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Prevalência de carrapatos em cães de áreas rurais da região norte do Estado do Paraná

Prevalence of ticks on dogs from rural areas at northern region of Paraná

Resumo

During January and February, 2000, 133 dogs from 21 farms located in eight diferent counties at the northern region of Paraná, Brazil, were examined for ticks. Ticks found on dogs were collected and identified. Information about dog rearing system was also obtained. Fifty-five ticks were collected on 19 dogs (14.3%) from 11 farms (52.4%). Four species were identified: Rhipicephalus sanguineus (20 ticks on nine dogs from seven farms), Boophilus microplus (15 ticks on five dogs from five farms), Amblyomma ovale (nine ticks on six dogs from four farms) and Amblyomma aureolatum (11 ticks on three dogs from one farm). The results are discussed considering the behavior of some dogs used to stroll into the woods and pasture areas whereas other dogs remained closer to the human facilities.

Dog; Rhipicephalus sanguineus; Boophilus microplus; Amblyomma aureolatum; Amblyomma ovale


Cão; Rhipicephalus sanguineus; Boophilus microplus; Amblyomma aureolatum; Amblyomma ovale

Dog; Rhipicephalus sanguineus; Boophilus microplus; Amblyomma aureolatum; Amblyomma ovale

COMUNICAÇÃO

[Communication]

Prevalência de carrapatos em cães de áreas rurais da região norte do Estado do Paraná

[Prevalence of ticks on dogs from rural areas at northern region of Paraná]

M.B. Labruna1, S.L.P. Souza1, J.S. Guimarães Jr.2, R.C. Pacheco2, A. Pinter1, S.M. Gennari1

1Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP

Av. Prof. Orlando Marques de Paiva, 87

05508-900 - São Paulo, SP

2Centro de Ciências Agrárias da Universidade Estadual de Londrina

Recebido para publicação em 5 de setembro de 2000

Recebido para publicação, após modificações, em 8 de junho de 2001

E-mail: labruna@usp.br

Financiado pela Fapesp (Processo 99/01208-5)

No Brasil, há relatos de várias espécies de carrapatos parasitando os cães. No entanto, a ocorrência de diferentes espécies em diversas localidades é resultante das características epidemiológicas particulares de cada situação. Em áreas urbanas a espécie mais encontrada em cães é a Rhipicephalus sanguineus (Linardi & Nagem, 1973; Massard et al., 1981; Ribeiro et al., 1997). Esse carrapato, originário de Velho Mundo e introduzido no Brasil durante a colonização, já se encontrava distribuído em todas as regiões geográficas do Brasil na década de 30 (Aragão, 1936). Em áreas rurais, diferentes espécies do gênero Amblyomma infestam cães que têm acesso a áreas de matas e florestas (Massard et al., 1981; Labruna et al., 2000). Na região Sudeste, as espécies de Amblyomma mais freqüentemente encontradas em cães de áreas rurais são A. aureolatum, A. ovale e A. cajennense (Aragão, 1936; Massard et al., 1981). Na região Sul destacam-se as espécies A. tigrinum e A. aureolatum, embora pelo menos outras quatro espécies de Amblyomma já tenham sido relatadas em cães (Freire, 1972). Na região Norte, a espécie A. oblongoguttatum foi relatada como a de maior ocorrência, seguida por A. ovale e A. cajennense (Labruna et al., 2000).

A diversidade de espécies de carrapatos parasitando cães no Brasil é resultante dos diferentes ecossistemas do território nacional. Nesse sentido, as características ambientais e a diversidade de espécies de hospedeiros de cada área são os pontos fundamentais para a existência de determinadas espécies de carrapatos nos cães. No presente trabalho estudou-se a ocorrência de carrapatos em cães da área rural da região norte do Estado do Paraná.

Cães foram examinados quanto à presença de carrapatos em propriedades rurais dos municípios de Apucarana (cinco propriedades rurais), Arapongas (uma), Cambé (duas), Jandaia do Sul (duas), Londrina (cinco), Mandaguari (três), Rolândia (uma) e Tamarana (duas), totalizando 21 propriedades rurais da microregião de Londrina. Essas propriedades, com média de 238,3ha, representavam 91,3% das fazendas de produção de leite tipo B da microregião.

A área do estudo localiza-se em relevo ondulado entre as altitudes de 580m e 760m. O clima, segundo a classificação de Köppen, é subtropical temperado (cfA), caracterizando-se por temperaturas médias nos meses mais frios inferiores a 18oC e no mês mais quente, acima de 22oC. O verão é quente, com poucas geadas e precipitação pluvial menos freqüente, contudo não há uma estação seca definida. O solo predominante é o latossolo roxo entrófico A moderado com textura argilosa e a vegetação original caracteriza-se por floresta tropical subperenifólia (IAPAR, 1994).

As propriedades rurais foram visitadas durante os meses de janeiro e fevereiro de 2000. Todos os cães das propriedades foram individualmente examinados quanto à presença de carrapatos. Paralelamente obtiveram-se informações quanto à forma de criação (solto ou preso, com ou sem acesso a áreas de matas e pastagens). Os carrapatos encontrados em cada cão foram colhidos e acondicionados em frascos com álcool 70o para posterior identificação taxonômica, realizada utilizando-se a chave taxonômica de Aragão & Fonseca (1961a). Os espécimens foram depositados na coleção nacional de carrapatos (CNC) da FMVZ da Universidade de São Paulo (números de acesso: 271-274; 296; 299-300).

