoeste da ilha, esta espécie, provavelmente, está confinada à costa noroeste... (Wallace, 1855a, p.104-105)

Para Wallace, esse achado era uma evidência a favor de sua teoria: uma distribuição tal das Ornithoptera com asas manchadas de verde era explicada admitindo-se uma forma hipotética que antes houvesse ocupado o resto de Bornéu; essa forma, que deve ter se extinguido depois da formação da O. brookiana, seria uma forma intermediária entre essa espécie e as formas relacionadas com O. priamus das ilhas do sudeste, isto se sua lei das modificações graduais fosse válida. Finalmente, em 1855, Wallace decidiu publicar sua Lei que regula a introdução de novas espécies (1885b).

Um caso posterior confirmou, mais uma vez, sua teoria. Em 1857, ao desembarcar nas ilhas Aru, teve a possibilidade de coletar três exemplares (um macho e duas fêmeas de uma nova forma relacionada com a Ornithoptera priamus. Esta nova forma nativa de Aru era exatamente intermédia entre o O. priamus de Amboina (nas ilhas Molucas) e o O. poseidon de Nova Guiné. Efetivamente, O. priamus tem quatro manchas negras na asa posterior, e a asa anterior não apresenta uma veia longitudinal central verde; O. poseidon tem duas manchas negras na asa posterior e uma veia longitudinal central verde na asa anterior: a nova forma descoberta por Wallace em Aru tinha três manchas negras na asa posterior, e a veia verde da asa anterior tem um comprimento exatamente intermediário entre O. poseidon e O. priamus.

Ali estava, de maneira clara, segundo Wallace, o processo de formação de espécies, com toda a sua evidência. Uma espécie antecessora havia ocupado completamente a área então ocupada por essas três formas, que se haviam diferenciado em populações localizadas, por influência do ambiente. Contudo, a forma intermediária (das ilhas Aru) existia. Se desaparecesse a forma encontrada em Aru, O. priamus e O. poseidon permaneceriam como espécies isoladas e separadas, tal como Wallace havia proposto para tantos e tão diversos grupos zoológicos.

Darwin e a classificação das cracas

Em sua autobiografia, publicada pelo filho Francis Darwin (1848-1925) em 1887, Charles Darwin disse:

Em outubro de 1846, comecei a trabalhar com os 'Cirripedia'.5 5 Classe de crustáceos marinhos, que inclui as cracas entre outros, com adultos ger. sésseis, fixados a rochas, conchas, corais e larvas livre-natantes; cirripédios. (Algumas espécies são comensais de baleias, tartarugas e peixes, e muitas outras são parasitas.) Enquanto estava na costa chilena encontrei uma forma muito curiosa que perfurava as conchas de Concholepas e que diferia tanto dos outros Cirripedia, que só para incluí-la tive que formar uma nova subordem. Mais tarde, outro gênero de perfurador relacionado foi encontrado nas praias de Portugal. Para entender a estrutura de meu novo Cirripedia, tive que examinar e dissecar muitas das formas comuns; isso, gradualmente, me levou a estudar todo o grupo. (Darwin, 1887, p.80)

Como resultado desses estudos, Darwin chegou a publicar, entre os anos de 1851 e 1854, ao menos quatro monografias sobre essa classe de crustáceos, totalizando pouco mais de 1.200 páginas, com 89 pranchas de preciosos desenhos (Darwin, 1851a; 1851b; 1854a; 1854b).

Um exame mais detalhado dos trabalhos de Darwin sobre os Cirripedia mostra que se baseiam na taxonomia clássica, aristotélico-lineana, atemporal, ou seja, não encontramos o mais insignificante traço de evolucionismo – algo bem diferente do que propôs Wallace em seus estudos sobre os Ornithoptera. Talvez porque Darwin, nesse período (até 1858), ainda não tivesse entendido como se formavam as espécies. Que melhor ocasião teria para demonstrar sua teoria da origem das espécies do que com uma monografia taxonômica?

