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Discriminação de áreas de espesso regolito do leste do Estado do Amazonas usando estatística multivariada, algoritmo hiperespectral e modelagem de dados espaciais

Resumos

Áreas com espessos regolitos estão amplamente distribuídas na região amazônica. Nas últimas décadas, as pesquisas sobre geologia de regolitos no Brasil têm se concentrado, principalmente, nos aspectos geoquímicos e mineralógicos e seus possíveis usos para a exploração de recursos minerais. Embora a utilização da aerogeofísica e de métodos de integração de dados tenham se ampliado na avaliação de recursos minerais, a aplicação em terrenos regolíticos ainda é recente. O objetivo deste artigo é mostrar o potencial de uma abordagem sistemática, incluindo o uso de aerogamaespectrometria regional, modelo digital de elevação e processamento digital de imagens, para a identificação de áreas de espesso regolito com potencial interesse econômico em uma área pouco explorada da porção leste do Estado do Amazonas. A aplicação de técnicas de estatística multivariada (Análise por Principais Componentes e K-médias) em dados aerogamaespectrométricos permitiu a individualização de regolitos frente às respostas provenientes de unidades geológicas da região. Como guias para a identificação de áreas de espesso regolito, os seguintes padrões foram observados: baixos valores de K (facilmente lixiviado durante o intemperismo) e da razão K/eU; altos valores de eTh, da razão eTh/K e médios de eU, além de maiores altitudes (platôs). Aplicou-se o algoritmo originalmente desenvolvido para o sensoriamento remoto hiperespectral, denominado Spectral Angle Mapper (SAM), e técnicas de modelagens espaciais (lógicas booleana e fuzzy) para a produção de mapas de favorabilidade para a ocorrência de espesso regolito que foram comparados com mapa geológico em escala 1:250.000. As relações quantitativas entre conjuntos de dados geofísicos e altimétricos mostraram grande capacidade para o link entre interpretações geológicas e geofísicas, indicando-se áreas potenciais para direcionar a prospecção mineral na área de estudo.

aerogamaespectrometria; SRTM; Spectral Angle Mapper; modelagem de dados espaciais; Análise por Principais Componentes; K-médias


Areas with deep regolith profiles are widely distributed in the Amazonian region. Research on regolith geology in Brazil has concentrated, mainly, in geochemical and mineralogical aspects and where possible utilizing these in exploration. Although airborne geophysics and spatial data integration methods are being used increasingly for mineral resource assessments, the application in regolith-dominated terrains is new. The objective of this paper is to show the potential of a systematic approach, including the use of regional gamma-ray spectrometry, digital elevation model and image digital processing techniques for the identification of deep regolith areas characterized by potential economic interest in less well explored region of the eastern portion of Amazonas State. The application of multivariate statistics techniques (Principal Components Analysis and K-means) in airborne gamma-ray data allows the individualization of regoliths in comparison to the geologic units of this region. How exploratory guide, the following patterns were observed: low values of K (easily lixivied during the weathering) and K/eU ratio; high values of eTh, eTh/K ration and medium values of eU, besides the higher altitude (plateau). Based on these images, the hyperspectral algorithm named Spectral Angle Mapper (SAM) and the boolean and fuzzy logic spatial modeling techniques were applied to produce regolith potential maps that were compared with previous geological data in 1:250.000 scale. The quantitative relationships between geophysical and altimetric datasets have shown great capability for linking geological and geophysical interpretations, indicating potential areas that can direct new ways for mineral prospecting at the study area.

airborne gamma-ray spectrometry data; SRTM; Spectral Angle Mapper; spatial data modeling; Principal Components Analysis; K-means


Discriminação de áreas de espesso regolito do leste do Estado do Amazonas usando estatística multivariada, algoritmo hiperespectral e modelagem de dados espaciais

Thais Andressa CarrinoI; Adalene Moreira SilvaI; Nilson Francisquini BotelhoI; Alexandre Augusto Cardoso da SilvaII

IInstituto de Geociências, Universidade de Brasília, Campus Universitário Darcy Ribeiro s/n, 70910-900 Brasília, DF, Brasil. Tel.: +55 (61) 3307-2877; Tel./Fax: +55 (61) 3340-4759 - E-mails: thais.carrino@gmail.com; adalene@unb.br; nilsonfb@unb.br

IICentro de Pesquisa e Desenvolvimento - CENPES, Petrobras, Av. Horácio de Macedo, 950, Cidade Universitária, Ilha do Fundão, 21941-915 Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Tel.: +55 (21) 3865-7573 - E-mail: alexandreaugusto@petrobras.com.br

RESUMO

Áreas com espessos regolitos estão amplamente distribuídas na região amazônica. Nas últimas décadas, as pesquisas sobre geologia de regolitos no Brasil têm se concentrado, principalmente, nos aspectos geoquímicos e mineralógicos e seus possíveis usos para a exploração de recursos minerais. Embora a utilização da aerogeofísica e de métodos de integração de dados tenham se ampliado na avaliação de recursos minerais, a aplicação em terrenos regolíticos ainda é recente. O objetivo deste artigo é mostrar o potencial de uma abordagem sistemática, incluindo o uso de aerogamaespectrometria regional, modelo digital de elevação e processamento digital de imagens, para a identificação de áreas de espesso regolito com potencial interesse econômico em uma área pouco explorada da porção leste do Estado do Amazonas. A aplicação de técnicas de estatística multivariada (Análise por Principais Componentes e K-médias) em dados aerogamaespectrométricos permitiu a individualização de regolitos frente às respostas provenientes de unidades geológicas da região. Como guias para a identificação de áreas de espesso regolito, os seguintes padrões foram observados: baixos valores de K (facilmente lixiviado durante o intemperismo) e da razão K/eU; altos valores de eTh, da razão eTh/K e médios de eU, além de maiores altitudes (platôs). Aplicou-se o algoritmo originalmente desenvolvido para o sensoriamento remoto hiperespectral, denominado Spectral Angle Mapper (SAM), e técnicas de modelagens espaciais (lógicas booleana e fuzzy) para a produção de mapas de favorabilidade para a ocorrência de espesso regolito que foram comparados com mapa geológico em escala 1:250.000. As relações quantitativas entre conjuntos de dados geofísicos e altimétricos mostraram grande capacidade para o link entre interpretações geológicas e geofísicas, indicando-se áreas potenciais para direcionar a prospecção mineral na área de estudo.

