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Aspectos ambientais e genéticos da prolificidade em caprinos utilizando modelos bayesianos de limiar e linear

Environmental and genetic aspects of litter size in goats using linear and threshold bayesian models

Resumos

Foram estimados os componentes de variância e os parâmetros genéticos da característica prolificidade, utilizando-se inferência bayesiana sob modelo animal linear e de limiar. A prolificidade de cabras mestiças foi estudada com informações referentes ao período de oito anos consecutivos. As análises foram realizadas com cadeias de 500.000 ciclos. Considerou-se burn-in dos 15.000 valores iniciais, sendo tomados valores a cada 250 ciclos, para se obter a distribuição a posteriori com 1.940 amostras. Os efeitos do mês de cobrição e da ordem de parto e o efeito linear do peso à cobrição foram significativos. As herdabilidades foram de 0,03 e 0,18 para o modelo linear e o modelo de limiar, respectivamente. O uso do modelo de limiar mostrou-se adequado, produzindo estimativas superiores acerca dos parâmetros estimados.

caprino; amostragem de Gibbs; componentes de variância; inferência bayesiana; parâmetros genéticos


Variance components and genetic parameters of the litter size trait, using Bayesian inference under linear and threshold animal model were estimated. The litter size of crossbred goats was studied with information regarding a period of eight consecutive years. Analyses were performed with 500,000 cycle chains. The burn-in of the 15,000 baseline values was considered and these were taken every 250 cycles to obtain a posteriori distribution with 1,940 effective samples. Statistical analyses showed that the effects of coverage month, delivery order and linear effect of weight on coverage were significant. The heritabilities were 0.03 and 0.18 for linear and threshold models respectively. The threshold model proved to be suitable, producing higher estimates regarding the estimated parameters.

bayesian inference; genetic parameters; Gibbs sampling; variance components


ZOOTECNIA E TECNOLOGIA E INSPEÇÃO DE PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL ANIMAL SCIENCE AND TECHNOLOGY AND INSPECTION OF ANIMAL PRODUCTS

Aspectos ambientais e genéticos da prolificidade em caprinos utilizando modelos bayesianos de limiar e linear

Environmental and genetic aspects of litter size in goats using linear and threshold bayesian models

N.P.S. SantosI; J.L.R. SarmentoII; E.C. Pimenta FilhoIII; J.E.G. CampeloIV; L.A.S. Figueiredo FilhoI; S.C. Sousa JúniorII

IPrograma de Pós-Graduação - Universidade Federal do Piauí - Teresina, PI

IIUniversidade Federal do Piauí - Campus Cinobelina Elvas - Bom Jesus, PI

IIIUniversidade Federal da Paraíba - Campus III, Centro de Ciências Agrárias – Areia, PB

IVUniversidade Federal do Piauí - Campus Ministro Petrônio Portela - Teresina, PI

RESUMO

Foram estimados os componentes de variância e os parâmetros genéticos da característica prolificidade, utilizando-se inferência bayesiana sob modelo animal linear e de limiar. A prolificidade de cabras mestiças foi estudada com informações referentes ao período de oito anos consecutivos. As análises foram realizadas com cadeias de 500.000 ciclos. Considerou-se burn-in dos 15.000 valores iniciais, sendo tomados valores a cada 250 ciclos, para se obter a distribuição a posteriori com 1.940 amostras. Os efeitos do mês de cobrição e da ordem de parto e o efeito linear do peso à cobrição foram significativos. As herdabilidades foram de 0,03 e 0,18 para o modelo linear e o modelo de limiar, respectivamente. O uso do modelo de limiar mostrou-se adequado, produzindo estimativas superiores acerca dos parâmetros estimados.

