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Avaliação da forma de inclusão de zeólita e do nível de consumo sobre a digestibilidade da dieta e as características fecais de cães

Evaluation of zeolite inclusion and level of food intake on diet digestibility and faecal characteristics of dogs

RESUMO

Objetivou-se avaliar a forma de inclusão da zeólita e de níveis de consumo sobre a digestibilidade da dieta e as características fecais de cães. O experimento 1 avaliou o efeito do nível de consumo (normal e 50% a mais do que as necessidades) e da inclusão de zeólita (0 e 15g/kg) sobre a digestibilidade e as características fecais de 12 cães. No experimento 2, foi avaliada a inclusão de 5, 15 e 25g/kg de zeólita adicionada na massa ou por cobertura, em seis cães, sobre a digestibilidade da dieta e as características fecais. O experimento 3 avaliou o odor fecal de nove cães consumindo dietas contendo 0 e 15g/kg de zeólita incluída na massa ou por cobertura. A quantidade consumida e a inclusão de zeólita não afetaram a digestibilidade das dietas. O escore e a matéria seca fecal aumentaram com a inclusão de zeólita. A inclusão de zeólita na massa propiciou aumento na digestibilidade das dietas, independentemente do nível de inclusão. A inclusão de 15g/kg de zeólita, adicionada na massa e por cobertura reduziu o odor fecal dos cães. A inclusão de zeólita na massa aumenta a digestibilidade da dieta, a consistência fecal e reduz o odor fecal de cães.

Palavras-chave:
adsorvente; aluminossilicatos; clinoptilolita

ABSTRACT

This study aimed to evaluate the form of inclusion of zeolite and consumption levels on diet digestibility and fecal characteristics of dogs. The first experiment examined the effect of consumption level (normal and 50% higher than the requirements) and zeolite level (0 and 15g/kg) on diet digestibility and fecal characteristics of 12 dogs. In experiment 2 the inclusion of 5, 15 and 25g/kg of added zeolite in dough or coating in six dogs on diet digestibility and fecal characteristics was evaluated. The third experiment assessed the fecal odor of nine dogs fed diets containing 0 and 15g/kg of zeolite included in the dough or coating. The amount consumed, as well as the inclusion of zeolite, did not affect diet digestibility. Fecal score and dry matter increased with the inclusion of zeolite. The inclusion of zeolite in the dough provided an increase in diet digestibility, regardless of the level of inclusion. The inclusion of 15g/kg zeolite added to the dough and by coating reduced fecal odor of dogs. The inclusion of zeolite in dough increases diet digestibility, fecal consistency, and reduces the fecal odor of dogs.

Keywords:
adsorbent; aluminosilicates; clinoptilolita

INTRODUÇÃO

As zeólitas são aluminossilicatos hidratados de metais alcalinos ou alcalinos terrosos. Seu uso na nutrição animal tem como objetivo adsorver água e gases do trato gastrintestinal (TGI) dos animais de companhia e, dessa maneira, melhorar as características fecais (Maia et al., 2010MAIA, G.V.C.; SAAD, F.M.O.B.; ROQUE, N.C. et al. Zeólitas e yucca schidigera em rações para cães: palatabilidade, digestibilidade e redução de odores fecais. Rev. Bras. Zootec., v.39, p.2442-2446, 2010.).

Os resultados encontrados na literatura (Félix et al., 2009FÉLIX, A.P.; ZANATTA, C.P.; BRITO C.B. et al. Suplementação de manoligossacarídeos (MOS) e uma mistura de alumino silicatos na qualidade das fezes de cães adultos. Arch. Vet. Sci., v.14, p.31-35, 2009.; Maia et al., 2010MAIA, G.V.C.; SAAD, F.M.O.B.; ROQUE, N.C. et al. Zeólitas e yucca schidigera em rações para cães: palatabilidade, digestibilidade e redução de odores fecais. Rev. Bras. Zootec., v.39, p.2442-2446, 2010.) acerca da inclusão de zeólita na alimentação de cães são contraditórios e podem, em parte, ser explicados pela falta de especificação do produto utilizado e pelo tipo de inclusão desse aluminossilicato na dieta. São conhecidas mais de 42 espécies de zeólitas naturais com composição e características distintas (Luz, 1995LUZ, A.B. Zeólitas: propriedades e usos industriais. Rio de Janeiro: CETEM CNPq, 1995. 68p. (Série Tecnologia Mineral, 68).), corroborando as divergências entre os resultados das pesquisas. Ainda, a ausência de especificação da forma de inclusão do adsorvente às dietas (na massa passando pelo processo de extrusão, ou por cobertura, posterior ao processamento) também é um agravante nesse contexto.