Palavras-chave: aerogamaespectrometria, SRTM, Spectral Angle Mapper, modelagem de dados espaciais, Análise por Principais Componentes, K-médias.

ABSTRACT

Areas with deep regolith profiles are widely distributed in the Amazonian region. Research on regolith geology in Brazil has concentrated, mainly, in geochemical and mineralogical aspects and where possible utilizing these in exploration. Although airborne geophysics and spatial data integration methods are being used increasingly for mineral resource assessments, the application in regolith-dominated terrains is new. The objective of this paper is to show the potential of a systematic approach, including the use of regional gamma-ray spectrometry, digital elevation model and image digital processing techniques for the identification of deep regolith areas characterized by potential economic interest in less well explored region of the eastern portion of Amazonas State. The application of multivariate statistics techniques (Principal Components Analysis and K-means) in airborne gamma-ray data allows the individualization of regoliths in comparison to the geologic units of this region. How exploratory guide, the following patterns were observed: low values of K (easily lixivied during the weathering) and K/eU ratio; high values of eTh, eTh/K ration and medium values of eU, besides the higher altitude (plateau). Based on these images, the hyperspectral algorithm named Spectral Angle Mapper (SAM) and the boolean and fuzzy logic spatial modeling techniques were applied to produce regolith potential maps that were compared with previous geological data in 1:250.000 scale. The quantitative relationships between geophysical and altimetric datasets have shown great capability for linking geological and geophysical interpretations, indicating potential areas that can direct new ways for mineral prospecting at the study area.

Keywords: airborne gamma-ray spectrometry data, SRTM, Spectral Angle Mapper, spatial data modeling, Principal Components Analysis, K-means.

INTRODUÇÃO

Regolitos são amplamente encontrados em terrenos tropicais, particularmente entre as latitudes 35°S e 35°N (Butt et al, 2000; Anand & Paine, 2002), e suas características geoquímicas e mineralógicas apresentam-se distintas das rochas parentais. A formação de regolitos envolve vários fatores ambientais, conforme assinalado por Butt et al. (2000): existência de longos períodos de estabilidade tectônica; relevo moderado e com drenagem adequada para permitir a lixiviação de produtos do intemperismo químico; formação, preferencial, em região de clima tropical úmido, onde processos intempéricos ocorrem de forma mais rápida, porém, sendo possível seu desenvolvimento em regiões mais temperadas, considerando-se um período mais longo para a geração dos mesmos.

Os estudos de regolitos podem contribuir efetivamente para a prospecção de depósitos minerais em regiões tropicais úmidas onde as mineralizações resultam freqüentemente de processos de laterização, tendo como exemplo, alguns tipos de depósitos de ouro, bauxita, ferro, manganês, nióbio, níquel, caulim entre outros (Figueiredo, 2000; Butt et al, 2000).

Nesse contexto, destacam-se os lateritos maturos e imaturos amplamente distribuídos em toda a região amazônica (Fig. 1 (a)). Rochas parentais de diferentes idades e composições mineralógicas e seu contexto morfológico são fatores que explicam os distintos tipos de lateritos na região, dos quais se destacam as coberturas bauxíticas, fosfáticas, ferruginosas, cauliníticas, magnesíferas e niquelíferas (Costa, 1991).


Este artigo tem como meta a seleção de áreas dominadas por espessos regolitos potencialmente associados com depósitos minerais do extremo leste do Estado do Amazonas (Fig. 1). São utilizadas imagens altimétricas e gamaespectrométricas e o emprego de técnicas de estatística multivariada, de classificação supervisionada e de modelagem de dados espaciais. Nesta região, o interesse por exploração de bauxita é revelado pela existência de áreas com concessões de pesquisa mineral junto ao Departamento Nacional de Pesquisa Mineral (DNPM) pela empresa Magellan Mineração Prospecção Geológica Ltda. (SIG-MINE, 2010), conforme mostrado na Figura 1(b).

CONTEXTO GEOLÓGICO DO EXTREMO LESTE DO AMAZONAS

A porção do extremo leste do Estado do Amazonas, focada neste artigo, compreende a parte oeste da Província Mineral do Tapajós, caracterizada como um arco magmático paleoproterozóico acrescido a um proto-craton arqueano (Klein et al, 2001) (Fig. 1 (b)).

A unidade geológica mais antiga presente na área em estudo consiste no Grupo Jacareacanga (~2,1 Ga), abrangendo rochas metassedimentares (quartzo-muscovita xistos, xistos máficos, entre outras) e metavulcânicas. A Suíte Intrusiva Parauari (~1,88 Ga) consiste em granitos e granodioritos. Estas rochas são pertencentes à série cálci-alcalina de médio a alto K, metaluminosas, às vezes peraluminosas, possuindo características de arco vulcânico (Klein et al, 2001).