Palavras-chave: caprino, amostragem de Gibbs, componentes de variância, inferência bayesiana, parâmetros genéticos

ABSTRACT

Variance components and genetic parameters of the litter size trait, using Bayesian inference under linear and threshold animal model were estimated. The litter size of crossbred goats was studied with information regarding a period of eight consecutive years. Analyses were performed with 500,000 cycle chains. The burn-in of the 15,000 baseline values was considered and these were taken every 250 cycles to obtain a posteriori distribution with 1,940 effective samples. Statistical analyses showed that the effects of coverage month, delivery order and linear effect of weight on coverage were significant. The heritabilities were 0.03 and 0.18 for linear and threshold models respectively. The threshold model proved to be suitable, producing higher estimates regarding the estimated parameters.

Keywords: bayesian inference, genetic parameters, Gibbs sampling, variance components

INTRODUÇÃO

Os baixos índices reprodutivos atribuídos às raças caprinas indicam que a reprodução é um processo complexo e sensível às variações ambientais. Esses índices, além de imporem prejuízos econômicos à atividade, limitam a resposta em programas de melhoramento genético, e, nesse caso, a qualidade dos resultados estimados sofre impacto, principalmente da não adequação da análise aos dados.

Entre as características de natureza reprodutiva, a prolificidade se apresenta com potencial para contribuir com o ganho genético anual nos rebanhos caprinos. Favoravelmente a essa característica, argumenta-se que é de fácil mensuração e apresenta herdabilidade alta quando comparada a outras características reprodutivas, o que sugere rápida resposta à seleção (Rao e Notter, 2000). Por tratar-se de característica de distribuição discreta (threshold) ou dicotômica, as metodologias e os modelos usuais de avaliação genética e dos efeitos ambientais não se mostram pertinentes, portanto cabe aos pesquisadores buscar formas de análise mais apropriadas, que consigam mostrar a variabilidade da característica mais próxima do valor real.

A aplicação de modelos bayesianos de limiar na avaliação de características categóricas pode favorecer maiores ganhos genéticos ao identificar de forma mais eficiente os animais com valor genético superior, pois a estimação de herdabilidades na escala subjacente mostra-se mais elevada (Sousa et al., 2000).

A literatura nacional é escassa na abordagem desse tema, com poucos trabalhos encontrados (Sousa et al., 2000), e essa dificuldade se amplia quando se refere a estudos sobre a aplicação de modelos de limiar, utilizando-se inferência bayesiana na avaliação genética de características ligadas à reprodução de caprinos (Zhang et al., 2009). Vale ressaltar que os poucos trabalhos quando buscaram avaliar a influência de efeitos do ambiente sobre a referida característica empregam modelos que pressupõem distribuição normal, quando, na prática, isso não ocorre, uma vez que esta tem distribuição discreta.

Diante do exposto, com este trabalho objetivou-se verificar os efeitos de ambiente que interferem na expressão da prolificidade e estimar os componentes de variância e parâmetros genéticos por meio de modelos de limiar e linear, utilizando-se inferência bayesiana em caprinos mestiços.

MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho foi realizado com dados do rebanho caprino de uma fazenda particular. Os registros de prolificidade foram obtidos do controle reprodutivo de cabras mestiças oriundas do cruzamento de reprodutores da raça Pardo Alpino com fêmeas do tipo naturalizado Gurgueia, coletados com representatividade durante intervalo de oito anos consecutivos. Os animais foram criados em sistema semi-intensivo e alimentados com capim-buffel (Cenchrus ciliaris L.) e vegetação nativa durante a estação chuvosa, e capim-elefante (Pennisetum purpureum), palma forrageira (Opuntia sp.), raspa de mandioca (Manihot sativa), bagaço de cana hidrolisado (Sacharum oficcinarum) e concentrado proteico, na estação seca, além de sal mineral à vontade.

A detecção do cio foi realizada visualmente de manhã e à tarde. Havendo a identificação de cio, a cabra era levada à baia do reprodutor correspondente, onde ocorria a cobertura, e depois retornava ao lote. A monta era do tipo natural controlada, sem estação de monta. Entre os 120 e 150 dias de idade, as cabritas passavam para o lote das marrãs, sendo cobertas na ocasião do primeiro cio fértil. Após a primeira parição, eram incorporadas ao lote das cabras adultas.

