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A Volkswagen e a ditadura: a colaboração da montadora alemã com a repressão aos trabalhadores durante o regime civil-militar brasileiro

RESUMO

O artigo problematiza a relação da Volkswagen com a ditadura civil-militar brasileira inaugurada com o golpe de 1964. Analisamos em particular a colaboração da montadora de origem alemã com o aparato repressivo do regime, que contou com o fornecimento de informações sobre os trabalhadores da empresa para os órgãos de vigilância e controle do Estado. Utilizamos fontes da empresa, documentos da repressão sediados em arquivos públicos e materiais produzidos pelos trabalhadores e sindicatos, além de depoimentos e dos relatórios das comissões da verdade. O trabalho se insere nos marcos da discussão sobre a relação do empresariado com a ditadura brasileira, indicando as estreitas imbricação e inserção das grandes empresas junto ao aparelho de Estado no período, o que incluía muitas vezes colaboração com a repressão.

Palavras-chaves:
Empresariado; ditadura civil-militar brasileira; Volkswagen; repressão a trabalhadores

ABSTRACT

The article questions the relationship of Volkswagen and the Brazilian civil-military regime formed after the 1964 coup. We analyze, in particular, the German automaker’s collaboration with the regime’s repressive apparatus since state surveillance and control agencies were provided with information about the company’s workers. We use company sources, documents from security agencies held in public archives, and materials produced by workers and unions, as well as testimonies and reports from truth commissions. The study is part of the discussion of the relationship between the business community and the Brazilian dictatorship, indicating the close intersection between large companies and the state apparatus in the period and indeed their insertion in this, which often included collaboration with the State’s repressive methods.

Keywords:
Employers; Brazilian civil-military dictatorship; Volkswagen; repression of workers

No dia 23 de setembro de 2020, foi anunciado pela Volkswagen do Brasil um acordo com o Ministério Público Federal (MPF) no qual a montadora admitia que colaborou com o aparato repressivo na repressão aos seus trabalhadores durante a ditadura brasileira. A empresa se comprometeu, através de um termo de ajustamento de conduta, a despender R$ 36 milhões para ressarcir ex-funcionários que sofreram com violações aos direitos humanos durante o regime e para financiar projetos de memória, pesquisa e fundos dedicados a questões relacionadas a violências cometidas durante o período da ditadura (G1, 2020G1. Volkswagen faz acordo com MPF para reparar violações dos direitos humanos durante a ditadura. 23 set. 2020. Disponível em: Disponível em: https://g1.globo.com/carros/noticia/2020/09/23/volkswagen-faz-acordo-com-mpf-para-reparar-violacoes-dos-direitos-humanos-durante-a-ditadura.ghtml . Acesso em 2 mar. 2021.
https://g1.globo.com/carros/noticia/2020...
). Trata-se do primeiro caso de empresa acionada na justiça no Brasil por crimes associados à repressão durante o regime civil-militar. Apesar de haver indícios de que a Volkswagen não foi a única, e que outros grupos econômicos colaboraram com a repressão, o caso ganhou projeção e avançou porque estava respaldado em depoimentos de ex-trabalhadores que sofreram violências e, principalmente, porque estava devidamente lastreado em extensa documentação que confirmava o conluio da companhia com os órgãos repressivos.

A montagem do processo contra a Volkswagen foi possível graças às ações de ex-operários vítimas de violência da empresa em cumplicidade com o sistema repressivo, além da atuação de militantes e dos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade (CNV) e de outras comissões em nível estadual e municipal. As atividades do Grupo de Trabalho 13 (GT 13) da CNV, que se debruçou sobre as violações cometidas contra os trabalhadores, foram fundamentais para levantar elementos e, com a parceria de pesquisadores e militantes argentinos - onde a agenda de reparação e as políticas de memória, verdade e justiça estão bem mais avançadas do que aqui -, foi levantado o material fornecido ao MPF, que acionou a empresa. Nesse sentido, a atuação dos militantes do Intercâmbio, Investigações, Estudos e Pesquisas (IIEP), órgão ligado às centrais sindicais, foi decisiva. Apesar disso, agentes fundamentais nesse processo, como Rosa Cardoso, Sebastião Neto, Adriano Diogo, Adriana Gomes Santos e Antonio Fernandes Neto expressaram contrariedade com o resultado final do acordo firmado, dado que, na reta final, os movimentos sociais e ex-trabalhadores foram alijados da negociação e o TAC não incluiu, dentre outras demandas, a criação de um “Lugar de Memória das Lutas dos Trabalhadores”, o que era um pleito fundamental do grupo, dada a inexistência de iniciativas como essa no país (Cardoso et al., 2020CARDOSO, Rosa et al. Ativistas de Direitos Humanos criticam acordo com a Volkswagen sobre cumplicidade com a ditadura. 24 set. 2020. Disponível em: Disponível em: https://esquerdaonline.com.br/2020/09/24/ativistas-de-direitos-humanos-criticam-acordo-com-a-volkswagen-sobre-cumplicidade-com-a-ditadura/?fbclid=IwAR3dhxw8BiRD1S4vvzkYyB7spkhiQzTAoFE9VJFn_HhjYf-E955eMNUMUKA . Acesso em: 2 mar. 2021.
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).

O propósito deste artigo é analisar a atuação da Volkswagen do Brasil durante a ditadura civil-militar implantada no país com o golpe de Estado de 1964, com ênfase sobre a colaboração da empresa com os órgãos repressivos. Para tal, usamos um conjunto de fontes composto pelos seguintes itens: documentos produzidos pela empresa, como a revista Família Volkswagen; acervo mantido pelos órgãos de repressão, como as fichas e os relatórios produzidos pela própria Volkswagen e enviados para o Departamento de Ordem Política e Social (DEOPS), depois depositados no Arquivo Público do Estado de São Paulo (APESP); material produzido pelo Serviço Nacional de Informações (SNI) e disponível no fundo do órgão mantido no Arquivo Nacional; dados e informações divulgados pela Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotores (ANFAVEA); fontes produzidas pelos trabalhadores, como o jornal sindical “Tribuna Metalúrgica”; além de depoimentos concedidos nas comissões da verdade e em outros canais. Utilizamos esse conjunto variado de fontes com o objetivo de apresentar uma visão diversa, que contraste o discurso oficial da empresa com as práticas cometidas por ela, tarefa empreendida por meio tanto do acesso aos documentos elaborados pela organização quanto pela consulta às críticas e denúncias formuladas pelos trabalhadores e sindicalistas. Com isso, buscamos evitar ficar reféns de um tipo exclusivo de fonte e de um olhar sobre a realidade e o objeto analisado.

Para darmos conta das intenções do nosso texto, dividimos o artigo em três partes. Após essas reflexões introdutórias, analisamos o estado da discussão na temática da relação entre empresas e ditadura no Brasil e na América Latina, tentando apreender e fornecer aspectos interpretativos e metodológicos que dão base ao nosso artigo. Em seguida, contextualizamos a trajetória da Volkswagen e sua atuação no Brasil antes e durante a ditadura, abordando aspectos mais genéricos e amplos, como o desempenho econômico e a expansão durante o regime, além de algumas polêmicas envolvendo a empresa no período. Na seção posterior, investigamos as denúncias de colaboração da companhia com o sistema repressivo durante a ditadura brasileira, trazendo relatos, fontes e elementos que comprovam a cooperação da montadora com os órgãos de repressão e controle sobre os trabalhadores no período. Em seguida, realizamos nossos apontamentos finais, buscando uma síntese analítica do problema proposto no texto.

