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Fontes de resistência em acessos de Solanum (secção Lycopersicon) a Verticillium dahliae raças 1 e 2

Sources of resistance to Verticillium dahliae races 1 and 2 in accessions of Solanum (section Lycopersicon)

Resumos

A murcha-de-verticílio (Verticillium dahliae) é uma das doenças mais severas do tomateiro (Solanum lycopersicum L.). Duas raças fisiológicas de V. dahliae foram caracterizadas infectando o tomateiro e ambas estão presentes no Brasil. A estratégia de controle mais efetiva para isolados da raça 1 tem sido a utilização de cultivares resistentes em associação com práticas culturais. Entretanto, não existem cultivares comerciais de tomate resistentes à raça 2 do patógeno. Neste contexto, torna-se importante a identificação de novas fontes de resistência que sejam efetivas contra as duas raças de V. dahliae. Buscou-se fontes de resistência a isolados de V. dahliae (raças 1 e 2). Cem acessos de uma coleção de germoplasma contendo espécies cultivadas e selvagens de Solanum (secção Lycopersicon) foram inicialmente inoculados pelo método de imersão de raízes com um isolado de V. dahliae raça 1 (5 mL de uma suspensão de 10(6) conídios/mL) em condições de casa de vegetação. A avaliação foi feita aos 30 dias após a inoculação, usando uma escala de notas variando de 1 (planta sadia) a 5 (planta morta). Foram considerados resistentes os acessos que apresentaram nota média entre 1 e 2. Um grupo composto por 38 acessos classificados como resistentes neste primeiro ensaio foi reavaliado para resistência a outros quatro isolados de V. dahliae pertencentes às raças 1 e 2. As cultivares Ponderosa e Floradade foram utilizadas como controles. O ensaio foi conduzido em casa de vegetação em delineamento experimental de blocos ao acaso em arranjo fatorial 5 x 40, com três repetições (vasos com quatro plantas). A avaliação foi feita baseada nos parâmetros epidemiológicos: período de incubação e índice de doença. Foram identificados acessos com resistência raça-específica e também com resistência a ambas as raças. Estes acessos podem ser indicados para futuros programas de melhoramento genético visando incorporar resistência ampla à doença.

Solanum lycopersicum; resistência; melhoramento genético


Verticillium wilt (Verticillium dahliae) is one of the most destructive diseases of tomato (Solanum lycopersicum). Two V. dahliae races have been described infecting tomatoes and both are present in Brazil. The most effective control strategy of V. dahliae race 1 isolates is based upon the use of resistant cultivars combined with cultural practices. However, there is so far no fresh-market tomato cultivar available with resistance to V. dahliae race 2. Therefore, it is important to identify new sources of effective resistance against both pathogen races. Solanum (section Lycopersicon) accessions were screened to search for resistance sources to both V. dahliae races 1 and 2. A germplasm collection composed by 100 accessions of cultivated and wild tomatoes was first inoculated via root dipping method (5 mL; 10(6) conidia/mL) with one isolate of V. dahliae race 1. Disease assessment was done 30 days after inoculation using a disease severity index ranging from 1 (plant without symptoms) to 5 (dead plant). Accessions with average severity index from 1 to 2 were classified as resistant. A subgroup of 38 race 1 resistant accessions was re-evaluated against four isolates of V. dahliae belonging to races 1 and 2. The cultivars Ponderosa and Floradade were used as controls. The assay was conducted under greenhouse conditions using a completely randomized, factorial (5 x 40) design with three replicates (three pots with four plants each). Evaluation was done based upon two epidemiological parameters: incubation period and disease severity index. Race-specific and multiple-race resistance sources were identified. The most promising accessions could be useful for breeding purposes aiming to develop cultivars with stable resistance to both races.