A Suíte Intrusiva Ingarana (~1,8 Ga) abrange rochas máficas, como diabásios e microgabros relacionados com gabronoritos, dioritos, monzodioritos e granófiros. A Suíte Intrusiva Maloquinha (~1,8 Ga) compreende uma unidade de granitos caracterizados como corpos plutônicos com formatos batolíticos e de stock, que são controlados por falhamentos NNW-SSE com tendência anorogênica. Além dessas unidades, destacam-se a Formação Bom Jardim (~1,8 Ga; rochas vulcânicas intermediárias); o Grupo Iriri (~1,8 Ga), compartimentado nas formações Salustiano (rochas vulcânicas ácidas, como riolitos, riodacitos e dacitos) e Aruri (rochas vulcanoclásticas, como tufos, ignimbritos, brechas vulcânicas). No mesoproterozóico destaca-se o Igarapé Escondido (granito tipo rapakivi), e no Fanerozóico incluem-se as seguintes unidades: a Formação Monte Alegre (arenitos e folhelhos da bacia amazônica, com idade carbonífera superior); os extensos diques máficos indiferenciados e aqueles pertencentes ao Diabásio Periquito (~180 Ma; e.g., Amaral, 1974) e ao Diabásio Piranhas (~510 Ma; Santos et al, 2002) e que caracterizam-se por direção preferencial NE-SW; e a Formação Alter do Chão (arenitos avermelhados, silicificados e ferruginizados, com idade associada ao Cretáceo Superior ou ao Terciário; Travassos & Barbosa Filho, 1990).

As unidades mais recentes eqüivalem a coberturas detríticas ou lateríticas e às aluviões recentes. As coberturas detríticas ou lateríticas consistem em platôs escarpados de pequenas dimensões e alongados, sobrepostas, preferencialmente, aos litotipos das formações Alter do Chão e Monte Alegre (cf., Fig. 1 (b)).

Mineralizações auríferas paleoproterozóicas são encontradas nesta região e estão hospedadas principalmente em rochas do Grupo Jacareacanga, da Suíte Intrusiva Parauari e em rochas vulcânicas do Grupo Iriri. Intenso intemperismo ocorre na região, com presença de espessos regolitos onde existem garimpos de ouro, possivelmente relacionados a processos de enriquecimento supergênico em alguns casos (Klein et al, 2001).

GAMAESPECTROMETRIA E DISCRIMINAÇÃO DE ÁREAS DE ESPESSO REGOLITO

A radiação gama, caracterizada por alta energia (menores comprimentos de onda) no espectro eletromagnético, constitui uma excelente ferramenta para a cartografia de coberturas superficiais, pois 90% dos raios gama são emanados de aproximadamente 30 a 45 cm do solo ou rocha. Os três radioelementos passíveis de medição compreendem o K, U e Th cujas concentrações médias na crosta eqüivalem a 2,0-2,35%, 2,7-3,0 ppm e 8,5-12,0 ppm, respectivamente (Dickson & Scott, 1997; Minty, 1997).

O K é medido diretamente a partir do pico de decaimento isotópico do 40K, o qual emite raios gama quando decai para 40Ar. Apresenta-se comum em K-feldspatos, micas, e em grande concentração em rochas félsicas e baixa em rochas máficas e ultramáficas. O Th e U possuem suas respectivas concentrações estimadas por meio de medidas mais complexas, pois estes radioelementos decaem em uma série de nuclídeos filhos. 0 cálculo da abundância de Th e U ocorre por meio de picos de emissão associados a 208TI e 214Bi, respectivamente (Minty, 1997). 0 U geralmente encontra-se em pegmatitos, sienitos, carbonatitos, granitos radioativos e alguns folhelhos escuros. Tanto o U como o Th também estão na composição mineralógica de minerais traços, minerais formadores de rochas e em minerais acessórios e resistatos (e.g., zircão, monazita, alunita). A concentração de K, U e Th tende a aumentar com o acréscimo do conteúdo de silica nas rochas ígneas (Dickson & Scott, 1997).

A intensidade dos raios gama emitida da superfície reflete a mineralogia e a geoguímica da rocha ou da cobertura intempérica. Em muitos casos, as características dos radioelementos associados com regolitos diferem da rocha subjacente, em função da reorganização geoguímica dentro dos mesmos.

Durante o intemperismo, os radioelementos são liberados total ou parcialmente dos constituintes minerais primários (da rocha in situ), podendo ser incorporados a argilas, óxidos de ferro, água subterrânea e matéria orgânica. O K é solúvel e móvel sob condições intempéricas, podendo ser lixiviado de minerais primários (micas, K-feldspatos) para solução e/ou ser absorvido em minerais de argila neoformada como a ilita e a esmectita. Em contrapartida, o U e Th são considerados, em geral, menos móveis gue o K (Wilford et al., 1997).

O U guando liberado de minerais pelo intemperismo, é móvel sob condições oxidantes, mas se precipita em condições redutoras. O Th pode tornar-se altamente móvel guando combinado com complexos orgânicos em solos e água subterrânea. Entretanto, tende a se concentrar no regolito, associando-se a minerais resistatos ou aos óxidos de ferro (Wilford et al., 1997).

Genericamente, Wilford et al. (1997) propõem uma escala de mobilidade relativa de elementos maiores no ambiente intempérico, incorporando-se as respostas esperadas com relação aos radioelementos K, eTh e eU (Fig. 2). Esta ordem, no entanto, pode mudar de acordo com as condições ambientais. A tendência geral mostra que cations (e.g., Na+, Ca+2, Mg+2, K+) são perdidos em solução podendo, no entanto, ser parcialmente incorporados em minerais de argila. Freguentemente, no regime tropical, o intemperismo leva ao desenvolvimento de argilas, principalmente a caulinita, e ao acúmulo de silica e de oxi-hidróxidos de ferro e alumínio.