Com a inclusão de zeólita na massa do extrusado, o mineral pode ser saturado pela água adicionada durante o processo. Todavia, essa saturação poderia ser revertida na fase de secagem, em que ocorre a desidratação reversível da rede cristalina da zeólita, deixando o mineral com mais espaços vazios (menor teor de água remanescente). Dessa maneira, a zeólita apresentaria maior potencial para adsorver água e amônia no TGI dos cães. Por outro lado, a inclusão da zeólita por cobertura, junto com o óleo na fase de recobrimento do extrusado, também poderia alterar a sua capacidade adsortiva. A gordura pode propiciar barreira física para a adsorção, já que as zeólitas são polares e, portanto, lipofóbicas (Keer, 1989KEER, G.T. Synthetic zeolites. Sci. Am., p.82-87, 1989.).

Além do tipo de inclusão da zeólita nas dietas para cães, outro ponto a ser considerado é o fornecimento excessivo de alimento pelos tutores aos seus animais de companhia e também o maior consumo de alimentos por animais com alta demanda energética, como cães atletas ou em crescimento. A ingestão excessiva de alimentos pode aumentar a produção fecal diária, afetando sua consistência e umidade (Case et al., 2000CASE, L.P.; CAREY, D.P.; HIRAKAWA, D.A. Canine and feline nutrition: a resource for companion animal professionals. 2.ed. St. Louis: Mosby, 2000. 592p.). Os níveis adequados de inclusão de zeólita nessa situação podem ser maiores do que quando em consumo para mantença.

Diante do exposto, o presente trabalho objetiva avaliar o efeito dos métodos de inclusão da zeólita clinoptilolita em dietas extrusadas para cães, quando fornecidas em dois níveis de consumo, sobre a digestibilidade dos nutrientes e as características fecais de cães.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram realizados três experimentos para avaliar os efeitos da zeólita sobre a digestibilidade dos nutrientes da dieta e as características fecais em cães. No experimento 1, foi avaliada a inclusão de zeólita em dois níveis de consumo alimentar (normal e 50% a mais do que as necessidades energéticas de cães). No experimento 2, foi avaliado o tipo de inclusão de zeólita na dieta (massa ou por cobertura). No experimento 3, foi avaliado o efeito da inclusão da zeólita por massa ou cobertura na dieta sobre o odor fecal de cães. Os experimentos foram aprovados pela Comissão de Ética no Uso de Animais da Universidade Federal do Paraná, Curitiba, Paraná, Brasil, sob o protocolo nº 018/2012.

Foram fabricadas sete dietas para cães adultos, constituídas por uma dieta controle (0g/kg zeólita) e seis dietas contendo adição de 5g/kg, 15g/kg e 25g/kg de zeólita (Clinoptilolita, CELPEC, Celta Brasil, Brasil) antes (inclusão na massa) e após a extrusão da dieta (no recobrimento com óleo de frango). A zeólita foi adicionada em substituição ao milho. As dietas foram moídas a 1mm em moinho de martelos e extrusadas em extrusora de rosca simples (E130, Ferraz, Ribeirão Preto, Brasil), com taxa de produção média de 1870kg/hora. Foram adicionados 330 a 387l/h de água, com temperatura média de 93ºC, no condicionador. Após extrusão, as dietas foram secas em secador horizontal de tripla esteira, durante 20 minutos, a 105ºC.

A zeólita utilizada foi caracterizada como um produto 100% natural, composto por aluminossilicato hidratado de estrutura cristalina. Apresentou relação Si/Al de 4,25 e CTC de 2,6mEq.g-1. Os ingredientes e a composição química das dietas estão apresentados na Tab. 1.