Wallace e o seu Ensaio sobre a tendência das variedades de se afastarem indefinidamente do tipo original

Quase no fim de sua vida, em seu livro The Wonderful Century (1898; 1903), Wallace referiu-se ao descobrimento da teoria da seleção natural, que fizera em meio a um ataque de febre produzido pela malária em Ternate:

Essa mesma tarde escrevi um esboço de um artigo e, nas tardes seguintes, escrevi-o todo e mandei no seguinte despacho de correspondência ao Sr. Darwin. Eu esperava que fosse completamente novo como o foi para mim, dado que ele me informou por carta que estava comprometido em um trabalho que intentava mostrar de que forma espécies e variedades se diferenciam umas das outras, agregando que "meu trabalho não alteraria ou agregaria nada". Pelo que fiquei surpreso ao descobrir que ele havia realmente chegado à mesma teoria que a minha tempos antes (em 1844). (Wallace, 1898, p.140)

Darwin realmente já havia chegado à teoria da seleção natural; não havia, porém, entendido a origem das espécies. Em carta datada de 1º de maio de 1857, Darwin contou a Wallace o fato de estar, havia quase 20 anos, trabalhando a questão de como as espécies e as variedades diferem umas das outras, insistindo na impossibilidade de explicar sua teoria em uma simples carta. Apesar disto, em setembro desse mesmo ano, Darwin enviou (não se sabe por quê) uma carta ao botânico estadunidense Asa Gray, contendo a parte fundamental de sua teoria da seleção natural, aconselhando-o que, por favor, não difundisse tal informação, pois alguém como o britânico Robert Chambers (1802-1871) poderia ouvi-las e desenvolvê-las facilmente. Uma pergunta surge aqui: por que enviar tal informação para Asa Gray, que considerava o conteúdo da carta como algo altamente hipotético, em lugar de remetê-la a Wallace, que compreenderia melhor o conteúdo? Ou será que Darwin temia que este alguém como Chambers fosse Wallace?

Muitos anos depois, Wallace pôde saber o impacto que sua carta e seu manuscrito haviam causado em Darwin. Em uma carta a Francis Darwin, datada de 1887, Wallace disse: "Não estava inteirado de que seu pai havia estado tão angustiado – ou melhor, perturbado – por haver mandado meu ensaio quando estava em Ternate...".

Ao receber o manuscrito de Wallace, Darwin notificou seus amigos, Charles Lyell e Joseph Dalton Hooker (1817-1811). Eles se encarregaram de apresentar essas contribuições aos membros da Sociedade Lineana de Londres e decidiram a ordem em que seriam apresentadas. Eram estas: um apontamento de Darwin, supostamente escrito em 1839 e copiado depois em 1844; um fragmento da carta que Darwin escreveu a Asa Gray em setembro de 1857; e o trabalho de Wallace Sobre a tendência das variedades de se afastarem indefinidamente do tipo original (Darwin; Wallace, 1858), escrito em fevereiro de 1858, em Ternate, nas ilhas Molucas. Desta forma, o ensaio de Wallace ficou no final. Darwin inseriu uma nota esclarecendo que o resumo do ensaio nunca fora escrito para ser publicado e que, portanto, não fora escrito cuidadosamente (o que pode ser notado na leitura). Todavia, como assinala Beddal (1968), o conteúdo dessa nota não era totalmente correto, pois Darwin tinha uma cópia encadernada do mesmo ensaio, com instruções dirigidas a sua esposa para que fosse publicado no caso de sua morte prematura.

Em relação às contribuições de Darwin na "publicação conjunta", Brooks (1984) esclarece que o esboço de Darwin, datado em 1844, na realidade fora escrito em 1842 (Darwin, 1859, p.1) e não 5 anos antes, como assinalava a carta de Lyell e Hooker apresentando esses escritos ao secretário da Sociedade Lineana. No esboço, Darwin não fez menção alguma ao princípio da divergência. Esse princípio da divergência, ou seja, a causa da origem das espécies, está, porém, mencionado na segunda contribuição de Darwin, no extrato da carta a Asa Gray de 1857. Entretanto, Dupree esclarece que, no extrato publicado no Journal da Sociedade Lineana, "a cópia enviada a Gray tem uma caligrafia que não é a de Darwin, ainda que corrigida por ele ... varia em detalhe com a versão publicada pela sociedade Lineana" (Dupree, 1968, p.459). De acordo com Dupree, a cópia da carta a Asa Gray contém, essencialmente, os mesmos argumentos que Lyell e Hooker conheceram em 1844 e 1856, com a adição do princípio de divergência. Dupree infere que esse princípio era somente um pronunciamento vago daquilo que, posteriormente, Darwin desenvolveria nos primeiros capítulos da Origem das espécies (Dupree, 1968).

