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Equilíbrio acidobásico, parâmetros urinários e sanguíneos de gatos induzidos ao estresse e suplementados com composto antioxidante

Acid-base balance, urinary and blood parameters of cats stress-induced cats and supplemented with antioxidant compound

RESUMO

Este estudo teve como objetivo avaliar a suplementação do composto antioxidante comercial EconomasE (Alltech, Brasil ( AOX) sobre o equilíbrio acidobásico, os parâmetros urinários, o hemograma completo e a fragilidade osmótica de eritrócitos (FOE) de gatos estressados. Foram utilizados 24 gatos adultos (3,49±0,87kg), distribuídos em delineamento inteiramente ao acaso, com quatro níveis (0, 250, 500, 750mg de AOX/kg de alimento na matéria seca) e seis repetições, durante o período de 80 dias. Os gatos foram induzidos ao estresse por meio da presença de cães próximo ao recinto experimental (agente estressor; AE), do 61º dia até o final do experimento. A pressão parcial de dióxido de carbono (pCO2) e o bicarbonato (HCO3 -) aumentaram linearmente (P<0,05) conforme o aumento da ingestão de AOX. Os maiores valores de dióxido de carbono total (tCO2) (P<0,05) foram observados nos gatos alimentados com 500 e 750mg de AOX/kg de dieta. As concentrações de hemoglobina foram maiores nos animais alimentados com 250 e 500mg de AOX/kg de dieta. Os parâmetros urinários e da FOE foram semelhantes nos gatos em todas as dietas. Esses dados indicam que a suplementação com AOX apresenta efeitos benéficos no equilíbrio acidobásico e na concentração de hemoglobina de gatos induzidos ao estresse.

Palavras-chave:
farinha de algas; felinos; gases sanguíneos; selênio

ABSTRACT

This study aimed to evaluate the supplementation of a commercial antioxidant EconomasE (Alltech, Brazil - AOX) on the acid-base balance, urinary parameters, red blood count (RBC) and erythrocyte osmotic fragility (EOF) of stressed cats. Twenty-four adult cats (3.49±0.87kg) were distributed in a completely randomized design with four levels (0, 250, 500, 750mg AOX/kg feed dry matter) and six replicates for a period of 80 days. Cats were induced to stress through the presence of dogs in the experimental environment (stressor agent; AE) from the 61th day to the end. Partial pressure of carbon dioxide (pCO2) and bicarbonate (HCO3) increased linearly (P<0.05) with increased intake of AOX. The highest values of total carbon dioxide (tCO2) (P<0.05) were observed in cats fed the 500 and 750mg AOX/kg diet. Hemoglobin concentration was higher (P<0.05) in animals fed the 250 and 500mg AOX/kg diet. The urinary parameters and EOF were similar among all diets. These data indicate that AOX supplementation has beneficial effects in acid-base balance and hemoglobin concentration of stress-induced cats.

Keywords:
algae flour; blood gases; feline; selenium

INTRODUÇÃO

Os gatos são animais muito susceptíveis ao estresse (Griffin e Humme, 2006GRIFFIN, B.; HUME, K.R. Recognitions and management of stress in housed cats. In: AUGUST, J.R (Ed.). Consultation in feline internal medicine. St. Louis: Elsevier, 2006. p. 717-727.), o que pode resultar em importantes alterações fisiológicas (Carlstead et al., 1993CARLSTEAD, K.; BROWN, J.L.; STRAWN, W. Behavior and physiological correlates of stress in laboratory cats. Appl. Anim. Behav. Sci., v.38, p.143-158, 1993.). Assim, muitas vezes torna-se necessário lançar mão de estratégias para conter os efeitos colaterais do estresse, e a suplementação com antioxidantes, nesse caso, pode ser um tratamento eficaz. Os antioxidantes atuam no combate das espécies reativas de oxigênio, produzidas excessivamente durante a situação de estresse, e contribuem na estabilização da condição saudável do animal (Zicker et al., 2006ZICKER, S.C.; WEDEKIND, K.J.; JEWELL. D.E. Antioxidants in veterinary nutrition. Vet. Clin. North Am. Small Anim. Pract., v.36, p.1183-1198, 2006.).

