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Crescimento pré-natal do corpo e de alguns órgãos de Zebu mestiço coletados em matadouros de São Paulo

Prenatal growth of body and some organs of crossbred Zebu collected from São Paulo slaughterhouse

Resumos

Cento e noventa e seis fetos de Zebu mestiço, entre 106 e 246mm de comprimento, coletados em matadouros do Estado de São Paulo e divididos a cada 10mm, em 15 classes, foram medidos e pesados. Alguns órgãos como fígado, coração e pulmões foram removidos e pesados. Para selecionar um método de avaliação do crescimento nesse período fetal, várias funções matemáticas foram examinadas. Entre as equações de regressão significativas, a função monologarítmica foi a escolhida. Além disso, os fetos em condições semelhantes de comprimento e peso foram comparados com fetos de raça pura.

Bovino; Zebu mestiço; desenvolvimento fetal; equação monologarítmica


A total of 196 fetuses of crossbred Zebu between 106 to 246mm in length collected from a slaughterhouse in São Paulo, Brazil, and divided into groups of 10mm size differences intervals into 15 classes were measured and weighed. Liver, heart and lungs were also removed and weighed. In order to select the method of evaluation of growth several mathematical functions were applied. Among significant equations the monologarithmic function was selected. Furthermore, the fetuses in similar conditions of length and weight were compared with racially pure fetuses.

Cattle; crossbred Zebu; fetal development; monologarithmic function


Crescimento pré-natal do corpo e de alguns órgãos de Zebu mestiço coletados em matadouros de São Paulo

(Prenatal growth of body and some organs of crossbred Zebu collected from São Paulo slaughterhouse)

M.C.P. Tse, H.G. Tse, C.R. Padovani, F.F. Aragon, J.R.C. Pinto e Silva

Instituto de Biociências - UNESP - Botucatu

Caixa Postal 510

18618-000 – Botucatu, SP

Recebido para publicação em 15 de setembro de 1998

Colaboradores: I.C.C. Camargo, L. Candeloro, M. Felix, M.L.P. Tse, C.A. Tofoli

e-mail: morfologia@ibb.unesp.br

RESUMO

Cento e noventa e seis fetos de Zebu mestiço, entre 106 e 246mm de comprimento, coletados em matadouros do Estado de São Paulo e divididos a cada 10mm, em 15 classes, foram medidos e pesados. Alguns órgãos como fígado, coração e pulmões foram removidos e pesados. Para selecionar um método de avaliação do crescimento nesse período fetal, várias funções matemáticas foram examinadas. Entre as equações de regressão significativas, a função monologarítmica foi a escolhida. Além disso, os fetos em condições semelhantes de comprimento e peso foram comparados com fetos de raça pura.

Palavras-Chave: Bovino, Zebu mestiço, desenvolvimento fetal, equação monologarítmica

ABSTRACT A total of 196 fetuses of crossbred Zebu between 106 to 246mm in length collected from a slaughterhouse in São Paulo, Brazil, and divided into groups of 10mm size differences intervals into 15 classes were measured and weighed. Liver, heart and lungs were also removed and weighed. In order to select the method of evaluation of growth several mathematical functions were applied. Among significant equations the monologarithmic function was selected. Furthermore, the fetuses in similar conditions of length and weight were compared with racially pure fetuses.

Keywords: Cattle, crossbred Zebu, fetal development, monologarithmic function.

INTRODUÇÃO

Em geral, os métodos matemáticos usados para descrever a cinética pré-natal do crescimento em diferentes espécies são baseados em dados de indivíduos de raça pura como Black-White (Szuba et al., 1988), Bos bubalus bubalis (Berg et al., 1968) e Camelus dromedarius (Moustafa et al., 1968). Os modelos probabilísticos de crescimento apresentados descrevem, de um lado, os impulsos de crescimento, e de outro, a influência das condições ambientais sobre esses impulsos. Na literatura, entretanto, não foram encontrados dados semelhantes sobre o desenvolvimento fetal em Zebu mestiço proveniente de vacas criadas em ambiente natural. É conhecida a capacidade de adaptação desses mestiços ao meio ambiente sujeito às mais variadas condições de clima, pastagem e manejo. Um estudo sobre a dinâmica embriofetal de crescimento do corpo e de alguns órgãos em embriões e fetos mestiços de Zebu nascidos de vacas criadas em pastagens abertas pode fornecer dados importantes de avaliação e conhecimentos biológicos sobre esses bovinos mestiços. Assim, o presente estudo, utilizando amostragem representativa de 196 fetos de Zebu mestiço, obtidos de várias localidades do Estado de São Paulo, procura considerar aspectos de crescimento do corpo e de alguns órgãos fetais com a finalidade de descrever a cinética do desenvolvimento pré-natal em fetos nascidos em meio natural.

