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Prevalência e fatores associados à dor lombar em escolares

Prevalence of lower back pain and associated factors in students

Resumos

O objetivo foi verificar a prevalência de dor lombar em adolescentes e sua relação com a prática de esportes e atividades sedentárias. Realizou-se um estudo transversal com 1.236 escolares das 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental de Bauru, São Paulo, Brasil. Foram utilizados um protocolo estruturado e o questionário nórdico de sintomas musculoesqueléticos. A análise foi realizada mediante uma abordagem descritiva, bivariada e multivariada por regressão logística binária. Notou-se que a prevalência de dor lombar foi de 19,5%, sendo 7% nos meninos e 12,5% nas meninas, com diferença estatisticamente significante entre os gêneros (p < 0,00001), a faixa etária (p = 0,0057) e prática de esportes (p = 0,0001). Na análise bivariada e multivariada, observaram-se associações independentes entre dor lombar e o gênero feminino, horas na frente da TV e prática de esportes. A dor lombar em escolares pode ter consequências importantes para dores crônicas em adultos, e a compreensão das relações entre as variáveis oferecerá elementos úteis de medidas visando à manutenção, à melhora e à promoção do bem-estar dos estudantes.

Dor Lombar; Estudantes; Adolescente; Fatores de Risco; Prevalência


The objective was to determine the prevalence of lower back pain in adolescents and its relationship to sports and sedentary activities. We conducted a cross-sectional study of 5th to 8th-grade students (n = 1,236) in Bauru, São Paulo State, Brazil. We used a structured protocol and the Nordic questionnaire for musculoskeletal symptoms. The analysis was performed using a descriptive approach and bivariate and multivariate binary logistic regression. Prevalence of lower back pain was 19.5% (7% in boys and 12.5% in girls), with statistically significant differences according to gender (p < 0.00001), age (p = 0.0057), and sports (p = 0.0001). Bivariate and multivariate analyses showed independent associations between lower back pain and female gender, time watching TV, and sports. Lower back pain in schoolchildren can persist as chronic pain in adults. Understanding the relationships between variables should provide useful measures for maintaining, improving, and promoting students' wellbeing.

Low Back Pain; Students; Adolescent; Risk Factors; Prevalence


ARTIGO ARTICLE

Prevalência e fatores associados à dor lombar em escolares

Prevalence of lower back pain and associated factors in students

Alberto De Vitta; Mariana Gonçalez Martinez; Nathália Toledo Piza; Sandra Fiorelli de Almeida Penteado Simeão; Nathália Pascucci Ferreira

Universidade do Sagrado Coração, Bauru, Brasil

Correspondência Correspondência: A. De Vitta Universidade do Sagrado Coração. Rua Irmã Arminda 10-50, Bauru, SP 17011-160, Brasil. albvitta@yahoo.com.br

ABSTRACT

The objective was to determine the prevalence of lower back pain in adolescents and its relationship to sports and sedentary activities. We conducted a cross-sectional study of 5th to 8th-grade students (n = 1,236) in Bauru, São Paulo State, Brazil. We used a structured protocol and the Nordic questionnaire for musculoskeletal symptoms. The analysis was performed using a descriptive approach and bivariate and multivariate binary logistic regression. Prevalence of lower back pain was 19.5% (7% in boys and 12.5% in girls), with statistically significant differences according to gender (p < 0.00001), age (p = 0.0057), and sports (p = 0.0001). Bivariate and multivariate analyses showed independent associations between lower back pain and female gender, time watching TV, and sports. Lower back pain in schoolchildren can persist as chronic pain in adults. Understanding the relationships between variables should provide useful measures for maintaining, improving, and promoting students' wellbeing.