Com base nas fichas de produção e reprodução, foi editado um arquivo contendo o número da cabra, paternidade e maternidade, data de nascimento, datas dos partos, pesos antes e durante a gestação, ordem e intervalo de partos e tipo de nascimento dos animais. Como os dados de prolificidade são provenientes de uma distribuição discreta, neste caso, foram consideradas duas classes distintas - nascimento simples e nascimento múltiplo. Os grupos de contemporâneos foram formados pelo ano de cobertura (1 a 8), ordem de parição (1 a 7) e estação de cobertura (1 e 2), em que a estação 1 corresponde ao período chuvoso, que vai de fevereiro a junho, e a estação 2, ao período seco, que vai de julho a janeiro do ano seguinte.

Inicialmente, o arquivo continha 1.939 registros. Para gerar o arquivo utilizado nas análises, foram feitas restrições, permanecendo no arquivo cabras com pai e mãe conhecidos, cabras com, no máximo, sete parições e grupos de contemporâneos com, no mínimo, cinco animais, restando 592 registros para as análises. Para formação dos arquivos de dados e pedigree, análise de consistência dos dados e verificação dos efeitos de ambiente que podem influenciar a prolificidade, foram utilizados os procedimentos MEANS e GENMOD do programa SAS (Statistical..., 2002). O procedimento GENMOD ajusta modelos lineares generalizados pelo método da máxima verossimilhança, utilizando uma função de ligação apropriada à probabilidade de distribuição. Utilizaram-se a função de distribuição binomial e a função de ligação logística. O teste de de Pearson foi utilizado para verificar o ajuste da função de ligação aos dados.

Dentro do procedimento GENMOD, utilizou-se a opção ESTIMATE, que calcula o logaritmo da razão de chances, ln[Pi /1-Pi], em que Pi representa a probabilidade de o parto ser múltiplo, e 1- Pi a probabilidade de ser simples. Para que os coeficientes estimados refletissem o efeito de o parto ser múltiplo, em relação ao simples, calculou-se a exponencial do logaritmo da razão de chances, por meio da opção EXP, também disponível no procedimento mencionado, cuja resposta representa o número de vezes que a classe de parto múltiplo teria mais chances de ocorrer que a classe de parto simples.

Para análise dos efeitos ambientais, considerou-se ano e mês de cobertura, ordem de parição, idade ao primeiro parto (coeficiente de regressão linear e quadrático) e peso da fêmea no momento da cobertura.

Os componente de variância e parâmetros genéticos foram estimados com modelos animais linear e de limiar, mediante análise bayesiana unicaracterística, realizada com o aplicativo MTGSAM Threshold (Multiple Trait Gibbs Sampler for Animal Models) desenvolvido por Van Tassell et al. (1998). Assim, considerou-se o peso do animal no dia da cobertura como covariável que descreve o efeito quadrático e considerou-se o grupo de contemporâneos como efeito fixo, de acordo com a solicitação do programa. Entretanto, na análise bayesiana, os efeitos fixos e aleatórios inclusos no modelo são considerados como variáveis aleatórias.

O modelo animal em notação matricial foi: y = Xb + Z1a + Z2c + e, em que y é o vetor das observações da característica medida nos animais (escala subjacente para a prolificidade); b é o vetor de efeitos "fixos" de rebanho; a é o vetor de efeitos aleatórios que representa os valores genéticos aditivos diretos de cada animal; c é o vetor de efeitos de ambiente permanente (não correlacionado); e é o vetor de erros aleatórios; X, Z1 e Z2 são matrizes de incidência que relacionam as observações aos efeitos fixos e aos efeitos aleatórios aditivo direto e de ambiente permanente, respectivamente.

Para o modelo adotado, sob o enfoque bayesiano, é usual pressupor que

em que são componentes de variância genética aditiva direta, de ambiente permanente e residual, respectivamente; A, é a matriz de numeradores do coeficiente de parentesco de Wrigth; I é a matriz identidade de ordem igual ao número de animais com observações; e R é a matriz de variância do vetor de resíduos.