A RELAÇÃO ENTRE EMPRESAS E DITADURAS NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA

O tema dos estudos sobre empresas e ditaduras no Brasil e na América Latina corresponde hoje a um campo consolidado nos estudos científicos, contando, inclusive, com uma rede internacional de pesquisadores/as constituída. Existem também organizações de perfil similar em nível nacional, em comunidades de caráter interdisciplinar - apesar da predominância dos historiadores -, havendo uma produção substantiva de artigos e livros sobre o tema, em especial nos países do Cone Sul. Apesar de a temática estar hoje mais associada ao terreno da História, originalmente as pesquisas e análises procedidas sobre a questão estavam mais circunscritas às áreas das Ciências Sociais e Econômicas. Assim, durante a ditadura brasileira e no período logo posterior, autores como Octavio Ianni (1981IANNI, Octavio. A Ditadura do Grande Capital. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1981.), Fernando Henrique Cardoso (1964CARDOSO, Fernando Henrique. Empresário Industrial e Desenvolvimento Econômico no Brasil. São Paulo: Difel, 1964.), Luciano Martins (1968MARTINS, Luciano. Industrialização, Burguesia Nacional e Desenvolvimento. Rio de Janeiro: Saga, 1968.), Renato Raul Boschi (1979BOSCHI, Renato Raul. Elites Industriais e Democracia. Rio de Janeiro: Graal, 1979.), René Armand Dreifuss (1981DREIFUSS, René Armand. 1964: A Conquista do Estado: ação política, poder e golpe de classe. 3ª Ed. Petrópolis: Vozes, 1981.), Ary Minella (1988MINELLA, Ary César. Banqueiros: organização e poder político no Brasil. Rio de Janeiro: Espaço e Tempo; ANPOCS, 1988.), Sebastião Velasco e Cruz (1995CRUZ, Sebastião Carlos Velasco e. Empresariado e Estado na Transição Brasileira: um estudo sobre a economia política do autoritarismo, 1974-1977. Campinas; São Paulo: Editora da Unicamp; Fapesp, 1995.) e Maria Antonieta Leopoldi (2000LEOPOLDI, Maria Antonieta Parahyba. Política e Interesses na Industrialização Brasileira: as associações industriais, a política econômica e o Estado. São Paulo: Paz e Terra, 2000.) dedicaram esforços para entender a atuação e a relação do empresariado com o regime, verificando formas de empenho político e posicionamento desses agentes ante o golpe de Estado, as práticas autoritárias e a política econômica da ditadura1 1 Não pretendemos aqui fazer um balanço exaustivo da produção historiográfica acerca da relação das empresas e do empresariado com o regime ditatorial brasileiro. Para tal, ver Campos (2020). .

Dentre esses trabalhos a respeito do tema abordado se sobressai a obra de Dreifuss. Ao nosso ver, o seu livro, derivado de tese de doutorado defendida em Glasgow em 1980, ganha destaque por três aspectos fundamentais: por usar um aparato teórico-conceitual bastante inovador, em boa medida baseado nas reflexões e categorias analíticas formuladas por Antonio Gramsci; pelas fontes com as quais ele trabalhou, dado que obteve acesso, no Arquivo Nacional, ao acervo do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), órgão de perfil empresarial-militar que teve um papel fundamental no golpe de 1964 e na elaboração de projetos de políticas públicas e de reformulação do Estado capitalista brasileiro que vieram a ser implementados sobretudo após a tomada do Estado, e, por fim, por sua obra trazer uma contribuição singular no que diz respeito à análise do golpe e da ditadura, tendo em vista que ele busca superar a noção estrita de um simples golpe e regime militar:

O novo Estado estabelecido em 1964 agiu, não só em nome do bloco de poder financeiro-industrial multinacional e associado, mas também sob o comando do bloco de poder vigente organizado pelo Ipes. O Estado de 1964 era de fato um Estado classista e, acima de tudo, governado por um bloco de poder. [...] Em suma, o Ipes representava, de forma orgânica, o poder dos interesses multinacionais e associados com uma visão estratégica que transcendia interesses restritos de companhias específicas ou de grupos sociais e capaz de formular diretrizes políticas que beneficiavam todo o bloco (Dreifuss, 1981DREIFUSS, René Armand. 1964: A Conquista do Estado: ação política, poder e golpe de classe. 3ª Ed. Petrópolis: Vozes, 1981., p. 488. Grifamos).

Assim, o autor chama a atenção para o perfil de classe do golpe de 1964 e do regime político inaugurado desde então. De acordo com as suas ponderações e reflexões, podemos entender que a derrubada do sistema político ocorrida em 1964 e a ditadura que lhe deu sequência possuem um sentido eminentemente civil-militar, ou então empresarial-militar, tendo em vista que a acepção de golpe e regime civil-militar na obra de Dreifuss não deve ser compreendida de maneira amorfa ou genérica, mas sim com conteúdo de classe, dizendo respeito aos grupos dominantes da sociedade.

Dessa forma, o trabalho de Dreifuss contribuiu significativamente para os estudos sobre empresas e ditadura no Brasil, no sentido de que fez avançar o conhecimento sobre o empenho dos empresários no golpe. O livro inovou em termos analíticos e conceituais sobre como compreender o fenômeno histórico da ditadura e seus principais agentes e condutores do processo político no período. Apesar de o assunto não dispor de tanta intensidade de estudos e debates nas décadas seguintes (anos 1990 e 2000), ele ganhou intenso fôlego na segunda década do século XXI, em meio ao impulso gerado pelos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade (CNV) e de iniciativas congêneres. Foi formado um ambiente fértil para pesquisas e estudos acadêmicos que fizeram avançar o conhecimento acerca da ditadura e da atuação empresarial no regime. Assim, trabalhos como os de Jorge José de Melo (2012MELO, Jorge José de. Boilesen, um Empresário da Ditadura: a questão do apoio do empresariado paulista à Oban/Operação Bandeirantes, 1969-1971. Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2012.), Pedro Campos (2014CAMPOS, Pedro Henrique Pedreira. Estranhas Catedrais: as empreiteiras brasileiras e a ditadura civil-militar, 1964-1988. Niterói: Eduff, 2014.), João Braga Arêas (2015ARÊAS, João Braga. As Batalhas de O Globo: ditadura militar, Lula X Collor, privatizações e a vitória do PT em 2002. Curitiba: Prismas, 2015.), Martina Spohr (2020SPOHR, Martina. American Way of Business. Curitiba: Appris, 2020.), Elaine Bortone (2018BORTONE, Elaine de Almeida. O Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e a Ditadura Empresarial-militar: os casos das empresas estatais federais e da indústria farmacêutica (1964-1967). Tese (Doutorado em História Social) - Instituto de História, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2018.), Rafael Moraes (2018MORAES, Rafael. O Canto do Cisne do Desenvolvimentismo Brasileiro: uma análise das relações do empresariado industrial com o Estado do II PND à crise dos anos 1980. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Econômico) - Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 2018.), Marcelo Almeida de Carvalho Silva (2018SILVA, Marcelo Almeida de Carvalho. As Práticas de Normalização da Violência Operacionalizadas pela Volkswagen do Brasil na Ditadura Militar Brasileira (1964-1985). Tese (Doutorado em Administração de Empresas) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2018.), Ana Carolina Reginatto Moraes (2019MORAES, Ana Carolina Reginatto. A ditadura empresarial-militar e as mineradoras (1964-1988). Tese (Doutorado em História Social) - Instituto de História, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2019.), Ana Beatriz Barros da Silva (2019SILVA, Ana Beatriz Ribeiro Barros. Corpos para o Capital: acidentes de trabalho, prevencionismo e reabilitação profissional durante a ditadura militar brasileira (1964-1985). Jundiaí: Paco, 2019.), Viviane Magalhães (2019MAGALHÃES, Viviane de Fátima. Antônio Delfim Netto: trajetória acadêmica, interface junto ao empresariado e atuação como ministro da ditadura de um intelectual orgânico da burguesia brasileira (1948-1973). Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Seropédica, 2019.), Elisandra Galvão (2020GALVÃO, Elisandra de Araújo. A Política na CNA: organização, mobilizações e inserções do patronato rural no Estado. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) - Instituto de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2020.), Marlon Marques (2020MARQUES, Marlon Rodrigues. Nos Átrios do Golpismo: associações civis e religiosas na desestabilização do governo de João Goulart. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Seropédica, 2020.) e Richard Martins (2020MARTINS, Richard de Oliveira. Lutas Vigiadas: militância operária, retaliação patronal e repressão no Vale do Paraíba (1979-1994). Tese (Doutorado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 2020.), entre muitos outros, ajudaram significativamente para que conhecêssemos melhor como se deu a atuação empresarial no período da ditadura, tendo em vista que o tema da atuação desses agentes no golpe foi em medida considerável contemplada pela pesquisa de Dreifuss, mas não se pode dizer o mesmo sobre os mais de 20 anos do regime.