Por outro lado, o equilíbrio acidobásico é um processo fisiológico complexo, regulado tanto por tampões intracelulares e extracelulares quanto pelos sistemas urinário e respiratório (Meyer et al., 1995MEYER, D.J.; COLES, E.H.; RICH, L.J. Medicina de laboratório veterinário: interpretação e diagnóstico. São Paulo: Roca, 1995. 308p.). É passível de ser influenciado por uma série de fatores internos e externos, incluindo os inerentes ao metabolismo, à dieta e às condições ambientais (Olanrewaju et al., 2007OLANREWAJU, H.A.; THAXTON, J.P.; DOZIER, W.A.; BRANTON, S.L. Electrolyte diets, stress, and acid-base balance in broiler chickens. Poult. Sci., v.86, p.1363-1371, 2007., muito embora o organismo sadio consiga compensar, em curto ou em longo prazo, as possíveis alterações ocorridas.

Tem sido relatado em animais de diversas espécies que as respostas ao estresse estão envolvidas com o balanço acidobásico (Aguilera-Tejero et al., 2000; Parker et al., 2003PARKER, A.J.; HAMLIN, G.P.; COLEMAN, C.J.; FITZPATRICK, L.A. Quantitative analysis of acid-base balance in Bos indicus steers subjected to transportation of long duration. J. Anim. Sci., v.81, p.1434-1439, 2003.; Wojtas et al., 2013WOJTAS, K.; CWYNAR, P.; KOLACZ, R.; et al. Effect of heat stress on acid base balance in Polish Merino sheep. Arch. Tierz., v.56, p.917-923, 2013.), bem como com o aumento da demanda de oxigênio (Garcia et al., 2012GARCIA, F.; SCHALCH, S.H.C.; ONAKA, E.M. et al. Hematologia de tilápia-do-nilo alimentada com suplemento a base de algas frente a desafios de estresse agudo e crônico. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.64, p.198-204, 2012.). Nesse sentido, Sivakumar et al. (2010SIVAKUMAR, A.V.N.; SING, G.; VARSHNEY, V.P. Antioxidants supplementation on acid base balance during heat stress in goats. J. Anim. Sci., v.23, p.1462-1468, 2010.) observaram que a suplementação com antioxidantes (vitamina C, vitamina E e selênio) pode resultar em melhora no equilíbrio acidobásico.

Há relatos de que o antioxidante comercial (AOX), composto por um pool de antioxidantes não enzimáticos, proporciona aprimoramento da capacidade antioxidante quando suplementado em dietas de aves (Pierce et al., 2009PIERCE, J.L.; AO, T.; POWER, R.F. et al. Investigation of replacing vitamin E with EconomasE(r) in broiler diet. Poult. Sci,. v.88, Suppl. 1, p.97, 2009. ; Xião et al., 2011XIÃO, R.; POWER, R.F.; MALLONEE, D. et al. comparative transcriptomic study of vitamin E and an algae-based antioxidant as antioxidative agents: investigation of replacing vitamin E with the algae-based antioxidant in broiler diets. Poult. Sci., v.90, p.136-146, 2011.). Entretanto, o AOX não foi estudado em gatos, e, sobretudo, ainda não se conhecem as possíveis interferências no status acidobásico e nos demais parâmetros fisiológicos desses animais.

Este trabalho tem por objetivo avaliar os efeitos de um suplemento antioxidante em gatos submetidos ao estresse nos parâmetros hematológicos, urinários e no equilíbrio acidobásico.

MATERIAL E MÉTODOS

O ensaio foi conduzido no Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Lavras, Minas Gerais, no Centro de Estudo em Nutrição de Animais de Companhia (Cenac), e foi aprovado pela Comissão de Ética no Uso de Animais (Comissões/Permanentes/PRP( UFLA ( Protocolo nº 036/11). A temperatura média foi de 20,50±2,48ºC, e a umidade relativa de 75,60±8,64%, no período experimental de 80 dias.

Foram utilizados 24 gatos sadios, com idade de 3,5 anos, sem raça definida, machos e fêmeas, peso médio de 3,49±0,87kg, alojados individualmente em gaiolas suspensas com dimensões de 0,8x0,8x1m (altura x profundidade x largura).