Não existe, infelizmente, uma cópia publicada, até onde sabemos, da versão original recebida por Asa Gray. Estranhamente, outros importantíssimos documentos também estão, até hoje, perdidos: o manuscrito original de Wallace, escrito em Ternate; a carta de Wallace a Darwin que acompanhava esse manuscrito, assim como o conteúdo desses dois documentos; as cartas troca-das entre Darwin, Hooker e Lyell, durante junho de 1858. Também estão perdidas as cartas de Darwin a Asa Gray sobre o tema das cartas que Darwin e Hooker remeteram para Wallace após esses acontecimentos. São muitas as perdas e coincidências...

De todas as formas, depois da publicação dos resumos de Darwin e do ensaio de Wallace, no Journal da Sociedade Lineana em 1858, Darwin abandonou, em definitivo, a redação de seu big book on species, intitulado Natural Selection, e, nesse mesmo ano começou a escrever febrilmente um novo livro, um resumo de seu big book on species, publicado em 1859, sob o título de Origin of Species.

Mais mistérios inexplicados

Em seu Diário, publicado por Sir Gavin de Beer (1959), Darwin disse que, em 31 de março de 1857, havia terminado o capítulo 6, sobre Seleção Natural. Foi desse capítulo que enviou um resumo a Asa Gray, em setembro de 1857.

Porém, um ano mais tarde, nesse mesmo diário, tem-se a seguinte anotação: "April 14th Discussion on large general & small & on Divergence & correcting Ch. 6 (Moor Park) finished June 12th & Bee Cells" (De Beer, 1959, p.14). Moor Park era uma estação hidroterápica, onde Darwin permaneceu de 20 de abril a 4 de maio de 1858. Isso poderia indicar que Darwin escreveu (ou reescreveu) sobre Divergência, bem como as correções do capítulo 6 de sua Natural Selection, entre 6 de maio e 12 de junho de 1858. O manuscrito original de Natural Selection, o Big Book on Especies de Darwin, foi dado como desaparecido até a Segunda Guerra Mundial, quando, em 1942, foi anunciado seu descobrimento na revista Nature. Entretanto, aquela não era uma ocasião propícia para estudos desta ordem. Finalmente, Stauffer (1959) deu a conhecer o conteúdo desse manuscrito inédito. Um exame feito por Brooks (1984) de uma cópia desse manuscrito em poder de Stauffer mostrou que cada fólio do manuscrito está numerado de forma consecutiva; na necessidade de alguma correção ou inserção no manuscrito, o fólio correspondente leva um asterisco; por exemplo, os fólios adicionados depois de 10, eram numerados da seguinte forma: 10*, 10a, 10b, etc.; se houvesse mais de 27 fólios inseridos, a numeração seguiria da seguinte forma: 10aa, 10bb, etc. A descoberta de Brooks foi surpreendente: após o fólio 26 havia uma inserção de 41 páginas, até o fólio 26nn. Nesse fólio, de número 26, ao final da página, há um cabeçalho intitulado Extinção, e, no início do fólio 26b, outro cabeçalho: Princípio da Divergência. Essas folhas foram, portanto, as que Darwin escreveu entre 6 de maio e 12 de junho de 1858.

Em 8 de junho de 1858, Darwin escreveu a Hooker dizendo que, finalmente, havia entendido como as espécies divergiam na natureza. Essa carta foi escrita, portanto, aparentemente, 4 dias antes que terminasse de escrever sua nova versão de 41 páginas do princípio da divergência.

A carta em que Darwin anunciava a Charles Lyell a chegada de uma correspondência e do manuscrito de Wallace está datada simplesmente "Down, 18th". Posteriormente, é possível que o filho de Darwin, Francis, editor de suas cartas, tenha anexado entre aspas "June 1858". Assim, parece que Darwin havia terminado de escrever sua nova versão do princípio da divergência 6 dias antes da chegada do manuscrito de Wallace sobre o mesmo assunto. Uma notável coincidência.

Toda essa coincidência, incluindo a apresentação dos dados na contribuição conjunta de Wallace e Darwin, fez com que vários autores investigassem mais detalhadamente esse extraordinário caso de convergência. Somente para citar alguns, mencionaremos Beddal (1968; 1969; 1972) e Brackman (1980). Porém, o estudo mais detalhado e documentado dessa estranha situação foi feito por Brooks (1984).