Não foi só no Brasil que a discussão floresceu. Pelo contrário, ela figura de forma ainda mais madura em outros países, tanto no que concerne ao volume e ao alcance das pesquisas, como na consolidação de métodos de investigação e mesmo de políticas públicas de memória e ações judiciais contra os grupos econômicos que cooperaram com o terror de Estado. Na América Latina, o país que possui maior massa crítica a respeito e experiência nessa agenda é a Argentina, que dispõe de uma produção numerosa e qualificada sobre a questão. Um marco desse processo é a publicação do livro Cuentas Pendientes, em 2013, organizado por Juan Pablo Bohoslavsky e Horacio Verbitsky. A coletânea traz uma série de textos de variados autores, de perfil acadêmico e militante, que aborda em diversos níveis e dimensões a “cumplicidade econômica com a ditadura”. De acordo com a abordagem de Bohoslavsky (2013BOHOSLAVSKY, Juan Pablo; VERBITSKY, Horacio. Cuentas Pendientes: los cómplices económicos de la dictadura. Buenos Aires: Siglo Ventiuno Editores, 2013.), a ditadura possui um déficit estrutural de legitimidade que é contrabalançada com a compra de lealdade junto a empresários e agentes da repressão, como militares e policiais. O mesmo autor organizou livros congêneres sobre a ditadura uruguaia (Bohoslavsky, 2016BOHOSLAVSKY, Juan Pablo (Org.). El Negocio del Terrorismo de Estado: los cómplices económicos de la dictadura uruguaya. Montevideo: Penguin, 2016.) e a chilena (Bohoslavsky; Fernández; Smart, 2019BOHOSLAVSKY, Juan Pablo; FERNÁNDEZ, Karinna; SMART, Sebastián (Orgs.). Complicidad económica con la ditadura chilena: un país desigual a la fuerza. Santiago: LOM, 2019.), trazendo uma enorme contribuição para o desenvolvimento da pauta de estudos e ações nesses dois países. Além desses livros, algumas obras recentes buscam desenvolver uma análise de perfil internacional e comparativa, estabelecendo semelhanças e diferenças entre a relação da classe empresarial com as ditaduras estabelecidas na América Latina no período da Guerra Fria2 2 Sobre isso, ver Basualdo, Berghoff e Bucheli (2020), além do dossiê organizado por Basualdo e Campos (2020). .

Na Argentina, o desenvolvimento da questão é tão avançado que recentemente foi publicado um extenso relatório no qual se expressa um método de trabalho para o estabelecimento de responsabilidade empresarial por violações aos direitos humanos em períodos de ditadura:

Este documento estuda a responsabilidade de um setor do empresariado nacional e estrangeiro nas violações dos direitos humanos cometidas durante a última ditadura argentina. Ele o faz a partir do exame de um arco de práticas empresariais de repressão aos trabalhadores em empresas localizadas em diferentes regiões do país. As provas recolhidas e analisadas em um conjunto de casos, limitados em número, mas altamente significativos pela sua importância econômica, permitem afirmar que, no território dos estabelecimentos fabris, as ações das Forças Armadas e as ações empresariais se conjugaram efetivamente, exercendo o poder repressivo contra os trabalhadores. Essa articulação, consubstanciada em diretrizes do Exército que expressavam uma preocupação comum com o conflito entre capital e trabalho, fazia parte da estratégia das grandes empresas, que colocavam em ação uma ampla variedade de práticas repressivas que incluíam a entrega de informações e a contribuição da logística e de recursos materiais às forças repressivas e a instalação de centros de detenção clandestinos nas dependências de suas fábricas, entre outros. Essas práticas, tanto por suas características próprias, como por estarem inseridas na trama do terrorismo de Estado quando vinculadas aos fatos que tiveram os trabalhadores como vítimas, configuram-se como crimes contra a humanidade (Argentina, 2016, p. 1)3 3 No original: “Este documento estudia la responsabilidad que tuvo un sector del empresariado nacional y extranjero en las violaciones a los derechos humanos cometidas durante la última dictadura argentina. Lo hace a partir del examen de un arco de prácticas empresariales de represión a los trabajadores en empresas situadas en distintas regiones del país. La evidencia recogida y analizada en un conjunto de casos, acotados en número pero muy significativos por su importancia económica, permite afirmar que, en el territorio de los establecimientos fabriles, se combinaron con eficacia el accionar de las Fuerzas Armadas y el accionar empresarial para ejercer el poder represivo contra los trabajadores. Dicha articulación, plasmada en directivas del Ejército que manifestaron una común preocupación por la conflictividad entre el capital y el trabajo, formó parte de la estrategia de grandes empresas, que pusieron en juego una amplia variedad de prácticas represivas que incluyeron la entrega de información y el aporte de recursos logísticos y materiales a las fuerzas represivas y la instalación de centros clandestinos de detención en el predio de sus fábricas, entre otras. Estas prácticas, tanto por sus características propias, como porque se insertaban en la trama del terrorismo de Estado al vincularse con los hechos que tuvieron como víctimas a los trabajadores, se configuran como delitos de lesa humanidade.” (Argentina, 2016, p. 1). .

O livro traz uma série de estudos de caso, mostrando a colaboração com a repressão por parte de empresas como Ford, Mercedes-Benz, Swift, Fiat, Loma Negra, entre outras. Realizado por historiadores e outros especialistas, o estudo contou com um método de trabalho rigoroso, verificando a colaboração empresarial com os órgãos repressivos e a realização de crimes, como o uso das dependências da empresa para detenção ilegal e realização de tortura. Com uso de fontes documentais que atestavam essas práticas, o relatório indicou a responsabilidade das empresas pelas violações dos direitos humanos dos trabalhadores vítimas de abusos no período da ditadura no país.

Como veremos adiante, os elementos indicados pelos pesquisadores argentinos guardam estreita semelhança com o que era praticado pela Volkswagen durante a ditadura brasileira, permitindo um debate sobre a responsabilização da empresa pelos crimes cometidos contra os seus funcionários. Porém, antes de analisar as violações perpetradas pela montadora, é importante conhecer a sua história e atuação no Brasil.

BREVE HISTÓRICO DA TRAJETÓRIA DA VOLKSWAGEN NA ALEMANHA E NO BRASIL4 4 Não pretendemos uma abordagem exaustiva sobre a questão. Acerca da trajetória da empresa no país, bem como de outras firmas alemãs, ver Russau (2017) e Bandeira (2011 [1994]).

A Volkswagen é hoje a maior montadora de automóveis do mundo, disputando a liderança do mercado global com a japonesa Toyota e superando a produção anual de veículos da Ford, da GM, da Peugeot, da Fiat e de outras grandes fabricantes internacionais (Quintanilha, 2020QUINTANILHA, Sergio. Matéria Volks e Toyota brilham no ranking global de montadoras. 15 jan. 2020. Disponível em: Disponível em: https://www.terra.com.br/parceiros/guia-do-carro/volks-e-toyota-brilham-no-ranking-global-de-montadoras,c6b390d8658884425d99d922e1748dab6bp33i97.html . Acesso em: 1 mar. 2021.
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). Apesar de constar no topo do ranking de um dos principais segmentos industriais da economia internacional, o grupo econômico dispõe de uma história controversa5 5 Além das polêmicas envolvendo a empresa e sua vinculação original com o nazismo, deve-se salientar outras questões atravessadas pelo grupo em período mais recente, como o esquema de fraudes de testes de emissões de gases poluentes, ou “Dieselgate”. Sobre isso, ver Autoesporte, 2015. .

