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Variabilidade espacial da qualidade de frutos de melão em áreas fertirrigadas

Spatial variability of fruit quality of melon under fertigation in Mossoró, Brazil

Resumos

Duas áreas de produção de melão fertirrigado por gotejamento foram amostradas em malha para identificar a variabilidade espacial de características de qualidade dos frutos, determinar sua dependência espacial e localizar regiões onde a qualidade dos frutos possa ser melhorada se adotado manejo adequado. Uma área foi cultivada com o híbrido Goldex em Latossolo Vermelho Amarelo eutrófico e a outra com o 'orange Flesh' em Argissolo Vermelho Amarelo. Determinou-se a massa média de frutos comerciáveis, conteúdo de sólidos solúveis totais, firmeza de polpa e espessura da polpa. Os dados foram analisados através da estatística descritiva e da geoestatística, com a qual se avaliou a dependência espacial das variáveis e se confeccionou mapas de isovalores por interpolação. As características estudadas se ajustaram à distribuição normal e apresentaram variabilidade baixa, com exceção do peso médio de frutos comerciáveis do 'Goldex'. A baixa variabilidade foi conseqüência da seleção cuidadosa após a colheita. A dependência espacial foi alta para o teor de sólidos solúveis totais no 'Goldex' e peso médio de frutos comerciáveis nas duas áreas, e foi média para as outras variáveis. Através dos mapas de isovalores, identificaram-se regiões com frutos muito grandes no 'Goldex' e com valores baixos de sólidos solúveis totais no 'Orange Flesh'.

Cucumis melo; variabilidade espacial; sólidos solúveis totais; firmeza de polpa


Two production areas of trickle fertigated melon were grid sampled to assess spatial variability of fruit quality, determining the spatial dependence, and localizing regions where site specific management can improve fruit quality. Goldex hybrid was grown in a Yellow Red Latosol, and orange flesh in a Yellow Red Argisol. Mean fresh mass of marketable fruits (PMCOM), total soluble solids (SST), pulp firmness and pulp thickness were determined. Descriptive statistics was used for an exploratory analysis of data, while geostatistics was used to evaluate spatial dependence of variables and generate contour maps by interpolation techniques. All variables were adjusted to normal distribution, and while PMCOM had medium variability the other variables showed a low variability, which is explained by well-defined selection criteria. Spatial dependence was strong for SST in 'Goldex' and PMCOM in both areas, while the other variables showed a moderate dependence. Contour maps showed regions where fruits exceeded weight standards in 'Goldex' and in 'Orange Flesh' the SST was below standards.

Cucumis melo; spatial variability; total soluble solids; pulp firmness


PESQUISA

Variabilidade espacial da qualidade de frutos de melão em áreas fertirrigadas1 1 Parte da tese apresentada à UFC para obtenção do grau de doutor em Agronomia

Spatial variability of fruit quality of melon under fertigation in Mossoró, Brazil

Neyton de O. MirandaI; Teógenes S. de OliveiraII; Sérgio Luiz A. LevienI; Edivan R. de SouzaI

IESAM, C. Postal 137, 59.625-900 Mossoró-RN; E-mail: neyton@esam.br

IIUFC, Depto. Ciências do Solo

RESUMO

Duas áreas de produção de melão fertirrigado por gotejamento foram amostradas em malha para identificar a variabilidade espacial de características de qualidade dos frutos, determinar sua dependência espacial e localizar regiões onde a qualidade dos frutos possa ser melhorada se adotado manejo adequado. Uma área foi cultivada com o híbrido Goldex em Latossolo Vermelho Amarelo eutrófico e a outra com o 'orange Flesh' em Argissolo Vermelho Amarelo. Determinou-se a massa média de frutos comerciáveis, conteúdo de sólidos solúveis totais, firmeza de polpa e espessura da polpa. Os dados foram analisados através da estatística descritiva e da geoestatística, com a qual se avaliou a dependência espacial das variáveis e se confeccionou mapas de isovalores por interpolação. As características estudadas se ajustaram à distribuição normal e apresentaram variabilidade baixa, com exceção do peso médio de frutos comerciáveis do 'Goldex'. A baixa variabilidade foi conseqüência da seleção cuidadosa após a colheita. A dependência espacial foi alta para o teor de sólidos solúveis totais no 'Goldex' e peso médio de frutos comerciáveis nas duas áreas, e foi média para as outras variáveis. Através dos mapas de isovalores, identificaram-se regiões com frutos muito grandes no 'Goldex' e com valores baixos de sólidos solúveis totais no 'Orange Flesh'.