Das 21 propriedades visitadas, em apenas uma não havia cães. Cento e trinta e três cães, todos sem raça definida, foram examinados em 20 propriedades, com média de 6,6 cães por propriedade (amplitude: 2-14). Cinqüenta e cinco carrapatos foram colhidos de 19 cães (14,3%), provenientes de 11 propriedades (52,4%). Quatro espécies foram encontradas: Rhipicephalus sanguineus, Boophilus microplus, Amblyomma ovale e Amblyomma aureolatum, sendo as quantidades e freqüências descritas na Tab. 1. Em duas propriedades observaram-se as espécies R. sanguineus e B. microplus, cada uma das espécies em um diferente cão. Da mesma forma, em uma propriedade encontraram-se R. sanguineus e A. ovale, cada espécie infestando um diferente cão. Somente em uma propriedade, do município de Tamarana, todos os três cães apresentaram infestações múltiplas pelas espécies B. microplus, A. aureolatum e A. ovale.

Em apenas uma das propriedades positivas os cães não tinham acesso a áreas de pastagens ou matas, permanecendo exclusivamente presos. Nestes, a única espécie encontrada foi R. sanguineus. Nas demais (10 propriedades), embora os cães ficassem soltos e tivessem acesso a áreas de matas e pastagens, muitos deles tinham o hábito de repousarem sempre no mesmo lugar, algumas vezes em casinhas próprias de madeira.

R. sanguineus foi o carrapato de maior prevalência neste estudo, encontrado em nove (6,7%) cães. Outros estudos indicam freqüências bem superiores de cães positivos para R. sanguineus. Em áreas urbanas de Minas Gerais, Linardi & Nagem (1973) encontraram essa espécie em 32,9% dos 282 cães. Na cidade de Porto Alegre, Ribeiro et al. (1997) encontraram R. sanguineus em 93,2% dos 236 animais de rua. O fato do presente estudo ter englobado somente cães de áreas rurais, ao contrário dos trabalhos citados realizados em áreas urbanas, deve ser considerado na interpretação destes resultados. Embora R. sanguineus seja um carrapato adaptado às condições das áreas urbanas, algumas formas de criação de cães em áreas rurais possibilitam o seu estabelecimento nessas áreas. Em uma propriedade rural do presente trabalho encontrou-se R. sanguineus em dois cães que viviam sempre presos em um canil. Nesse caso a forma de criação era semelhante à do meio urbano. Em outras seis propriedades, R. sanguineus foi encontrado em sete cães que viviam sempre soltos, com infestação média de 2,5 carrapatos por cão. Esse valor é bem inferior ao encontrado por Ribeiro et al. (1997), de 24 carrapatos R. sanguineus por cão.

Nas áreas urbanas, a disponibilidade de habitates para as fases de vida livre do R. sanguineus é abundante, uma vez que esse carrapato tem por hábito penetrar em pequenos buracos ou frestas em superfícies de cimento ou madeira (Dipeolu et al., 1982). Nas áreas rurais essa disponibilidade é limitada, ficando concentrada às instalações feitas pelo homem, onde os cães soltos tendem a passar algumas horas do dia. Elas contribuem para a manutenção de populações de R. sanguineus nas áreas rurais.

O encontro de B. microplus nos cães poderia estar relacionado a dois fatores: primeiro ao fato desse carrapato parasitar várias espécies de hospedeiros (Moreno, 1984; Ito et al., 1998; Heuchert et al., 1999), e segundo ao fato de os cães parasitados terem acesso às pastagens dos bovinos, onde seguramente existiam formas infestantes de B. microplus. Os achados de R. sanguineus e B. microplus em diferentes indivíduos da mesma propriedade, mas não em um mesmo cão, sugerem que as infestações estão associadas a diferentes hábitos dos cães, fato comum em propriedades rurais.

O encontro de A. ovale e A. aureolatum confirma os resultados da literatura de que esses carrapatos, relatados em várias espécies de carnívoros silvestres, também podem infestar cães de áreas rurais do Brasil (Aragão & Fonseca, 1961b; Ribeiro, 1967; Massard et al., 1981; Labruna et al., 2000). É interessante observar que as duas espécies foram encontradas apenas em uma propriedade, no município de Tamarana, e nos mesmos cães, semelhante ao descrito por Barros & Baggio (1992), que também observaram o parasitismo por ambas as espécies em um mesmo indivíduo da espécie Galictis cuja (Carnivora: Mustelidae), no município paranaense de Paranaguá.

Palavras-chave: Cão, Rhipicephalus sanguineus, Boophilus microplus, Amblyomma aureolatum, Amblyomma ovale

ABSTRACT

During January and February, 2000, 133 dogs from 21 farms located in eight diferent counties at the northern region of Paraná, Brazil, were examined for ticks. Ticks found on dogs were collected and identified. Information about dog rearing system was also obtained. Fifty-five ticks were collected on 19 dogs (14.3%) from 11 farms (52.4%). Four species were identified: Rhipicephalus sanguineus (20 ticks on nine dogs from seven farms), Boophilus microplus (15 ticks on five dogs from five farms), Amblyomma ovale (nine ticks on six dogs from four farms) and Amblyomma aureolatum (11 ticks on three dogs from one farm). The results are discussed considering the behavior of some dogs used to stroll into the woods and pasture areas whereas other dogs remained closer to the human facilities.

Keywords: Dog, Rhipicephalus sanguineus, Boophilus microplus, Amblyomma aureolatum, Amblyomma ovale

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Jun 2002
  • Data do Fascículo
    Out 2001

Histórico

  • Revisado
    08 Jun 2001
  • Recebido
    05 Set 2000
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