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Efeitos da administração epidural de amitraz, xilazina ou dimetil sulfóxido em vacas

Effects of epidural injection of amitraz, xylazine or dimethyl sulfoxide in cows

Resumos

Avaliaram-se os efeitos da injeção epidural de amitraz (0,4mg/kg), xilazina (0,05mg/kg) ou dimetil sulfóxido 10% (5,0ml) sobre a freqüência cardíaca (FC), pressão arterial sistólica (PAS), freqüência respiratória (FR), motilidade ruminal (MR), temperatura retal (TR), altura de cabeça (AC) e latência das respostas a estímulos nociceptivos nas regiões da coxa (LECC) e coroa do casco (LRRM) de vacas. Houve diminuição da FC e da MR nos grupos xilazina e amitraz. O tratamento com xilazina resultou em alterações na FR, PAS e AC. LECC e LRRM foram maiores nos tratamentos com agonistas alfa-2. Nas doses utilizadas, o amitraz aumentou a latência de resposta a estímulo nociceptivo em menor grau que a xilazina, sem induzir efeitos colaterais sistêmicos severos, em vacas.

agonista alfa-2; amitraz; analgesia; bovinos; epidural


The effects of epidurally amitraz (0.4mg/kg), xylazine (0.05mg/kg) or 10% dimethyl sulfoxide (5.0ml) over heart rate (HR), systolic arterial pressure (SAP), respiratory rate (RR), ruminal motility (RM), rectal temperature (RT), head height (HH), and latency to heat-evoked reflexes (LSPR - skin of perineal region; LHWR - hoof withdrawal reflex) were evaluated in cows. HR and RM decreased in amitraz and xylazine groups. Only xylazine group showed statistical difference over RR, SAP and HH. LSPR and LHWR were prolonged in both alpha-2 agonist groups. Amitraz epidural administration does not induce severe systemic effects, and induces prolongation of the latency to heat-evoked reflexes in a minor degree than xylazine, at the used dosages, in cows.

alfa-2 agonist; amitraz; analgesia; cattle; epidural


MEDICINA VETERINÁRIA

Efeitos da administração epidural de amitraz, xilazina ou dimetil sulfóxido em vacas

Effects of epidural injection of amitraz, xylazine or dimethyl sulfoxide in cows

R.M. AlmeidaI; C.A.A. ValadãoII; J.C.D. MorenoIII; A. FariasIII; A.H. SouzaIII

IFaculdade de Medicina Veterinária – União Pioneira de Integração Social, Departamento de Medicina Veterinária, SEPS, 712/912, conj. A, asa sul, 70390-125 - Brasília, DF

IIFaculdade de Ciências Agrárias e Veterinária - UNESP-Jaboticabal, SP

IIIPós-graduando - FCAV/UNESP-Jaboticabal, SP

RESUMO

Avaliaram-se os efeitos da injeção epidural de amitraz (0,4mg/kg), xilazina (0,05mg/kg) ou dimetil sulfóxido 10% (5,0ml) sobre a freqüência cardíaca (FC), pressão arterial sistólica (PAS), freqüência respiratória (FR), motilidade ruminal (MR), temperatura retal (TR), altura de cabeça (AC) e latência das respostas a estímulos nociceptivos nas regiões da coxa (LECC) e coroa do casco (LRRM) de vacas. Houve diminuição da FC e da MR nos grupos xilazina e amitraz. O tratamento com xilazina resultou em alterações na FR, PAS e AC. LECC e LRRM foram maiores nos tratamentos com agonistas a-2. Nas doses utilizadas, o amitraz aumentou a latência de resposta a estímulo nociceptivo em menor grau que a xilazina, sem induzir efeitos colaterais sistêmicos severos, em vacas.

Palavras-chave: agonista alfa-2, amitraz, analgesia, bovinos, epidural

ABSTRACT

The effects of epidurally amitraz (0.4mg/kg), xylazine (0.05mg/kg) or 10% dimethyl sulfoxide (5.0ml) over heart rate (HR), systolic arterial pressure (SAP), respiratory rate (RR), ruminal motility (RM), rectal temperature (RT), head height (HH), and latency to heat-evoked reflexes (LSPR – skin of perineal region; LHWR – hoof withdrawal reflex) were evaluated in cows. HR and RM decreased in amitraz and xylazine groups. Only xylazine group showed statistical difference over RR, SAP and HH. LSPR and LHWR were prolonged in both a-2 agonist groups. Amitraz epidural administration does not induce severe systemic effects, and induces prolongation of the latency to heat-evoked reflexes in a minor degree than xylazine, at the used dosages, in cows.