Estudos geofísicos na Austrália quantificaram respostas gamaespectrométricas de pisólitos, ferricretes e gossans, observando-se, em geral, valores de eTh e eU acima das médias crustais (Tab. 1) (Dickson & Scott, 1997). Este mesmo padrão também foi observado em medidas gamaespectrométricas de bauxitas (Isles & Rankin, 2000), conforme mostrado na Tabela 1. Adicionalmente, estes altos valores de eU e/ou eTh apresentam-se, na maioria das vezes, relacionados com relevos típicos de platôs gue podem estar relacionados a áreas gue sofreram maior intensidade intempérica, resultando na formação de bauxitas e lateritas. De acordo com Butt et al. (2000), a cartografia de formas de relevo associadas com materiais regolíticos pode ser realizada regionalmente através de imagens de satélites, analisando-se, sobretudo, as características da macrotopografia.

MATERIAIS

Dados gamaespectrométricos regionais e imagens altimétricas do Shuttle Radar Topography Mission (SRTM) foram utilizados no estudo.

Os dados gamaespectrométricos são referentes àgueles de 1998 realizados pela Lasa Engenharia e Prospecções S.A para a CPRM, e inclusos no levantamento aéreo Bloco 1 - Província Aurífera do Tapajós. Os dados foram adguiridos considerando-se uma altura de voo de 100 m e espaçamentos das linhas de voo (N-S) e de controle (E-W), respectivamente, de 1 km e 13 km. Este aerolevantamento totalizou 48.879 km2 de área, 49.807,6 km e 4.043,4 km de perfis de linhas de voo e de controle, respectivamente, sendo as leituras do aerogamaespectrômetro realizadas a cada 55 m (Lasa Engenharia e Prospecções S.A., 1998). Os dados foram registrados a bordo da aeronave Britten-Norman, modelo BN-2A-lslander, prefixo PT-KNE, de forma digital e analógica, e utilizando-se um sistema de navegação GPS Picodas/NovAtel. Foi empregado o sistema Picodas, modelo PGAM, de 256 canais espectrais, para registro da radiação gama referente aos canais de K, U, Th e da contagem total. O volume total de cristais de iodeto de sódio ativado a tálio empregado consistiu em 2048 polegadas cúbicas para dois conjuntos de cristais voltados para baixo (downward looking crystals) e 512 polegadas cúbicas para dois conjuntos de cristais voltados para cima (upward looking crystals). Em síntese, o espectro de cada cristal detector é analisado individualmente para a determinação dos fotopicos de K, U e Th. As radiações gama detectadas são somadas e as leituras reduzidas a uma única saída de 256 canais espectrais (Lasa Engenharia e Prospecções S.A., 1998).

As imagens altimétricas foram adquiridas no ano 2000, por meio do ônibus espacial Endeavour. Consistem nos dados do modelo digital de terreno do SRTM, derivados da técnica de interferometria de radar de abertura sintética e caracterizados por resolução espacial aproximada de 90 metros (Rabus et al., 2003). Utilizando a interferometria, duas imagens de radar foram adquiridas ao mesmo tempo: uma pela antena instalada no compartimento de carga do ônibus espacial e outra pela antena suspensa, por meio de um mastro a uma distância de 60 metros da espaçonave. As imagens coletadas são caracterizadas pelo formato de números complexos a fim de extrair informações da fase. A diferença de fase entre as imagens é empregada para o cálculo da diferença da distância de um mesmo pixel entre as imagens que, por sua vez, é a base para a obtenção da altura do pixel. Essa missão topográfica por radar interferométrico adquiriu dados topográficos de 80% das terras emersas do planeta em 11 dias de operação, e foi patrocinada pela NASA, USGS, Departamento de Defesa dos Estados Unidos e pelas Agências Espaciais da Alemanha e da Itália (Rabus et al., 2003). A imagem utilizada foi obtida sem custos através da Global land Cover Facility, via endereço eletrônico (http://glcf.umiacs.umd.edu/index.shtml).

ABORDAGEM METODOLÓGICA

Aerogamaespectrometria e aplicação de técnicas de estatística multivariada

Os dados gamaespectrométricos foram processados por Silva (2003) que empregou o interpolador curvatura mínima e um tamanho da célula do grid de 250 m durante a aplicação do micronivelamento baseado em Minty (1991), utilizando-se o algoritmo de Blum (1999). A partir da interpolação dos dados, Silva (2003) produziu as imagens dos canais de K, eTh, eU, e das razões K/eTh, eTh/Ke K/eU.

A imagem da composição colorida de K, eTh e eU no espaço de cores RGB foi produzida e integrada com as unidades geológicas mostradas no mapa da Figura 1 (Klein et al., 2001), conforme mostrado na Figura 3(a). Com base na mesma, é possível notar que a unidade coberturas detríticas ou lateríticas são caracterizadas por assinatura gamaespectrométrica de alto eTh em contrapartida a baixos valores de K e baixos a médios de eU. Esta mesma relação é observada em detalhe na Figura 4, na comparação de um recorte das imagens de K, eTh, eU e das razões de K/eU e eTh/K de uma área mapeada por Klein et al. (2001) como cobertura detrítica ou laterítica. É possível analisar visualmente que as imagens de eTh e das duas razões supracitadas eqüivalem aos melhores produtos gamaespectrométricos para discriminação desta unidade.



Análise estatística também foi empregada para avaliar o potencial das imagens gamaespectrométricas na diferenciação de regolitos frente às unidades litológicas existentes na área de estudo. Assim, a partir das cinco imagens produzidas por Silva (2003), vinte e oito pontos amostrais foram selecionados para compor um banco de dados das variáveis K, eTh, eU, K/eU e eTh/K e, em seguida, a técnica Análise por Principais Componentes (APC) foi aplicada. A APC é uma técnica estatística usada para analisar inter-relações entre um número de variáveis, condensando-se as informações contidas nestas variáveis originais em um conjunto menor de variáveis com perda mínima de informações (Hair et al, 1998). As componentes principais são apresentadas na ordem decrescente de variabilidade, sendo que a última componente caracteriza-se pela menor contribuição que explica a variabilidade total dos dados originais. 0 foco da APC para a redução da dimensionalidade dos dados torna possível identificar padrões nos dados que anteriormente não são visualizados por possuírem alta correlação entre os mesmos. Os autovetores representam a contribuição de cada variável original a cada componente principal (PC) e podem ser positivos ou negativos devido ao reposicionamento da origem da distribuição das n variáveis.