Palavras-chave:Cucumis melo, variabilidade espacial, sólidos solúveis totais, firmeza de polpa.

ABSTRACT

Two production areas of trickle fertigated melon were grid sampled to assess spatial variability of fruit quality, determining the spatial dependence, and localizing regions where site specific management can improve fruit quality. Goldex hybrid was grown in a Yellow Red Latosol, and orange flesh in a Yellow Red Argisol. Mean fresh mass of marketable fruits (PMCOM), total soluble solids (SST), pulp firmness and pulp thickness were determined. Descriptive statistics was used for an exploratory analysis of data, while geostatistics was used to evaluate spatial dependence of variables and generate contour maps by interpolation techniques. All variables were adjusted to normal distribution, and while PMCOM had medium variability the other variables showed a low variability, which is explained by well-defined selection criteria. Spatial dependence was strong for SST in 'Goldex' and PMCOM in both areas, while the other variables showed a moderate dependence. Contour maps showed regions where fruits exceeded weight standards in 'Goldex' and in 'Orange Flesh' the SST was below standards.

Keywords:Cucumis melo, spatial variability, total soluble solids, pulp firmness.

Na agricultura, a qualidade e quantidade do produto colhido variam de forma espacialmente correlacionada com os fatores de variabilidade no campo (STAFFORD et al., 1996). Estes fatores influenciam principalmente a disponibilidade de nutrientes, o suprimento de água e as condições para o crescimento das raízes (MANTOVANI et al., 1998). A confecção de mapas de produtividade da cultura deve ser o primeiro passo para a adoção do manejo localizado, pois permite a visualização completa da variabilidade dos fatores de produção. A análise destes mapas e da correlação entre as propriedades do solo e da cultura permite a tomada de decisões de manejo associadas à irrigação e drenagem, ao plantio, à aplicação localizada de sementes, fertilizantes e corretivos, herbicidas e defensivos agrícolas e à intensidade do preparo do solo (SCHUELLER, 2000).

A melhor remuneração obtida quando um produto como o melão (Cucumis melo L.) atinge critérios específicos de qualidade justifica que, além do mapeamento da produtividade, sejam mapeadas as características de qualidade. Com a adoção do manejo localizado nas regiões do campo onde os parâmetros de qualidade estejam fora dos padrões, pode-se obter produtos com características superiores na maior parte do campo e, com isto, o aumento do retorno econômico da atividade (BREDEHOEFT et al., 2000; MEDEMA e Van Berjeijk, 2000). Entre os poucos estudos para mapear características de qualidade de produtos agrícolas estão o mapeamento por Humburg e Stange (1998) do conteúdo de açúcar em beterraba e do rendimento de sacarose da cana-de-açúcar a partir de correlação com a condutividade elétrica do solo (LINGLE; WIEGAND, 1997).

Para o mercado internacional do melão existem requerimentos de qualidade definidos por critérios nutricionais, higiênicos, tecnológicos e sensoriais que influenciam a aceitação pelo consumidor, além de resistência ao manuseio, transporte e armazenamento que determinam o preço recebido pelo produto. São exigidos frutos firmes, com conteúdo médio de sólidos solúveis totais (SST) acima de 9%, suficientemente desenvolvidos e em estádio de maturação satisfatório para suportar as condições de transporte e manuseio (MENEZES et al., 2000).

O amadurecimento é indicado pelo conteúdo de SST, que exibe correlação positiva com o conteúdo de açúcares e dá idéia da doçura da fruta, atributo sensorial mais importante para o consumidor. Os valores mínimos de SST estão entre 8 e 10% (SANTOS JR., 2002). Melões com menos de 9% são considerados não comercializáveis, porque SST não aumenta após a colheita (MENEZES et al., 2000).

A firmeza de polpa indica propriedades mecânicas de resistência fundamentais no manuseio, transporte e armazenamento. Frutos com maior firmeza são mais resistentes às injúrias mecânicas durante o transporte e a comercialização (GRANGEIRO et al., 1999). O fruto de melão deve ter polpa espessa e, consequentemente, uma cavidade interna pequena, que proporciona maior resistência ao manuseio e transporte, impedindo o deslocamento da placenta, fator que acelera a deterioração do fruto. São considerados frutos de polpa espessa aqueles com espessura entre 4 e 5 cm (PAIVA et al., 2000; PAIVA et al., 2003).