Solanum lycopersicum; resistance; genetic breeding


PESQUISA RESEARCH

Bruno Eduardo C de MirandaI; Leonardo S BoiteuxII; Eduardo M CruzII; Ailton ReisII

IUnB, Depto Fitopatologia, C. Postal 4457, 70910-900 Brasília-DF

IIEmbrapa Hortaliças, C. Postal 218, 70359-970 Brasília-DF; ailton@cnph.embrapa.br

RESUMO

A murcha-de-verticílio (Verticillium dahliae) é uma das doenças mais severas do tomateiro (Solanum lycopersicum L.). Duas raças fisiológicas de V. dahliae foram caracterizadas infectando o tomateiro e ambas estão presentes no Brasil. A estratégia de controle mais efetiva para isolados da raça 1 tem sido a utilização de cultivares resistentes em associação com práticas culturais. Entretanto, não existem cultivares comerciais de tomate resistentes à raça 2 do patógeno. Neste contexto, torna-se importante a identificação de novas fontes de resistência que sejam efetivas contra as duas raças de V. dahliae. Buscou-se fontes de resistência a isolados de V. dahliae (raças 1 e 2). Cem acessos de uma coleção de germoplasma contendo espécies cultivadas e selvagens de Solanum (secção Lycopersicon) foram inicialmente inoculados pelo método de imersão de raízes com um isolado de V. dahliae raça 1 (5 mL de uma suspensão de 106 conídios/mL) em condições de casa de vegetação. A avaliação foi feita aos 30 dias após a inoculação, usando uma escala de notas variando de 1 (planta sadia) a 5 (planta morta). Foram considerados resistentes os acessos que apresentaram nota média entre 1 e 2. Um grupo composto por 38 acessos classificados como resistentes neste primeiro ensaio foi reavaliado para resistência a outros quatro isolados de V. dahliae pertencentes às raças 1 e 2. As cultivares Ponderosa e Floradade foram utilizadas como controles. O ensaio foi conduzido em casa de vegetação em delineamento experimental de blocos ao acaso em arranjo fatorial 5 x 40, com três repetições (vasos com quatro plantas). A avaliação foi feita baseada nos parâmetros epidemiológicos: período de incubação e índice de doença. Foram identificados acessos com resistência raça-específica e também com resistência a ambas as raças. Estes acessos podem ser indicados para futuros programas de melhoramento genético visando incorporar resistência ampla à doença.

Palavras-chave:Solanum lycopersicum, resistência, melhoramento genético.

ABSTRACT

Verticillium wilt (Verticillium dahliae) is one of the most destructive diseases of tomato (Solanum lycopersicum). Two V. dahliae races have been described infecting tomatoes and both are present in Brazil. The most effective control strategy of V. dahliae race 1 isolates is based upon the use of resistant cultivars combined with cultural practices. However, there is so far no fresh-market tomato cultivar available with resistance to V. dahliae race 2. Therefore, it is important to identify new sources of effective resistance against both pathogen races. Solanum (section Lycopersicon) accessions were screened to search for resistance sources to both V. dahliae races 1 and 2. A germplasm collection composed by 100 accessions of cultivated and wild tomatoes was first inoculated via root dipping method (5 mL; 106 conidia/mL) with one isolate of V. dahliae race 1. Disease assessment was done 30 days after inoculation using a disease severity index ranging from 1 (plant without symptoms) to 5 (dead plant). Accessions with average severity index from 1 to 2 were classified as resistant. A subgroup of 38 race 1 resistant accessions was re-evaluated against four isolates of V. dahliae belonging to races 1 and 2. The cultivars Ponderosa and Floradade were used as controls. The assay was conducted under greenhouse conditions using a completely randomized, factorial (5 x 40) design with three replicates (three pots with four plants each). Evaluation was done based upon two epidemiological parameters: incubation period and disease severity index. Race-specific and multiple-race resistance sources were identified. The most promising accessions could be useful for breeding purposes aiming to develop cultivars with stable resistance to both races.

Keywords:Solanum lycopersicum, resistance, genetic breeding.

A murcha-de-verticílio (Verticillium dahliae Kleb.) é uma das doenças mais destrutivas do tomateiro (Solanum lycopersicum L.). Essa doença é importante tanto no cultivo do tomateiro para consumo in natura como para processamento industrial. A murcha-de-verticílio é mais severa em áreas de clima ameno. Verticillium dahliae apresenta amplo círculo de plantas hospedeiras, sendo relatado como parasita de cerca de 200 espécies vegetais, na sua maioria dicotiledôneas (Bhat & Subbarao, 1999). No Brasil, a doença é mais importante nas regiões Sul e no Sudeste do Brasil e em regiões de microclima de altitude, onde severos danos vêm sendo relatados (Reis & Boiteux, 2006a).