Keywords: alfa-2 agonist, amitraz, analgesia, cattle, epidural

INTRODUÇÃO

Os agonistas de receptores a-2 adrenérgicos (agonistas a-2) são substâncias derivadas da tiazina que causam sedação, miorrelaxamento e analgesia dose-dependentes, sendo comumente empregados como sedativos e analgésicos e na medicação pré-anestésica (Maze e Tranquilli, 1991). O uso epidural dos agonistas a-2 foi bem descrito na literatura em diversas espécies. Nos bovinos, os principais efeitos são caracterizados por sedação, antinocicepção, bradicardia, ligeiro decréscimo da pressão arterial e inibição da motilidade ruminal com timpanismo. Quando comparados aos anestésicos locais, a incidência de ataxia é menor à medida que a duração do efeito analgésico e a potência são maiores (Le Blanc et al., 1988; St. Jean et al., 1990; Riebold et al., 1992; Vesal et al., 1998).

A xilazina é o agonista a-2 mais empregado nas técnicas epidurais de analgesia. Em bovinos, doses entre 0,05 e 0,07mg/kg promovem sedação e analgesia perineal satisfatória com duração mínima de duas horas, podendo ainda produzir depressão cardiorrespiratória, hipomotilidade ruminal, ataxia, vocalização e salivação (Caron e Le Blanc, 1989; Skarda et al., 1990; St. Jean et al., 1990).

O amitraz é utilizado no tratamento de ectoparasitoses de pequenos e grandes animais (Sharma e Dabas, 1993). Estudos farmacodinâmicos e de toxicidade conduzidos em ratos, cães, gatos e pôneis demonstraram que esse fármaco apresenta atividade intrínseca em receptores a-2 adrenérgicos centrais e periféricos (Hsu et al., 1986; Roberts e Argenzio, 1986; Cullen e Reynoldson, 1988; Lee et al., 2003). Em eqüinos, o amitraz injetado por via epidural na dose de 0,1mg/kg causou sedação e relaxamento muscular, com mínimos efeitos deletérios nos sistemas cardiovascular e respiratório (Valadão, 1998). Na espécie bovina, a injeção intravenosa de 0,4mg/kg promoveu antinocicepção, bradicardia e diminuição nos movimentos ruminais, quando comparada à dose de 0,1mg/kg de xilazina (Polimeno et al., 2000). Seu emprego como medicação pré-anestésica para a indução anestésica de bezerros com a cetamina mostrou efeitos semelhantes, quando comparado aos efeitos do tratamento com xilazina (Reis et al., 2001).

O dimetil sulfóxido (DMSO), utilizado na medicina veterinária como veículo para diversos medicamentos, tem a propriedade de carrear substâncias de pequeno peso molecular. Também possui outras aplicações como estimulador da cicatrização, antiinflamatório, antioxidante e analgésico. Segundo Jacob (2003) e Muir, (2003), o DMSO é uma substância de baixa toxicidade.

A xilazina, substância hidrossolúvel e com apresentação comercial em solução aquosa com conhecida efetividade, não necessita do DMSO como diluente, enquanto que o amitraz, por ser um composto insolúvel em água, deve ser diluído em DMSO, conforme citações da literatura, as quais demonstraram além da compatibilidade, a inexistência de sinergismo entre as duas substâncias (Eisenach et al., 1987; Valadão, 1998; Balestrero, 2001).