Low Back Pain; Students; Adolescent; Risk Factors; Prevalence

RESUMO

O objetivo foi verificar a prevalência de dor lombar em adolescentes e sua relação com a prática de esportes e atividades sedentárias. Realizou-se um estudo transversal com 1.236 escolares das 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental de Bauru, São Paulo, Brasil. Foram utilizados um protocolo estruturado e o questionário nórdico de sintomas musculoesqueléticos. A análise foi realizada mediante uma abordagem descritiva, bivariada e multivariada por regressão logística binária. Notou-se que a prevalência de dor lombar foi de 19,5%, sendo 7% nos meninos e 12,5% nas meninas, com diferença estatisticamente significante entre os gêneros (p < 0,00001), a faixa etária (p = 0,0057) e prática de esportes (p = 0,0001). Na análise bivariada e multivariada, observaram-se associações independentes entre dor lombar e o gênero feminino, horas na frente da TV e prática de esportes. A dor lombar em escolares pode ter consequências importantes para dores crônicas em adultos, e a compreensão das relações entre as variáveis oferecerá elementos úteis de medidas visando à manutenção, à melhora e à promoção do bem-estar dos estudantes.

Dor Lombar; Estudantes; Adolescente; Fatores de Risco; Prevalência

Introdução

A dor lombar tornou-se um grave problema de saúde pública, pois possui alta incidência na população economicamente ativa, em adolescentes e crianças 1. A prevalência de dores lombares em crianças de 9 a 10 anos é similar a da população adulta 2. Em um estudo longitudinal com adolescentes de 12 a 15 anos, foi observado que a incidência anual de sintomas musculoesqueléticos na coluna vertebral foi de 21,5% 3. Em outro estudo com 1.389 escolares dinamarqueses de 13 a 16 anos, foi constatado que 19,4% apresentaram dores na coluna lombar 4.

Ainda na Dinamarca, outra pesquisa com escolares apontou que a incidência de dor lombar foi de 33% em crianças de 8 a 10 anos e 47% em adolescentes de 14 a 16 anos 5. Em estudo similar que observou 254 meninas na faixa etária de 8 a 16 anos, notou-se que 31,4% apresentaram dor na coluna lombar 6.

Os fatores de risco para o desenvolvimento de dores lombares são multifatoriais, tais como o gênero, antropometria (altura e peso corporal), diminuição da flexibilidade e mobilidade dos músculos, hipermobilidade, obesidade, psicossociais, participação em esportes de competição; o peso, tipo e modo de carregar a mochila; hábitos posturais incorretos; atividade ocupacional após o período escolar; atividades sedentárias (tempo na frente da TV e no computador e/ou videogame); nível de atividade física e tabagismo 7.

De acordo com alguns estudos, as atividades sedentárias (tempo na frente da TV e no computador e/ou videogame) são fatores associados a dores lombares. Adolescentes com maior prevalência de dores na coluna lombar são os que passam maior tempo na frente da TV 8. Crianças de nove anos que assistem à televisão ou jogam videogame por mais de duas horas ao dia apresentaram mais dores na coluna lombar 9.

Em relação à participação em esportes de competição, estudos concluíram que essa prática é um importante fator de risco para dores na coluna lombar em escolares 10,11.

A relevância de estudos sobre a prevalência de dores lombares em escolares reside no fato de que essas patologias geram consequências sociais e econômicas, tanto para o Estado como para os indivíduos. Para o sujeito, significa a perda da qualidade de vida, e, para o Estado, as despesas com tratamento e reabilitação.

Dessa forma, considerando os estudantes de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental municipal da cidade de Bauru, São Paulo, Brasil, o objetivo deste trabalho foi verificar a prevalência de dor lombar em adolescentes e sua relação com a prática de esportes de competição e atividades sedentárias (tempo na frente da TV e no computador e/ou videogame).

Materiais e métodos

Foi realizado um estudo epidemiológico observacional, transversal, no ano letivo de 2007, cuja variável dependente foi a dor na coluna lombar, e as independentes foram a prática de esportes de competição e atividades sedentárias (tempo na frente da TV e no computador e/ou videogame).

A quantidade de alunos matriculados no ensino fundamental, no ano de 2007, na cidade de Bauru, foi obtida na Diretoria de Ensino dessa cidade, órgão ligado à Secretaria Estadual de Educação. De acordo com esse órgão, havia 26.067 estudantes, sendo 14.985 (57,5%) matriculados na rede estadual, 9.750 (37,4%) em escolas particulares e 1.332 (5,1%) na municipal.

Considerando esses percentuais, foram sujeitos da pesquisa todos os escolares matriculados no ensino fundamental (5ª a 8ª séries) de todas as escolas municipais de Bauru (5 unidades). Tal escolha deveu-se à disponibilidade de acesso à rede municipal devido a um convênio firmado entre a Universidade do Sagrado Coração e a Secretaria Municipal de Educação de Bauru. Essa situação não se repetiu nas escolas particulares e estaduais.