No modelo de limiar, assume-se que a escala subjacente apresenta distribuição normal contínua, chamada Liability (predisposição) e é representada como: em que U é o vetor da escala base de ordem r; θ = (b, a, c) é o vetor dos parâmetros de locação de ordem s com b (definidos sob o ponto de vista frequentista, como efeitos fixos), e ordem s com a e c (como efeitos aleatórios genéticos aditivos diretos e de ambiente permanente, como efeito não correlacionado, respectivamente); W é a matriz de incidência conhecida de ordem r por s; I é a matriz identidade de ordem r por r; e σ2e é a variância residual.

As características categóricas são determinadas por variáveis contínuas não observáveis, em escala subjacente, e são fixados valores iniciais de limiares

que dividem a linha da tabela de contingência dentro de j intervalos de respostas, com em que j é o número de categorias (limiares). Os dados observáveis são dependentes da variável subjacente, que é limitada entre dois limiares não observáveis (Sorensen e Gianola, 2002), ou seja, para compreender a função densidade de probabilidade conjunta dos parâmetros, dados os hiperparâmetros, é necessário conhecer a distribuição dos valores observados y, a qual é condicional às observações contínuas e limiares. A relação entre as duas variáveis é incomum porque os valores de y são conhecidos se os valores de U e t são conhecidos, mas o inverso não é verdadeiro.

Neste caso, as categorias de y1- característica definida em parto simples e parto múltiplo - para cada animal i foram definidas por Ui, na escala subjacente:

em que n é o número de observações para cada categoria. Após as especificações dos limiares t0 a t2, é necessário que o limiar (t1) seja ajustado a uma constante arbitrária. Neste caso, assumiu-se t1= 1 . Por serem as observações condicionalmente independentes, a função de verossimilhança é definida pelo produto das contribuições de cada registro. A probabilidade condicional de que yi caia na categoria j (j = 1 ou 2), dados os vetores b, a, c e t, é apresentada como:

em que yi é a variável resposta para a observação i tomando valores 1 ou 2 se a observação pertence à primeira ou à segunda categoria, respectivamente; t é o valor do limiar, para o qual, por ele não ser estimável, será fixado um valor arbitrário; Ui é o valor da variável subjacente para a mencionada observação; é a função de distribuição cumulativa de uma variável normal padrão - indicadora de função que tem valor 1 se a expressão é avaliada como verdadeira e 0 em caso contrário.

Como a variância residual σ2e não é estimável em modelos de limiar, para a parametrização dela atribuiu-se o valor 1 (σ2e = 1 ), no sentido de se obter identificabilidade na função de verossimilhança (Sorensen e Gianola, 2002). Ressalta-se que essa pressuposição é padrão em análises de dados categóricos. Neste estudo, o grau de liberdade correspondente à distribuição Wishart invertida, que indica o grau de confiabilidade da distribuição inicial (v), foi flat para todas as variâncias iniciais, ou seja, não refletia grau de conhecimento sobre os parâmetros (v=0).

Foram realizadas análises com cadeias de 500, 800 mil e 1 milhão de ciclos. Assim sendo, este também foi um dos critérios utilizados para análise da convergência (Cardoso, 2008). Dimensão de burn-in e intervalo de amostragem para cada tamanho da cadeia foram obtidos por análise prévia das cadeias geradas pelo amostrador de Gibbs (Tab. 1), utilizando-se o programa Gibanal, sob sistema operacional DOS, desenvolvido por Van Kaam (1998), que utiliza o método de Raftery e Lewis (1992) para a monitoração da convergência.

O erro de Monte Carlo foi obtido mediante o cálculo da variância das amostras retiradas para cada componente dividida pelo número de amostras. Assim, a raiz quadrada desse valor se refere à aproximação do desvio-padrão do erro associado ao tamanho da cadeia de Gibbs (Sorensen e Gianola, 2002).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A prolificidade média do rebanho foi de 1,4 cabrito por fêmea, com coeficiente de variação igual a 35%. A frequência de ocorrência de partos simples e múltiplos no rebanho foi 60 e 40%, respectivamente. Médias mais altas que estas foram relatadas por Silva e Araújo (2000), ao estudarem caprinos mestiços oriundos de cruzamentos entre as raças Alpina, Moxotó e Anglo-Nubiana, assim pode-se dizer que se trata de uma característica que também sofre influência da raça.