Sabe-se que Wallace enviou, no mesmo dia em que remeteu a carta com o manuscrito de Ternate a Darwin, também de Ternate, uma carta a Frederick Bates (1777-1825), o irmão mais jovem de Henry Walter Bates (1825-1892), que vivia em Leicester. Essa carta, endereçada a Frederick Bates, está datada de 2 de março de 1858. A carta encontra-se em posse da família de Wallace, e McKinney (1972, p.140-141) reproduziu-a em seu livro, onde podemos ver a marca "Via Southampton", com a data de 21 de abril em Cingapura e a data de 3 de junho em Londres. Todo o problema parece estar em quantos dias uma carta levava para chegar de Ternate a Londres. Isto foi o que Brooks se dedicou a investigar, fazendo uma extensa pesquisa no Museu dos Correios e nos Arquivos dos Correios de Haia, assim como nos arquivos da P&O Steamship Navigation Company de Londres. Munido das informações conseguidas nesses centros de documentação, Brooks chegou a duas únicas possibilidades.

Se a carta com o manuscrito foi postada em Ternate em 9 de março de 1858, chegaria a Cingapura em 21 de abril e, deste modo, por vários portos, até Malta, no dia 23 de maio. Se estivesse assinalada "Via Southampton", chegaria a Londres no mesmo dia em que a carta a Frederick Bates chegou a Leicester, ou seja, 3 de junho. Se estivesse marcada "Via Marseille" e "Overland", chegaria a Londres em 28 de maio.

A segunda possibilidade é a de que a carta endereçada a Darwin, escrita em fevereiro, seguiu em uma mala postal anterior a 9 de março, a qual seria em 23 de fevereiro. Neste caso, chegou a Cingapura em 7 de abril e a Malta em 10 de maio; se seguiu "Via Southampton", chegaria a Londres em 20 de maio; no caso de ter seguido "Overland, Via Marseille", deveria ter chegado à capital inglesa em 14 de maio. O dia 14 de maio foi uma sexta. Para Brooks, a carta chegou às mãos de Darwin no dia 17 (segunda), ou 18 (terça) de maio de 1858.

Brooks acredita que, com o manuscrito de Wallace em suas mãos, Darwin releu o trabalho de Wallace de 1855 e, finalmente, teve uma "iluminação" sobre o princípio da divergência. Escreveu a carta a Lyell anunciando a chegada do manuscrito em 18 de maio, porém não a enviou. Deste modo, teve pelo menos 25 dias para reescrever as 41 páginas novas sobre o princípio da divergência, que anunciou a Hooker em 12 de junho. Finalmente, pode-se interpretar que enviou a carta a Lyell em junho, e é por isso que talvez Francis Darwin, seu filho e editor de suas cartas, escreveu, do próprio punho, depois de "Down, 18th", "June 1858".

A outra possibilidade é a de que a carta chegou às mãos de Darwin em 28 de maio (ou em 29). O que deixaria a Darwin duas semanas para escrever as 41 páginas do princípio da divergência. Afirma Brooks que precisamos reconhecer que o desespero fez a pena mover-se rapidamente. Neste caso, a carta escrita por Darwin a Lyell seria realmente de 18 de junho.

De qualquer forma, Darwin teve entre 2 e 4 semanas para escrever um novo capítulo sobre o princípio da divergência. De todas as maneiras, publicou uma ideia distinta da de Wallace, e incidiu no mesmo erro de Maupertuis (1698-1759) – como, sem isolamento geográfico (Darwin só admite uma competição entre as variedades formadas a partir de uma espécie antecessora), se pode explicar a formação de morfoespécies? Como é possível que as novidades evolutivas, surgidas fortuitamente, não se disseminassem por todas as populações? Por que, em lugar de se matarem, as variedades surgidas de uma espécie antecessora não copulariam antes? Será que, para um vitoriano como Darwin, o incesto seria mais grave que o fratricídio, no caso das variedades originadas de uma espécie-mãe comum?