MATERIAL E MÉTODOS

Cento e noventa e seis fetos de Zebu classificados no período fetal inicial de acordo com Hubbert (1972), medindo entre 106 e 246mm de comprimento corporal, foram coletados em matadouros do Estado de São Paulo e divididos, arbitrariamente, em 15 classes com intervalo de 10mm de comprimento entre elas.

As dimensões dos fetos foram obtidas com paquímetro metálico aferido. Foi tomado um ponto referencial preciso, representado pela parte mais saliente do frontal, sobre a qual era aplicada uma das hastes do paquímetro e a outra em ponto localizado sobre um plano tangencial às nádegas e que tocava a tuberosidade isquiática.

Os fetos, secos com papel de filtro, foram pesados independente do sexo, uma vez que não houve diferença significativa em peso e comprimento de machos e fêmeas. Em seguida, foram retirados os pulmões, coração e fígado. Para os pulmões, a secção foi feita na traquéia, na altura de sua bifurcação nos brônquios. No coração, os vasos da base foram seccionados em sua emergência. O fígado foi cortado no seu pedículo, sendo sempre conservada a vesícula biliar. As peças foram secas e pesadas em balança de precisão.

Para o estudo da dinâmica do crescimento, foram ajustadas aos pesos várias equações de regressão simples: linear, hiperbólica, raiz quadrada, quadrática incompleta, bilogarítmica, monologarítmica e logarítmica inversa em função dos comprimentos (os comprimentos considerados foram os pontos médios das classes das freqüências), conforme Draper & Smith (1966).

O critério de ajustes baseou-se em testes estatísticos ao nível de 5% de significância e nos maiores coeficientes de determinação. Dentre as regressões estatisticamente significativas e com o mesmo coeficiente de determinação optou-se pela expressão matemática mais simples.

RESULTADOS

Entre os modelos de regressão avaliados, a equação monologarítmica foi a que mais se ajustou aos dados de peso dos fetos e órgãos fetais nos diferentes comprimentos.

A visualização gráfica das equações de regressão e suas derivadas, apresentadas na

Tab. 1, é mostrada nas

Fig. 1 e

2. A

Fig. 1 mostra no eixo à esquerda o aumento do peso dos fetos estudados entre 106 e 246mm e no eixo à direita, o ganho de peso na proporção que aumenta o comprimento. Embora a taxa de variação inicial de ganho de peso, indicada na

Fig. 1, não mostre uma variação significativa, comparativamente ao final da observação, ela apresenta uma diferença significativa de variação de 13,51 de peso entre as taxas inicial e final. Além disso, o ganho de peso dos fetos variou de maneira diferente entre o início e o final da observação, indicando que a taxa de variação dos pesos é uma variável dependente do comprimento. As curvas de crescimento dos órgãos (

Fig. 2) indicam um componente de relação diferente para cada órgão estudado, fígado, pulmão e coração, em função do comprimento. Os pesos finais desses órgãos, em relação aos pesos iniciais, aumentaram 13,51 vezes para o fígado, 14,50 vezes para o coração e 18,92 para os pulmões. Além disso, a taxa de variação de peso mais uma vez foi diferente entre os órgãos estudados mostrando que cada órgão se relaciona de modo diferente em função do comprimento dos fetos, com plena autonomia fisiológica. Ainda mais, uma observação comparativa entre curvas de crescimento do peso corpóreo e órgãos fetais mostra que a relação entre o peso do fígado e o peso dos fetos apresenta impulsos de crescimento semelhante, com taxas próximas de 13,71 e 13,51, respectivamente. Essa semelhança não é observada entre os impulsos de crescimento dos pulmões e do coração em relação ao comprimento fetal. Para o pulmão, observou-se uma taxa variável de peso, chegando a 18,92 vezes o peso inicial. O coração apresentou uma taxa regular de crescimento para cada unidade de comprimento fetal.