O objetivo deste estudo foi avaliar os possíveis efeitos sistêmicos e antinociceptivos do amitraz diluído em DMSO, após sua administração epidural na dose de 0,4mg/kg, e compará-los aos efeitos produzidos pela dose de 0,05mg/kg de xilazina pela mesma via, em vacas.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram utilizadas 21 vacas da raça Holandesa, com pesos entre 452 e 655kg (553,50± 143,54kg). Os animais foram mantidos em pasto e alimentados com silagem de milho, sal mineral e água à vontade. Todos os procedimentos e avaliações foram realizados em tronco de contenção, em local tranqüilo e climatizado, com temperatura média de 25°C. Os animais, distribuídos aleatoriamente em três grupos, receberam por via epidural: 0,4mg/kg de amitraz1 1 Amitraz técnico – Laboratório Sintesul S.A., Pelotas, RS diluído em DMSO2 2 DMSO, PA – Quimibrás Indústrias Químicas S.A., Rio de Janeiro, RJ 10% (grupo amitraz, n=8); 0,05 mg/kg de xilazina3 3 Virbaxyl 2% - Laboratório Virbac S.A., São Paulo, SP (grupo xilazina, n=8) e 5,0ml de DMSO 10% (grupo controle, n=5). O volume final das soluções foi ajustado para 5,0ml com água destilada e a injeção foi realizada no canal epidural, em região correspondente ao espaço entre a quinta vértebra sacral (S5) e a primeira vértebra coccígea (Co1). Após a localização do espaço entre S5-Co1, efetuou-se a tricotomia da região e subseqüente anti-sepsia da pele com álcool iodado para a realização da anestesia local subcutânea com 2,0ml de cloridrato de lidocaína 2% com vasoconstritor4 4 Anestésico Bravet - Laboratório Bravet Ltda., Rio de Janeiro, RJ . Decorridos 20 minutos da anestesia local, uma agulha espinhal de Tuohy5 5 Agulha técnica reusável de Tuohy 80x10F - Becton Dickinson Indústrias Cirúrgicas Ltda., Juiz de Fora, MG foi introduzida no espaço S5-Co1 até atingir o canal epidural. O correto posicionamento da agulha foi confirmado pela ausência de resistência à injeção de 1,0ml de ar, associado ao teste da gota pendente. Os fármacos foram aplicados na razão de 1,0ml a cada 3,0 segundos.

Antes dos tratamentos, os animais foram avaliados clinicamente por duas vezes, com intervalo de 10 minutos, para que fossem registradas as variáveis fisiológicas basais (T0) de cada animal para: freqüência respiratória (FR), freqüência cardíaca (FC), temperatura retal (TR), movimentos ruminais (MR) e pressão arterial sistólica (PAS).

FR, FC e PAS foram aferidas após as injeções epidurais aos 5, 10 e 15 minutos (T5, T10, T15) e a intervalos de 10 minutos até 75 minutos (T25,..., T75). Após esse tempo, as aferições ocorreram a cada 15 minutos até 120 minutos (T120) e a intervalos de 30 minutos até 240 minutos (T150,..., T240). As variáveis fisiológicas TR e MR foram avaliadas nos tempos 10, 25, 45, 65, 90, 105 e 120 minutos e posteriormente a cada 30 minutos, até o final do período de observação.

Paralelamente, avaliaram-se o comportamento e a resposta nociceptiva nos mesmos momentos definidos para os exames clínicos, para a observação de possível sedação e antinocicepção. Para a aferição da sedação, mensurou-se a altura da cabeça em relação ao solo (AC), medindo-se a distância entre a região mentoniana da mandíbula e o chão, com o uso de uma régua afixada no tronco de contenção e subseqüente conversão da medida para porcentagem, para evitar a variabilidade ocasionada pela diferença de tamanho entre os animais. A resposta a um estímulo nociceptivo induzido pela exposição rápida a um foco de luz de alta intensidade estimou o grau de analgesia promovido pelos tratamentos. O aparelho empregado para essa avaliação é formado por um processador que registra o tempo de exposição a um foco de luz que gera uma temperatura de 140°C, emitido por uma fonte de luz artificial6 6 Dolorimeter model 331 - IITC Inc. Life Science Instruments, USA . O aparelho, direcionado para as regiões da coxa ou coroa do casco, permite a apreciação da latência da resposta ao estímulo térmico por movimentos de esquiva (latência do estímulo cutâneo da coxa - LECC) ou retirada do membro (latência do reflexo de retirada do membro - LRRM), de acordo com metodologia descrita (Pippi et al., 1979; Kamerling, 1985). A latência foi definida como o tempo que transcorre entre a focalização do facho de luz e a reação do animal. A interrupção do estímulo doloroso ocorreu, invariavelmente, sempre que o tempo de exposição alcançasse 20 segundos, para evitar danos aos tecidos. LECC e LRRM sempre foram avaliadas pelo mesmo observador.