Os objetivos deste trabalho foram avaliar a variabilidade espacial de características de qualidade dos frutos de melão, determinar sua dependência espacial e localizar regiões com frutos fora dos padrões onde a qualidade possa ser melhorada se adotado manejo adequado.

MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho foi realizado entre agosto e dezembro de 2002 em Mossoró, com coordenadas geográficas: 05º 09' 59,55'' S e 37º 24' 39,92'' W e altitude de 29 m. No primeiro ciclo o meloeiro amarelo híbrido Goldex (Cucumis melo var. inodorus Naud.) foi cultivado num Latossolo Vermelho Amarelo eutrófico (3,18 ha) e, no segundo, o 'Orange Flesh' (Cucumis melo var. cantalupensis Naud.) em um Argissolo Vermelho Amarelo (1,92 ha).

O preparo do solo constou de duas gradagens para eliminação da vegetação espontânea e afrouxamento do solo, subsolagem, nova gradagem e sulcamento com aplicação de 4 t ha-1 de composto (1,3% de N; 0,91% de P2O5; 3% de K2O; 3,6% de Ca e 0,5% de Mg). A semeadura foi feita em bandejas de 128 células e o transplante após 12 dias, com espaçamento de 2,0 m entre linhas, ficando a população em 16.667 plantas ha-1 no 'Goldex' e em 18.750 no 'Orange Flesh'. Os tratamentos fitossanitários seguiram as recomendações para o meloeiro.

A irrigação foi por gotejamento utilizando, no 'Goldex' tubos gotejadores com emissores não autocompensantes, do tipo labirinto, espaçados de 50 cm, com vazão de 2,27 L h-1 e, no 'Orange Flesh', emissores autocompensantes, espaçados de 80 cm, com vazão de 5,0 L h-1. A pressão de operação era de 245 kPa no cabeçal de controle. O manejo da irrigação se baseou na evapotranspiração de referência calculada pelo método de Penman-Monteith com dados da Estação Climatológica da ESAM, com coeficientes de cultura propostos pela FAO (ALLEN et al., 1998), e em características do solo. As lâminas totais de irrigação, entre 11 e 79 dias após semeadura, foram de 322,8 mm no Latossolo e de 316,7 mm no Argissolo. A adubação via água de irrigação constou de 70 kg ha-1 de N, 138 kg ha-1 de P2O5, 267 kg ha-1 de K2O, 2,2 kg ha-1 de B, 3,81 kg ha-1 de CaO, 1,4 kg ha-1de MgO e 9,4 kg ha-1 de S, no Latossolo; e 90 kg ha-1 de N, 121 kg ha-1 de P2O5, 318 kg ha-1 de K2O, 6,5 kg ha-1 de B, 2,45 kg de CaO, 7 kg ha-1 de MgO, 4,8 kg ha-1 de S e 0,2 kg de Zn, no Argissolo.

Foram realizadas duas colheitas no 'Goldex' e quatro no 'Orange Flesh'. Após as colheitas os frutos foram selecionados nos tipos exportação e mercado nacional, cuja soma constituiu os frutos comerciáveis. O número e a massa de frutos comerciáveis foi determinado com balança digital com capacidade de 30 kg e resolução de 10 g para calcular a massa média de frutos comerciáveis (PMCOM). Segundo Moretti e Araújo (2003) os frutos tipo exportação são os menores, com massa ao redor de 1,0 kg e de forma arredondada. Em geral são frutos do tipo 10 e acima, ou seja, uma caixa padrão contém dez ou mais frutos, até quatorze. Além disso, é exigida alta qualidade das características do produto, como consistência, uniformidade de formato, tamanho, cor e teor de açúcares. Os frutos com qualidade inferior são destinados ao mercado local, regional ou nacional. Os refugados são aqueles com evidentes defeitos de forma, tamanho, manchas, danos mecânicos, cor e sanidade.

Entre os frutos selecionados foram escolhidos dois por parcela para determinações de qualidade. A espessura da polpa (ESPOLP) foi determinada com paquímetro; a firmeza de polpa, expressa em Newtons (N), foi determinada por meio de penetrômetro com plunger de 8 mm de diâmetro e o conteúdo de sólidos solúveis totais (SST) através de refratômetro digital, usando o suco de uma fatia do fruto homogeneizado em liqüidificador.

