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Atividade secretória de tubas uterinas com e sem patologia de porcas adultas nas fases folicular e luteínica

Secretory activity of uterine tubes with and without alterations of sexually mature sows in the folicular and luteal phases

Resumos

Descrevem-se as características anatomopatológicas e histoquímicas de 124 tubas uterinas de porcas (matrizes) abatidas em matadouros, nas fases folicular e luteínica do ciclo estral. As tubas uterinas foram distribuídas em quatro grupos: LSP- fase luteínica sem patologia tubárica (n=45), LCP- fase luteínica com patologia tubárica (n=19), FSP- fase folicular sem patologia tubárica (n=45) e FCP- fase folicular com patologia tubárica (n=15). Para estudo histoquímico de mucossubstâncias foram utilizadas as colorações de periodic acid Schiff (PAS) com e sem digestão prévia pela amilase salivar e Alcian Blue (AB) em pH 2,5 e 0,4. Utilizou-se a coloração de Ninhidrina-Schiff para evidenciação de proteínas ricas em radicais -NH2. Foram observadas alterações em 34 tubas uterinas. Independente da fase do ciclo estral, as patologias mais comumente encontradas foram os cistos de parede e a metaplasia escamosa. Em menor número foram observados divertículo e adenomiose. A ampola e o infundíbulo foram os segmentos mais afetados. Na fase folicular, o infundíbulo apresentou maior intensidade de secreção de mucossubstâncias neutras e AB 2,5-positivas. Na ampola houve maior intensidade de secreção de mucossubstâncias AB 2,5-positivas, sulfomucinas e de proteínas ricas em radicais -NH2. As patologias não reduziram significativamente a secreção de mucossubstâncias nas regiões adjacentes em nenhum dos segmentos tubáricos, tanto na fase luteínica quanto na folicular. Nas áreas de metaplasia escamosa do epitélio tubárico e nos cistos de parede houve redução da secreção de mucossubstâncias neutras e ácidas.

porca; tuba uterina; patologia; histoquímica; fase folicular; fase luteínica


The goal of this study was to describe the anatomopathological and histochemical features of uterine tubes from 62 sexually mature sows, in both follicular and luteal phases. The animals were assigned into four groups as follows: the first (LSP) containing sows in the luteal phase without tube pathology (n=45), the second (LCP) with sows in the luteal phase with tube pathology (n=19), the third (FSP) with sows in the follicular phase without tube pathology (n=45) and the fourth (FCP) with sows in the follicular phase with tube pathology (n=15). PAS, Alcian Blue (pH 2.5 and 0.4), and Ninhidrina-Schiff stains were used for the histochemical study. Grossly, 34 uterine tubes presented morphological lesions. Wall cysts and squamous metaplasia were the changes found more frequently in both phases. Ampulla and infundibulum were the segments affected more frequently. In the follicular phase, the infundibulum had a higher secretion intensity of neutral mucosubstances, whereas the ampulla and the infundibulum had a higher secretion intensity of AB 2.5-positive mucosubstances. The ampulla had a higher intensity of sulphomucins and Ninhidrina-Schiff-positive secretions in the follicular phase. The morphologic changes did not correlate with reduction in secretion of mucosubstance in the adjacent areas of the uterine tube in both follicular and luteal phases. There was a reduction in secretion of neutral and acid mucosubstances in areas affected by squamous metaplasia and wall cysts.

sow; uterine tube; pathology; histochemistry; follicular phase; luteal phase


MEDICINA VETERINÁRIA

Atividade secretória de tubas uterinas com e sem patologia de porcas adultas nas fases folicular e luteínica

Secretory activity of uterine tubes with and without alterations of sexually mature sows in the folicular and luteal phases

F.J.F. Sant'AnaI; E.F. NascimentoII; J.C. NogueiraIII; R. SerakidesII

IEscola de Veterinária da Universidade Federal de Goiás- Campus Avançado de Jataí, BR 364, km 192 – Caixa Postal 03, 75800-000 – Jataí, GO