A murcha-de-verticílio se tornou, nas últimas décadas, uma doença de importância secundária devido ao extensivo uso de cultivares resistentes à raça 1 do patógeno. No entanto, o aparecimento e ampla disseminação da raça 2 têm acarretado grandes prejuízos aos produtores brasileiros (Reis & Boiteux, 2006a). Isolados da raça 2 foram inicialmente relatados causando danos esporádicos em tomate para processamento industrial em Pernambuco (Laterrot et al., 1983); em tomate de mesa em São Paulo (Cerezine et al., 1990) e no Distrito Federal (Santos & Lopes, 1995). No entanto, mais recentemente, diversos surtos epidêmicos foram relatados nas regiões de produção de tomate in natura no Sul e Sudeste do Brasil (Reis & Boiteux, 2006a; Reis et al., 2007).

Resistência a isolados de Verticillium foi inicialmente identificada em 1932 no acesso S. lycopersicum var. cerasifore 'Peru Wild' (Schaible et al., 1951; Accari et al., 2005). Esta resistência é raça 1-específica, apresentando herança simples, monogênica e dominante (Schaible et al., 1951; Bender & Shoemaker, 1984; Kawchuk et al., 2001). A resistência derivada de 'Peru Wild' é condicionada por um locus complexo composto por dois genes Ve-1 e Ve-2 que se localizam no cromossomo 9 do tomateiro (Diwan et al., 1999; Kawchuk et al., 2001; Fradin et al., 2009). Dados recentes indicam que o gene Ve-1 controla a resposta de resistência a V. dahliae raça 1 (Fradin et al., 2009).

Algumas das fontes de resistência/tolerância a V. dahliae raça 2 foram detectadas em germoplasma de Solanum (secção Lycopersicon), mas não se mostraram tão efetivas e/ou estáveis quando comparadas com as fontes de resistência relatadas para a raça 1 (Okie & Gardner, 1982). Por exemplo, algumas cultivares identificadas como resistentes à raça 2 do patógeno em outras partes do mundo apresentaram resposta de suscetibilidade quando inoculadas com isolados brasileiros (Santos, 1997). Além disso, existem relatos indicando que o controle genético da resistência para isolados da raça 2 nestas fontes é mais complexo, podendo apresentar herança quantitativa e/ou respostas do tipo "isolado-específica" (Baergen et al., 1993). Mais recentemente, Stamova (2005) relatou uma nova fonte de resistência monogênica dominante para a raça 2. No entanto, esta fonte ainda não foi avaliada nas condições brasileiras.

O presente trabalho teve como objetivo avaliar um conjunto de acessos cultivados e selvagens do gênero Solanum (secção Lycopersicon) quanto à reação à murcha-de-verticílio, buscando identificar novas fontes que combinem resistência às raças 1 e 2 do fungo V. dahliae.

MATERIAL E MÉTODOS

Produção de inóculo de Verticillium dahliae: A produção de inóculo do patógeno seguiu o protocolo descrito por Santos (1997). Um isolado de V. dahliae raça 1 ('Vert. 94') previamente caracterizado como virulento e agressivo ao tomateiro cultivar 'Ponderosa' (Reis et al., 2007) foi cultivado em meio BDA (batata dextrose ágar) + rifampicina (antibiótico) por sete dias. Após este período, retirou-se um disco de 1 mm do meio de cultura com crescimento abundante do micélio e colocou-se em um frasco Erlenmeyer contendo 100 mL do meio líquido BD. O Erlenmeyer foi mantido por 15 dias em agitador automático a temperatura de (23 ± 2ºC) e ausência de luz. Após esta etapa, a suspensão de esporos obtida foi filtrada em gaze dupla e a concentração do inóculo foi ajustada para 106 conídios/mL.

Primeira triagem de acessos de Solanum (secção Lycopersicon) com um isolado de V. dahliae raça 1: Em um primeiro ensaio as respostas de acessos de Solanum (secção Lycopersicon) a um isolado de V. dahliae raça 1 foram avaliadas de acordo com o protocolo descrito por Santos (1997). O experimento foi conduzido em casa de vegetação na Embrapa Hortaliças em Brasília. Foi avaliada uma coleção de 100 acessos de tomateiro do banco de germoplasma da Embrapa Hortaliças. Os acessos que serviram como controles foram as cultivares de tomateiro Ponderosa (suscetível às duas raças) e Floradade (resistente à raça 1, devido à presença do gene Ve-1). Os acessos foram semeados em bandejas de poliestireno contendo o substrato Plantmax®. As mudas foram inoculadas quando atingiram o estádio de dois pares de folhas verdadeiras.