Os efeitos do mês de cobertura e de ordem de parto e o efeito linear do peso à cobrição foram significativos (P<0,05), indicando que devem ser considerados no estudo desta característica. Sarmento et al. (2010) obtiveram resultados similares ao trabalharem com técnica análoga à deste estudo, mas utilizando quantidade de dados mais restrita e sugeriram que melhorias na prolificidade podem ser mais facilmente obtidas com ajustes no manejo alimentar e na adequação da idade mínima para o início da vida reprodutiva.

Como a metodologia utilizada permite calcular as chances de ocorrência de partos múltiplos, considerando os efeitos significativos incluídos no modelo de análise, avaliou-se o comportamento das probabilidades em função da ordem de parição (Tab. 2). As chances de ocorrência de partos múltiplos tenderam a aumentar com o aumento da idade da fêmea (ordem do parto), ou seja, à medida que a fêmea tornou-se anatômica e fisiologicamente mais preparada. As maiores diferenças observadas foram em relação às chances estimadas entre o primeiro e os demais partos (Tab. 2). Fêmeas de segunda parição apresentaram 4,7 vezes mais chances de terem parto múltiplo que as de primeira; as de terceira 6,1 vezes mais chances que a de primeira e assim sucessivamente, até as de sétima parição, que apresentaram 25,1 vezes mais chances de parirem duas ou mais crias. As diferenças da segunda ordem de parição foram de menor magnitude em comparação às de primeira, porém significativas.

As chances de ocorrência de partos múltiplos foram próximas entre as fêmeas com quatro ou mais partos, uma vez que as fêmeas nesse estágio, possivelmente, já atingiram a maturidade fisiológica, sobretudo do aparelho reprodutor (Sarmento et al., 2010). Dessa forma, o comportamento verificado nas cabras primíparas neste estudo parece biologicamente correto, visto que fêmeas em idades mais jovens não têm alcançado a maturidade necessária do sistema reprodutor, em termos anatômicos e fisiológicos, refletindo maior frequência de partos simples.

Um aspecto que merece destaque, relativo à inferência bayesiana neste estudo, é a necessidade de se especificar os parâmetros que definem a forma das distribuições, uma vez que o conjunto de dados utilizado pode ser considerado pequeno, apenas 592 registros de nascimentos. Consequentemente, ao assumir a falta de informação a priori, ou seja, maior grau de incerteza sobre o verdadeiro valor do parâmetro, tem-se que a distribuição a posteriori pode se tornar menos simétrica. No entanto, conforme o tamanho da amostra aumenta, a distribuição a posteriori torna-se mais simétrica e a influência da informação a priori decresce. Assim, optou-se pela análise das cadeias de 500 mil ciclos em virtude de as estimativas dos parâmetros genéticos manterem-se praticamente constantes com o aumento do tamanho da cadeia, 800 mil e 1 milhão de ciclos (Tab. 3). Dessa forma, observou-se que a não utilização de informação a priori em cadeias de 500, 800 mil e 1 milhão de ciclos não apresentou variação dos parâmetros estimados, sendo indicativos de possível convergência à distribuição conjunta a posteriori, como recomendado por Cardoso (2008).

Associado ao tamanho da cadeia e com o intuito de constatar se a informação a priori não interferiu no resultado da distribuição a posteriori, neste estudo também foram utilizadas prioris não informativas para os valores iniciais em ambos os modelos e tamanhos de cadeia. Na situação em questão, o conhecimento a respeito dos parâmetros é muito pequeno, sendo correto assumir prioris não informativas. Vale ressaltar que, ao assumir prioris que refletem algum grau de conhecimento a respeito da distribuição inicial dos componentes, em populações pequenas, pode-se permitir a indução de valores para um intervalo desejado (Carneiro Júnior et al., 2005). Diante disso, é possível afirmar que análises de pequenos conjuntos de dados utilizando grandes cadeias de Gibbs, que tenham atingido a convergência, juntamente com a informação do erro de Monte Carlo, são consideradas como indicativos de que a distribuição a posteriori estimada pode ser satisfatória.