A APC foi empregada utilizando-se uma matriz de correlação para produção de autovetores apresentados na Tabela 2, assim como a informação de porcentagem de variância associada a cada uma das componentes principais (PCs) geradas, as quais são caracterizadas pelos valores contínuos (escores) mostrados na Tabela 3. Nota-se que a PC1 caracteriza-se por maior contribuição positiva das variáveis eTh e razão eTh/K e pela contribuição negativa das variáveis K e razão K/eU, além de equivaler a 60,832% da variância dos dados originais (Tab. 2). Tal componente principal mostra-se a mais interessante para a discriminação de regolitos, pois menores valores de K e da razão K/eU e altos de eTh e da razão eTh/K são característicos dos mesmos. A segunda componente principal (PC2) é marcada por maior contribuição positiva das variáveis K, eTh e eU e representa 30,530% da variância dos dados originais. Diferentemente da PC1, a segunda componente principal dá informação relevante para a distinção de rochas ígneas ácidas e básicas, observando-se que altos valores nos três radioelementos citados tendem a ser observados com o aumento do conteúdo de silica da rocha (cf, Dickson & Scott, 1997). As demais componentes principais não apresentam informações associadas à discriminação de regolitos ou demais unidades geológicas da área em estudo, e são caracterizadas por menores variâncias dos dados amostrais.

O classificador K-médias (MacQueen, 1967)foi utilizado para a geração de quatro classes a partir dos dados de escores das PCs (Tab. 3), similarmente à metodologia utilizada por Sancevero et al. (2008). Esta técnica compreende uma classificação não supervisionada que objetiva o agrupamento de dados similares, fato que produz melhor visualização dos mesmos. Este método trabalha com o cálculo de distâncias para realizar o agrupamento, sendo que ao usuário cabe a informação do número de classes desejadas. Desta forma, se k classes são definidas, então k diferentes conjuntos com a maior distinção possível entre eles serão discriminados (MacQueen, 1967).

Nesta abordagem, um gráfico dos escores da PC1 versus os escores da PC2 foi gerado com a indicação das classes produzidas pelo K-médias, conforme apresentado na Figura 3(b).

Integração de imagens multifonte e análise de perfis geofísicos

A imagem do SRTM foi retificada por meio do uso da folha topográfica Vila Mamãe Anã (1:250.000), utilizando-se 89 pontos de controle. Deste procedimento, obteve-se um erro quadrático médio de 11,59 m.

Essa imagem foi integrada com imagens aerogamaespectrométricas, especificamente, optando-se pela composição colorida das imagens da razão eTh/K, do SRTM e de eTh, respectivamente, associadas aos canais RGB. A análise deste resultado, ilustrado num estudo de caso na Figura 4 em perspectiva 2,5 D, fortalece a questão da associação de ocorrências de coberturas detríticas ou lateríticas com maiores altitudes nesta região, em conjunto às maiores anomalias de eTh e da razão eTh/K.

Uma análise mais refinada das variáveis gamaespectrométricas eqüivale à verificação das respostas dos radioelementos em perfil das linhas de voo. O perfil mostrado na Figura 4 caracteriza-se por maior resolução dos dados gamaespectrométricos, uma vez que, para este aerolevantamento, há uma medida da radiação gama registrada a cada 55 m (Lasa Engenharia e Prospecções S.A., 1998). De forma geral, os valores observados para eTh e eU compreenderam cerca de 25 a 30 ppm e de 3 a 4 ppm, respectivamente, para as áreas de coberturas detríticas ou lateríticas mapeadas por Klein et al. (2001) (Fig. 4).

Uso de algoritmo hiperespectral

Criados originalmente para aplicação em dados de sensoriamento remoto de alta resolução espectral, algoritmos hiperespectrais com foco em classificações supervisionadas possuem destaque em diversos estudos de casos para exploração mineral. Dentre os mais utilizados nos últimos anos estão os algoritmos Spectral Feature Fitting (Clark et al, 1990), Spectral Angle Mapper (Kruse et al, 1993) e o Mixture Tuned Matched Filtering (Boardman et al, 1995). Assim como aplicados em trabalhos voltados ao sensoriamento óptico e do infravermelho termal (e.g., Kruse, 1998; Rowan & Mars, 2003), estes tipos de classificadores supervisionados também são passíveis de utilização em dados de outras naturezas, como os geoquímicos e geofísicos, conforme já registrado em trabalhos como os de Miethke et al. (2007) e Carrino et al. (2008a, b).

Neste artigo, o algoritmo Spectral Angle Mapper (SAM) foi selecionado para o realce de áreas de espesso regolito no leste do Estado do Amazonas. Este algoritmo baseia-se nas seguintes premissas (Kruse et al, 1993; Kruse, 1998):

- um conjunto de imagens é selecionado, e os pixels das mesmas são vetorizados. Para cada pixel, são extraídos os valores correspondentes das N bandas e armazenados em vetores-teste T, de tamanho 1 x N. Da mesma forma, os endmembers (assinaturas de referência), que no caso deste estudo compreendem respostas gamaespectrométricas e altimétricas, também são tratados como vetores R de tamanho 1 x N;

- realiza-se a comparação dos vetores endmember e pixels das imagens a partir da determinação subjetiva do ângulo de similaridade, em radianos. Este ângulo compreende o arco-cosseno (a) do produto escalar entre os vetores T e R, normalizado pelo produto de seus respectivos módulos. Os resultados de interesse correspondem aos menores valores do ângulo, pois implicam em maior semelhança da comparação dos vetores endmember e pixels das imagens;

- estes resultados são expressos por meio de imagens Rules (em níveis de cinza, e cujos pixels de menor valor significam maior similaridade do alvo mapeado na imagem com relação ao endmember), ou por meio de imagens classificadas pela determinação de uma cor específica a cada endmember.