Durante todo o período experimental, os animais receberam água ad libitum e um alimento comercial completo, extrusado e seco para gatos adultos (dieta padrão) (Tab. 1 ). A quantidade de alimento foi calculada segundo a equação de predição energética de manutenção do National Research Council (Nutrient, 2006), 2006), dada por 100kcal x (PC em kg)0,67.

Tabela 1
Composição nutricional da dieta padrão1

O AOX (EconomasE(r), Alltech, Araucária, Brasil) contém em sua composição farinha de algas marinhas (Schizochytrium sp.), levedura enriquecida com selênio (1.500mg de selênio/kg de produto), ácido ascórbico e produto de fermentação de Aspergillus niger. O aditivo foi fornecido nas seguintes proporções: 0, 250, 500 e 750mg/kg da dieta padrão na matéria seca (MS). Para cada nível, foram utilizados seis gatos, sendo o animal considerado uma parcela experimental. Os animais receberam os diferentes níveis de AOX veiculados a 2mL de leite, exceto para o nível 0mg/kg de MS, que recebeu apenas o leite, como forma de padronizar o procedimento adotado.

O desafio (agente estressor; AE) foi promovido do 61º ao 80º dia experimental, por meio da inclusão, próximo à sala de experimentação, de seis cães da raça Labrador, que permaneceram até o final do experimento.

No dia zero e no 80º dia experimental, foram realizadas coletas de sangue para gasometria e hemograma completo. Para a gasometria, em cada dia houve uma coleta de 1,0mL/animal em jejum (às oito horas) e outra após seis horas da alimentação. As avaliações foram realizadas por meio de um analisador de pH e de gases sanguíneos (Modelo AGS22; Drake Ltda.; São Jose do Rio Preto, Brasil). As variáveis mensuradas foram pH, pressão parcial de dióxido de carbono (pCO2), concentração de bicarbonato (HCO3 -), total de dióxido de carbono (tCO2) e excesso de bases (EB). Para o resultado do hemograma completo, foi utilizado 1,0mL de sangue de cada animal em jejum em cada dia de observação, utilizando-se o EDTA como anticoagulante e os reagentes hematológicos Dialyse ( 3CF, Diascatter Pak, Diaton 3 e Diaclenz (Diagon, Belo Horizonte, Brasil).

Para a avaliação da FOE, foi coletado, no 80º dia experimental, 1,0mL de sangue dos gatos em jejum, com heparina sódica como anticoagulante. A metodologia utilizada foi a descrita por Maede e Hata (1975MAEDE, Y; HATA, R. Studies on feline haemobartonellosis II. The mechanism of anemia produced by infection with Haemobartonella felis. J. Vet. Med. Sci., v.37, p.49-54, 1975.); desse modo adicionou-se 0,05mL de sangue a 5,0mL de solução de NaCl com concentrações de 0,1 a 0,9%. O conteúdo de hemoglobina sobrenadante foi determinado por espectrofotometria a 540nm (Bel SPECTRO S05, Bel Engineering(r), Monza, Itália), e a solução contida no tubo de 0,9% foi considerada como branco ou acerto do zero. A porcentagem de hemólise foi calculada com a solução de 0,1% NaCl assumindo 100% de hemólise.

A densidade e o pH urinário foram avaliados nos três últimos dias do experimento, seguindo o protocolo proposto por Carciofi (2007CARCIOFI, C. Métodos para estudo das respostas metabólicas de cães e gatos a diferentes alimentos. Rev. Bras. Zootec., v.36, Supl. Esp., p.235-249, 2007. ). O pH urinário foi mensurado usando-se um pHmetro digital (Modelo DM22; Digimed, São Paulo, Brasil) e a densidade foi determinada por meio de um refratômetro portátil (Modelo RTP-20ATC; Instrutherm, São Paulo, Brasil).