A Secretaria Municipal de Educação de Bauru emitiu uma carta de autorização. Os pais dos alunos foram informados sobre todas as etapas do estudo, o caráter voluntário da participação, a possibilidade de seu filho abandonar a pesquisa a qualquer momento e o direito ao sigilo dos dados individuais e assinaram o termo de consentimento. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Sagrado Coração (processo nº. 119/06).

Os pesquisadores realizaram a coleta de dados no período de fevereiro a maio de 2007, contando com a colaboração das professoras de cada classe, que enviavam um estudante de cada vez para responder o questionário. A cada aluno, eram explicados os objetivos do estudo, e, em seguida, o pesquisador realizava a entrevista estruturada, questão por questão, sendo que cada abordagem individual teve um tempo despendido de, aproximadamente, vinte minutos.

As variáveis independentes foram coletadas por meio do questionário 4, composto das seguintes questões: idade (11, 12, 13 e 14 anos); sexo; "Você pratica modalidade esportiva de competição fora da escola?" (sim/não); "Em uma semana normal de aula, você assiste à TV?" (sim/não); "Em uma semana normal de aula, quantas vezes você assiste à TV?" (uma vez, duas vezes, três vezes, quatro vezes, cinco vezes ou mais por semana); "Em um dia normal de aula, quantas horas você assiste à TV?" (menos de uma hora, duas horas, três horas, quatro horas, cinco horas ou mais por dia); "Em uma semana normal de aula, quantas vezes usa o computador ou videogame em casa?" (uma vez, duas vezes, três vezes, quatro vezes, cinco vezes ou mais por semana); "Em um dia normal de aula, quantas horas usa o computador ou videogame em casa?" (menos de uma hora, duas horas, três horas, quatro horas, cinco horas ou mais por dia).

As variáveis "número de vezes na semana e quantidade de horas ao dia que assiste à TV" e "número de vezes na semana e quantidade de horas ao dia que utiliza o computador" foram geradas a partir das uniões das variáveis "número de vezes que assiste à TV na semana" e "quantidade de horas que assiste à TV ao dia" e "número de vezes que utiliza o computador na semana" e "quantidade de horas que utiliza o computador ao dia", respectivamente. O motivo de tal junção se deve à associação entre as mesmas quanto ao aspecto da presença ou não da dor. As variáveis foram categorizadas da seguinte forma: até 2 vezes e até 2 horas; até 2 vezes e acima de 2 horas; mais de 2 vezes e até 2 horas; mais de 2 vezes e acima de 2 horas.

A variável dependente - dor na coluna lombar - foi observada por meio do questionário nórdico, adaptado para a cultura brasileira 12. A dor lombar foi definida como dor ou desconforto nos últimos 12 meses não relacionada à trauma ou à dor menstrual. No momento da entrevista, foi realizada a seguinte pergunta aos escolares: "Você teve dor na coluna lombar (parte inferior das costas) no último ano?". Para maior especificidade sobre o local da dor, além do questionamento verbal, foi apresentada uma imagem das regiões da coluna vertebral, em diferentes cores, para que identificassem a região lombar. Esse tipo de ferramenta é válido e confiável para medir dor em escolares, pois os torna capazes de ser muito específicos na localização da dor 13.

Considerando a multiplicidade das variáveis investigadas, o amplo universo de escolas e alunos, o instrumento de investigação e as características da equipe, foi realizado (abril de 2006), previamente, um estudo piloto com 35 alunos da quinta série, com a finalidade de averiguar a exequibilidade do projeto (evidenciando suas dificuldades a fim de minimizá-las) e promover o treinamento dos pesquisadores, reduzindo a possibilidade de tendenciosidade na coleta de dados. A linguagem simples dos questionários facilitou sua utilização em crianças e adolescentes.