Inoculação e delineamento experimental: A inoculação foi feita retirando-se as mudas das bandejas, seguida de lavagem das raízes e corte com tesoura de suas extremidades (2 cm). Em seguida, as raízes foram imersas por um minuto na suspensão de conídios em Becker de 100 mL contendo 50 mL da suspensão conidial descrita acima. Após isto, as mudas foram transplantadas para vasos de 1,5 L contendo substrato esterilizado composto de areia, argila e esterco bovino curtido. Estes vasos haviam sido previamente irrigados até o ponto de saturação. Em seguida, adicionou-se 5 mL da suspensão de conídios ao colo de cada plântula. As plantas não foram irrigadas no dia da inoculação para evitar a perda do inóculo através de escorrimento. As irrigações foram retomadas a partir do segundo dia após a inoculação e, a partir deste ponto, somente quando fosse necessário. O delineamento experimental foi de blocos ao acaso, com três repetições (parcelas representadas por um vaso com quatro plantas). A avaliação dos acessos foi feita 30 dias após a inoculação. Observou-se a presença de sintomas externos e escurecimento vascular, verificado através do corte transversal no colo de cada planta. Foi adotada uma escala de notas adaptada de Reis et al. (2007) variando de 1 até 5 onde: 1= plantas sem sintomas; 2= plantas sem sintomas de murcha ou amarelecimento foliar, mas com leve escurecimento vascular, limitado à região do colo da planta; 3= plantas com escurecimento vascular ultrapassando a região do colo e/ou com murcha, necrose em "V" ou amarelecimento foliar; 4= plantas com murcha intensa, associada com amarelecimento, necrose foliar e seca de ramos e 5= plantas mortas. Os acessos que apresentaram notas médias (média das 4 plantas) entre 1 e 2 foram considerados resistentes e aqueles com notas acima de 2 foram arbitrariamente considerados suscetíveis. Os acessos resistentes foram selecionados para serem avaliados quanto à resistência a cinco isolados de V. dahliae raças 1 e 2.

Avaliação da resistência dos acessos selecionados a isolados de V. dahliae (raças 1 e 2): Este segundo experimento visou avaliar a resposta para um grupo maior e mais variado de isolados do fungo dos 38 acessos que apresentaram níveis de resistência promissores no primeiro ensaio. Estes acessos foram avaliados quanto à reação a cinco isolados de V. dahliae, sendo três deles pertencentes à raça 1 e dois pertencentes à raça 2. Foram utilizados os seguintes isolados da raça 1: 'Vert. 02' (obtido de tomateiro em Botucatu-SP), 'Vert. 12' (obtido de quiabeiro em Lavras-MG) e 'Vert.94' (obtido de berinjela em Brazlândia-DF). Foram utilizados os seguintes isolados da raça 2: 'Vert. 63' e 'Vert. 93' (obtidos de tomateiro em Caçador-SC e Araguari-MG, respectivamente). Todos isolados foram previamente testados quanto à virulência em tomate. As cultivares Ponderosa e Floradade foram utilizadas como controles. A produção de mudas dos acessos e do inóculo seguiram a mesma metodologia descrita previamente. Neste segundo ensaio foram quantificados dois parâmetros epidemiológicos: período de incubação (PI), definido como o período transcorrido (em dias) entre a inoculação e o aparecimento de sintomas (murcha e/ou necrose em "V" nas folhas) e índice de doença (ID), baseado na severidade estimada na última avaliação. O PI foi avaliado diariamente (a partir do 15º dia após a inoculação) quando apareceram os primeiros sintomas em algum dos acessos. A avaliação do PI foi concluída no 30º dia após a inoculação, quando foi feita a última avaliação da severidade. Os acessos que não apresentaram sintomas aparentes tiveram o PI arbitrariamente ajustado para 31 dias (30 dias de avaliação acrescidos de um dia), conforme proposto por Iamsupasit et al. (1993). O delineamento experimental foi em blocos ao acaso, em arranjo fatorial 5 x 40. Na conclusão do experimento, avaliou-se a severidade final através da escala de notas descrita anteriormente. A partir destes dados foi calculado o índice de doença, em que ID (%) = 100S[(f.v)/(n.x)], sendo f = número de plantas com a mesma nota; v = nota observada; n = número total de plantas avaliadas e x = nota máxima da escala (Dalbosco et al., 2002). Os dados de PI e ID foram submetidos à análise de variância (ANOVA) e ao teste de agrupamentos de médias Scott-Knott através do programa de análises estatísticas SisVar versão 4.2 (Ferreira, 2003). Foram determinadas as correlações fenotípicas (correlação de Pearson) entre as variáveis PI e ID para cada isolado de Verticillium, com auxílio do Software Genes (Cruz, 2006).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