A empresa foi formada na década de 1930 por iniciativa do Partido Nacional-Socialista Alemão, que buscou o engenheiro austríaco Ferdinand Porsche para desenvolver um modelo de automóvel que fosse prático, econômico, popular e barato, um “carro do povo”. Nasceu aí o projeto da Volkswagen, com o modelo “fusca”, que passou a ser produzido na fábrica da empresa, cuja construção teve início em 1937. A partir do ano seguinte, a planta industrial começou a fabricar os seus primeiros automóveis. A inspiração da unidade fabril remontava ao método da linha de produção estabelecido na fábrica da Ford em Detroit nos anos 1910, que inspirou o estabelecimento de unidades industriais semelhantes em outros locais do mundo na década de 1930, como na União Soviética (Huberman, 1986HUBERMAN, Leo. A História da Riqueza do Homem: Do Feudalismo ao Século XXI. 21ª Ed. Rio de Janeiro: LTC, 1986 [1936]. [1936]). Durante a guerra, a fábrica da montadora em Wolfsburg foi adaptada ao esforço relacionado ao conflito e usou força de trabalho compulsória, havendo levantamentos que indicam que 20 mil trabalhadores forçados atuaram na fábrica da Volkswagen (Silva, 2018SILVA, Marcelo Almeida de Carvalho. As Práticas de Normalização da Violência Operacionalizadas pela Volkswagen do Brasil na Ditadura Militar Brasileira (1964-1985). Tese (Doutorado em Administração de Empresas) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2018.). Não só a Volkswagen teve a sua história associada ao nazismo, mas também outras empresas alemãs (Vuillard, 2019VUILLARD, Éric. A Ordem do Dia. São Paulo: Tusquets, 2019.) e de outros países, como a norte-americana IBM (Black, 2001BLACK, Edwin. IBM e o Holocausto: a aliança estratégica entre a Alemanha nazista e a mais poderosa empresa americana. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Campus, 2001.).

A empresa não foi desmobilizada após a guerra e continuou tendo participação fundamental do capital estatal alemão. A montadora teve expansão após o conflito e foi um dos emblemas do “milagre alemão”, passando a exportar automóveis na Europa já em 1948. A primeira filial no exterior da empresa foi justamente no Brasil, dado como o mercado mais promissor da América Latina após a visita de um dirigente da montadora à região. Em 1953, a empresa se instalou no país com uma unidade que fazia a importação de peças e a montagem dos veículos Kombi e Fusca. Para se estabelecer no país, o grupo germânico se associou à família Monteiro Aranha, detentora de 20% do capital da Volkswagen do Brasil, estando o resto do capital sob controle da matriz. Com os incentivos do governo Kubitschek para o estabelecimento de fábricas e a nacionalização da produção de automóveis, a Volkswagen recebeu uma série de incentivos, como isenções fiscais, garantias cambiais e financiamentos facilitados do BNDE (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico) para montar uma planta industrial completa no Brasil. A partir dos privilégios concedidos ao capital estrangeiro pela instrução 113 da Superintendência da Moeda e do Crédito do Banco do Brasil, a SUMOC (Ianni, 1986IANNI, Octavio. Estado e Planejamento Econômico no Brasil. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 1986.), a montadora alemã estabeleceu em 1957 uma unidade industrial em São Bernardo do Campo, na grande São Paulo (Silva, 2020SILVA, Marcelo Almeida de Carvalho. A expansão da Volkswagen do Brasil baseada em políticas econômicas e alinhamento ideológico. In: CAMPOS, Pedro Henrique Pedreira; BRANDÃO, Rafael Vaz da Motta; LEMOS, Renato Luís do Couto Neto e (Orgs.). Empresariado e ditadura no Brasil. Rio de Janeiro: Consequência, 2020. pp. 463-480.).

A empresa foi líder de mercado no país desde a inauguração da sua fábrica e ao longo de toda a ditadura. Com o modelo de transporte que privilegiava as rodovias, com a eliminação de ramais ferroviários, a construção de novas estradas e os incentivos à indústria automobilística, o regime viu crescer significativamente a atividade industrial no país nas suas mais de duas décadas de vigência, com destaque para o segmento produtor de bens duráveis, que tinha como estrela maior justamente a fabricação de automóveis. Assim, dados da ANFAVEA (2014ANFAVEA. Anuário da Indústria Automobilística. São Paulo: Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores. 2014. Disponível em: Disponível em: https://acervo.anfavea.com.br/AcervoDocs/Anu%C3%A1rio%202014.pdf . Acesso em 6 dez. 2021.
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) indicam que o setor automotivo como um todo correspondia a 13% do PIB brasileiro em 1966 e 20,6% em 1975. A Volkswagen era a maior montadora do país, sendo responsável por 42% da produção nacional de veículos e 51% de automóveis em 1966. Cinco anos depois, esses mesmos índices foram respectivamente a 57 e 64%. A empresa construiu duas novas fábricas e adquiriu empresas, como a Vemag e a Chrysler do Brasil. Apenas no ano de 1979, produziu 475 mil veículos, recorde da empresa no país, uma marca que só foi superada posteriormente em 1995 (Silva, 2018SILVA, Marcelo Almeida de Carvalho. As Práticas de Normalização da Violência Operacionalizadas pela Volkswagen do Brasil na Ditadura Militar Brasileira (1964-1985). Tese (Doutorado em Administração de Empresas) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2018.). Na década de 1970, a Volkswagen do Brasil era a maior empresa privada do país, maior que qualquer empresa nacional e só inferior em termos de faturamento às companhias estatais, como a Petrobrás (Kopper, 2020KOPPER, Christopher. Business as Usual Under a Military Regime? Volkswagen do Brazil and the Military Dictatorship in Brazil (1964-1980). In: BASUALDO, Victoria; BERGHOFF, Hartmut; BUCHELI, Marcelo (Orgs.). Big Business and Dictatorships in Latin America: A Transnational History of Profits and Repression. Cham (Suíça): Palgrave Macmillian , 2020. pp. 319-344.). Nesse período, as atividades da montadora correspondiam a aproximadamente 1% do PIB brasileiro (Dodt; Aders, 2017DODT, Stefanie; ADERS, Thomas. CÚMPLICES: a Volkswagen e a ditadura militar no Brasil (Komplizen?). Alemanha: Deutsche Welle, 2017. 44 min. ).

No entanto, não é só de sucesso que vivia a empresa. A companhia esteve envolvida em uma série de polêmicas nesse período. Nos anos 70, a montadora diversificou suas atividades no país e estabeleceu outros negócios como a montagem e a exploração de fazendas na região amazônica. Na propriedade de Cristalino foram realizados experimentos agroindustriais marcados por denúncias de graves impactos socioambientais, além do uso de força de trabalho compulsória (Acker, 2014ACKER, Antoine. “O maior incêndio do planeta”: como a Volkswagen e o regime militar brasileiro acidentalmente ajudaram a transformar a Amazônia em uma arena política global. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 34, n. 68, pp. 13-33, 2014.).

Além disso, em sua revista oficial, a Família Volkswagen, a empresa não só não era crítica em relação à ditadura e às suas arbitrariedades como fazia coro com o discurso ufanista alardeado pelo regime. Assim, a empresa realizava cerimônias com a presença de autoridades governamentais, como a festividade em homenagem à produção de um milhão de automóveis no país pelo grupo em 1970, que contou com a participação do presidente mundial da fabricante, Kurt Lotz, o prefeito de São Paulo, Paulo Maluf, o governador do estado, Abreu Sodré, o comandante do II Exército, general Canavarro Pereira, o ex-ministro Roberto Campos e ministros, que representaram o ditador Emílio Garrastazu Médici (Anfavea, 2016ANFAVEA. Anuário da Indústria Automobilística. São Paulo: Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores . 2016. Disponível em: Disponível em: https://acervo.anfavea.com.br/AcervoDocs/Anu%C3%A1rio%202016.pdf . Acesso em 6 dez. 2021.
https://acervo.anfavea.com.br/AcervoDocs...
).