IIEscola de Veterinária da UFMG - Belo Horizonte

IIIInstituto de Ciências Biológicas da UFMG - Belo Horizonte

RESUMO

Descrevem-se as características anatomopatológicas e histoquímicas de 124 tubas uterinas de porcas (matrizes) abatidas em matadouros, nas fases folicular e luteínica do ciclo estral. As tubas uterinas foram distribuídas em quatro grupos: LSP- fase luteínica sem patologia tubárica (n=45), LCP- fase luteínica com patologia tubárica (n=19), FSP- fase folicular sem patologia tubárica (n=45) e FCP- fase folicular com patologia tubárica (n=15). Para estudo histoquímico de mucossubstâncias foram utilizadas as colorações de periodic acid Schiff (PAS) com e sem digestão prévia pela amilase salivar e Alcian Blue (AB) em pH 2,5 e 0,4. Utilizou-se a coloração de Ninhidrina-Schiff para evidenciação de proteínas ricas em radicais –NH2. Foram observadas alterações em 34 tubas uterinas. Independente da fase do ciclo estral, as patologias mais comumente encontradas foram os cistos de parede e a metaplasia escamosa. Em menor número foram observados divertículo e adenomiose. A ampola e o infundíbulo foram os segmentos mais afetados. Na fase folicular, o infundíbulo apresentou maior intensidade de secreção de mucossubstâncias neutras e AB 2,5-positivas. Na ampola houve maior intensidade de secreção de mucossubstâncias AB 2,5-positivas, sulfomucinas e de proteínas ricas em radicais –NH2. As patologias não reduziram significativamente a secreção de mucossubstâncias nas regiões adjacentes em nenhum dos segmentos tubáricos, tanto na fase luteínica quanto na folicular. Nas áreas de metaplasia escamosa do epitélio tubárico e nos cistos de parede houve redução da secreção de mucossubstâncias neutras e ácidas.

Palavras-chave: porca, tuba uterina, patologia, histoquímica, fase folicular, fase luteínica

ABSTRACT

The goal of this study was to describe the anatomopathological and histochemical features of uterine tubes from 62 sexually mature sows, in both follicular and luteal phases. The animals were assigned into four groups as follows: the first (LSP) containing sows in the luteal phase without tube pathology (n=45), the second (LCP) with sows in the luteal phase with tube pathology (n=19), the third (FSP) with sows in the follicular phase without tube pathology (n=45) and the fourth (FCP) with sows in the follicular phase with tube pathology (n=15). PAS, Alcian Blue (pH 2.5 and 0.4), and Ninhidrina-Schiff stains were used for the histochemical study. Grossly, 34 uterine tubes presented morphological lesions. Wall cysts and squamous metaplasia were the changes found more frequently in both phases. Ampulla and infundibulum were the segments affected more frequently. In the follicular phase, the infundibulum had a higher secretion intensity of neutral mucosubstances, whereas the ampulla and the infundibulum had a higher secretion intensity of AB 2.5-positive mucosubstances. The ampulla had a higher intensity of sulphomucins and Ninhidrina-Schiff-positive secretions in the follicular phase. The morphologic changes did not correlate with reduction in secretion of mucosubstance in the adjacent areas of the uterine tube in both follicular and luteal phases. There was a reduction in secretion of neutral and acid mucosubstances in areas affected by squamous metaplasia and wall cysts.

Keywords: sow, uterine tube, pathology, histochemistry, follicular phase, luteal phase

INTRODUÇÃO

A mucosa da tuba uterina é revestida por epitélio simples cilíndrico formado essencialmente por células ciliadas e secretórias não-ciliadas. A secreção tubárica ocorre sob efeito dos esteróides ovarianos (Harper, 1994) e apresenta características bioquímicas peculiares e imprescindíveis para a capacitação do espermatozóide, fertilização do oócito e início do desenvolvimento embrionário.

Embora já se conheça as características histoquímicas das secreções tubáricas nas fêmeas dos mamíferos eutéreos (Fredricsson, 1969; Dickey, Hill, 1974), poucas são as informações disponíveis para a espécie suína. Várias pesquisas apontam as patologias da tuba uterina de porcas como causa de infertilidade (Warnick et al., 1949; Wilson et al., 1949; Nalbandov, 1952; Perry, Pomeroy, 1956; Einarsson, Gustafsson, 1970; Heinonen et al., 1998), mas a maior parte dos estudos se restringe a determinar a freqüência das patologias tubáricas de porcas abatidas em matadouros, sem menção à interferência na sua atividade secretória.