Separando o que Hooker e Lyell juntaram

Por fim, ao analisarmos, pormenorizadamente e em separado as contribuições de Wallace e Darwin, na publicação conjunta orquestrada por Hooker e Lyell, podemos observar que o ensaio de Wallace é consideravelmente mais bem escrito e desenvolvido que os resumos de Darwin. Wallace, por exemplo, inicia dizendo que as variedades produzidas em estado de domesticação são muito distintas daquelas que ocorrem em estado natural – uma total oposição ao ponto de vista de Darwin, que acreditava ser o processo de seleção artificial, promovido pela domesticação, uma fiel analogia da seleção natural ocorrida na natureza. Para Wallace, as variedades domesticadas, quando abandonadas, têm uma tendência a reverter à forma normal de sua espécie antecessora. Deste modo, Wallace rechaçou firmemente a validez dessa analogia. Darwin, como tantos outros naturalistas, havia iniciado por uma consideração dos animais domésticos e por uma analogia com o estado natural; mas fez uma analogia dos resultados conhecidos da seleção de formas domésticas com possíveis resultados de uma força seletiva mais poderosa que ele propunha atuar na natureza.

Wallace também afirmou que "A vida dos animais selvagens é uma luta pela existência" (Darwin; Wallace, 1858, p.54), ou seja, todos devem exercer suas faculdades e energias ao máximo para preservar sua própria existência e de sua prole. Dependendo do grau de êxito de uma espécie, seus membros serão mais ou menos numerosos: "A proporção geral que deve haver em certos grupos de animais é facilmente visível. Animais grandes não podem ser tão abundantes como os pequenos; os carnívoros hão de ser menos numerosos que os herbívoros" (ibidem). Apesar da fecundidade, que permitiria que cada espécie expandisse amplamente seu número, é evidente que a população animal do globo deve ser estacionária ou, talvez, pela influência do homem, decrescente (ibidem); é claro que as flutuações se evidenciam por todas as partes. Depois de um simples cálculo, baseado na fecundidade das aves, Wallace concluiu que "é evidente, portanto, que a cada ano um número imenso de seres deve perecer – tantos, de fato, quantos nascem" (Darwin; Wallace, 1858, p.55), isso se a população permanecer em equilíbrio.

Em seguida, Wallace pondera:

O número dos que morrem anualmente deve ser imenso, e como a existência individual de cada animal depende dele mesmo, os que morrem devem ser os mais fracos – os muito jovens, os velhos e os enfermos –, posto que os que prolongam sua existência devem ser os mais perfeitos em saúde e vigor – os mais aptos na obtenção regular de alimento e no evitar seus numerosos inimigos. É, como notamos, uma "luta pela existência", na qual o mais fraco e menos perfeitamente adaptado sempre deve sucumbir. (Darwin; Wallace, 1858, p.56-57)

Até este ponto, os argumentos de Darwin e Wallace são notavelmente semelhantes. Porém, o seguinte passo lógico de Wallace, claramente, não tem um correspondente na formulação prévia de Darwin (1844), nem tampouco o conceito – muito distinto – expressado em sua carta de 1857 a Asa Gray (1810-1888).

Segundo Wallace, a maioria das variações da forma típica de uma espécie, ou talvez todas, devem ter algum efeito definido – apesar de serem pequenas – sobre os hábitos e capacidades dos indivíduos. Igualmente uma mudança na cor pode, por deixá-los mais ou menos indistinguíveis, afetar sua segurança (Darwin; Wallace, 1858, p.58). Também é evidente que a maioria das mudanças afetará, favorável ou desfavoravelmente, as faculdades ligeiramente ampliadas para prolongar sua existência; essa variedade, inevitavelmente deve, com o tempo, adquirir superioridade numérica (ibidem). Então, em geral,

Todas as variedades se situam, portanto, em duas classes – aquelas que, sob as mesmas condições, nunca alcançarão a população de uma espécie parental, e aquelas que, com o tempo, obterão e manterão uma superioridade numérica. Entretanto, se ocorre alguma alteração das condições físicas em um distrito ... é evidente que, de todos os indivíduos que formam a espécie, aqueles que formam o grupo menos numeroso e a variedade mais deficientemente organizada serão os que sofrerão primeiro, e, se a pressão é severa, deverão extinguir-se logo. (ibidem)

Se essa crise ambiental extrema é contínua, os indivíduos da espécie antecessora também morrerão, diminuindo, assim, a população típica da espécie ao ponto da extinção: "A variedade superior será, então, a única que restará e, com o regresso das circunstâncias favoráveis, aumentará rapidamente de número e ocupará o lugar da espécie e da variedade extintas" (ibidem).