Todas as análises estatísticas foram realizadas com o auxílio do programa Statistical Analysis System (SAS, 2004). Os dados foram submetidos à análise de covariância, sendo as medidas no tempo zero as covariáveis e, em seguida, à análise de regressão. Entretanto, quando não houve ajuste, as médias foram comparadas pelo teste de SNK a 5%. Na análise de FOE, para encontrar as concentrações (valores derivativos) em que ocorreram as porcentagens de hemólise de 5, 50 e 95%, foi realizada a análise de Probit, por meio do procedimento PROC PROBIT do SAS (2004). Os valores derivativos foram comparados pelo teste não paramétrico de Kruskal-Wallis.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A ingestão das dietas não influenciou (P>0,05) nos valores de pH sanguíneo e no excesso de bases (EB) dos gatos, independentemente do período de avaliação: jejum ou pós-prandial (Tab. 2 ). Para o tCO2, as maiores concentrações (P<0,05) foram obtidas nos níveis de 500 e 750mg de AOX/kg de dieta na matéria seca (MS). As variáveis pressão parcial de dióxido de carbono (pCO2) e bicarbonato (HCO3 -) apresentaram aumento linear nas concentrações (P<0,05) conforme a ingestão de AOX, porém somente do período de jejum.

Tabela 2
Valores médios dos parâmetros de gasometria de gatos adultos aos 80 dias após suplementação com antioxidante comercial (AOX)

Embora a hemogasometria em gatos venha sendo estudada em ambos os períodos, jejum e pós-prandial (Jeremias et al., 2013JEREMIAS, J.T.; NOGUEIRA, S.P.; BRUNETTO, M.A. Predictive formulas for food base excess and urine pH estimations of cats. Anim. Feed Sci. Technol., v.182, p.82-92, 2013.; Pires et al., 2013PIRES, C.P.; SAAD, F.M.O.B.; OGOSHI, R.C.S. et al. Urinary acidifier in diet with high excess base for adult cats. Cienc. Agrotec., v.37, p.359-368, 2013.), sabe-se que a metabolização de carboidratos, proteínas e lipídeos resulta em compostos que interferem no equilíbrio acidobásico. Desse modo, a ausência dos resultados das avaliações hemogasométricas pós-prandial pode ter sido influenciada pela composição da dieta controle, a qual impediu uma melhor visualização dos efeitos do AOX apenas nesse período. Entretanto, no período em jejum, foram observadas diferenças em alguns parâmetros, demonstrando efeito em longo prazo da ingestão do AOX.

Até o momento, não foram encontrados trabalhos que avaliassem valores hemogasométricos de gatos em situações de estresse quando suplementados com antioxidantes. No entanto, os resultados do presente estudo corroboram os dados encontrados por Sivakumar et al. (2010SIVAKUMAR, A.V.N.; SING, G.; VARSHNEY, V.P. Antioxidants supplementation on acid base balance during heat stress in goats. J. Anim. Sci., v.23, p.1462-1468, 2010.), que observaram maiores valores de HCO3 - e pCO2 em cabras estressadas recebendo suplemento antioxidante quando comparadas àquelas estressadas e não suplementadas. Os autores consideraram esse efeito como uma melhora no equilíbrio acidobásico.

Além disso, há relatos na literatura (West, 1999WEST, J.W. Nutritional strategies for managing the heat stressed dairy cow. J. Anim. Sci., v.77, suppl. 2, p.21-35, 1999.; Olanrewaju et al., 2007OLANREWAJU, H.A.; THAXTON, J.P.; DOZIER, W.A.; BRANTON, S.L. Electrolyte diets, stress, and acid-base balance in broiler chickens. Poult. Sci., v.86, p.1363-1371, 2007.) de que situações estressantes podem resultar em mudanças na frequência e na profundidade respiratória com consequente expiração excessiva de CO2, resultando na diminuição da pCO2. Portanto, acredita-se que a inclusão de AOX nos maiores níveis atenuou o estresse nos gatos.

Houve diferenças apenas para os níveis de hemoglobina (P<0,05) (Tab. 3 ) conforme a ingestão de AOX, em que os maiores valores foram observados nos animais suplementados com os níveis de 250 e 500mg de AOX/kg de matéria seca, e houve tendência (P=0,05) para hematócrito e contagem de eritrócitos. As demais variáveis dos parâmetros hematológicos, assim como as médias de pH e densidade urinária, não apresentaram diferenças significativas (P>0,05) conforme a suplementação de AOX.