Os dados referentes às variáveis fisiológicas, de comportamento e nociceptivas foram tabelados e submetidos à análises de variância para repetições múltiplas, seguidas de teste de Student-Newman-Keuls, para a comparação de médias ao longo do tempo, dentro de cada grupo. Para a comparação das médias nos mesmos momentos, entre os grupos, foram utilizadas análises de variância sem repetições, seguidas de teste de Student-Newman-Keuls.

RESULTADOS

Os valores de FR, FC, PAS, TR, MR, LECC, LRRM e AC são apresentados nas Tab. 1, 2 e 3.

A administração epidural dos agonistas a-2 promoveu vários graus de antinocicepção nas regiões da coxa e coroa do casco, demonstrados pelo aumento do tempo de latência da resposta aos estímulos nociceptivos. Esse incremento da LECC ocorreu entre 25 e 120 minutos após a injeção de amitraz, e durante todo o experimento, após a injeção de xilazina. Na LRRM, no grupo xilazina, foi observado aumento máximo de 74,1% no T25, e as diferenças ocorreram apenas nos momentos T15 a T55.

Ambos os agonistas a-2 reduziram a FC até 240 minutos em relação aos valores basais e aos valores do grupo-controle. No grupo xilazina, cinco minutos após o tratamento, houve redução de 14,6% na FC em relação ao valor basal; a inibição foi mais acentuada até 65 minutos após a injeção em comparação ao grupo amitraz. A administração epidural de amitraz provocou leve aumento da PAS nos primeiros 15 minutos, enquanto que a de xilazina diminuição até os 210 minutos de observação. A FR diminuiu significativamente desde os 5 até os 240 minutos, com as menores médias aos 45 minutos de observação no grupo-xilazina, ao passo que no grupo-amitraz não houve alterações. Nos MR houve redução dos valores no tratamento com amitraz até o final do período de observação; no grupo xilazina, essa redução persistiu somente até os 180 minutos. Nesse grupo, no intervalo entre 10 e 45 minutos, a inibição sobre os MR foi maior do que no grupo com amitraz, e dois animais (25%) apresentaram quadro moderado de timpanismo, cerca de 40 minutos após o tratamento. Os animais do grupo-controle apresentaram atividade de ruminação durante a fase experimental, o que não ocorreu nos outros grupos. A TR aumentou no grupo xilazina a partir de 45 até 210 minutos. Os outros grupos mostraram redução dos valores dessa variável após cerca de 45 minutos até o final do experimento. A xilazina induziu alterações de comportamento como sedação, caracterizada pelo abaixamento da cabeça até 120 minutos. Apenas um animal tentou o decúbito, aos 40 minutos. Não houve diferenças entre os grupos amitraz e controle quanto à AC.

DISCUSSÃO

Os agonistas a-2 induzem analgesia ligando-se em estruturas sinápticas espinhais e supra-espinhais (Sidall e Cousins, 1998). Quando aplicados por via epidural, interagem com sítios receptores do corno dorsal da medula espinhal, inibindo a transmissão do estímulo mediado pela substância P (Yaksh, 1985). Segundo Skarda et al. (1990), a injeção epidural de xilazina produziu antinocicepção em bovinos mediada por receptores espinhais, pois a administração sistêmica de antagonista a-2 não reverteu esse efeito. Esse mecanismo deve estar implicado no aumento da latência de resposta aos estímulos térmicos observados nos animais tratados com os fármacos agonistas a-2 testados. O período de latência, potência e duração da analgesia dos agonistas a-2 são dependentes de parâmetros farmacocinéticos e, principalmente, farmacodinâmicos relacionados à afinidade aos receptores adrenérgicos do tipo a. As características físico-químicas do fármaco, como peso molecular e lipossolubilidade também podem influenciar, pois a substância deve ultrapassar as meninges para alcançar o seu sítio de ação na medula espinhal (Eisenach et al., 1987; Lin et al., 1998). Portanto, provavelmente devido às diferenças entre os dois fármacos, o amitraz promoveu efeito antinociceptivo menos intenso que a xilazina. A injeção intravenosa de 0,4mg/kg de amitraz em bovinos resultou também em efeito antinociceptivo inferior a xilazina, pela mesma via (Polimeno et al., 2000). Além disso, pode ser considerada a possibilidade de uma relação dose-efeito, como demonstrado por Queiroz Neto et al. (1998). A administração epidural de DMSO não modificou a sensibilidade cutânea, fato já descrito por Eisenach et al. (1987), Valadão (1998) e Balestrero (2001), os quais fizeram uso desse composto como veículo de diluição para injeções epidurais.