Na espécie suína, as técnicas de maturação e fertilização de oócitos in vitro apresentam resultados insatisfatórios, diferente do que ocorre na espécie bovina. Postula-se que o meio de maturação utilizado não forneça as mesmas condições da tuba uterina quando da fertilização in vivo (Wang et al., 1997). Assim, o estudo das características histoquímicas das secreções tubáricas na porca poderá fornecer subsídios para a viabilização da transferência de embriões e da fertilização de oócitos in vitro, atualmente apenas disponível em caracter experimental nessa espécie. Este trabalho teve por objetivo estudar a atividade secretória de tubas uterinas com e sem patologia de porcas adultas nas fases folicular e luteínica.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram estudadas 124 tubas uterinas de 62 matrizes suínas, mestiças, abatidas em matadouros da região metropolitana de Belo Horizonte. Os animais foram sacrificados mediante eletrocussão, seguida de sangria. Após a evisceração, fragmentos longitudinais do ovário e transversais do útero e das três porções da tuba uterina, correspondentes ao istmo, ampola e infundíbulo, foram coletados e imediatamente fixados em formol neutro e tamponado a 10%. Os fragmentos foram processados pela técnica de inclusão em parafina, cortados com 4mm e corados pela hematoxilina-eosina (Prophet, 1992).

Para estudo histoquímico de mucossubstâncias foram utilizadas as colorações do ácido periódico-Schiff (PAS) (Lison, 1960) com e sem digestão prévia pela amilase salivar (McManus, 1946), Alcian Blue (AB) em pH 2,5 (Mowry, 1956) e 0,4 (Prophet, 1992). Ademais, utilizou-se a coloração de Ninhidrina-Schiff (Yasuma, Ichikawa, 1953) para evidenciação de proteínas ricas em radicais –NH2.

A secreção tubárica detectada histoquimicamente foi classificada quanto à intensidade em: discreta - quando a secreção estava localizada focalmente no citoplasma, ápice ou no glicocálix das células secretórias, ou ainda em quantidades mínimas no lúmen; moderada - quando o lúmen e as células secretórias apresentaram cerca de 50% de secreção positiva, sob a forma de grânulos ou extrusões citoplasmáticas; e intensa - quando grande parte das células secretórias e do lúmen apresentaram grânulos secretórios ou extrusões citoplasmáticas.

A morfologia uterina e ovariana foi estudada para determinação das fases folicular ou luteínica do ciclo estral, segundo Hughes e Varley (1980).

As tubas uterinas foram divididas em quatro grupos, de acordo com a fase do ciclo estral na qual as porcas se encontravam, e com a presença ou não de patologias, como seguem: tubas uterinas na fase luteínica sem patologia (LSP) (n=45); tubas uterinas na fase luteínica com patologia (LCP) (n=19); tubas uterinas na fase folicular sem patologia (FSP) (n=45) e tubas uterinas na fase folicular com patologia (FCP) (n=15).

Quando os animais apresentavam alguma patologia tubárica em apenas um antímero, uma tuba era distribuída em um grupo com patologia (LCP ou FCP) e a outra em um grupo sem patologia (LSP ou FSP). Quando alguma patologia afetava apenas um segmento da tuba uterina, a mesma tuba não era incluída (adicionada) em outros grupos e em outros segmentos.

O delineamento estatístico foi o inteiramente ao acaso. Utilizou-se o teste não paramétrico de Kruskal-Wallis (Sampaio, 2001) para analisar a intensidade de secreção tubárica em cada grupo e em cada segmento.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram observadas alterações em 34 tubas uterinas (27,4%). Na fase luteínica, observaram-se patologias em 19 tubas (15,3%) (Tab. 1). Macroscopicamente, evidenciaram-se 12 cistos de parede, onde a ampola foi o segmento mais afetado (Fig. 1a), seguida do istmo e infundíbulo. A alteração foi encontrada em um ou em ambos os antímeros. Em alguns casos havia mais de um cisto por tuba, que variavam de 0,3 a 2,5 cm de diâmetro. Microscopicamente, notou-se que o epitélio afetado apresentava-se atrofiado com células cuboidais baixas e com diminuição do pregueamento. O cisto localizava-se principalmente na miossalpinge comprimindo a mucosa e o lúmen adjacente, às vezes, ocupando aproximadamente 90% do seu espaço (Fig. 1b). O aspecto histológico dos cistos foi o mesmo independente do segmento tubárico afetado. Como a alteração foi encontrada principalmente na ampola, a principal função comprometida desempenhada pela tuba seria a fertilização, visto que o lúmen tubárico é comprimido, diminuindo o espaço físico para a fertilização.