No estudo de caso deste artigo, as imagens de altimetria (SRTM), de eTh, e das razões K/eTh e K/eU foram utilizadas como dados de entrada à aplicação da classificação SAM, e por tal, foram re-escalonadas para 8 bits e tiveram os pixels vetorizados. Desta maneira, foi extraída a assinatura típica de regolitos já mapeados, conforme ilustrado na Figura 5(a). Este endmember representativo e a seleção de um ângulo de similaridade de 0,11 radianos foram empregados, resultando em uma imagem classificada, conforme apresentado na Figura 5(b). A quantificação da área total classificada compreendeu 175,0571 km2.


Modelagem de dados espaciais

Da mesma maneira que na aplicação do SAM, para a modelagem de dados espaciais foram selecionadas as imagens de eTh, SRTM e das razões K/eTh e K/eU. As técnicas de modelagem espacial abordadas neste artigo -as lógicas booleana e fuzzy- estão inclusas nos modelos guiados pelo conhecimento que, por sua vez, baseiam-se nas hipóteses e conhecimentos obtidos por um expert (Bonham-Carter, 1994).

Lógica booleana

A lógica booleana compreende uma operação simples que trabalha com a combinação lógica de mapas binários a partir de operadores condicionais, de forma a supor uma hipótese determinada por um expert. A simplicidade do método booleano é observada pelo fato do resultado gerar as respostas de presença/ausência ou 1/0, sem possibilidades de "talvez" (Bonham-Carter, 1994). Por tal, este método não é tido como ideal para a pesquisa mineral, visto que as áreas determinadas não são variáveis em graus de favorabilidade.

Para suprir esta questão, o método booleano Index Overlay criado. Este método também baseia-se na combinação lógica de mapas binários. Entretanto, para cada mapa de entrada é atribuído um peso dependente da hipótese considerada. Cada mapa binário é multiplicado pelo fator peso, somado com os outros mapas, e normalizado pela soma dos pesos. O resultado final (mapa previsional) é caracterizado por uma variação de valores entre 1 e 0 (Bonham-Carter, 1994).

Neste estudo de caso, a lógica booleana Index Overlay foi aplicada a partir da transformação das imagens de entrada em binários, conforme ilustrado na Figura 6. Assim, os mapas de eTh e SRTM tiveram seus altos valores (associados com regolitos) transformados em 1 e os baixos valores em 0. Contrariamente, os mapas das razões K/eTh e K/eU foram codificados em 1 para áreas de baixos valores e 0 para regiões com altos valores (que não associam-se com ocorrências de regolitos). 0 passo seguinte consistiu na soma destes quatro mapas, aos quais foram designados os seguintes pesos: 1 para mapas binários de eTh e das razões K/eTh e K/eU; e peso 3 para o mapa binário da altimetria (SRTM), pois o condicionamento topográfico (platôs) compreende o fator preponderante no desenvolvimento de lateritos e outros produtos intempéricos (Fig. 6). 0 resultado final compreende o mapa previsional apresentado na Figura 7 para a porção sul da região em estudo, e o mapa da Figura 8, referente à porção norte. As respectivas quantificações das áreas classificadas estão mostradas nas Tabelas 4 e 5.




Lógica fuzzy

A lógica fuzzy compreende uma modelagem de dados espaciais na qual os dados (mapas) de entrada, previamente rasterizados, devem ser inicialmente simplificados por meio da fuzificação, ou seja, seleção de funções de pertinência fuzzy que permitem o escalonamento dos dados originais em graus de variabilidade entre 0 (pertinência ausente) e 1 (pertinência total). Desta maneira, o uso de uma função de pertinência fuzzy (e.g., small, large, near, entre outras) permite a modificação do mapa em dados ordenados ou intervalares, além de ser determinada de maneira subjetiva (Bonham-Carter, 1994).

Posteriormente, os valores de pertinência fuzzy são combinados por meio da escolha de operadores fuzzy, tais como: E, OU, produto algébrico, soma algébrica, fuzzy gama. Todos estes operadores podem ser revistos detalhadamente em An et al. (1991) e Bonham-Carter (1994).

O operador produto algébrico fuzzy consiste no produto entre mapas fuzificados, sendo o resultado final inferior ou igual à menor contribuição de valores de pertinência fuzzy dos mapas de entrada (Bonham-Carter, 1994). A Equação (1) mostra esta relação:

onde µi é a possibilidade fuzzy para o i-ésimo mapa, i = 1,2,..., n mapas fuzificados a serem combinados, e µproduto é a possibilidade fuzzy resultante (An et al, 1991; Bonham-Carter, 1994).

O operador soma algébrica fuzzy compreende a diferença de uma unidade em relação ao produtório das diferenças desta unidade e as possibilidades fuzzy dos mapas evidenciais a serem combinados. O resultado final equivale a valores superiores ou iguais à maior contribuição de valores de pertinência fuzzy dos mapas de entrada (An et al, 1991; Bonham-Carter, 1994). A Equação (2) apresenta esta relação matemática:

onde µsoma é a possibilidade fuzzy resultante (Bonham-Carter, 1994).

Com a finalidade de contrabalancear os efeitos minimizantes do produto algébrico fuzzy com os valores maximizantes do operador soma algébrica fuzzy, aplica-se o operador fuzzy gama, caracterizado pela ausência de influência tendenciosa para a seleção de alvos (Bonham-Carter, 1994) (Eq. 3):

onde γ é o parâmetro escolhido na variação entre 0 e 1. Quando γ é 1, a combinação fuzzy gama compreende o resultado da soma algébrica fuzzy. Quando γ é 0, o resultado final consiste somente na contribuição do produto algébrico fuzzy (An et al, 1991; Bonham-Carter, 1994).