Os dados obtidos foram introduzidos em um banco de dados e submetidos ao programa estatístico SPSS, versão 10.0 (SPSS Inc., Chicago, Estados Unidos). A análise foi realizada mediante uma abordagem descritiva e outra analítica. Na abordagem descritiva, foram feitas as distribuições de frequências absoluta e relativa para variáveis categóricas, e média e desvio-padrão, para as variáveis contínuas. Na abordagem analítica, foram realizadas uma análise bivariada por meio do teste de Pearson e, em seguida, uma análise multivariada por regressão logística binária, utilizando análise hierarquizada. O método de introdução das variáveis nos modelos adotados foi o backward stepwise. Considerou-se um nível de significância de 5% e intervalo de 95% de confiança (IC95%), com cálculo dos odds ratios ajustados 14,15.

Resultados

A população total de escolares matriculados, no ano de 2007, nas salas de 5ª a 8ª séries de todas as escolas municipais de Bauru, totalizando 5 unidades, era de 1.332. Desse total, 1.236 responderam o questionário, e 96 se recusaram a participar do estudo, representando 7,2% de perdas.

Considerando os dados acima, dos 1.236 escolares que responderam o questionário, 596 eram do sexo masculino, e 640, do feminino. Desses, 340 cursavam a 5ª série, sendo 166 do sexo masculino e 174 do feminino; 323 a 6ª série, sendo 145 masculinos e 178 femininos; 312 estavam matriculados na 7ª série, sendo 148 do sexo masculino e 164 do feminino, e 261, matriculados na 8ª série, sendo 137 do sexo masculino e 124 do sexo feminino.

Na Tabela 1, nota-se a distribuição dos estudantes por faixa etária, participação na aula de educação física, prática de esportes e atividades sedentárias, segundo o sexo. Em relação à idade, observa-se que há maior porcentagem de meninos com 14 anos (34,5%) e de meninas com 13 anos (28,2%).

Quanto à participação na aula de educação física, notou-se que 95,5% dos meninos e 92,9% das meninas realizam essa atividade escolar, enquanto que 46,8% dos meninos e 45,8% das meninas frequentam alguma modalidade esportiva fora da escola.

De acordo com as respostas dos estudantes, verificou-se que os esportes mais praticados fora do ambiente escolar pelo sexo feminino são natação (20,3%), futebol (10,9%) e basquetebol (10,4%) e, pelo masculino, são o futebol (15%) e voleibol (14,5%).

Quanto às atividades sedentárias (tempo na frente da TV e no computador e/ou videogame), verificou-se que 593 meninos (99,4%) e 635 meninas (99,2%) assistem à TV. Em relação ao número de vezes na semana e quantidade de horas ao dia diante da tela da TV, 66,8% dos adolescentes e 70,9% das adolescentes passam mais de 2 vezes por semana e acima de 2 horas por dia utilizando esse equipamento.

No que diz respeito ao computador, 481 meninos (80,7%) e 439 meninas (68,3%) utilizam o equipamento, e, quanto ao número de vezes na semana e quantidade de horas ao dia de uso do mesmo, 38,7% dos meninos relataram que usam mais de duas vezes por semana e acima de 2 horas por dia, enquanto que 55,5% das meninas utilizam o computador/videogame até duas vezes por semana e até duas horas por dia.

A Tabela 2 indica que a prevalência de dor lombar nos escolares foi de 19,5%, sendo 35,6% nos meninos e 64,4% nas meninas, com diferença estatisticamente significante entre os gêneros (p = 0,0000014), assim como entre a faixa etária (p = 0,0057) e a prática de esportes (p = 0,0001).

A associação entre dor lombar e as atividades sedentárias mostrou significância estatística para os fatores de risco: horas na frente da TV (p = 0,0001) e número de vezes na semana associado à quantidade de horas ao dia diante da tela da TV (p = 0,0009) (Tabela 3).

Na análise de regressão logística multivariada, foi verificado, na Tabela 4, que os fatores associados com os sintomas na coluna lombar foram o gênero feminino, quantidade de horas que assiste à TV ao dia e a prática de esportes.

Discussão

A ocorrência e características dos sintomas musculoesqueléticos na coluna lombar em escolares das escolas municipais de uma cidade do interior do Estado de São Paulo em 2007 mostraram que a prevalência de dor lombar foi de 19,5%, sendo 7% nos meninos e 12,5% nas meninas; as meninas praticam natação, futebol e basquetebol, e os meninos, futebol e voleibol; que a maioria dos adolescentes passa mais de 2 vezes por semana e acima de 2 horas por dia utilizando computador ou TV, e os principais fatores associados com os sintomas na coluna lombar foram o gênero feminino, a quantidade de horas que assiste à TV ao dia e a prática de esportes.