Nas análises, o desvio-padrão do erro de Monte Carlo foi pequeno e praticamente nulo, confirmando que o tamanho da cadeia amostral utilizada foi suficiente para obtenção de estimativas a posteriori das distribuições marginais dos componentes de (co)variância, ou seja, a convergência foi alcançada pela cadeia de Gibbs (Tab. 3 e 4).

Com relação ao erro de Monte Carlo, Van Tassel e Van Vleck (1996) afirmaram que esse erro é considerado pequeno quando seu valor, somado à estimativa média da distribuição a posteriori dos coeficientes de herdabilidade, não altera o valor dessa estimativa, considerando-se até a segunda casa decimal.

A amplitude dos intervalos de confiança permite inferir com maior confiabilidade sobre as estimativas obtidas em ambos os modelos. Assim, pode-se constatar que o uso do modelo de limiar para a característica em estudo possibilitou a obtenção de estimativas maiores para os parâmetros genéticos, tendo em vista que as estimativas dos componentes de variância diferiram de forma marcante quando comparados os modelos de limiar e linear (Tab. 4), pois as regiões de credibilidade não se sobrepõem, o que caracteriza rejeição da hipótese estatística de igualdade, entre as estimativas geradas pelos dois modelos (Faria et al., 2008).

Em virtude de a distribuição a posteriori das estimativas obtidas, com o uso dos modelos de limiar e linear, possuir densidade simétrica, os valores da média e da moda resumem a medida da distribuição. No entanto, segundo Wright et al. (2000), a moda é a mais aconselhável medida de posição das distribuições a posteriori, pois aponta o valor de maior frequência. A esse respeito, é possível observar que a moda e a média da herdabilidade diferem de forma marcante na análise com modelo linear, o que possivelmente foi causado pelo fato de os valores da moda dos componentes de variância, obtidos com modelo linear, estarem fora do intervalo de credibilidade.

Como o modelo de limiar assume que conjuntamente ao fenótipo expresso de forma categórica repousa uma postulada base genética e ambiental com distribuição normal, os valores na escala observável são ligados por uma escala subjacente, não visível, por intermédio de pontos de limiar entre categorias consecutivas. Dessa forma, a análise de dados categóricos assumindo uma distribuição normal dos dados pode produzir resultados impróprios e as inferências acerca das estimativas podem ser erradas ou subestimadas. Esse fato parece notório quando se observa a baixa variabilidade dos componentes de variância da característica quando estimados pelo modelo linear (Tab. 4).

A herdabilidade estimada foi de 0,18 e 0,03, por meio dos modelos de limiar e linear, respectivamente, para a prolificidade. Com relação à dissimilaridade entre os resultados, Ferreira (2008) relata que, o modelo de limiar parece mais adequado em análises genéticas para prolificidade, por produzir maiores estimativas de herdabilidade, além de considerar a natureza binária da característica. Assim, pelas pressuposições assumidas e pelas diferenças observadas nos parâmetros estimados com o uso de ambos os modelos, supõe-se que será possível se obter ganho pela seleção se os parâmetros estimados por meio do modelo de limiar estiverem corretos.

Comparações entre as duas estratégias, baseadas em dados simulados, foram feitas por Meijering (1985). Esse estudo indicou que a superioridade dos métodos não lineares sobre os lineares, em termos de resposta genética à seleção, fica mais evidente quando: o número de categorias for pequeno; as categorias forem acentuadamente diferentes umas das outras; a herdabilidade na escala subjacente for alta e quanto maior for o desbalanceamento da amostra. Logo, o estudo da prolificidade pode ser enquadrado nessa perspectiva.