Outra controvérsia diz respeito ao fato de que, em 1967, foi descoberto que a filial brasileira da montadora alemã empregava Franz Paul Stangl, criminoso nazista responsável por campos de extermínios durante a Segunda Guerra Mundial, tendo ele atuado em Treblinka, envolvido na morte de milhares de pessoas naquele campo. Stangl era responsável, na Volkswagen do Brasil, justamente pelo setor de controle sobre os trabalhadores, tendo ele sido responsável por montar uma estrutura de vigilância sobre os operários a qual contava com dezenas de pessoas, sobretudo militares e policiais. Depois de descoberto, Stangl foi extraditado para a Alemanha Ocidental, onde foi condenado à prisão perpétua em 1971, morrendo de ataque cardíaco seis meses após a sentença (Abal, 2017ABAL, Felipe Cittolin. Um nazista na Volkswagen do Brasil: Franz Stangl e a cooperação entre militares e industriais durante a ditadura militar brasileira. Dimensões, v. 38, pp. 240-256, jan.-jun. 2017.).

Além de empregar um criminoso nazista em seu quadro funcional, a empresa colaborou com o sistema repressivo através da cessão de carros à Operação Bandeirantes, iniciativa que buscava perseguir os integrantes da resistência armada à ditadura e que utilizava métodos como detenções ilegais, tortura e assassinato dos opositores do regime. A Volkswagen era uma das empresas que cooperavam com a Oban, assim como a Folha de S. Paulo, a Ford, a Supergel e a Ultragás, dentre outros grupos econômicos que apoiaram as políticas de terrorismo de Estado da ditadura brasileira (Gaspari, 2002GASPARI, Elio. A Ditadura Escancarada. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.).

No entanto, a maior das polêmicas envolvendo a empresa e a sua relação com a ditadura, a qual inclusive deu motivo para o processo judicial movido contra a montadora, diz respeito à sua colaboração com o aparato repressivo do regime.

A VOLKSWAGEN E A REPRESSÃO AOS TRABALHADORES DURANTE A DITADURA

Consoante o processo de expansão da empresa ao longo da ditadura, beneficiada pelas políticas em favor do transporte rodoviário e do crescimento do processo de urbanização, a montadora foi aumentando a força de trabalho empregada e a quantidade de operários que atuavam em suas fábricas. Em uma contagem global, em 1966 a empresa possuía um total de 50 mil funcionários e, em 1975, acumulava 150 mil empregados (Silva, 2018SILVA, Marcelo Almeida de Carvalho. As Práticas de Normalização da Violência Operacionalizadas pela Volkswagen do Brasil na Ditadura Militar Brasileira (1964-1985). Tese (Doutorado em Administração de Empresas) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2018.).

Como a classe trabalhadora como um todo durante a ditadura (Negro, 2004NEGRO, Antonio Luigi. Linhas de Montagem: o industrialismo nacional-desenvolvimentista e a sindicalização dos trabalhadores. São Paulo: Boitempo, 2004.), os operários da Volkswagen sofreram com contenção salarial, perda de direitos e práticas repressivas. Assim, os operários da companhia foram especialmente lesados com o fim da estabilidade por tempo de serviço nas empresas privadas durante o governo Castelo Branco (1964-1967). Com sua fábrica estabelecida em 1957, diversos operários se tornariam estáveis na segunda metade da década de 1960, mas não tiveram esse direito garantido, dada a mini reforma trabalhista da ditadura, que extinguiu essa conquista e instituiu o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS)6 6 Sobre o FGTS, ver Ferrante (1978) e Valeriano (2008). . Dada a participação decisiva de grupos estrangeiros e empresas associadas ao capital internacional no golpe de 1964 e no primeiro governo da ditadura, há indicações de que a medida tinha como alvo fundamental a inviabilização da estabilidade justamente dos funcionários das companhias multinacionais que se estabeleceram no país durante o governo Kubitschek (1956-1961). O historiador Christian Kopper, que teve acesso aos documentos internos da Volkswagen, indica que foram comemoradas na empresa as medidas iniciais da ditadura, como o fim da estabilidade do trabalhador no setor privado, a proibição das greves e outras medidas que favoreciam os empregadores (Kopper, 2020KOPPER, Christopher. Business as Usual Under a Military Regime? Volkswagen do Brazil and the Military Dictatorship in Brazil (1964-1980). In: BASUALDO, Victoria; BERGHOFF, Hartmut; BUCHELI, Marcelo (Orgs.). Big Business and Dictatorships in Latin America: A Transnational History of Profits and Repression. Cham (Suíça): Palgrave Macmillian , 2020. pp. 319-344.).

De forma similar, tal como ocorreu com outros trabalhadores durante a ditadura, os operários da Volkswagen sofreram com reajustes salariais abaixo da inflação, baseados em índices deturpados em relação aos dados reais do custo de vida. Em outra frente, tal qual em outros setores da economia, a multinacional alemã aproveitou as facilidades dadas pelo governo para contratar horas extras de seus funcionários, sendo que o cálculo para a contagem das mesmas era atrelado ao pagamento das férias, do 13º salário e do FGTS. Na década de 1970, a empresa chegava a contabilizar um total de 300 mil horas extras pagas por mês. Com a intensificação da exploração da força de trabalho, houve ganhos de produtividade por trabalhador nas fábricas. Assim, um funcionário da Volkswagen era responsável pela fabricação de 6,6 carros por ano em 1968. Esse mesmo índice saltou para 10,53 em 1973 e 11,86 em 1976. Apesar de os dados sugerirem um uso mais racional do trabalho humano e a introdução de inovações tecnológicas no sistema produtivo, boa parte dessa elevação na produtividade se deve a uma maior exploração da força de trabalho e ao uso de artifícios como as horas extras (Silva, 2018SILVA, Marcelo Almeida de Carvalho. As Práticas de Normalização da Violência Operacionalizadas pela Volkswagen do Brasil na Ditadura Militar Brasileira (1964-1985). Tese (Doutorado em Administração de Empresas) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2018.; Singer, 1976SINGER, Paul Israel. A Crise do “Milagre”: interpretação crítica da economia brasileira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.).

Por fim, as condições sanitárias, de higiene e segurança no ambiente das fábricas eram questionadas pelos trabalhadores. O discurso oficial da empresa ia no sentido oposto. Em sua revista, a Família VW, a empresa alegava que os cuidados com a saúde do trabalhador ficavam a cargo da seção médica, “setor de máxima importância dentro do sistema de relações humanas adotado pela Volkswagen do Brasil em favor da paz e da justiça social” (Volkswagen, 1964VOLKSWAGEN. Revista Família VW, São Bernardo do Campo jun. 1964., p. 7). A empresa alegava ainda que mantinha adequadas condições de higiene no ambiente de trabalho, procurando contribuir para “um maior equilíbrio médico social, eliminando possíveis causas de doenças; tratando as doenças e orientando condições de trabalho sempre melhores.” (Volkswagen, 1963VOLKSWAGEN. Revista Família VW, São Bernardo do Campo fev. 1963., p. 3).

Apesar do cenário idílico desenhado pela montadora, essa não era a percepção dos trabalhadores. O jornal sindical Tribuna Metalúrgica denunciava que, no recinto da fábrica, os operários eram expostos a gases irritantes, névoas ácidas, poeiras de lã de vidro e outros materiais que causavam “chiadeira no pulmão, bronquite, fraqueza, falta de ar, tosse ou muito catarro.” (Sindicato..., 1980SINDICATO dos Metalúrgicos do ABC Paulista. Tribuna Operária, n. 76, São Bernardo do Campo, dez. 1980., pp. 4-5). Além dos impactos respiratórios, o trabalho na planta industrial tinha repercussões sobre a visão: “A vista fica fraca e o trabalhador até pode ficar cego quando lida em locais mal iluminados (...); o calor radiante das fundições pode dar catarata.” (Sindicato..., 1980SINDICATO dos Metalúrgicos do ABC Paulista. Tribuna Operária, n. 76, São Bernardo do Campo, dez. 1980., pp. 4-5). Por fim, a matéria “Não somos máquinas!”, do jornal operário, assinalava a estafa causada pelas longas jornadas de trabalho:

Quantas vezes saímos do trabalho, depois de 12 horas, com dor de cabeça, com canseira, sem disposição até de conversarmos com a nossa mulher e nosso filho e, ao invés de culparmos as condições de trabalho a que somos submetidos, preferimos chamar nossa mulher e filhos de chatos, que só enchem o saco quando a gente quer dormir (Sindicato..., 1980SINDICATO dos Metalúrgicos do ABC Paulista. Tribuna Operária, n. 76, São Bernardo do Campo, dez. 1980., pp. 4-5).