Tabela 1
Ingredientes e composição química analisada e calculada (com base na matéria seca) das dietas experimentais

Para melhor caracterizar a capacidade adsorvente da zeólita nas dietas experimentais, foi utilizada a metodologia da análise de curva de retenção de água no solo descrita por Gauland (1997GAULAND, D.C.S.P. Relações hídricas em substratos à base de trufas sob o uso dos condicionadores casca de arroz carbonizada ou queimada. 1997. 118f. Dissertação (Mestrado em Agronomia) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS.). Primeiramente, realizou-se a vedação do fundo dos anéis (cilindros metálicos) com tecido de nylon preso por um atilho de borracha e a pesagem desses anéis. Os anéis foram preenchidos com as rações moídas a 2mm. A quantidade foi calculada por meio da densidade úmida deles, para garantir a uniformidade de volume. Os anéis foram, então, colocados em bandejas plásticas com água até 1/3 de sua altura, para saturação por 24 horas. Passado esse tempo, os anéis foram retirados da água e pesados.

O volume de água contido na amostra nesse momento corresponde ao ponto zero de tensão, equivalendo à porosidade total (PT). Os anéis foram, então, transferidos para funis de vidro (25cm de diâmetro superior interno), com uma base de placa porosa (pressão de 1 bar e alta condutância) de mesmo diâmetro. Os cilindros foram saturados novamente por 24 horas, com uma lâmina de 0,5cm abaixo da borda destes. Em seguida, a tensão foi ajustada para 10cm de coluna de água (10hPa), na qual os funis permaneceram por cerca de 48 horas até atingirem o equilíbrio. Posteriormente, os funis foram pesados e os mesmos procedimentos foram repetidos para as tensões 50 e 100cm de coluna de água (50 e 100hPa). A água facilmente disponível (AFD) foi obtida pelo volume de água liberado entre 10 e 50cm de tensão, e a remanescente (AR) pelo volume de água que permaneceu na amostra após esta ser submetida à pressão de sucção de 100hPa, a qual é equivalente à “água de microporos” (Haynes e Goh, 1978HAYNES, R.J.; GOH, K.M. Evaluation of potting media for commercial nursery production of container-grow plants: IV - physical properties of a range amendment peat-based media. J. Agric. Res., v.21, p.449-456, 1978.). Depois desse processo, as amostras foram secas em estufa a 105ºC. A análise foi realizada em triplicata.

Foram avaliadas as dietas 0 e 15g/kg de zeólita adicionada por cobertura, fornecidas em dois níveis de consumo: normal e 50% a mais do que as necessidades de energia metabolizável de cães adultos em manutenção (NEM). As NEM dos cães foram calculadas com base na equação: 130 x peso (kg)0,75 (Nutrient..., 2006). Foram utilizados 12 cães (seis machos e seis fêmeas) adultos da raça Beagle, com peso médio de 10+1,2kg e quatro anos de idade. Os animais foram alojados em baias individuais de alvenaria (5 metros de comprimento x 2 metros de largura).

O delineamento utilizado foi o de blocos ao acaso, composto por quatro tratamentos e dois períodos (blocos), em arranjo fatorial 2 x 2 (inclusão de zeólita x nível de consumo), totalizando seis repetições por tratamento. Os cães foram pesados no início e no final do experimento.

Antes do início do experimento, amostras das rações foram analisadas para determinação de matéria seca (MS), proteína bruta (PB, método 954.01), matéria mineral (MM, método 942.05), fibra bruta (FB, método 962.10) e extrato etéreo em hidrólise ácida (EE, método 954.02) segundo a AOAC (Official..., 1995). A energia bruta (EB) foi obtida em bomba calorimétrica (Parr Instrument Co, modelo 1261, Moline, IL, USA).

O ensaio de digestibilidade foi conduzido pelo método de coleta total de fezes, conforme as recomendações da Association of American Feed Control Officials (Dog..., 2003), com cinco dias de adaptação seguidos de cinco dias de coleta total de fezes por período. Os animais foram alimentados uma vez ao dia, às oito horas, segundo o nível de consumo avaliado. A água foi fornecida ad libtum. As fezes foram coletadas, no mínimo, duas vezes por dia, pesadas e congeladas individualmente (-14ºC), constituindo um composto de fezes de cada animal por período de coleta.