DISCUSSÃO

As equações exponenciais que relacionam pesos de fetos e de alguns órgãos durante um período de crescimento têm-se mostrado ajustáveis, evidenciando um alto grau de adequação conforme mostram os coeficientes de determinação (Tab. 1).

Os fetos de Zebu mestiço de fêmeas provenientes das mais variadas regiões de São Paulo, que trazem no seu fenótipo uma herança multifatorial determinada por combinações de fatores genéticos (miscigenação) e ambientais (clima, nutrição, localidade e manejo) mostraram um ganho de peso progressivo entre 106 e 246mm de comprimento, chegando a uma diferença significativa de 13,71 vezes o peso inicial. Essa diferença ponderal não foi uniformemente distribuída durante o período de crescimento, indicando que a taxa de variação de ganho de peso é uma variável dependente do comprimento e se constitui como uma propriedade intrínseca originada pela relação feto e mãe. Essa característica se comporta como uma resposta genética da espécie e do ambiente.

Estudos realizados por Szuba (1988), com a raça pura Black White, por Hubert et al. (1972), com Aberdeen-Angus, Hereford e Holstein-Friesian, por Berg et al.(1968), com water-buffalo e por Berg et al. (1967), com camelos, mostram fetos com 10cm de comprimento pesando 67,2g para Black-White, 39,98g para water-buffaloes e 26,8g para camelos. De acordo com a Fig. 1, fetos mestiços de Zebu, com comprimento de 106mm (10,6cm) e 50g de peso, apresentam valor similar aos obtidos com as raças puras, mostrando que a rusticidade das condições de gestação dos fetos de Zebu mestiço pouco influenciou no ganho de peso, projetando um possível fenótipo resistente ao ambiente.

O comportamento, entretanto, dos órgãos fetais descrito pelas curvas de crescimento (Fig. 2) durante o mesmo período de desenvolvimento foi diferente, indicando para cada órgão um significado fisiológico ligando sua participação a um momento do desenvolvimento fetal.

Quando se analisa a Fig. 2, fica evidente que dentre os três órgãos estudados, os pulmões apresentaram a maior taxa de crescimento. Sob o ponto de vista biológico, essa taxa de crescimento elevada dos pulmões (18,92 vezes o peso inicial) pode ser explicada pela fisiologia, levando-se em conta o alto grau de diferenciação que os alvéolos devem assumir já no início do desenvolvimento para desempenhar uma função definitiva ao nascimento e para atingir alta eficiência na vida adulta, em mamíferos (Balinsky, 1961).

Segundo Carlson (1996), o desenvolvimento do fígado não é apenas uma questão de aumento da sua massa e de complexidade estrutural. Enquanto se formam, suas células vão adquirindo gradativamente a capacidade para realizar as funções bioquímicas que caracterizam o fígado maduro em pleno funcionamento. O fígado aumenta de tamanho com muita rapidez e se converte em um órgão muito volumoso (Michel & Schwarze, 1970), principalmente no período inicial do desenvolvimento, diminuindo com a maturidade do feto. Assim, a taxa de crescimento do fígado, de 13,51 vezes o peso inicial, durante a vida fetal, está relacionada com a importante função hematopoiética do órgão durante um período do desenvolvimento. Deve-se notar o comportamento paralelo de crescimento entre o corpo e o fígado o que mostra a importância desse órgão durante a vida fetal. A taxa de desenvolvimento do coração, 14,50 vezes, pode ser atribuída ao seu relativo grau de diferenciação histofisiológica já apresentada na vida fetal como órgão funcionante.

Os dados mostram que fetos mestiços de Zebu, nas condições estudadas, apresentam um ganho de peso similar aos fetos das raça puras com 10cm, evidenciando que o ganho de peso, embora seja uma variável dependente de crescimento, possivelmente apresenta o componente biológico ligado ao fator genético de miscigenação.

CONCLUSÃO

A aplicação de um modelo de regressão monologarítmica permite concluir que os fetos de Zebu mestiço com comprimento corporal entre 106 e 246mm podem ser comparados aos fetos de raças puras em condições de comprimento e peso semelhantes, apesar das diferentes situações ambientais de criação, no mesmo período de desenvolvimento.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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  • SZUBA, Z., KALISINSKA, E., BABULA, Z. Growth of body weight and lenght of bovine fetuses. Anat. Histol. Embriol., v.17, p.53-59, 1988.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Abr 2001
  • Data do Fascículo
    Ago 1999

Histórico

  • Recebido
    15 Set 1998
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