Na primeira área as variáveis foram amostradas em 75 parcelas de 20 m2 e, na segunda, em 56 parcelas de 11,2 m2. O centro das parcelas coincidia com os nós de uma malha de amostragem locada com trena segundo coordenadas x e y. O espaçamento entre parcelas, nas duas direções, era de 20 m no Latossolo e de 19 m no Argissolo. Os dados amostrados foram analisados por meio de estatística descritiva para verificar o comportamento geral dos dados e a aderência à distribuição normal, da análise de correlação e da geoestatística, que foi utilizada para confeccionar semivariogramas omnidirecionais e determinar o modelo de melhor ajuste destes semivariogramas, avaliando assim a dependência espacial das variáveis. Os dados destes semivariogramas foram usados para a confecção de figuras com isolinhas das características pelo método de interpolação denominado krigagem. Para tanto foi usado o software de geoestatística Variowin (PANNATIER, 1996). A semivariância para uma dada distância foi estimada como a média das diferenças ao quadrado entre todas as observações separadas por aquela distância e calculada pela Equação 1:

em que, y(h) é a semivariância e N(h) é o número de pares de valores medidos Z(xi) e Z(xi+h) separados por um intervalo h (VIEIRA, 2000).

O semivariograma é um gráfico da semivariância versus a distância de amostragem. O efeito pepita (C0) é o valor da semivariância quando a distância de separação entre amostras tende a zero. Quando este valor é maior do que zero indica a existência de variação aleatória ou inexplicada, devida a erros de medida ou que não foi detectada na escala de amostragem usada (TRANGMAR et al., 1985). A medida que a distância entre amostras aumenta a semivariância também aumenta até atingir um valor mais ou menos constante, o patamar (Co+C1), a uma distância chamada alcance da dependência espacial (a). Amostras separadas por distâncias menores do que o alcance são correlacionadas espacialmente. Em distâncias maiores do que o alcance, as amostras são independentes entre si e a variação é aleatória. Os modelos de semivariogramas resultam do ajuste de uma curva aos valores de semivariância obtidos para cada distância. A partir da curva ajustada se obtém os valores de semivariância para qualquer distância dentro da área, os quais serão usados no processo de interpolação. A krigagem é um método de interpolação que produz estimativas da variável para locais não amostrados, usando os parâmetros do semivariograma e o conjunto dos valores amostrados. Os mapas resultantes permitem a visualização das distribuições de valores (ETTEMA; WARDLE, 2002). No procedimento de krigagem pontual cada estimativa é uma média ponderada dos valores observados vizinhos, calculada pela equação 2:

em que, Z(x0) é o valor estimado, n é o número de amostras vizinhas cujos valores são Z(xi) e li são os pesos aplicados a cada vizinho.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Observou-se pela estatística descritiva das características de qualidade de 'Goldex' e 'Orange Flesh' coincidência entre médias e medianas, o que indica simetria da distribuição e ajuste à normalidade, confirmado pelo teste de Shapiro-Wilk. As características apresentaram baixa variabilidade, com exceção do CV médio de PMCOM no 'Goldex' (21,89%), indicando que a seleção dos frutos após a colheita, visando ao mercado de exportação, tende a uniformizá-los. Mesmo assim, pode haver redução considerável na receita na parte do campo onde a qualidade dos frutos esteja fora dos padrões.

O peso médio de frutos comerciáveis (PMCOM) do 'Goldex' foi de 1,57 kg, tendo apresentado alguns valores acima do desejável para melões amarelos do tipo exportação, que segundo Gurgel (2000) está entre 1,1 e 1,8 kg. Os frutos de maior tamanho são destinados ao mercado interno. A espessura de polpa média obtida, de 4,1 cm, não deixa a desejar se comparada aos valores entre 3,1 a 4,8 cm encontrados em vários genótipos de melão amarelo e entre 2,8 e 3,4 cm para o melão amarelo Gold Mine (PAIVA et al., 2003). A firmeza de polpa de 40,2 N está na faixa superior dos padrões de 24 a 40 N para melões amarelos (FILGUEIRAS et al., 2000), necessários para resistir bem o manuseio, transporte e armazenamento. Também está acima dos valores relatados entre 20 e 35 N em híbridos de melão amarelo (GURGEL, 2000) e entre 27 e 40 N (GRANGEIRO et al., 1999; Medeiros et al., 2000) no melão amarelo 'Gold Mine'. O conteúdo de SST (12,2%) está dentro dos padrões para melões amarelos destinados ao mercado externo, entre 10 e 12% (FILGUEIRAS et al., 2000). Os valores do ''Goldex estão acima dos valores obtidos no melão amarelo Gold Mine, na região de Mossoró, entre 10 e 12% (MEDEIROS et al., 2000).