Outra patologia observada na fase luteínica foi a metaplasia escamosa, visualizada microscopicamente em 10 tubas uterinas. A porção mais comprometida foi a ampola, e em apenas um caso o istmo foi afetado. Essa alteração, caracterizada pela presença de epitélio estratificado pavimentoso, em substituição ao simples cilíndrico normal, era quase sempre focal ou multifocal e bilateral. Muitas vezes, o epitélio metaplásico encontrava-se substituindo o epitélio tubárico, e em alguns casos, situava-se apenas na lâmina própria. Quando o epitélio tubárico encontra-se afetado, a secreção pode estar comprometida, visto que, possivelmente, o epitélio metaplásico perde sua capacidade de secretar. Ademais, a atividade ciliar da tuba pode encontrar-se afetada, dificultando o transporte de ovócitos e, conseqüentemente, a fertilização. Os fatores que predispõem à metaplasia, se persistentes, podem induzir a transformação neoplásica do epitélio metaplásico (Cotran et al., 2000). Entretanto, tal efeito não tem sido descrito na tuba uterina da porca. Na mulher, segundo Wheeler (1994), o epitélio tubárico pode sofrer metaplasia sem causa aparente.

Foi evidenciado um caso de divertículo na ampola. Macroscopicamente, a alteração foi caracterizada por dilatação saculiforme em forma de apêndice com parede delgada, medindo aproximadamente 3×1cm (Fig. 1c). Microscopicamente, notou-se que as células epiteliais secretórias apresentavam-se ativas. Evidenciou-se diminuição acentuada da altura das pregas, adelgaçamento da miossalpinge, além de dois focos de metaplasia escamosa. Einarsson e Gustafsson (1970) descreveram 14 casos de divertículo da tuba uterina em um estudo com 1000 marrãs abatidas em matadouros. Esses autores admitiram que a alteração possui efeito adverso sobre a fertilidade, possivelmente pelo comprometimento do transporte de gametas.

A adenomiose foi observada em uma ampola. Histologicamente, a lesão foi focal e caracterizada pela presença de epitélio tubárico na miosalpinge (Fig. 1d). Não foram notadas áreas de hipertrofia ou hiperplasia muscular, conforme nota-se na adenomiose tubárica humana. Na mulher, a adenomiose é descrita com maior freqüência na forma difusa e localizada no istmo (Wrork, Broders, 1942). Neste trabalho a alteração foi focal e a ampola foi o segmento comprometido. Aparentemente a alteração tratou-se de um simples achado microscópico, visto que foi evidenciado apenas um foco em uma única região da tuba, e o epitélio secretor e ciliado na mucosa adjacente estava morfologicamente normal. Com relação à gênese da patologia, não foi possível inferí-la, pois nenhuma alteração inflamatória regional ou hiperplásica da miossalpinge foi observada, bem como não foi realizada dosagem da concentração plasmática dos hormônios sexuais.

Ainda na fase luteínica, observou-se na lâmina própria e na miossalpinge de um infundíbulo dilatação vascular sangüínea intensa sem congestão e nenhum outro indício de processo inflamatório. Nesse animal, não foram observadas alterações circulatórias ou inflamatórias em outros segmentos tubáricos, nem tão pouco no útero ou no ovário.