Tabela 3
Valores médios dos parâmetros hematológicos e dos parâmetros urinários de gatos adultos após suplementação com antioxidante comercial (AOX)

Os eritrócitos são importantes indicadores de estresse oxidativo (Machado et al., 2009MACHADO, L.P.; KOHAYAGAWA, A.; SAITO, M.E. et al. Lesão oxidativa eritrocitária e mecanismos antioxidantes de interesse na medicina veterinária. Rev. Cienc. Agrovet., v.8, p.84-94, 2009.), e em animais de companhia, o principal alvo da lesão oxidativa é a hemoglobina (Caldin et al., 2005CALDIN, M.; CARLI, E.; FURLANELLO, T. et al. A retrospective study of 60 cases of eccentrocytosis in the dog. Vet. Clin. Pathol., v.34, p.224-231, 2005.). As maiores concentrações da hemoglobina nos gatos suplementados com 250 e 500mg de AOX/kg de MS estão de acordo com Sivakumar et al. (2010SIVAKUMAR, A.V.N.; SING, G.; VARSHNEY, V.P. Antioxidants supplementation on acid base balance during heat stress in goats. J. Anim. Sci., v.23, p.1462-1468, 2010.) e Yousef et al. (2003YOUSEF, M.I.; SALEM, M.H.; KAMEL, K.I. et al. Influence of ascorbic acid supplementation on the hematological and clinical biochemistry parameters of male rabbit exposed to aflatoxin B. J. Environ. Sci. Health B., v.38, p.193-209, 2003.), que também encontraram o mesmo resultado em caprinos e coelhos estressados suplementados com antioxidantes.

A elevação da hemoglobina sugere algumas hipóteses fisiológicas, e uma delas pode ser devido ao fato de que a hemoglobina corresponde a mais de 80% da capacidade tampão não bicarbonato presente no sangue (Dibartola, 2006DIBARTOLA, S.P. (Ed.). Fluid, electrolyte and acid-base disorders in small animal practice. 3.ed. Missouri: Elsevier, 2006. 250p.) e pode estar reduzida em situações de desequilíbrio acidobásico (West, 1999WEST, J.W. Nutritional strategies for managing the heat stressed dairy cow. J. Anim. Sci., v.77, suppl. 2, p.21-35, 1999.). Outra hipótese pode ser em razão de a redução de eritrócitos e, consequentemente, da hemoglobina já ter sido associada à exaustão na capacidade de eritropoiese ocasionada pelo estresse (Garcia et al., 2012GARCIA, F.; SCHALCH, S.H.C.; ONAKA, E.M. et al. Hematologia de tilápia-do-nilo alimentada com suplemento a base de algas frente a desafios de estresse agudo e crônico. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.64, p.198-204, 2012.). Alguma dessas hipóteses pode ter ocorrido nos animais não suplementados com AOX e, de maneira inesperada, nos que ingeriram 750mg de AOX/kg de MS, o que sugere um possível excesso do produto, no entanto um estudo mais amplo dessas respostas deve ser feito para a confirmação.

Quanto aos parâmetros urinários, o pH urinário pode se tornar alcalino ou ácido a partir da compensação devido às alterações do pH sanguíneo (Dibartola, 2006DIBARTOLA, S.P. (Ed.). Fluid, electrolyte and acid-base disorders in small animal practice. 3.ed. Missouri: Elsevier, 2006. 250p.). No presente trabalho, no entanto, observou-se que o AOX não interfere nesses parâmetros. Não foram encontradas pesquisas que permitissem uma discussão mais ampla dos resultados aqui achados.

As curvas acumulativas (médias) da FOE obtidas após 80 dias de suplementação com AOX de gatos foram semelhantes para todos os níveis (Fig. 2).

Figura 1
Alterações nas concentrações da pressão parcial de dióxido de carbono (A) e bicarbonato (B) no plasma de gatos em jejum aos 80 dias de suplementação com antioxidante comercial (AOX) mg/kg de matéria seca da dieta.