Assim, é possível contrastar a fala oficial da empresa a respeito das condições médicas, sanitárias e de segurança do ambiente de trabalho com os relatos dos trabalhadores, que apontam a precariedade dos cuidados dispensados pela empresa aos seus funcionários, o que gerava problemas de saúde e fadiga dos trabalhadores.

Quando a questão diz respeito à segurança, novamente o que ocorria nas unidades produtivas da Volkswagen guarda muitas semelhanças com o quadro geral da situação dos trabalhadores no país. Assim, em uma época em que o Brasil era líder mundial de acidentes de trabalho (Silva, 2019SILVA, Ana Beatriz Ribeiro Barros. Corpos para o Capital: acidentes de trabalho, prevencionismo e reabilitação profissional durante a ditadura militar brasileira (1964-1985). Jundiaí: Paco, 2019.), eles também eram recorrentes nas fábricas da montadora. Só no primeiro semestre de 1970, operários relataram a morte de cinco trabalhadores na unidade de São Bernardo por acidentes de trabalho. Isso consta em panfleto apreendido pela empresa e encaminhado ao DEOPS, no qual se lê: “três operários morreram esmagados pela prensa. Um operário morreu em consequência da explosão de um tanque. E outro morreu queimado ao incendiar-se com álcool.” (A Volkswagen vista..., 1970A VOLKSWAGEN VISTA por seus operários [Panfleto]; Fundo DEOPS, localização: 50-Z-341-609, São Paulo (APESP - Arquivo Público do Estado de São Paulo). 1970. ). Assim, a empresa parecia atuar como outras no período, sendo relapsa em relação aos cuidados da segurança dos seus trabalhadores, economizando no fornecimento desses itens e abusando das horas extras, o que deixava os operários mais cansados e propensos a acidentes, numerosos no período.

O documento citado acima é representativo também de outro fenômeno verificado no período na relação da empresa com o aparelho estatal, que diz respeito à colaboração da companhia com o aparato repressivo durante a ditadura. Como se vê, a fonte foi obtida no APESP. Isso ocorre porque o Departamento de Segurança Industrial da Volkswagen cooperava com o Departamento de Ordem Política e Social do Estado de São Paulo (DEOPS). Além de repassar panfletos como o mencionado, o órgão da empresa elaborava fichas dos seus funcionários que traziam dados como nome completo, foto, filiação, características físicas, números de documentos, período em que atuou na empresa e atividades políticas desempenhadas pelo trabalhador, como engajamento no sindicato, empenho em greves e distribuição de panfletos:

Figura 1
Exemplo de ficha confeccionada pela Volkswagen enviada ao DEOPS sobre um funcionário da companhia.

A ficha é uma das muitas elaboradas pela empresa e enviada aos órgãos policiais e de repressão. É possível verificar que o documento foi elaborado por conta de o operário Idalécio Custódio da Silva ter sido surpreendido com “panfletos e jornais subversivos” e que o trabalhador será “observado”. É importante assinalar que a empresa assumia em seus documentos um tom de combate e aversão à “subversão” típico do discurso do próprio regime no período.

É interessante notar como na Volkswagen - a exemplo de outras várias empresas -, os agentes responsáveis pela segurança interna e pela vigilância sobre os operários era um militar de formação. Assim, em 1970, o major Ademar Rudge era chefe da segurança industrial da empresa e recebeu um agente do DEOPS na fábrica, entregando-lhe documentos com relatos sobre as atividades políticas dos seus funcionários. Foi feito pelo DEOPS um relatório dessa visita do representante da empresa:

O referido oficial, forneceu ao nosso agente, um relatório elaborado pelo mesmo sobre o assunto, juntamente com fotos e fichas individuais dos elementos suspeitos de terem ligações com a distribuição do referido jornal e panfletos subversivos (Relatório da visita..., 1976RELATÓRIO DA VISITA e documentos fornecidos pelo major Rudge. Fundo DEOPS, localização: 50-Z-30-828, São Paulo (APESP - Arquivo Público do Estado de São Paulo). 1976. ).

É significativo que o representante da multinacional alemã não é referido pelo DEOPS em seu documento como um funcionário da empresa, mas como um “oficial”, ou melhor, um militar que atua no interior da companhia privada. Isso dá a noção da não-descontinuidade entre a empresa e o Estado e, mais especificamente, entre o sistema de vigilância e controle da montadora sobre seus trabalhadores e o aparato repressivo da ditadura.

Das diversas parcerias do sistema de segurança interno da Volkswagen com o aparato policial e repressivo da ditadura ganha destaque a ação para a desmontagem de uma célula do Partido Comunista Brasileiro (PCB) no início dos anos 70. O partido desenvolvia naquele momento um trabalho de base nos sindicatos e nas representações populares que não acessava o uso das ações armadas. Por conta dessa escolha, vários grupos dissidentes se desligaram do partido e formaram organizações que desenvolviam ações armadas contra a ditadura (Gorender, 1987GORENDER, Jacob. Combate nas Trevas: a Esquerda Brasileira: das Ilusões Perdidas à Luta Armada. 2ª Ed. São Paulo: Ática , 1987.). Na Volkswagen, o partido desenvolvia uma ação junto aos trabalhadores que foi devidamente identificada pela própria empresa e pelos órgãos repressivos do regime, como fica evidente nesse documento do DEOPS paulista de 1971:

no início do 3º trimestre [de 1971] ainda era nítida a ênfase dada pelo Partido Comunista Brasileiro - PCB ao trabalho dos “Comitês de Empresas”, em detrimento da ação nos sindicatos [...]. Já agora verifica-se por parte do Partido o estímulo à infiltração nos sindicatos [...]. Não descura, entretanto, o PCB de criar nas empresas suas organizações de base (OB). Foi identificada uma destas OB na Volkswagen do Brasil, em SÃO BERNARDO DO CAMPO/SP, integrada por 32 militantes, e que vinha desenvolvendo um trabalho de aliciamento intenso naquela indústria (Célula do PCB..., 1971CÉLULA DO PCB na Volkswagen; Fundo DEOPS, localização: 200-43-3651, São Paulo (APESP - Arquivo Público do Estado de São Paulo). 1971. ).

Como se percebe, a polícia da ditadura conseguiu encontrar a célula do PCB entre os operários da Volkswagen e identificou a estratégia do partido de formar comitês na empresa e, depois, infiltrar-se nos sindicatos.

Mesmo o Serviço Nacional de Informações (SNI) monitorava a ação do PCB entre os operários da Volkswagen. Em 21 de julho de 1971, os agentes do órgão apreenderam um panfleto intitulado “Como construir o partido nas grandes empresas”. No documento constava o trecho “nossa atuação se desenvolve numa grande empresa imperialista, com milhares de operários [e] somente após 1964 conseguimos reunir quatro companheiros em nossa empresa”. O panfleto indicava ainda a expansão da célula dentro da Volkswagen: “[...] um companheiro [...] começou reunindo quatro ou cinco operários na hora do almoço e daí a algum tempo já reunia mais de cem.” (Como construir o partido..., 1971COMO CONSTRUIR O PARTIDO nas Grandes Empresas; Fundo Serviço Nacional de Informações, Referência: ago_ace_4374_83. Rio de Janeiro (Arquivo Nacional, AN). 1971.). Em depoimento à Comissão Municipal da Verdade de São Paulo, o operário Lúcio Antonio Bellentani, militante do PCB e funcionário da Volkswagen, assim se referiu à desmontagem da célula do partido na empresa, numa ação combinada entre a montadora e a repressão: “naquela época a base do partido dentro da Volkswagen era de aproximadamente 250 pessoas” (CMV, 2012CMV (Comissão Municipal da Verdade de São Paulo Vladimir Herzog). Relatório final. São Paulo: Câmara Municipal de São Paulo. 2012. Disponível em: Disponível em: https://www.saopaulo.sp.leg.br/livrocomissaodaverdade/ . Acesso em: 6 dez. 2021.
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, p. 49).