Darwin não havia explicado, no trabalho de 1844, como surgem as novas espécies; e igualmente sobre a formação de variedades na natureza havia dito simplesmente "Quem pode pretender afirmar que ela [a seleção natural] não produzirá algum efeito?".

Como Lyell e Hooker puderam afirmar, na introdução do trabalho conjunto, que Darwin e Wallace haviam chegado independentemente à mesma "teoria engenhosa para explicar a aparição e perpetuação de variedades e formas em nosso planeta", quando isso não era correto?

Em outra passagem da carta a Gray, Darwin expôs sua ideia mais claramente: "Cada nova variedade ou espécie, quando formada, geralmente tomará o lugar de, e assim exterminará, seu antecessor menos adaptado" (Darwin; Wallace, 1858, p.51-52). A diferença entre os conceitos dos dois infatigáveis naturalistas é evidente: Wallace postulou que a variedade superior se expande para ocupar o lugar da espécie antecessora depois que essa população sucumbiu a alguma crise ambiental; Darwin postulou uma competição direta entre a variedade superior e a população da espécie antecessora, terminando com a eliminação da população da espécie antecessora.

A teoria de Wallace, através do princípio de divergência, teria a vantagem adicional de explicar outros fenômenos. Esse termo, utilizado ao redor do ano de 1829, significava desvio de uma norma contínua ou padrão, e o registro fóssil deixava evidente a divergência das formas representativas posteriores comparadas com as anteriores, em cada grupo de organismos.

Já o princípio de divergência de Darwin não ofereceu nenhuma explicação para a separação contínua. Não explicou a formação nem de linhagens nem de morfoespécies. Darwin somente afirmou que "a variada prole de cada espécie intentará (e somente umas poucas conseguirão) ocupar tantos e tão diversos lugares na economia da natureza como sejam possíveis". Esta conjectura contrariava a experiência de Wallace que, depois de uma década estudando animais em campo, sabia que, apesar de as variedades ocuparem localidades diferentes das da espécie antecessora, todas as diferenças que apresentavam eram ligeiras e que, em ambas, a variedade e espécie típica ocupavam o mesmo lugar na economia da natureza. A conjectura de Darwin só podia ser vista por Wallace como uma especulação de alguém que conhecia muito pouco da variação que ocorria na natureza (Brooks, 1984, p.211).

Por fim, se levarmos em conta as diferenças existentes entre os trabalhos de Darwin e Wallace, que bem se podem notar nos escritos de ambos, Wallace poderia ter-se perguntado se Lyell e Hooker compreenderam o que a teoria de cada um afirmava. Se houvessem realmente entendido, certamente não teriam afirmado, na publicação conjunta, que as teorias de Wallace e Darwin eram as mesmas (Brooks, 1984, p.211-212).

Passados mais de 150 anos da publicação conjunta de Darwin e Wallace, este último, apesar de ter intuído a seleção natural e a origem das espécies mais rápida e detalhadamente que Darwin, ainda permanece relegado a um plano secundário na história das ciências. Muito do que vemos hoje em relação ao estrelato de Darwin e o anonimato de Wallace pode ser explicado pela indústria acadêmica que gira em torno da figura de Darwin. Entretanto, parte da resposta a esse fenômeno também pode ser encontrada na maneira pouco atenta com que estudantes, professores e pesquisadores têm estudado a história do evolucionismo.

NOTAS

Artigo recebido em 31 de março de 2011.

Aprovado em 4 de março de 2014.

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  • _______. Viaje al Archipiélago Malayo Barcelona: Ed. Laertes, 1986.
  • 1
    A tradução das citações para o português, ao longo do artigo, é nossa.
  • 2
    Borboletas e mariposas.
  • 3
    Subfamília Heliconiinae (família Nymphalidae), dotadas de asas escuras com manchas alaranjadas ou amarelas.
  • 4
    Borboletas da família Papilionidae, de belos coloridos e de tamanho relativamente grande, muito estimadas por colecionadores.
  • 5
    Classe de crustáceos marinhos, que inclui as cracas entre outros, com adultos ger. sésseis, fixados a rochas, conchas, corais e larvas livre-natantes; cirripédios. (Algumas espécies são comensais de baleias, tartarugas e peixes, e muitas outras são parasitas.)
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jul 2014
    • Data do Fascículo
      Jun 2014

    Histórico

    • Aceito
      04 Mar 2014
    • Recebido
      31 Mar 2011
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