Figura 2
Curvas acumulativas (médias) da fragilidade osmótica eritrocitária de gatos após 80 dias da suplementação com antioxidante comercial (AOX) mg/kg de matéria seca da dieta/kg de MS na dieta.

Não foram observadas diferenças (P>0,05) na FOE quando avaliados os valores derivativos médios das concentrações de solução salina tamponada que corresponderam a 5, 50 e 95% de hemólise (Tab. 4 ). A FOE consiste numa técnica ainda pouco empregada e, portanto, com precárias referências para gatos em circunstâncias diversas. Contudo, os valores das concentrações de solução salina (% NaCl), em que se observou 50% de hemólise, apresentaram-se semelhantes ao valor médio de 0,54 para gatos sadios, obtido por Jain (1973JAIN, N.C. Osmotic fragility of erythrocytes of dogs and cats in health and in certain hematologic disorders. Cornell Vet., v.63, p.411-423, 1973.).

Tabela 4
Valores médios (derivativos) das concentrações de solução salina (% NaCl) correspondentes a 5, 50 e 95% de hemólise em gatos adultos após 80 dias de suplementação com antioxidante comercial (AOX) mg/kg de MS

O aumento da FOE pode ocorrer em situações de estresse devido ao aumento da peroxidação lipídica, a qual atrapalha a organização dos fosfolipídeos (fosfatidilserina e da fostadiletanolamina) da membrana plasmática (Jain, 1984JAIN, S.K. The accumulation of malonyldialdehyde, a product of fatty acid peroxidation, can disturb aminophospholipid organization in the membrane bilayer of human erythrocytes. J. Biol. Chem., v.259, p.3391-3394, 1984.) e, consequentemente, reduz a fluidez celular (Hebbel, 1986HEBBEL, R.P. Erythrocyte antioxidants and membrane vulnerability. J. Lab. Clin. Med., v.107, p.401-404, 1986.). Sabe-se que o antioxidante ácido gálico protegeu a integridade da membrana dos eritrócitos de ratos diabéticos, apresentando menor porcentagem de hemólise (Ramkumar et al., 2014RAMKUMAR, K.M.; VIJAYAKUMAR, R.S.; VANITHA, P. et al. Protective effect of gallic acid on alloxan-induced oxidative stress and osmotic fragility in rats. Hum. Exp. Toxicol., v.33, p.638-649, 2014.). Há relato de que a suplementação com vitamina E, outro potente antioxidante, reduziu a FOE em ratos induzidos ao estresse oxidativo (Ambali et al., 2010AMBALI, S.F.; AYO, J.O.; OJO, S.A.; ESIEVO, K.A. Vitamin E protects rats from chlorpyrifos-induced increased erythrocyte osmotic fragility in Wistar rats. Food Chem. Toxicol., v.48, p.3477-3480, 2010.). Foram atribuídos ao composto antioxidante AOX efeitos fisiológicos redundantes à vitamina E em aves (Xião et al., 2011XIÃO, R.; POWER, R.F.; MALLONEE, D. et al. comparative transcriptomic study of vitamin E and an algae-based antioxidant as antioxidative agents: investigation of replacing vitamin E with the algae-based antioxidant in broiler diets. Poult. Sci., v.90, p.136-146, 2011.). Apesar disso, contrariando esses resultados, o atual trabalho demonstra que a inclusão do AOX pode não ter sido suficiente para alterar a FOE de gatos induzidos ao estresse.

CONCLUSÕES

A suplementação de AOX em dietas apresenta efeitos benéficos para os parâmetros relacionados ao equilíbrio acidobásico e na concentração de hemoglobina de gatos induzidos ao estresse, sendo recomendada, nas condições estudadas, uma suplementação de até 500mg de AOX/kg de matéria seca. Por se tratar de um experimento pioneiro, tornam-se necessários mais estudos para compreensão dos mecanismos de ação do AOX, sobretudo com outros agentes estressores para gatos.

AGRADECIMENTOS

À empresa Alltech, pelo financiamento do projeto; ao CNPq pela concessão da bolsa de estudos e à Fapemig pelo apoio financeiro.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2016

Histórico

  • Recebido
    06 Set 2014
  • Aceito
    01 Mar 2016
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