O diretor geral da polícia do DEOPS de São Paulo enviou um documento ao secretário estadual de segurança de São Paulo em 7 de agosto de 1972, no qual admitia a colaboração com a Volkswagen e o monitoramento sobre a ação política dos operários da montadora:

Este departamento vem há muito procedendo a investigações tendo em vista a ação do Partido Comunista Brasileiro nas grandes empresas que, aliás, obedece a planos já elaborados. Tínhamos conhecimento de que as indústrias automobilísticas seriam visadas, entre elas, a Wolkswagen [sic], o que inclusive motivou um entrosamento entre esta direção e elementos de segurança da citada Empresa (Entrosamento entre a Polícia..., 1972ENTROSAMENTO ENTRE A POLÍCIA do DEOPS e a Volkswagen; Fundo DEOPS, localização: 30-C-1 22488, São Paulo (APESP - Arquivo Público do Estado de São Paulo). 1972. ).

Esse documento revela e comprova a colaboração da empresa com os órgãos repressivos. Para além das fichas e dos relatórios entregues pela companhia ao DEOPS, o relato corrobora a atuação da multinacional alemã em conluio com os órgãos de controle da ditadura.

Toda essa ação de vigilância e monitoramento precedeu o movimento decisivo da repressão em parceria com a Volkswagen. Entre os dias 28 de julho e 8 de agosto de 1972, a polícia prendeu seis trabalhadores da Volkswagen: Amauri Danhone, Annemarie Buschel, Antonio Torini, Geraldo Castro del Pozzo, Henrich Plagge e Lucio Antonio Bellentani. De acordo com o relato de Bellentani, a Volkswagen não entrou simplesmente com as informações e denúncias sobre as atividades políticas dos seus operários. Ela ofereceu suas dependências para a detenção dos trabalhadores e para a própria tortura dos mesmos naquele recinto. O metalúrgico afirmou, na Comissão Municipal da Verdade, que foi “[...] preso dentro da Volkswagen. Estava trabalhando e chegaram dois indivíduos com metralhadora, encostaram nas minhas costas, já me algemaram, isso às 23h, coisa assim. Na hora em que cheguei à sala de segurança da Volkswagen já começou a tortura, já comecei a apanhar ali, comecei a levar tapa, soco. Daí já queriam saber se tinha mais alguém na Volkswagen.” (CMV, 2012CMV (Comissão Municipal da Verdade de São Paulo Vladimir Herzog). Relatório final. São Paulo: Câmara Municipal de São Paulo. 2012. Disponível em: Disponível em: https://www.saopaulo.sp.leg.br/livrocomissaodaverdade/ . Acesso em: 6 dez. 2021.
https://www.saopaulo.sp.leg.br/livrocomi...
, p. 49). No dia seguinte à prisão, quem assumiu o caso Bellentani foi o delegado Sergio Paranhos Fleury, da Operação Bandeirantes. Segundo o trabalhador, “a partir dali começou a pauleira, quer dizer, pau-de-arara, arrebentaram algumas daquelas palmatórias na minha cabeça, nas mãos, nos pés; perdi alguns dentes. Isso daí foi assim por uns 45 dias.” (CMV, 2012CMV (Comissão Municipal da Verdade de São Paulo Vladimir Herzog). Relatório final. São Paulo: Câmara Municipal de São Paulo. 2012. Disponível em: Disponível em: https://www.saopaulo.sp.leg.br/livrocomissaodaverdade/ . Acesso em: 6 dez. 2021.
https://www.saopaulo.sp.leg.br/livrocomi...
, p. 49). No documentário gravado para a rede de televisão alemã em 2017, Bellentani dá mais detalhes sobre a tortura que sofreu: “pegaram um fio elétrico, amarraram um aqui [faz o gesto como se enrolasse o fio na orelha direita] e o outro no canal do pênis. E aí eles começavam a dar choques. E nessa posição assim [indica a posição em que ficava pendurado pelos braços e pernas] formava aquela bacia aqui na barriga, então pra aumentar a sensação do choque eles jogavam água. E ali, eles dando soco na cabeça, na cara, pontapé...” (Dodt; Aders, 2017DODT, Stefanie; ADERS, Thomas. CÚMPLICES: a Volkswagen e a ditadura militar no Brasil (Komplizen?). Alemanha: Deutsche Welle, 2017. 44 min. ).

Bellentani ficou preso durante 40 dias sem que a família soubesse do seu paradeiro ou se ele permanecia vivo. Outro funcionário da Volkswagen que foi preso, José Miguel, chegou a ficar detido durante seis meses no DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informação/Centro de Operações de Defesa Interna) e mais oito meses nas dependências do Cenimar (Centro de Informações da Marinha). A Volkswagen não vigiava seus operários apenas quando eles atuavam como funcionários da empresa. Ela os monitorava mesmo após a demissão. Assim, um documento interno de 1974, encaminhado ao DEOPS, mostra que os diretores da empresa acompanharam o julgamento de seis ex-operários da companhia pelo STM. O documento enviado à repressão indica que os trabalhadores foram condenados pelo “Supremo Tribunal Militar por práticas de subversão” (Condenação de Seis..., 1974CONDENAÇÃO DE SEIS ex-operários da Volkswagen pelo STM; Fundo DEOPS, localização: 50-Z-341 11350001, São Paulo (APESP - Arquivo Público do Estado de São Paulo). 1974. ).

A desarticulação da célula do PCB no auge da ditadura provavelmente foi o maior caso de colaboração da Volkswagen com o aparato repressivo da ditadura civil-militar. No entanto, houve outros momentos em que essa parceria ocorreu durante o regime. Assim, durante as greves de 1978, 1979 e 1980, a Volkswagen desenvolveu intensa vigilância e controle sobre os seus operários, fornecendo dados para os órgãos policiais. Nos arquivos do DEOPS depositados no APESP estão disponíveis 222 boletins elaborados pela Volkswagen do Brasil, com registros de ocorrências durantes as greves do período. O sindicato denunciava a ação da companhia. Dessa forma, em 1978, após a realização do III Congresso Metalúrgico, os sindicalistas denunciaram que a empresa demitiu 11 funcionários que haviam participado da atividade, de acordo com a Tribuna Metalúrgica (Sindicato..., 1978SINDICATO dos Metalúrgicos do ABC Paulista. Tribuna Operária, n. 46, São Bernardo do Campo, jun. 1978.). Durante as greves, a montadora buscou isolar os trabalhadores, chegando a cortar linhas telefônicas e colocando pessoal armado na entrada das principais áreas de produção e das ferramentarias (Humphrey, 1982HUMPHREY, John. Fazendo o “Milagre”: controle capitalista e luta operária na indústria automobilística brasileira. Tradução de Maria Augusta Fonseca. Petrópolis: Vozes; CEBRAP, 1982.). A Volkswagen ameaçava os grevistas de prisão e elaborava “listas negras” ou “listas sujas” com os nomes de operários envolvidos em atividades sindicais, “subversivas” e em greves, repassando aos órgãos repressivos e a outras empresas do ramo (Silva, 2018SILVA, Marcelo Almeida de Carvalho. As Práticas de Normalização da Violência Operacionalizadas pela Volkswagen do Brasil na Ditadura Militar Brasileira (1964-1985). Tese (Doutorado em Administração de Empresas) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2018.; Ianni, 1981IANNI, Octavio. A Ditadura do Grande Capital. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1981.).