O pH e a amônia foram avaliados em duplicata nas fezes frescas coletadas, no máximo, após 15 minutos de defecação. O pH fecal foi avaliado em 2,0g de fezes frescas, diluídas em 20mL de água destilada usando-se pHmêtro digital (331, Politeste Instrumentos de Teste Ltda., São Paulo, Brasil). O teor de amônia foi determinado segundo Félix et al. (2013). A consistência fecal foi avaliada por meio de escore com graduação de 1 a 5, sendo 1 o indicativo de fezes pastosas e sem forma, 2 o indicativo de fezes macias e malformadas, 3 o indicativo de fezes macias, formadas e úmidas, 4 o indicativo de fezes bem formadas e consistentes e 5 para fezes bem formadas, duras e secas (Carciofi et al., 2009CARCIOFI, A.C.; OLIVEIRA, L.; VALÉRIO, A. et al. Comparison of micronized whole soya to common protein sources in dry dog and cat diets. Anim. Feed Sci. Technol., v.151, p.251-260, 2009.). Ao final das coletas fecais, a mistura composta das fezes de cada animal foi descongelada, homogeneizada e submetida à secagem em estufa a 55ºC (320-SE, Fanem, São Paulo, Brasil) por 72 horas e posterior moagem a 1mm em moinho (Wiley hammer Mill, Arthur H. Thomas Co., Philadelphia, PA), para determinação dos teores de UM, PB, MM, FB, EEA e EB.

Com base nos resultados laboratoriais obtidos, os CDA e a EM das variáveis analisadas foram calculados por meio das equações propostas pela AAFCO (Dog..., 2003):

CDA = (g nutriente ingerido - g nutriente excretado) / g nutriente ingerido;

EM (kcal/kg) = {kcal/g energia bruta ingerida - kcal/g energia bruta excretada nas fezes - [(g proteína bruta ingerida - g proteína bruta excretada nas fezes) x 1,25kcal/g]}/g alimento ingerido.

No experimento 2, foram avaliadas as dietas com inclusão de 0, 15 e 25g/kg de zeólita na massa e por cobertura. Foram utilizados seis cães (três machos e três fêmeas) adultos da raça Beagle, com peso médio de 10+1,2kg e quatro anos de idade. O delineamento experimental utilizado foi o quadrado latino 6 x 6, em arranjo fatorial 2 x 3 (forma de adição x nível de inclusão), totalizando seis repetições por tratamento.

Os cães foram alimentados duas vezes ao dia (oito horas e 16h), em quantidade suficiente para suprir suas NEM, segundo o NRC (Nutrient..., 2006). Os animais foram alojados nas mesmas condições descritas anteriormente, sendo seguido o mesmo protocolo de coletas e análises.

Para o experimento 3 (análise sensorial das fezes), foram utilizados nove cães (cinco machos e quatro fêmeas) adultos da raça Beagle, com peso médio de 10+1,2kg e quatro anos de idade, com as mesmas condições experimentais descritas no primeiro experimento. O delineamento experimental utilizado foi o inteiramente ao acaso. Foram avaliados três tratamentos: 0g/kg e 15g/kg de inclusão de zeólita na massa e por recobrimento. Os cães foram alimentados durante seis dias, conforme descrito no experimento 2. Ao sexto dia experimental, foram coletadas as fezes dos animais e separados 10g de cada animal, totalizando mistura de 30g de fezes para cada tratamento, destinadas à análise sensorial de odor, adaptando-se a metodologia descrita por Morales (1994MORALES, A.A. La evaluación sensorial de los alimentos en la teoria y la prática. Zaragoza: Acriba, 1994. 198p.). Os potes foram identificados como: A (dieta controle), B (15g/kg zeólita na massa) e C (15g/kg zeólita por cobertura). A análise sensorial foi feita às 12h30min por 50 avaliadores, que desconheciam os tratamentos experimentais. A avaliação foi realizada comparando-se as amostras B e C em relação à padrão (A), e foram atribuídos valores em relação ao odor: 1- melhor que a padrão (menos fétido/intenso); 2- igual à padrão e 3- pior que a padrão (mais fétido/intenso).