De 100 acessos avaliados, 38 (incluindo o padrão de resistência 'Floradade') apresentaram resposta classificada como resistente e 62 (incluindo o padrão de suscetibilidade 'Ponderosa') foram classificados como suscetíveis para o isolado 'Vert.94' (raça 1). No grupo dos acessos classificados como resistentes estavam representadas as seguintes espécies: S. lycopersicum, S. habrochaites, S. peruvianum e S. pimpinellifolium. Destes, destacaram-se dois acessos de S. habrochaites ('CNPH-0417' e 'CNPH-0421') e um acesso de S. lycopersicum ('CNPH-0437'), que apresentaram reação do tipo imunidade (Tabela 1).

Os resultados deste primeiro ensaio confirmam as observações de Santos et al. (2004), onde foi identificado um número reduzido de acessos selvagens com resistência ao patógeno, sendo que um número maior de acessos resistentes foi encontrado dentro da espécie cultivada (S. lycopersicum). A predominância de acessos resistentes em S. lycopersicum, pode ser explicada pela maciça incorporação do gene de resistência Ve-1 em linhagens comerciais em diferentes programas de melhoramento conduzidos no mundo (Bender & Shoemaker, 1984; Accari et al., 2005). No entanto, novas fontes de resistência à raça 1 foram encontradas em acessos de algumas espécies selvagens, sugerindo uma provável diversidade alélica para o gene Ve-1 nos diferentes acessos de tomateiro (Tabela 1).

No segundo ensaio, a virulência e identidade da raça fisiológica dos isolados foi confirmada pelas respostas exibidas pelo conjunto de variedades diferenciadas. As cultivares de tomate 'Ponderosa', berinjela 'Ciça' e jiló 'Morro Redondo' apresentaram suscetibilidade a todos os isolados do patógeno. Por sua vez, a cultivar 'Floradade' ('CNPH-0010') demonstrou resistência a isolados da raça 1 e suscetibilidade a isolados da raça 2. Neste segundo ensaio, 27 dos 38 acessos avaliados com o isolado 'Vert. 94' (raça 1) voltaram a expressar níveis de resistência similares, confirmando a reação observada na primeira triagem. Entretanto, os acessos S. habrochaites 'CNPH-0417' e S. habrochaites 'CNPH-0421' não confirmaram a imunidade apresentada no primeiro experimento, indicando que esta "resistência" pode ter se dado por escape ou que é de natureza quantitativa, sendo influenciada por componentes ambientais. Diferenças na capacidade de causar doença foram observadas em um grupo de isolados de V. dahliae de uma mesma raça, mas oriundos de regiões geográficas distintas (O'Garro & Clarkson, 1988), sugerindo que diferenças entre isolados também possam explicar a instabilidade da resposta de resistência observada em alguns dos acessos no presente ensaio.

Os resultados das reações dos acessos avaliados em relação aos valores dos parâmetros epidemiológicos PI e ID encontram-se na Tabela 2 (resposta para isolados da raça 1) e na Tabela 3 (resposta para isolados da raça 2). A diferenciação dos acessos de acordo com o critério PI foi significativa (teste de Scott-Knott, 5%). A cultivar 'Ponderosa' esteve entre acessos com menor PI, para todos os isolados inoculados, confirmando a sua condição de hospedeira "universal" de isolados de Verticillium. O parâmetro ID foi eficiente para diferenciar os acessos em distintas classes de resistência (teste de Scott-Knott, 5%). O grupo de acessos pertencente a cada classe foi variável de acordo com o isolado/raça do patógeno utilizado (Tabelas 2 e 3). Um período de incubação longo é um importante componente de resistência parcial de uma espécie de planta hospedeira a um dado patógeno (Van der Plank, 1963). Para alguns acessos inoculados com V. dahliae, observou-se PI maiores, sendo que, algumas vezes, os sintomas se tornaram evidentes somente na avaliação final. Entretanto, foi verificado que alguns acessos considerados extremamente suscetíveis apresentaram uma combinação de PI altos e ID elevados. Isso pode ser atribuído ao fato de que na avaliação do PI se considerou somente os sintomas externos (aparentes) e excluindo a avaliação de sintomas de escurecimento vascular (internos).