Na fase folicular notaram-se alterações da morfologia de 15 tubas (12,1%) (Tab. 2). Macroscopicamente, foram observados 16 cistos de parede. O infundíbulo e a ampola foram igualmente afetados pela lesão, apresentando-a de forma unilateral, ou em alguns casos, bilateral. A maioria dos cistos possuía diâmetro inferior a 1cm, porém alguns atingiam 2cm. Tsumura et al. (1982) relataram cistos no infundíbulo de porcas com até 5cm de diâmetro. Na fase folicular, os cistos da parede tubárica foram freqüentemente encontrados no infundíbulo, especialmente na sua porção fimbriada. Estes dados confirmam as descrições de Einarsson e Gustafsson (1970) e Tsumura et al. (1982). Neste caso, de acordo com o tamanho da formação cística presente, poderia haver comprometimento da captação dos ovócitos no momento da ovulação.

Sete casos de metaplasia escamosa foram encontrados nas tubas uterinas durante a fase folicular. A ampola foi o segmento afetado com maior freqüência, seguida do infundíbulo. A patologia ocorreu igualmente, tanto unilateral quanto bilateral, e focal ou multifocal (Fig. 1e).

Em alguns casos, mais de uma patologia era notada em um mesmo segmento tubárico (Tab. 3) e, ocasionalmente, em uma mesma tuba uterina observava-se mais de um segmento comprometido, conforme mostra a Tab. 4.

Duas patologias comumente descritas na tuba uterina da porca (Kennedy, Miller, 1993; Nascimento, Santos, 2003), salpingite e hidrosalpinge, curiosamente não foram observadas no presente estudo. Provavelmente, o tamanho da amostragem e a casuística local exerceram influência sobre os dados encontrados. Observou-se que os cistos de parede foram a patologia tubárica mais freqüente. Einarsson e Gustafsson (1970) e Tsumura et al. (1982) também observaram freqüência considerável de cistos na parede da tuba uterina de porcas.

No estudo das mucossubstâncias neutras, notou-se que no infundíbulo a secreção foi significativamente maior na fase folicular (Fig. 2a), comparando-se à fase luteínica (P<0,05) (Tab. 5). Embora a intensidade de secreção na ampola também tenha sido superior na fase folicular, esse aumento não foi significativo (P>0,05). As patologias tubáricas não comprometeram a secreção de mucossubstâncias neutras em nenhum dos segmentos estudados (P>0,05).



Nos cistos de parede, como havia acentuada redução da altura do epitélio tubárico, a atividade secretória local foi reduzida. Quando presente, a secreção apresentava-se como uma camada delgada de material PAS-positivo sobre o glicocálix ou como poucos grânulos extrusados. As áreas com metaplasia escamosa não apresentaram indícios de conteúdo secretório sobre o glicocálix, entretanto, em algumas tubas uterinas, no interior do epitélio estratificado pavimentoso metaplásico, observaram-se poucos grânulos e feixes lineraes PAS-positivos (Fig. 2d). Estes resultados sugerem que mesmo com a metaplasia escamosa instalada, algumas poucas células secretórias, remanescentes do epitélio cúbico simples, ainda podem persistir ativas, mesmo com redução drástica da função secretória e ciliar da região. No divertículo havia secreção PAS-positiva no ápice do epitélio e, principalmente, no lúmen e, aparentemente, não havia interferência da atividade secretória. A adenomiose caracterizou-se pela presença discreta de grânulos PAS-positivos na região supranuclear das células secretórias. A diminuição na secreção tubárica de mucossubstâncias desfavorece o prognóstico, pois nesse caso a implantação uterina do blastocisto estaria dificultada (Menghi et al., 1988). Menghi et al. (1988) também citaram que os carboidratos neutros presentes na secreção da ampola fornecem um meio ambiente ideal para a proteção do ovócito e para o processo de fertilização.

Com relação as mucossubstâncias ácidas, observaram-se no infundíbulo e na ampola diferenças significativas evidenciadas pela coloração AB em pH 2,5, entre os grupos FSP e LSP (P<0,05) (Tab. 6) (Fig. 2b). Estes dados mostram, como esperado, que as tubas na fase folicular secretam mucossubstâncias ácidas em maior intensidade que na fase luteínica. Além disso, pôde-se observar que as alterações morfológicas encontradas nas tubas uterinas nas fases luteínica e folicular (grupos LCP e FCP, respectivamente) não prejudicaram significativamente a intensidade de secreção de mucossubstâncias ácidas do segmento adjacente à patologia (P>0,05).