Os resultados dos três experimentos foram submetidos à análise quanto à normalidade, pelo teste Shapiro-Wilk, e à heterocedascidade das variâncias, pelo teste de Bartlett. Os resultados homocesdásticos de digestibilidade e consumo foram analisados utilizando-se o procedimento GLM do pacote estatístico SAS (Statistical..., NC, USA). Quando houve interação significativa, as médias foram comparadas pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade. Os resultados da curva de retenção de água, digestibilidade e características fecais foram avaliados por correlação de Pearson, utilizando-se o procedimento CORR, também do pacote estatístico SAS. Os resultados da análise sensorial, que foram não paramétricos, foram avaliados pelo teste de Kruskall-Wallis a 5% de significância.

RESULTADOS

As maiores porcentagens de PT e AFD foram obtidas ao se incluir a zeólita na massa, enquanto maiores teores de AR foram observados ao se incluir o mineral por cobertura (Tab. 2).

Tabela 2
Porosidade total (PT), água facilmente disponível (AFD) e água remanescente (AR) de dietas contendo zeólita adicionada na massa ou por cobertura

No experimento 1, tanto o nível de consumo de alimento como o nível de inclusão de zeólita não afetaram a digestibilidade dos nutrientes e a EM das dietas (P>0,05). Mesmo com o maior consumo de alimento (50% a mais das NEM), a inclusão de zeólita aumentou o escore e a matéria seca fecal dos cães (P<0,05). Como esperado, o consumo e a variação de peso dos animais foram superiores quando eles foram alimentados com 50% a mais que suas NEM (P<0,05, Tab. 3).

Tabela 3
Coeficientes de digestibilidade aparente (CDA) dos nutrientes, energia metabolizável (EM, kcal/kg), consumo das dietas (g/kg de peso corporal) e características fecais de cães alimentados com dietas contendo ou não zeólita, fornecidas em quantidade normal e 50% a mais que as necessidades dos animais

No experimento 2, a inclusão de zeólita na massa propiciou maiores valores de digestibilidade dos nutrientes em relação à zeólita adicionada em cobertura (P<0,05). Não houve efeito do nível de inclusão de zeólita sobre os CDA e EM das dietas (P>0,05). Houve interação entre o nível e o tipo de inclusão de zeólita apenas para o CDA da MO (P<0,05). As características fecais não diferiram (P>0,05) entre os tratamentos (Tab. 4).

Tabela 4
Coeficientes de digestibilidade aparente (CDA) dos nutrientes, energia metabolizável (EM, kcal/kg), consumo (g/kg de peso corporal) e características fecais de cães alimentados com dietas contendo níveis crescentes de zeólita na massa do extrusado ou por cobertura

A PT e a AFD correlacionaram-se positivamente com os CDA da EB, MS, PB (P<0,05) e MO (P<0,01). A AR correlacionou-se negativamente com os CDA da MS (P<0,05), EB, MO e PB (P<0,01). A PT, a AFD e a AR não apresentaram correlação com as características fecais, CDA do EE e com a EM da dieta (P>0,05, Tab. 5).

Tabela 5
Correlação entre porosidade total (PT), água facilmente disponível (AFD), água remanescente (AR), características fecais, coeficientes de digestibilidade dos nutrientes e energia metabolizável (EM) de dietas contendo 5, 15 e 25g/kg de zeólita na massa e por cobertura

No experimento 3, a inclusão de 15g/kg de zeólita na massa e por cobertura foi suficiente para reduzir o odor fecal de cães em comparação às fezes dos animais alimentados com a dieta controle (P<0,05, Tab. 6).

Tabela 6
Medianas do odor fecal de cães alimentados com dieta contendo 15g/kg de zeólita na massa antes da extrusão e 15g/kg de zeólita adicionada posteriormente ao processo de extrusão, em relação a uma dieta controle com 0g/kg de zeólita

DISCUSSÃO

Os cães, pelos hábitos caçadores e de competição na alimentação de seus ancestrais, são animais que apresentam o TGI adaptado à ingestão de grandes quantidades de alimento (Case et al., 2000CASE, L.P.; CAREY, D.P.; HIRAKAWA, D.A. Canine and feline nutrition: a resource for companion animal professionals. 2.ed. St. Louis: Mosby, 2000. 592p.). Desse modo, o consumo de quantidade de alimento 50% superior às suas necessidades não afetou a digestibilidade dos nutrientes da dieta e a consistência fecal dos cães, embora tenha aumentado a produção de fezes.