O 'Orange Flesh' produziu frutos de tamanho compatível com o mercado de exportação (1,38 kg), sem a ocorrência de valores muito altos, e não muito diferentes dos valores relatados na região de Mossoró, entre 1,2 e 1,5 kg (PAIVA et al., 2000) e 1,63 kg (BARROS, 2002). A espessura de polpa média foi de 3,9 cm, um pouco maior do que a relatada por Santos Jr. (2002), entre 3,2 e 3,6 cm. Frutos com maior espessura de polpa têm a cavidade das sementes menor, o que os torna mais resistentes ao manuseio e ao transporte (PAIVA et al., 2000). A firmeza de polpa (53,2 N) foi bem mais alta do que o padrão de 30 N para 'orange Flesh' (FILGUEIRAS et al., 2000), e também acima dos valores entre 38 a 43 N relatados por Barros (2002), Paiva et al. (2000) e Santos Jr. (2002). O conteúdo de sólidos solúveis totais (9,1%) ficou no limite inferior dos padrões para frutos destinados ao mercado externo, existindo alguns valores abaixo destes padrões. Enquanto que, na região de Mossoró têm sido relatados valores entre 9 e 10,3% (BARROS, 2002).

Na Tabela 1 estão apresentados os parâmetros dos semivariogramas omnidirecionais das características de qualidade dos frutos, alguns dos quais estão representados na Figura 1. Foi constatada dependência espacial de todas as características. A eliminação de valores discrepantes, segundo critérios citados por Queiroz et al. (1999), de espessura de polpa e de firmeza de polpa do 'Goldex', e de PMCOM e SST no 'Orange Flesh', praticamente não influenciou as medidas estatísticas de posição e de dispersão, apenas a amplitude total. A modelagem da estrutura de dependência espacial através do semivariograma permite estimar valores da variável em locais não amostrados e gerar mapas de isovalores.


A dependência espacial das características avaliada através da relação efeito pepita/patamar (REPP), segundo Cambardella et al. (1994), foi alta (REPP menor do que 25%) para PMCOM nas duas áreas (Tabela 1), SST no 'Goldex' e firmeza no 'Orange Flesh'; e foi média (REPP entre 25 e 75%) para ESPOLP nas duas áreas, SST no 'Orange Flesh' e firmeza no 'Goldex'. Utilizando como critério o IGF (Indicative Goodness of Fit), conforme Pannatier (1996), o modelo exponencial foi considerado o de melhor ajuste para ESPOLP nas duas áreas e PMCOM no 'Orange Flesh', enquanto as outras características se ajustaram ao modelo esférico. O alcance da dependência espacial de ESPOLP, firmeza de polpa e SST foi semelhante nas duas áreas, mas não em PMCOM. Segundo Vieira (2000) o alcance indica a distância dentro da qual as amostras são consideradas espacialmente dependentes.

As figuras com isovalores das características de qualidade de frutos mostram que, apesar da seleção proporcionar a predominância de regiões com frutos dentro dos padrões aceitos pelo mercado, existem regiões com frutos fora destes padrões. No 'Goldex' (Figura 2) existiam regiões com frutos acima de 1,9 kg, localizadas na parte inferior central do mapa (X: 40-60 m e Y: 0-75 m, 130-170 m). Entre as maneiras de obter frutos menores nestas regiões estão o aumento na densidade de plantio (GRANGEIRO et al., 1999) e a redução na lâmina de irrigação, a qual também causa redução em produtividade (BARROS, 2002). Os valores predominantes de ESPOLP foram entre 4 e 4,35 cm, existindo regiões com valores menores (3,65 a 4 cm) na lateral direita da metade inferior do mapa e na parte central superior. Os valores de firmeza de polpa estão acima dos padrões, predominando aqueles entre 36 e 41 N; as poucas regiões com firmeza entre 41 e 46 N estão na parte superior (X: 50-80 m e Y: 270-300 m) e inferior do mapa (X: 40-106 m e Y: 0-120 m) e valores acima de 46 N estão na parte superior esquerda (X: 0–10 m e Y: 200–300 m). O conteúdo de SST é alto em toda a área, com valores entre 12 e 13,5% na faixa central vertical do mapa. Em uma pequena região (X: 20-50 m e Y: 120-170 m) os frutos podem ter sido colhidos com atraso. Nela, coincidem valores elevados de SST com as menores firmezas, havendo correlação negativa significativa a 1% entre firmeza de polpa e SST (-0,37). A explicação de Gomes Jr. et al. (2001) é que um alto conteúdo de SST, que não aumenta após a colheita, e menores firmezas ocorrem quando o fruto permanece muito tempo ligado à planta, diminuindo o tempo de conservação pós-colheita.