Uma limitação do presente estudo, que necessita ser examinada, é o fato de que todos os mensuramentos foram baseados em autorrelatos. Devido à confidencialidade, não foram pesquisados, junto aos familiares, os dados relativos aos sintomas, práticas esportivas, frequência e horas na frente da TV/computador respondidos pelos escolares. Em alguns casos, pode ter ocorrido, principalmente sobre os sintomas, a dificuldade dos adolescentes em se lembrarem sobre a presença ou ausência dos mesmos após doze meses. Contudo, os apontamentos deste estudo são comparáveis aos da literatura específica.

Os resultados do presente estudo mostram que a prevalência de dores lombares (19,5%) é, em geral, semelhante às taxas registradas na literatura, as quais variam entre 13% e 64%. Nos estudantes de uma região do Kuwait 16, foi observado que 50,8% dos meninos e 64,7% das meninas relataram essa queixa, e, na Turquia, constataram que estava presente em 40,9% da população estudada 17. Em 204 adolescentes de Moçambique, foi notado que 13,5% referiram dor 18. Alguns estudos verificaram que 28,4%, 26% e 34% dos escolares relataram dor na coluna, respectivamente 19,20,21.

Essas variações nos relatos de dor podem ser relacionadas à definição de dor lombar, às diferenças entre populações, ao fator tempo, aos fatores psicológicos, como também a outros aspectos da personalidade das crianças.

Em relação ao gênero, pode-se notar que as meninas tiveram cerca de duas vezes mais chances de ter dor lombar do que os meninos. Os estudos 22,23,24 apontaram que as meninas apresentaram duas vezes mais chances de possuir dor em relação aos meninos. Nos adolescentes dinamarqueses 24, o risco foi 15% maior, e, nos escolares do Kuwait 25, as meninas apresentaram cerca de 40% maior risco para o desenvolvimento de dor em comparação aos meninos.

As diferenças entre os sexos podem ser explicadas por meio de algumas suposições. A primeira está relacionada à força física, que é menor nas mulheres do que nos homens, fazendo com que o gasto energético delas seja maior quando expostas à demanda de trabalho similar, aumentando o risco de sobrecarga musculoesquelética. Uma outra é de ordem psicossocial, pois se acredita que as mulheres se queixam com maior frequência do que os homens, ou seja, de acordo com essa linha, os contrastes resultam das diferenças na predisposição de homens e mulheres quanto a relatar as informações. Talvez as mulheres tenham mais permissão social para falarem sobre seus sintomas e sentimentos ou tenham uma capacidade de observação mais desenvolvida, devendo-se ambos os eventos a fatores sociais e educacionais 26.

Os esportes mais praticados fora da escola pelas meninas são a natação, o futebol e o basquetebol e, pelos meninos, são o futebol e o voleibol. Em escolares do Município de Niterói (Rio de Janeiro), os esportes mais praticados pelos meninos foram o futebol e a corrida, enquanto que, pelas meninas, foram a corrida e a dança 27. Na Noruega, os esportes mais praticados foram o handebol e o futebol 28. Uma possível explicação para tal fato está relacionada aos fatores culturais, no caso específico do futebol, enquanto as outras modalidades são populares entre estudantes de diferentes nacionalidades 29.

Como mencionado anteriormente, verificou-se a maior frequência de escolares utilizando a TV mais de 2 vezes por semana e acima de 2 horas por dia, e, quanto ao computador/videogame, o maior número de meninos acima de 2 horas ao dia e as meninas até 2 horas ao dia. Adolescentes noruegueses e dinamarqueses que assistem à TV e utilizam o computador por 3 horas diárias relataram maior prevalência de dor 4,28, enquanto que, nos escolares finlandeses, foi notada maior frequência de dor nos que utilizam o computador e assistem à TV de 2 a 3 horas por dia 30.

No presente estudo, a análise multivariada mostrou que o gênero feminino, quantidade de horas que assiste à TV ao dia e a prática de esportes são importantes preditores de dores na coluna lombar.