Acessos que exibiram resistência a pelo menos um isolado e que apresentaram valores de ID menores quando comparados com acessos suscetíveis foram considerados como resistentes a este isolado. Cerezine (1989) verificou valores de ID menores que 30% para cultivares de tomateiro resistentes a ambas as raças do patógeno ('Ohio 12' e 'Petomech VF 1+2'). Alguns acessos, tais como 'CNPH-0698 e 'CNPH-1120', apresentaram uma resistência (valores de PI iguais ou próximos de 31 dias e ID abaixo dos 25%) a diferentes isolados das duas raças, sendo, portanto, de maior amplitude. De acordo com Van der Plank (1963), a resistência vertical, raça-específica ou imunidade pode ser facilmente quebrada devido à variabilidade do patógeno. Foi constatada correlação significativas entre o PI e o ID, a qual variou de 54% a 86% e foi negativa, conforme esperado. A correlação significativa e negativa observada entre PI e ID para todos os isolados testados mostra que, no geral, quanto maior os valores de PI menores serão os valores do ID. Levando em consideração o que foi discutido acima sobre o PI e os resultados do teste de correlação, neste trabalho o parâmetro mais seguro para selecionar os acessos quanto à resistência à murcha-de-verticílio foi o ID. Este parâmetro pode ser utilizado individualmente ou em conjunto com outros parâmetros epidemiológicos (não avaliados no presente trabalho) nos testes de identificação de acessos de tomate com resistência a V. dahliae.

A quebra de resistência de acessos de tomateiro por isolados de V. dahliae raça 2 pode ser explicada pela utilização maciça de cultivares portadoras do gene Ve, que confere resistência a isolados da raça 1 (Cerezine et al., 1991). Este uso maciço representou uma pressão de seleção para isolados virulentos às cultivares portadoras do gene Ve-1. A resistência do gene Ve-1 apresenta grande estabilidade, pois acessos de tomateiros que possuem este gene (tais como 'Floradade' e 'Marmande VR') sempre apresentam resistência vertical quando inoculados com isolados da raça 1 (Laterrot et al., 1983; Reis et al., 2007).

Reação de suscetibilidade para todos os isolados (das duas raças) foi observada na cultivar 'Ponderosa' e 'Floradade' apresentou suscetibilidade para os isolados da raça 2, confirmando a identidade de raça dos isolados e concordando com resultados obtidos anteriormente (Santos, 1997; Reis & Boiteux, 2006b; Reis et al., 2007). Os isolados 'Vert.94', e 'Vert.12', provenientes de berinjela e de quiabo, respectivamente, foram virulentos em diversos acessos de tomateiro. Isto reforça a natureza polífaga de V. dahliae (Reis & Boiteux, 2006b). Apesar disso, existem trabalhos que separam isolados do fungo de acordo com o hospedeiro e através da reação de diferentes espécies em testes de inoculação cruzada (Bhat & Subbarao, 1999).

Foram identificados acessos pertencentes a S. lycopersicum e S. habrochaites resistentes a pelo menos um isolado da raça 1, com destaque para 'CNPH-1046', 'CNPH-1039' e 'CNPH-1122'. Acessos resistentes a pelo menos um isolado da raça 2 foram identificados nas espécies S. lycopersicum e S. habrochaites com destaque para os acessos 'CNPH-0424', 'CNPH-0427' e 'CNPH-0431'. De acordo com a literatura, este parece ser o primeiro registro de resistência a isolados de V. dahliae em S. habrochaites. O acesso 'Campbell-28' ('CNPH-0431') apresentou alta resistência no primeiro e no segundo ensaio para o isolado 'Vert.94' (raça 1). Além disso, este acesso mostrou resposta resistente aos isolados 'Vert.02' e 'Vert.12' (ambos classificados como raça 1) e ao isolado 'Vert.93' (raça 2). É interessante ressaltar que o acesso 'Campbell-28' foi identificado como uma fonte de resistência a alguns isolados da raça 2 nos Estados Unidos (Okie & Gardner, 1982). Entretanto, 'Campbell-28' não possui, aparentemente, resistência de amplo espectro, uma vez que este acesso se mostrou suscetível ao isolado 'Vert.63' (classificado como raça 2). Foram identificados outros acessos dentro da espécie cultivada S. lycopersicum com resistência parcial a todos os isolados inoculados com destaque para 'CNPH-0698', 'CNPH-0428' e 'CNPH-1120'.