Apesar do aumento na excreção de fezes decorrente do maior consumo, a adição de 15g/kg de zeólita na dieta foi suficiente para aumentar a consistência fecal (escore e matéria seca) dos cães. Essa melhora na consistência fecal corrobora os resultados encontrados por Félix et al. (2009FÉLIX, A.P.; ZANATTA, C.P.; BRITO C.B. et al. Suplementação de manoligossacarídeos (MOS) e uma mistura de alumino silicatos na qualidade das fezes de cães adultos. Arch. Vet. Sci., v.14, p.31-35, 2009.) e Maia et al. (2010MAIA, G.V.C.; SAAD, F.M.O.B.; ROQUE, N.C. et al. Zeólitas e yucca schidigera em rações para cães: palatabilidade, digestibilidade e redução de odores fecais. Rev. Bras. Zootec., v.39, p.2442-2446, 2010.), em estudos sobre zeólita em cães, e se deve à sua alta capacidade adsorvente de umidade. Em vista disso, é interessante que, em situações de maior consumo e produção fecal, como em cães atletas e de grande porte, por exemplo, a zeólita seja adicionada à dieta. Cães com alta atividade física, como cães de pastoreio e corrida, por exemplo, podem apresentar NEM duas a três vezes superiores às necessidades de mantença (Nutrient..., 2006). Assim, é relevante que novos estudos sejam conduzidos para avaliarem níveis de inclusão ótimos de zeólita em dietas para cães que apresentem consumo alimentar superior a 50% das necessidades de mantença.

O aumento na digestibilidade dos nutrientes com a adição da zeólita na massa pode estar relacionado à maior capacidade adsorvente do mineral, promovida pelo processo de extrusão e secagem. Durante o processamento, especificamente na etapa de secagem, a temperatura de 110 a 120ºC pode promover a desidratação endotérmica reversível da rede cristalina da zeólita (Dana, 1981DANA, J.D. Manual de mineralogia (Dana- Hurlbut). São Paulo: S.A., 1981, 642p.). A remoção de umidade pelo aquecimento aumenta o volume de vazios da zeólita (Harben e Kuzvart, 1996HARBEN, P.W.; KUZVART, M. Industrial minerals - a global geology. London: Industrial Minerals Information, 1996. 462p.) e a deixa mais acessível para adsorver água e gases do TGI dos animais. A interação entre o nível e o tipo de inclusão de zeólita sobre o CDA da MO demonstrou, no presente estudo, que são necessários maiores níveis de inclusão de zeólita em cobertura para se atingirem os mesmos valores de digestibilidade das dietas contendo zeólita na massa.

Estudos afirmam que a propriedade adsorvente dos minerais da família das zeólitas reduz a taxa de passagem do alimento no TGI, promovendo maior tempo de ação das enzimas digestivas e aumento na digestibilidade dos nutrientes (Luz, 1995LUZ, A.B. Zeólitas: propriedades e usos industriais. Rio de Janeiro: CETEM CNPq, 1995. 68p. (Série Tecnologia Mineral, 68).; Olver, 1997OLVER, M.D. Effect of feeding zeolite on the performance of 3 strains of laying hens. Br. Poult. Sci., v.38, p.220-222, 1997.; Parisini et al., 1999PARISINI, P.; MARTELLI, G.; SARDI, L.; ESCARBINO, F. Protein and energy retention in pigs fed diets containing sepiolite. Anim. Feed Sci. Technol., v.79, p.155-162, 1999.). Os aluminossilicatos são minerais lipofóbicos (Keer, 1989KEER, G.T. Synthetic zeolites. Sci. Am., p.82-87, 1989.), portanto têm pouca atratividade por compostos gordurosos e apolares. Esse comportamento possivelmente prejudicou a ação da zeólita quando aplicada por cobertura junto ao banho de óleo, resultando em menores teores de digestibilidade dos nutrientes em relação às dietas com inclusão de zeólita na massa.