Para o estudo de caso, a primeira etapa da aplicação da lógica fuzzy consistiu na fuzificação dos dados de entrada, com a aplicação da função pertinência fuzzy large aos mapas de eTh e SRTM, e da função pertinência fuzzy small' aos mapas das razões K/eTh e K/eU. Estes quatro mapas reescalonados foram combinados por meio do operado produto algébrico fuzzy e também pelo uso do operador soma algébrica fuzzy. Contrabalanceando estes dois resultados, foi selecionado o operador fuzzy gama 0,9 (generalização - contribuição aditiva alta) e 0,7 (restrição - contribuição aditiva baixa), gerando-se os mapas previsionais (Fig. 6).

Para a melhor visualização dos resultados gerados por meio das modelagens de dados espaciais, duas regiões (norte e sul) foram individualizadas conforme mostrado nas Figuras 7 e 8, e tratadas a partir da integração com o modelo digital de terreno do SRTM.

A quantificação das áreas classificadas por meio do uso dos operadores fuzzy gama 0,7 e 0,9 está mostrada nas Tabelas 4 e 5, respectivamente para as regiões sul e norte da área de estudo.

RESULTADOS

A análise dos dados aerogamaespectrométricos através de técnicas de estatística multivariada, no caso a APC e o K-médias (Fig. 3(b)), justifica o emprego de tal dado geofísico para a discriminação regional de assinaturas associadas a ocorrências de áreas com espessos regolitos. Observa-se que a classe 1 está relacionada com regolitos anteriormente mapeados por Klein et al. (2001) (indicados como a unidade detrítica ou laterítica), marcados por altos valores de eTh e da razão eTh/K, e baixos valores de K e da razão K/eU. Os regolitos, por sua vez, são bem distinguidos das demais classes associadas com metassedimentos do Grupo Jacareacanga (alto K e razão K/eU; baixo eTh e razão eTh/K), sedimentos da Formação Alter do Chão (baixo a médio K, eTh e razões K/eU eTh/K), rochas vulcânicas ácidas (Grupo Iriri), granitos Parauari e aluviões (médio a alto K e razão K/eU; médio eTh e razão eTh/K), rochas vulcânicas intermediárias (médio K e razão K/eU; baixo eTh e razão eTh/K) e rochas máficas da Suíte Intrusiva Ingarana (baixo a médio K e razão K/eU; médio eTh e razão eTh/K) (Fig. 3(b)). Isto demonstra que a aerogamaespectrometria consiste numa ferramenta útil à discriminação regional de regolitos através da análise visual (Figs. 3(a) e 4) e via estatística multivariada (Fig. 3(b)).

Juntamente com esse tipo de dado, a altimetria proveniente do SRTM se mostrou como uma importante ferramenta para a discriminação de espessos regolitos na região em estudo.

A caracterização dos mesmos através da combinação colorida falsa-cor (Fig. 4) indicou associação íntima de platôs com anomalias de alto eTh e da razão eTh/K e, com base na análise de perfil gamaespectrométrico, quantificou-se valores de eTh e eU de cerca de 25-30 ppm e 3-4 ppm, respectivamente (Fig. 4). Estes valores são similares aos observados em outras localidades do mundo para lateritos bauxíticos, conforme o banco de dados apresentado em Isles & Rankin (2000) e dados de pisólitos, ferricretes e gossans quantificados na Austrália (cf., Tab. 1).

O entendimento de que com a aerogamaespectrometria auxiliada pelos dados do SRTM é possível discriminar, coerentemente, áreas de espessos regolitos, torna-se potencialmente útil à aplicação de métodos de processamento digital de imagens e modelagens espaciais, conforme efetivado neste artigo.

Com relação à aplicação do algoritmo SAM, nota-se que a seleção do endmember mostrado na Figura 5(a) reafirma a caracterização gamaespectrométrica inicialmente descrita para regolitos. Adicionalmente, inclui-se a importante componente altimétrica (SRTM), que assinala altos valores para a ocorrência deste tipo de área. A imagem classificada produzida revelou áreas potenciais de espesso regolito anteriormente não reconhecidos, conforme observado por meio de setas na Figura 5(b).

Da mesma forma, a combinação de vários dados espaciais permitiu a produção de mapas previsionais de espessos regolitos, conforme mostrado nas Figuras 7 e 8. Os resultados mostrados para a área sul, por meio do uso das lógicas booleana (Index Overlay) e dos operadores fuzzy gama 0,9 e 0,7, foram, em partes, similares ao procedimento de combinação colorida e à análise de perfil geofísico (cf, Fig. 4), os quais também permitiram a identificação de áreas mais favoráveis. Ainda com respeito à área sul, foi possível, com base nas modelagens de dados espaciais guiadas pelo conhecimento, selecionar alvos não cartografados no atual mapa geológico disponível (cf, Fig. 1 (b)), estando estes indicados por meio de setas na Figura 7.

Outras áreas de menor extensão também foram reconhecidas na área norte, estando as principais e mais condizentes com a relação topográfica, assinaladas por meio de setas (Fig. 8).

Nota-se que a aplicação do operador fuzzy gama 0,7 restringiu mais as áreas selecionadas como favoráveis em relação ao uso do operador fuzzy gama 0,9, que gerou um efeito maximizante em ambas as áreas (norte e sul) (Figs. 7 e 8). Esta observação pode ser observada nas Tabelas 4 e 5, por meio da quantificação das áreas classificadas por intervalos de pertinência fuzzy. A análise da área total classificada com o valor de até 0,5 de pertinência fuzzy permite averiguar o caráter maximizante dos resultados proporcionados pela aplicação do operador fuzzy gama 0,9, em relação ao efeito minimizador do operador fuzzy gama 0,7. Estes resultados seguem os princípios teóricos que caracterizam tais operadores (cf, An et al, 1990; Bonham-Carter, 1994).