Está claro que essas práticas de associação com a repressão, que forneciam informações para os órgãos policiais, não eram exclusividade da Volkswagen, ainda mais no que diz respeito ao monitoramento das atividades políticas e sindicais dos seus operários em meio ao pique de greves do final da década de 1970 e início dos anos 1980. Assim, recentemente foi feita uma extensa reportagem sobre a colaboração da fabricante de automóveis Fiat com os órgãos repressivos em Minas Gerais, em meio às paralisações dos seus operários nas greves do final da década de 1970 (Cesar et al., 2019CESAR, Janaina et al. 145 espiões: o aparelho clandestino da espionagem que enriqueceu a Fiat no Brasil. 25 fev. 2019. Disponível em: Disponível em: https://theintercept.com/2019/02/25/espionagem-enriqueceu-fiat-brasil/ . Acesso em: 1 mar. 2021.
https://theintercept.com/2019/02/25/espi...
). De forma semelhante ao ocorrido com o caso da Volkswagen, os documentos que comprovam o conluio da montadora italiana com o aparato policial e repressivo foram encontrados no Arquivo Público Mineiro (APM).

CONCLUSÃO

Diante do que foi exposto até aqui, podemos proceder algumas considerações finais acerca do sentido e dos significados da colaboração da Volkswagen com a repressão durante a ditadura brasileira.

Os documentos apresentados, em seus termos e mesmo em foto parecem atestar que houve uma significativa colaboração da Volkswagen do Brasil com os órgãos de terrorismo de Estado durante a ditadura civil-militar brasileira. Ao elaborar fichas e registros de seus operários, monitorando suas atividades políticas e sindicais, e ao fornecer esses documentos ao DEOPS, a empresa se propunha a desenvolver uma notória cooperação com a polícia política do regime autoritário, exercendo as ações de monitoramento sobre os seus trabalhadores e submetendo esses dados aos órgãos repressivos. Pelos relatos dos ex-operários, o conluio foi ainda mais intenso e contemplou detenções ilegais realizadas no recinto da fábrica e mesmo práticas de tortura dos funcionários da empresa no interior da planta industrial da Volkswagen em São Bernardo do Campo. Dados esses elementos e considerações, parece atestado que a empresa cooperou com a política autoritária e repressiva da ditadura, sendo ela também responsável pelas violações dos direitos humanos de seus operários durante aquele período.

Os episódios analisados apontam características e aspectos que são deveras impressionantes. O DEOPS não só admitia a colaboração com o Departamento de Segurança Industrial da montadora como atuava ali, chefiando a seção um militar de formação, que tinha canais e portas abertas no órgão policial e nas instâncias repressivas da ditadura. Além disso, a empresa, nas fichas elaboradas, adotava o linguajar e o vocabulário típicos da própria repressão, denunciando aos órgãos de controle que alguns operários mantinham e distribuíam dentro da empresa materiais de cunho “subversivo”. Esses elementos parecem atestar uma certa não-descontinuidade da empresa com a própria ditadura e, em particular, do sistema de vigilância interna dos funcionários da empresa com os órgãos repressivos. Havia um trânsito fluido entre ambos e uma identificação da própria empresa, e de suas práticas burocráticas cotidianas, com o regime. Nesse sentido, casos como esse parecem comprovar o caráter empresarial-militar da ditadura brasileira, que tinha entre os principais beneficiados e contemplados com as ações e políticas do período justamente os proprietários das maiores companhias privadas que atuavam na economia brasileira. Se por um lado o grande empresariado foi o principal segmento social favorecido pelo regime, por outro a ditadura tinha os/as trabalhadores/as e os/as integrantes das classes subalternas em geral como as principais vítimas e onerados/as pelas arbitrariedades e violências da ditadura.

REFERÊNCIAS

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  • VUILLARD, Éric. A Ordem do Dia. São Paulo: Tusquets, 2019.
  • 1
    Não pretendemos aqui fazer um balanço exaustivo da produção historiográfica acerca da relação das empresas e do empresariado com o regime ditatorial brasileiro. Para tal, ver Campos (2020CAMPOS, Pedro Henrique Pedreira. Empresariado e ditadura no Brasil: fontes, métodos e historiografia. Sillogés, v. 3, n. 1, pp. 15-42, 2020.).
  • 2
    Sobre isso, ver Basualdo, Berghoff e Bucheli (2020BASUALDO, Victoria; BERGHOFF, Hartmut; BUCHELI, Marcelo (Orgs.). Big Business and Dictatorships in Latin America: A Transnational History of Profits and Repression. Cham (Suíça): Palgrave Macmillian, 2020.), além do dossiê organizado por Basualdo e Campos (2020BASUALDO, Victoria; CAMPOS, Pedro Henrique Pedreira (Orgs.). Ditaduras, empresas e transformações econômicas e trabalhistas na América do Sul durante a Guerra Fria [Dossiê]. Revista Continentes, ano 8, n. 16, jan.-jun. 2020.).
  • 3
    No original: “Este documento estudia la responsabilidad que tuvo un sector del empresariado nacional y extranjero en las violaciones a los derechos humanos cometidas durante la última dictadura argentina. Lo hace a partir del examen de un arco de prácticas empresariales de represión a los trabajadores en empresas situadas en distintas regiones del país. La evidencia recogida y analizada en un conjunto de casos, acotados en número pero muy significativos por su importancia económica, permite afirmar que, en el territorio de los establecimientos fabriles, se combinaron con eficacia el accionar de las Fuerzas Armadas y el accionar empresarial para ejercer el poder represivo contra los trabajadores. Dicha articulación, plasmada en directivas del Ejército que manifestaron una común preocupación por la conflictividad entre el capital y el trabajo, formó parte de la estrategia de grandes empresas, que pusieron en juego una amplia variedad de prácticas represivas que incluyeron la entrega de información y el aporte de recursos logísticos y materiales a las fuerzas represivas y la instalación de centros clandestinos de detención en el predio de sus fábricas, entre otras. Estas prácticas, tanto por sus características propias, como porque se insertaban en la trama del terrorismo de Estado al vincularse con los hechos que tuvieron como víctimas a los trabajadores, se configuran como delitos de lesa humanidade.” (Argentina, 2016, p. 1).
  • 4
    Não pretendemos uma abordagem exaustiva sobre a questão. Acerca da trajetória da empresa no país, bem como de outras firmas alemãs, ver Russau (2017RUSSAU, Christian. Empresas Alemãs no Brasil: o 7 a 1 na economia. São Paulo: Autonomia Literária, 2017.) e Bandeira (2011 [1994]BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. O “milagre alemão” e o Desenvolvimento do Brasil (1949-2011). 2ª Ed. São Paulo: EdUnesp, 2011 [1994].).
  • 5
    Além das polêmicas envolvendo a empresa e sua vinculação original com o nazismo, deve-se salientar outras questões atravessadas pelo grupo em período mais recente, como o esquema de fraudes de testes de emissões de gases poluentes, ou “Dieselgate”. Sobre isso, ver Autoesporte, 2015AUTOESPORTE. Matéria: Entenda o caso Dieselgate. 12 set. 2015. Disponível em: Disponível em: https://autoesporte.globo.com/carros/noticia/2017/03/entenda-o-caso-dieselgate.ghtml . Acesso em: 2 mar. 2021.
    https://autoesporte.globo.com/carros/not...
    .
  • 6
    Sobre o FGTS, ver Ferrante (1978FERRANTE, Vera Lúcia B. FGTS: Ideologia e Repressão. São Paulo: Ática, 1978.) e Valeriano (2008VALERIANO, Maya Damasceno. O Processo de Precarização das Relações de Trabalho e a Legislação Trabalhista: o fim da estabilidade no emprego e o FGTS. Dissertação (Mestrado em História Social) - Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2008.).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Fev 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    12 Mar 2021
  • Aceito
    29 Set 2021
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