A ocorrência de bradicardia seguida da aplicação epidural de agonistas a-2 foi descrita em bovinos (Ko et al., 1989; Skarda et al., 1990; St. Jean et al., 1990; Vesal et al., 1998) e foi atribuída à inibição da liberação pré-sináptica de noradrenalina, diminuição do tônus simpático, liberação direta de acetilcolina no coração por fibras parassimpáticas e, principalmente, pelo aumento da atividade vagal reflexa à hipertensão transitória causada pela elevação inicial da resistência periférica (Doherty, 1988; Maze e Tranquilli, 1991). Os mecanismos responsáveis pela redução da FC provavelmente foram conseqüentes à diminuição do tônus simpático, e predominância da atividade vagal, pois o aumento da PAS só foi verificado nos animais tratados com o amitraz. A xilazina diminuiu de forma mais acentuada a FC nos primeiros 65 minutos, quando comparada ao tratamento com amitraz. Em cavalos, Valadão (1998) relatou que esses valores foram menores por 120 minutos após administração epidural de amitraz, não ocorrendo alterações da FC com o tratamento com xilazina pela mesma via. Todavia, os efeitos ocorridos nesse estudo com a espécie bovina poderiam ser explicados pela sua maior sensibilidade aos efeitos sistêmicos induzidos pelos agonistas a-2, conforme descrito para a xilazina (Garcia-Villar et al., 1981). Polimeno et al. (2000) constataram redução da FC pela injeção intravenosa do amitraz em bovinos e, comparativamente, tais efeitos foram mais pronunciados com a xilazina. Além disso, outros estudos demonstraram a ocorrência ou não de bradicardia após aplicação epidural de xilazina, sugerindo que esse efeito esteja relacionado à dose administrada (Le Blanc e Eberhart, 1990; Skarda e Muir III, 1996).

O efeito vascular dos agonistas a-2 é caracterizado por hipertensão inicial seguida de hipotensão mais tardia. A elevação da pressão deve-se ao aumento da resistência periférica por vasoconstrição mediada pelos receptores a-1 e a-2 localizados nos vasos sanguíneos. Essa ação aumenta a resistência vascular periférica e conseqüentemente, eleva a pós-carga fazendo com que haja bradicardia por ativação reflexa vagal. Posteriormente, há diminuição da pressão arterial, sustentada pela ação pré e pós sináptica central ou periférica dos agonistas a-2 nas terminações simpáticas (Doherty, 1988). A xilazina reduziu a PAS por período prolongado, que pode ser justificado pela absorção do fármaco pela circulação sanguínea peridural e posterior distribuição sistêmica, conforme relatos de Skarda et al. (1990) e St. Jean et al. (1990). Os tratamentos com amitraz não alteraram a PAS, de maneira coerente com o menor efeito sobre a FC produzido por esse fármaco.

Os efeitos a-2 adrenérgicos sobre o sistema respiratório são citados como diminuição da FR e broncodilatação (Maze e Tranquilli, 1991). De acordo com Skarda et al. (1990), St. Jean et al. (1990) e Vesal et al. (1998), a depressão respiratória está associada à inibição da atividade dos centros respiratórios superiores subseqüentes à absorção sistêmica da xilazina aplicada por via epidural, como foi evidenciado no grupo que recebeu essa substância. Não foram verificadas alterações respiratórias nos animais tratados com amitraz, semelhante ao observado em eqüinos por Valadão (1998).