Comparando-se as estimativas da herdabilidade para a característica em estudo com estimativas de herdabilidade de outras características reprodutivas, o uso da prolificidade como critério de seleção seria uma alternativa viável, uma vez que poderia conferir maior resposta à seleção, corroborando os preceitos de Rao e Notter (2000). Além disso, por ser facilmente obtida e não requerer mudanças bruscas de manejo, a característica pode ser usada por todos os criadores que façam controle zootécnico do rebanho.

As características que se repetem ao longo da vida do animal se expressam em diferentes intensidades em cada ocorrência e o coeficiente de repetibilidade representa a correlação entre desempenhos sucessivos de um mesmo animal. A repetibilidade estimada da característica em estudo com o uso dos modelos de limiar e linear foi, respectivamente, de 0,67 e 0,05 (Tab. 4).

Dessa forma, o ambiente permanente apresentou efeito pronunciado na variação da prolificidade pelo modelo de limiar, implicando alta repetibilidade da característica. O mesmo resultado não foi obtido de forma pronunciada com o uso do modelo linear, no qual foram praticamente iguais os valores de herdabilidade e repetibilidade, 0,03 e 0,05, respectivamente. Nesse sentido, pode-se inferir que o ambiente permanente constitui uma importante fonte de covariância entre as observações do mesmo indivíduo, quando avaliado pelo modelo de limiar. Assim, a decisão quanto ao descarte ou à seleção dos animais com base nos resultados obtidos, utilizando-se o modelo de limiar, pode ser tomada mediante registro de poucas observações.

Vale destacar que a seleção dos melhores animais com base no valor da repetibilidade deve ser vista com certa cautela, pois, como visto anteriormente, a prolificidade aumenta em função da maturidade fisiológica reprodutiva dos animais, haja vista que cabras primíparas normalmente produzem um animal por parto e apresentam menores chances de parto em relação às cabras de ordem de parto subsequente.

Na literatura, é possível observar estimativas inferiores às obtidas nesta pesquisa. Gunia et al. (2010) estimaram herdabilidade e repetibilidade para prolificidade de caprinos em torno de 0,12 e 0,16, respectivamente. Hamed et al. (2009), ao utilizarem 4.784 registros de caprinos da raça Zaraibi, estimaram herdabilidade e repetibilidade de 0,08±0,01 e 0,15±0,04, na mesma ordem. Na China, Zhang et al. (2009), ao trabalharem com dados de 1.205 partos de caprinos da raça Boer, utilizando a metodologia bayesiana, estimaram valores dos componentes de variância e parâmetros genéticos para características reprodutivas, entre elas a prolificidade, herdabilidades de 0,12±0,01 e repetibilidade média de 0,57±0,02.

É importante ressaltar que são escassas referências na literatura nacional sobre estimativa de componentes de variância, com o uso do modelo de limiar por meio da amostragem de Gibbs para prolificidade de caprinos. São necessários, portanto, mais estudos que permitam inferências mais seguras sobre essa estimativa, visto que os parâmetros genéticos se apresentaram variáveis em função do método usado, além de serem propriedades não somente de um caráter, mas também da população e das circunstâncias de ambiente às quais os indivíduos estão sujeitos.

CONCLUSÕES

A variação ambiental, a maturidade fisiológica e a condição corporal afetam a prolificidade em caprinos. O uso de modelo animal de limiar sob análise bayesiana mostrou-se adequado para o estudo da prolificidade, produzindo estimativas superiores dos parâmetros genéticos. A prolificidade pode ser utilizada como critério de seleção com o intuito se obter progresso genético em caprinos.

AGRADECIMENTOS

À Fazenda Carnaúba, à Agropecuária Manoel Dantas Ltda. (AMDA), e ao professor Dr. Edgard Cavalcanti Pimenta Filho, pela concessão dos dados.

Recebido em 30 de julho de 2011

Aceito em 19 de julho de 2012

E-mail: elisanieteixeira@yahoo.com.br

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Jul 2013
  • Data do Fascículo
    Jun 2013

Histórico

  • Recebido
    30 Jul 2011
  • Aceito
    19 Jul 2012
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