As características histoquímicas dos cistos de parede e do divertículo visualizadas pela coloração AB pH 2,5 e 0,4 foram similares às observadas pelo PAS. A metaplasia escamosa apresentou secreção linear AB 2,5-positiva no glicocálix e, ocasionalmente, foram observados poucos grânulos citoplasmáticos reativos no interior do epitélio escamoso metaplásico. A adenomiose apresentou reação discreta ao AB pH 2,5 e 0,4.

A intensidade de reação positiva ao AB pH 0,4 oi menor que a encontrada no AB pH 2,5, sugerindo que a tuba uterina da porca secreta, além de outras mucossubstâncias, sulfomucinas e carboximucinas. Na ampola a secreção de mucossubstâncias AB pH 0,4-positivas foi significativamente maior na fase folicular em comparação à fase luteínica (P<0,05) (Tab. 7). Não houve efeito negativo das patologias tubáricas sobre a intensidade de secreção de sulfomucinas nas regiões adjacentes às patologias de nenhum dos segmentos avaliados (P>0,05).

A secreção de proteínas ricas em radicais –NH2, observada na coloração Ninhidrina-Schiff, foi significativamente maior na ampola durante a fase folicular (P<0,05) (Fig. 2c), semelhante ao encontrado nas colorações AB pH 2,5 e AB pH 0,4 (Tab. 8). Estes resultados caracterizam a atividade secretória intensa de proteínas na ampola sob efeito do estrógeno, conforme citações da literatura (McDaniel et al., 1968; Abe, 1996). Conforme visto nas demais colorações empregadas, as patologias tubáricas não interferiram significativamente na secreção protéica do órgão, tanto na fase luteínica quanto na folicular (P>0,05).

Os cistos de parede e a adenomiose observadas nas tubas uterinas nas fases luteínica e folicular (grupos LCP e FCP, respectivamente) apresentaram reação positiva à Ninhidrina-Schiff, semelhante ao resultado evidenciado pelo PAS, AB pH 0,4 e AB pH 2,5. Havia secreção protéica fracamente positiva no divertículo. Nas áreas de metaplasia escamosa foram visualizados pequenos grânulos Ninhidrina-Schiff-positivos, semelhantes àqueles observados no PAS e AB pH 2,5. Essa redução na secreção de proteínas, principalmente na ampola, possivelmente traz prejuízos a muitos eventos que ocorrem nessa região e que são dependentes dos fluidos tubáricos. Como exemplos podem-se destacar a fertilização e o desenvolvimento inicial do embrião. Até o momento, as reais funções dessas macromoléculas na fisiologia tubárica não são totalmente conhecidas.

CONCLUSÕES

Com base no presente estudo conclui-se que: 1 - os cistos de parede e a metaplasia escamosa são patologias freqüentes da tuba uterina da porca; 2 - a tuba uterina normal da porca apresenta secreção composta predominantemente de mucossubstâncias neutras, carboximucinas, sulfomucinas e proteínas ricas em radicais –NH2; 3 – na fase folicular do ciclo estral, a secreção de mucossubstâncias neutras é significativamente mais intensa no infundíbulo de porcas. A ampola e o infundíbulo de porcas na fase folicular apresentam maior intensidade de secreção de mucossubstâncias AB 2,5-positivas. A ampola de porcas, na fase folicular, também possui maior intensidade de secreção rica em sulfomucinas e em proteínas contendo radicais –NH2; 4 – as patologias da tuba uterina de porcas não reduzem significativamente a secreção de mucossubstâncias, nas regiões adjacentes em nenhum dos segmentos estudados, tanto na fase luteínica quanto folicular; 5 – nas áreas de metaplasia escamosa do epitélio tubárico, ocorre diminuição da secreção de mucossubstâncias neutras e ácidas, enquanto que nos cistos de parede também há discreta redução da quantidade de mucossubstâncias secretadas, independente do segmento afetado.

Recebido para publicação em 11 de março de 2003

Recebido para publicação, após modificações, em 13 de outubro de 2003

E-mail: santanafjf@yahoo.com

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Jun 2004
  • Data do Fascículo
    Fev 2004

Histórico

  • Aceito
    13 Out 2003
  • Recebido
    11 Mar 2003
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