Os agonistas a-2 agem no sistema nervoso intrínseco mioentérico reduzindo a concentração de acetilcolina na junção neuromuscular (Doherty, 1988; Maze e Tranquilli, 1991). Ruckebusch e Allal (1987) demonstraram que essas substâncias diminuem prolongadamente a motilidade retículo-ruminal em bovinos, por um bloqueio do mecanismo adrenérgico central que coordena a motilidade dos pré-estômagos. Assim, os grupos tratados com o amitraz ou a xilazina apresentaram diminuição dos MR. Os achados concordam com experimentos prévios realizados na espécie eqüina, nos quais a injeção intravenosa de 0,1 mg/kg de amitraz reduziu a motilidade intestinal (Queiroz Neto et al., 2000). Ademais, na espécie bovina, a dose intravenosa de 0,4mg/kg dessa substância resultou em efeitos depressores semelhantes aos da xilazina (0,05mg/kg, IV) sobre os MR (Polimeno et al., 2000).

Os agonistas a-2 aumentam, reduzem ou não interferem na temperatura retal de bovinos, porém esse efeito não foi explicado pelos autores (Young, 1979; Skarda et al., 1990; St. Jean et al., 1990). Neste trabalho, essa variedade de resposta foi obtida após os diferentes tratamentos, sendo que os animais do grupo xilazina apresentaram aumento prolongado na temperatura retal, enquanto os animais dos grupos amitraz e controle tiveram decréscimo dos valores médios dessa variável. Os resultados para o tratamento com amitraz concordam com os observados por Queiroz Neto (1997) e Balestrero (2001), os quais relataram ausência de alterações na temperatura retal de cavalos tratados com amitraz por via epidural ou intravenosa. Nesses estudos, o DMSO também não induziu modificações nessa variável. A explicação provável para a diminuição das temperaturas retais nos grupos amitraz e controle, que se mantiveram dentro da faixa fisiológica para a espécie, é o fato do experimento ter sido conduzido em sala climatizada, com temperatura que variou de 20 a 25oC.

A sedação provocada pelos agonistas a-2 aplicados no espaço epidural resulta da absorção sistêmica e da conseqüente ação adrenérgica supra-espinhal (Yaksh, 1985; Maze e Tranquilli, 1991), demonstrada pela ausência de reversão do efeito sedativo da clonidina aplicada via epidural por antagonista a-2 administrado pela mesma via, ocorrendo apenas reversão da analgesia (Eisenach et al., 1987). Desse modo, o abaixamento de cabeça induzido pela xilazina resultou do relaxamento do tônus muscular do pescoço, semelhante ao que ocorre durante o sono (Kamerling et al., 1988), sendo esse método já empregado para avaliar os efeitos sedativos de agonistas a-2 em bovinos (Skarda et al., 1990; St. Jean et al., 1990; Polimeno et al., 2000). No entanto, o amitraz não induziu sedação nos bovinos, talvez em função da dose ou de uma menor absorção sistêmica do composto. Esse fato pode apoiar as poucas alterações observadas nas outras variáveis fisiológicas analisadas, como FR, PAS e TR, quando comparadas ao tratamento com a xilazina.

CONCLUSÕES

Os resultados permitiram concluir que o amitraz, quando aplicado por via epidural na dose de 0,4mg/kg, aumenta a latência da resposta a um estímulo nociceptivo térmico em menor grau que a dose de 0,05mg/kg de xilazina e não causa efeitos colaterais sistêmicos de maior importância em vacas holandesas.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelo apoio financeiro – processo 00/14833-4.

JACOB, S.W. Current status of dimethyl sulfoxide (DMSO). Disponível em: <http://www.dmso.org/articles/information/jacob.htm>. Acessado em: 27 de setembro de 2004.

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Recebido para publicação em 4 de novembro de 2003

Recebido para publicação, após modificações, em 4 de outubro de 2004

E-mail: ricardo02608@upis.br

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  • 1
    Amitraz técnico – Laboratório Sintesul S.A., Pelotas, RS
  • 2
    DMSO, PA – Quimibrás Indústrias Químicas S.A., Rio de Janeiro, RJ
  • 3
    Virbaxyl 2% - Laboratório Virbac S.A., São Paulo, SP
  • 4
    Anestésico Bravet - Laboratório Bravet Ltda., Rio de Janeiro, RJ
  • 5
    Agulha técnica reusável de Tuohy 80x10F - Becton Dickinson Indústrias Cirúrgicas Ltda., Juiz de Fora, MG
  • 6
    Dolorimeter model 331 - IITC Inc. Life Science Instruments, USA
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Mar 2005
    • Data do Fascículo
      Dez 2004

    Histórico

    • Aceito
      04 Out 2004
    • Recebido
      04 Nov 2003
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