No 'Orange Flesh' (Figura 3) não existem regiões com frutos muito grandes. Os frutos maiores (PMCOM entre 1,5 e 1,7 kg) estão na parte superior do mapa (X: 50-100 m e Y: 100-160 m) e os menores na parte inferior. Os valores predominantes de espessura de polpa são entre 3,5 e 4 cm, embora existam algumas regiões com valores entre 4 e 4,5 cm na lateral direita superior e pequenas regiões com valores abaixo de 3,5 cm (X: 0-20 m e Y: 0-10 m, 130-160 m). Os frutos com maiores ESPOLP, provavelmente por serem mais desenvolvidos, tendem a apresentar maior SST, como indicado pela correlação significativa a 1% de probabilidade (0,35). Os valores de firmeza de polpa estão acima dos padrões em toda área. Predominam regiões com firmeza entre 53 e 56,6 N, mas algumas apresentam firmeza mais elevada (X: 20-40 m e Y: 130-150 m; X: 90-110 m e Y: 20-50 m), indicando a possibilidade da colheita ter sido feita antes do momento adequado. A firmeza de polpa dos frutos colhidos desta maneira é mais elevada do que se colhidos em estádios posteriores (GOMES JR. et al., 2001). Os valores predominantes de SST, entre 8,9 e 9,95% são adequados para exportação. No entanto, existem regiões com valores abaixo do exigido: no lado direito da parte inferior do mapa (X: 50-120 m e Y: 0-50m); no lado esquerdo (X: 0-20 m e Y: 10-70 m); na parte superior (X: 20-60 m e Y: 110-150 m), bem como no canto superior direito do mapa. Há possibilidade de que estas regiões tenham sido colhidas antecipadamente visando obter melhor preço ou maior período de armazenamento (PAIVA et al., 2000).


As causas mais prováveis da variabilidade das características de qualidade dos frutos, cuja investigação deve partir da constatação da variabilidade espacial e da localização de regiões com baixo desempenho, estão associadas ao déficit ou excesso de irrigação, à reação do solo e disponibilidade de nutrientes, às características físicas do solo e à infestação por pragas e doenças.

Os coeficientes de correlação entre características de qualidade dos frutos e alguns componentes de produção mostram que, como esperado, as regiões de maior produção comercializável apresentaram frutos de melhor qualidade. Isto foi mais evidente no 'Orange Flesh' onde PMCOM apresentou correlação de 0,37 com ESPOLP (significativa a 1%) e de 0,27 com SST (significativa a 5%). Há tendência das regiões de maior PMCOM terem as maiores produtividades dos diversos tipos, principalmente no 'Goldex', onde as correlações foram significativas a 1% de probabilidade. A constatação da eficiência da seleção é baseada na observação de que as regiões com maior produção de frutos tipo exportação também produziram os frutos com as melhores características de qualidade, com tendência das regiões de maior produção para o mercado nacional apresentarem os menores SST no 'Goldex'.

Os resultados obtidos mostram uma baixa variabilidade espacial das características de qualidade dos frutos de melão, a qual é conseqüência da seleção cuidadosa após a colheita. A constatação de dependência espacial de média a alta daquelas características é útil para indicar que a sua variabilidade está correlacionada a fatores com distribuição espacializada. A disponibilidade destas informações levou à confecção de figuras com isovalores das características, nos quais pôde-se identificar regiões dos campos onde o tamanho dos frutos do 'Goldex' e o conteúdo de sólidos solúveis totais do 'Orange Flesh' estavam fora dos padrões de qualidade. A localização destas regiões possibilita que, em próximos trabalhos, sejam identificadas as causas da baixa qualidade e sejam adotadas práticas de manejo localizado visando a melhoria da qualidade na área como um todo, aumentando o retorno econômico da atividade.

AGRADECIMENTOS

À CAPES pelas bolsas concedidas, à FUNCAP pelo apoio financeiro e à Fazenda São João Ltda pelo uso de toda estrutura experimental.

LITERATURA CITADA

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(Recebido para publicação em 4 de março de 2004 e aceito em 24 de janeiro de 2005)

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  • 1
    Parte da tese apresentada à UFC para obtenção do grau de doutor em Agronomia
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Ago 2005
    • Data do Fascículo
      Jun 2005

    Histórico

    • Recebido
      04 Mar 2004
    • Aceito
      24 Jan 2005
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