A utilização da lógica booleana Index Overlay também produziu mapas previsionais com efeitos maximizantes (cf, Tabs. 3 e 4). Entretanto, para a área norte, o método booleano (Fig. 8) correspondeu ao melhor resultado, pois caracterizou de maneira superior em relação aos mapas gerados pela lógica fuzzy as grandes unidades de regolitos já mapeadas (cf, Fig. 1 (b)), além dos alvos menores reconhecidos neste artigo. Este resultado é similar àquele produzido com a técnica SAM (Fig. 5(b)).

CONCLUSÕES

Este artigo ressalta que o emprego de dados aerogamaespectrométricos e altimétricos (SRTM) possui um papel relevante na discriminação de espessos regolitos na região amazônica, atuando como importante guia exploratório para investigação de áreas de possível ocorrência de mineralizações relacionadas a processos de enriquecimento superficial.

A aplicação de técnicas de estatística multivariada em dados aerogamaespectrométricos mostrou que é viável o uso de tal conjunto de dados para a discriminação dessas áreas, assim como a integração destes com os de altimetria SRTM. Em particular, para a área em apreço, as imagens do SRTM, eTh e das razões eTh/K e K/eU mostraram maior potencial para a discriminação de regolitos através de análise visual (cf, Fig. 4). De posse destas considerações, técnicas de processamento de dados e modelagens espaciais puderam ser utilizadas com sucesso para a determinação de áreas potenciais de maneira menos subjetiva que interpretações visuais.

Os resultados do uso do SAM e das modelagens de dados espaciais aplicadas neste artigo (Figs. 5,7 e 8) foram satisfatórios quanto ao reconhecimento das grandes áreas reconhecidas por ocorrência de espessos regolitos por Klein et al. (2001) (cf, Fig. 1(b)). Entretanto, cabe ressaltar que esta metodologia aqui aplicada deve ser utilizada com cautela, pois tanto o SAM quanto as modelagens guiadas pelo conhecimento são determinadas pela subjetividade do expert. No caso do SAM, este fato associa-se à determinação do ângulo de similaridade; no caso das modelagens, pela seleção do corte para transformação binaria dos dados e pelos pesos (lógica booleana), além dos valores de pertinência fuzzy e da escolha dos operadores e em qual ordem aplicá-los (lógica fuzzy).

O SAM e as modelagens guiadas pelo conhecimento, assim como qualquer outra que considere dados de entrada gamaespectrométricos, devem ser utilizados nas etapas iniciais de exploração mineral, visto que a informação geofísica aqui utilizada não irá corroborar diretamente com um potencial associado a metais específicos (e.g., bauxita laterítica, depósito de níquel laterítico, entre outros), mas servirá como uma importantíssima ferramenta de estudo prospectivo regional.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à CPRM-DIGEOF pela cessão dos dados aerogeofísicos. TA. Carrino agradece à CAPES pela bolsa de mestrado e ao Laboratório de Geofísica Aplicada (UnB) pelo apoio técnico. A.M. Silva e N.F Botelho agradecem ao CNPq pela bolsa de produtividade em pesquisa.

Recebido em 20 abril, 2009 /Aceito em 27 dezembro, 2010

Received on April 20, 2009 /Accepted on December 27, 2010

NOTAS SOBRE OS AUTORES

Thais Andressa Carrino. Geóloga (UNICAMP, 2007) e Mestre em Geologia (UnB, 2010). Suas áreas de interesse são: processamento e interpretação de imagens de sensoriamento remoto e aerogeofísicas; sistemas de informações georreferenciadas; e modelagens de dados espaciais com foco em exploração de recursos naturais.

Adalene Moreira Silva. Engenheira Geóloga (1989) graduada pela Universidade Federal de Ouro Preto, Mestre (1992) e Doutora em Geologia (1999) pela Universidade de Brasília. Profissionalmente, atuou como pesquisadora do Serviço Geológico Americano (1997-1999), Professora Visitante da Universidade de Brasília (2000-2002), Pesquisadora (05/2002-04/2003) e Professora do Instituto de Geociências da UNICAMP (04/2003-10/2005). Atualmente, é Professora e Coordenadora de Extensão do Instituto de Geociências da Universidade de Brasília e Professora Colaboradora Voluntária do Instituto de Geociências da UNICAMP. Desenvolve projetos sobre novas técnicas de processamento, interpretação e integração de dados aplicados à exploração mineral, hidrogeologia e ambiente. É bolsista de produtividade do CNPq.

Nilson Francisquini Botelho. Possui graduação em Geologia pela Universidade de Brasília (1981), mestrado em Geologia pela Universidade de Brasília (1984) e doutorado em Geologia - Université de Paris VI (Pierre et Marie Curie, 1992). Atualmente é Professor Titular da Universidade de Brasília. Tem experiência na área de Geociências, com ênfase em Mineralogia, Petrologia e Metalogenia, atuando principalmente nos seguintes temas: granito, alteração hidrotermal, ouro, cobre, estanho e outros metais raros. Desenvolve projetos de pesquisa nos estados de Goiás, Tocantins e Amazonas e nas províncias minerais de Carajás e do Tapajós.

Alexandre Augusto Cardoso da Silva. Geólogo (2000) e Mestre (2003) pela Universidade de Brasília com ênfase, neste último, em geologia regional e prospecção de ouro utilizando dados magnéticos e gamaespectrométricos. Trabalha como geofísico na Petróleo Brasileiro S.A. desde 2002, principalmente na área de inversão sísmica e sísmica 4D.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Ago 2011
  • Data do Fascículo
    Mar 2011

Histórico

  • Recebido
    20 Abr 2009
  • Aceito
    27 Dez 2010
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