Alguns acessos (por exemplo 'CNPH-0698' e 'CNPH-1120') apresentaram resistência do tipo "horizontal" (sensu Van der Plank, 1963) ou "parcial" e outros acessos apresentaram resistência do tipo "vertical" ou mais precisamente "raça 1-específica". Com a existência de duas raças fisiológicas do patógeno confirmadas, é de grande importância o desenvolvimento de cultivares que possuam um espectro de resistência mais amplo (resistência horizontal), combinada com a presença de genes maiores para resistência às duas raças. Os acessos que demonstraram melhor desempenho foram classificados dentro da espécie cultivada de tomateiro (S. lycopersicum), incluindo um grupo que apresentou resistência do tipo "horizontal" a todos os isolados inoculados. A grande vantagem da identificação de resistência em cultivares comerciais deve-se ao fato de que estas já apresentam diversas características de interesse e poucas características indesejáveis (muito comuns em acessos de espécies selvagens), que necessitam ser eliminadas através de longos processos de seleção dentro dos programas de melhoramento genético.

A reação do acesso 'Campbell-28' ('CNPH-0431') aos diversos isolados avaliados foi inesperada, considerando a existência de apenas duas raças do patógeno. Novos estudos, com este e alguns outros acessos da hospedeira são necessários, uma vez que 'Campbell-28' ('CNPH-0431') pode, potencialmente, representar uma nova hospedeira diferencial e revelar a existência de uma terceira raça fisiológica de V. dahliae. A inoculação de diversos acessos (resistentes a uma ou às duas raças) com isolados das duas raças, de diferentes hospedeiras e locais de procedência, pode ajudar a esclarecer a existência ou não de novas raças de V. dahliae. De fato, Baergen et al. (1993) já haviam verificado que acessos de tomateiro norte-americanos classificados como resistentes à raça 2 do patógeno foram suscetíveis a isolados brasileiros da mesma raça do patógeno. No entanto, é preciso considerar, também, que estes resultados podem ser creditados a outros aspectos, tais como agressividade diferencial dos isolados (O'Garro & Clarkson, 1988), condições ambientais e até mesmo erro experimental.

A resistência para a raça 2 de V. dahliae observada em acessos de tomateiro neste trabalho assemelha-se ao tipo quantitativa ou "horizontal" (sensu Van der Plank, 1963). Isto pode dificultar um pouco mais os programas de melhoramento, que visem à incorporação/piramidização da resistência às duas raças de V. dahliae em cultivares comerciais de tomate. A incorporação de resistência do tipo "horizontal" é mais trabalhosa, demorada e de fenotipação mais complexa. Por outro lado, a incorporação desta resistência em cultivares comerciais, bem como sua complementação/piramidização com genes de maior espectro de resistência, pode também contribuir para uma maior durabilidade da mesma (Van der Plank, 1963).

Em conclusão, os resultados sugerem que as novas fontes de resistência descritas podem ser úteis para futuros programas de melhoramento genético do tomateiro visando resistência às duas raças de V. dahliae. Entretanto, ainda é necessária a combinação da resistência genética com outras medidas de controle da doença. É também fundamental o estabelecimento de um sistema de monitoramento constante da variabilidade do patógeno (incluindo o potencial surgimento de novas raças). Além disso, existe a necessidade de novas avaliações, com um número maior de isolados de ambas as raças visando identificar os acessos mais adequados para programas de melhoramento genético bem como o desenvolvimento de cultivares com resistência mais estável e durável.

AGRADECIMENTOS

Os autores Leonardo S Boiteux e Ailton Reis agradecem ao CNPq pela concessão de bolsa de produtividade em pesquisa.

(Recebido para publicação em 22 de julho de 2009; aceito em 15 de outubro de 2010)

(Received on July 22, 2009; accepted on October 15, 2010)

Parte da dissertação de mestrado do primeiro autor.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Jan 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 2010

    Histórico

    • Recebido
      22 Jul 2009
    • Aceito
      15 Out 2010
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