Os escolares que permaneciam em frente à TV acima de duas horas apresentaram quase duas vezes mais chances de possuir dor. Nos escolares que permaneciam por mais de duas horas, o risco de dor lombar foi de 1,27 (1,0-1,52) 1, e, em escolares noruegueses 28 e os de uma região do Kwuait 31, a taxa de risco foi 30% maior nos que permanecem mais de duas horas na frente da TV. Outros estudos não apontaram relação entre as mesmas 24,30.

Essa associação pode ser devido ao tempo prolongado na posição sentada e/ou posturas incorretas, mobiliário inadequado e mal organizado e/ou sedentarismo 1. A postura sentada gera várias alterações nas estruturas musculoesqueléticas dos diversos segmentos corporais. Aumenta em, aproximadamente, 35% a pressão interna no núcleo do disco intervertebral, estira todas as estruturas (ligamentos, pequenas articulações e nervos) da coluna vertebral, reduz a circulação de retorno dos membros inferiores e promove o desenvolvimento de processos inflamatórios nas estruturas osteomusculares com sintomatologia dolorosa associada 32.

Os escolares que praticam esportes fora da escola têm duas vezes e meia mais chances de possuir dor lombar. Estudos 13,17,31 indicaram associação significativa entre as práticas esportivas e dor lombar, permitindo, dessa forma, que os autores afirmassem que as atividades esportivas podem ser fator de risco para o surgimento desses sintomas na infância e na adolescência.

Tal fato pode ser justificado por um conjunto de fatores, tais como o tipo de esporte, o nível de exigência, a intensidade do treinamento e o grau de trauma agudo gerado pelo esporte, principalmente em crianças e adolescentes 13,33,34. Em contraposição, alguns pesquisadores têm mostrado que a participação em esportes não apresenta correlação com a prevalência de dores na coluna 21,22,28,35. Nessa linha de raciocínio, os autores consideram que a participação esportiva regular é protetora para o surgimento de sintomas musculoesqueléticos pelo fato de provocar mudanças fisiológicas nas estruturas musculares, aumentar a capacidade de suportar carga estática e repetitiva e pelos efeitos secundários (melhora do humor, autoeficácia, equilíbrio e habilidades).

As demais variáveis (uso da TV e do computador/videogame e quantidade de horas que assiste à TV ao dia ou usa o computador/videogame) não apresentaram resultados estatisticamente significantes. No entanto, a literatura enquadra essas variáveis como fatores de risco para a presença de sintomas em escolares.

Dessa maneira, os resultados do presente estudo mostraram que há predomínio da manifestação dos sintomas musculoesqueléticos (dor lombar) na coluna vertebral nas adolescentes e que há associação entre os sintomas e o sexo, a quantidade de horas que assiste à TV ao dia e a prática de esportes. Um ponto extremamente favorável deste estudo foi o número de indivíduos questionados com o mesmo nível socioeconômico, e uma contribuição importante é que dados dessa natureza e de outras que dela decorrerem possam melhorar a compreensão das relações entre as variáveis e oferecer elementos úteis ao planejamento de medidas visando à manutenção, à melhora e à promoção do bem-estar físico e psicológico dos estudantes.

Colaboradores

A. De Vitta contribuiu com a pesquisa, análise e interpretação dos dados e redação final. M. G. Martinez contribuiu com a pesquisa, análise e interpretação dos dados. N. T. Piza contribuiu com a pesquisa, análise e interpretação dos dados. S. F. A. P. Simeão contribuiu com a análise estatística e revisão crítica. N. P. Ferreira contribuiu com a coleta e interpretação dos dados.

Agradecimentos

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP; 08/56306-2).

Recebido em 15/Out/2010

Versão final reapresentada em 15/Abr/2011

Aprovado em 06/Mai/2011

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  • Correspondência:

    A. De Vitta
    Universidade do Sagrado Coração.
    Rua Irmã Arminda 10-50, Bauru, SP 17011-160, Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Ago 2011
    • Data do Fascículo
      Ago 2011

    Histórico

    • Aceito
      06 Maio 2011
    • Revisado
      15 Abr 2011
    • Recebido
      15 Out 2010
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