Os maiores teores de PT e AFD nas dietas com inclusão de zeólita na massa do extrusado podem estar relacionados com a sua adequada mistura e a desidratação endotérmica da rede cristalina da zeólita durante a secagem. Quando a zeólita é adicionada posteriormente ao banho de óleo, na cobertura, pode não haver adequada adesão ao extrusado, por ser um material lipofóbico (Keer, 1989KEER, G.T. Synthetic zeolites. Sci. Am., p.82-87, 1989.). Ainda, os lipídios podem promover barreira física, dificultando a adsorção de água do TGI pela zeólita.

Não foram encontrados na literatura outros trabalhos que avaliassem a PT, a AFD e a AR de dietas extrusadas contendo zeólita.

Segundo Neves e Schvartzman (2005NEVES, C.F.; SCHVARTZMAN, M.A. Separação de CO2 por meio de tecnologia PSA. Quim. Nova, v.28, p.622-628, 2005. ), a porosidade é o parâmetro mais importante correlacionado à estrutura dos aluminossilicatos, uma vez que afeta suas propriedades físicas, como capacidade de adsorção e troca iônica. Os teores de AR foram inversamente proporcionais à digestibilidade dos nutrientes. Portanto, quanto mais AR estiver no mineral, menos espaços vazios este tem disponível para adsorver substâncias no TGI dos animais, o que justifica os teores mais elevados de PT e AFD terem promovido maior digestibilidade dos nutrientes no presente estudo.

Apesar de a forma de inclusão de zeólita ter afetado a sua porosidade e a digestibilidade da dieta, ela não influenciou significativamente as características fecais dos cães. Desse modo, a inclusão de 5g/kg de zeólita já é suficiente para aumentar a MS e o escore e reduzir o odor fecal dos cães. Segundo Houssain et al. (1999), o odor fecal é proveniente da formação de compostos durante a fermentação microbiana intestinal, em que se destacam amônia, aminas alifáticas, ácidos graxos de cadeia ramificada, indóis, fenóis e compostos saturados voláteis. Dentre todos esses compostos, o mais comumente mensurado em ensaios de digestibilidade é a amônia fecal. Tal análise pode não ser suficiente para mensurar o odor fecal, já que outros gases estão envolvidos nesse processo. Portanto, deve, sempre que possível, ser acompanhada de uma análise sensorial de odor.

O odor fecal de cães alimentados com dietas contendo zeólita foi avaliado por Maia et al. (2010MAIA, G.V.C.; SAAD, F.M.O.B.; ROQUE, N.C. et al. Zeólitas e yucca schidigera em rações para cães: palatabilidade, digestibilidade e redução de odores fecais. Rev. Bras. Zootec., v.39, p.2442-2446, 2010.). Os autores também obtiveram redução no odor fecal de cães quando suplementados com 7,5g/kg e 10g/kg de zeólita, em relação à dieta controle. A redução do odor fecal promovida pela zeólita ocorre pela sua elevada superfície interna (1000m²/g) e capacidade de troca catiônica (200meq/100g). Isso garante maior facilidade desse mineral em adsorver outras substâncias, como os gases da fermentação intestinal (Castaign, 1994). Além disso, o fato de a zeólita ter reduzido a umidade das fezes também contribui para a menor volatilização de compostos odoríferos (Félix et al., 2009FÉLIX, A.P.; ZANATTA, C.P.; BRITO C.B. et al. Suplementação de manoligossacarídeos (MOS) e uma mistura de alumino silicatos na qualidade das fezes de cães adultos. Arch. Vet. Sci., v.14, p.31-35, 2009.).

CONCLUSÕES

Os processos de extrusão e secagem podem aumentar a porosidade total da zeólita em relação à sua adição por cobertura. Ainda, a porosidade total apresenta correlação positiva com a digestibilidade da dieta. Desse modo, recomenda-se a inclusão de 15g/kg de zeólita na massa para aumentar a digestibilidade da dieta e a consistência fecal e reduzir o odor das fezes dos cães. Inclusive, com 50% a mais de consumo de alimento, a inclusão de 15g/kg de zeólita na dieta aumenta a consistência fecal dos cães.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2018

Histórico

  • Recebido
    22 Set 2016
  • Aceito
    29 Ago 2017
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