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Promoção da saúde: a construção social de um conceito em perspectiva comparada

RESENHAS BOOK REVIEWS

Maria de Fátima Lobato Tavares

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil. flobato@ensp.fiocruz.br

PROMOÇÃO DA SAÚDE: A CONSTRUÇÃO SOCIAL DE UM CONCEITO EM PERSPECTIVA COMPARADA. Rabello LS. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2010. 228p. ISBN: 978-85-7541-196-4

A compreensão sobre a promoção da saúde contemporânea em sua perspectiva política, isto é, em sua relação com o desenvolvimento social, requer redefinição das práticas de saúde, configurações de cenários e estratégias para mediação e/ou atuação intersetorial sobre os Determinantes Sociais de Saúde (DSS), ao lado de reconceitualização das necessidades em saúde. Além disso, traz como exigência uma nova concepção de Estado e de Política Pública no sentido de compromisso com os interesses coletivos e o bem comum e compartilhamento de recursos e responsabilidades com os diferentes atores.

O livro Promoção da Saúde: A Construção Social de um Conceito em Perspectiva Comparada, de Lucíola Santos Rabello traz importante contribuição para esse propósito, preenchendo relevante lacuna, principalmente se considerarmos que investigações e publicações com análise mais abrangente e debates, tais como suscitados pela autora, são ainda incipientes. O livro originado de sua tese de doutorado supera as limitações da delimitação de uma pesquisa ao buscar fundamentos na teoria social que permitisse vislumbrar a construção social deste conceito.

O capítulo introdutório, Como Abordamos a Promoção da Saúde, enfoca a polissemia do tema, tendo por base a proposta de promoção da saúde aprovada em Ottawa, Canadá (1986) e sua inserção no escopo das ciências sociais, como campo ainda em desenvolvimento, ao mesmo tempo em que busca iluminar seu entendimento como novo paradigma em saúde contrapondo-o ao paradigma flexneriano. Esta contraposição fundamenta-se na compreensão de que as mudanças da realidade social como expressão da qualidade de vida trazem a exigência da incorporação de conteúdos sociais mediante os pressupostos teóricos e metodológicos da promoção da saúde, em complementaridade à explicação biologicista. Neste sentido aborda a saúde como conceito de protagonismo que se expressa através da vitalidade física mental e social para a atuação frente aos desafios e às transformações sociais inserindo-se, portanto, na discussão sobre a transformação social, vis-à-vis políticas e ações integrais que radicalizem a questão da equidade, ao lado de possibilidades de desenvolvimento social, destacando a relevância do Estado e da Sociedade Civil para implementação de suas propostas, partindo da consideração da complexidade da realidade social e de suas múltiplas dimensões.

A Medicina como Instituição Social traz questões inovadoras para o debate, dentre elas a demonstração da necessidade de transformar seu caráter normativo em práxis inclusiva, o que significa a importância da articulação entre a dimensão pessoal e profissional da formação, a dimensão social e coletiva do exercício do processo de trabalho, e a relação complexa entre saberes teóricos e saberes construídos na ação. A proposta da Promoção da Saúde resgata a influência dos determinantes sociais e/ou recursos para a saúde na problemática saúde/doença/cuidado no entendimento de que a temática da saúde não é uma questão apenas técnica, mas social, e que a doença é socialmente construída, trazendo à tona a influência dos fatores econômicos, políticos, sociais, culturais, emocionais, biológicos e outros na gênese das doenças. Enfatiza também a necessidade de novas abordagens e rápidas mudanças em frente à crise e os problemas atuais da medicina sinalizando a relevância de sua revisão como instituição social, em várias dimensões, inserindo neste contexto a promoção da saúde entendida como qualidade de vida.

No capítulo 3, um outro mérito da obra de Rabello é a contextualização histórica do Estado em diferentes períodos possibilitando entendimento dos desafios das situações presentes a partir do caráter histórico e processual na constituição de saberes e práticas sociais em saúde e da instituição das políticas públicas, apresentando neste contexto estudo sobre a atenção primária e a Estratégia Saúde da Família no Brasil. Culmina com a reflexão - em perspectiva comparada - sobre a incorporação da proposta da promoção da saúde no Canadá e no Brasil, mediante análise das categorias de participação social, intersetorialidade e formas de gestão dentro da concepção de saúde enquanto qualidade de vida, assim como análise do processo organizacional dos dois países considerando os distintos marcos históricos.

O capítulo 4 - Estado de Arte da Promoção da Saúde em Países Desenvolvidos - traz breve memória sobre a incorporação da promoção da saúde mediante a chamada medicina da família considerando como principal ator social, o médico generalista, ao mesmo tempo em que destaca a questão economicista como principal indutora das reformas nestes países supracitados e que seguiram o modelo neoliberal. Contrasta ainda essa afirmação referindo que os pressupostos teóricos e metodológicos contidos na proposta da promoção da saúde como política na Carta de Ottawa recupera a Atenção Primária em Saúde. Finaliza este capítulo apresentando pesquisas sobre a Disciplina Medicina da Família que ressaltam descompasso entre as prioridades dos estudos acadêmicos e aquelas dos governos, bem como estudos relacionados à Atenção Primária à Saúde e Promoção da Saúde em três temáticas: (i) utilização da Atenção Primária à Saúde como base da atenção à saúde, (ii) dados de Sistemas Nacionais de Saúde com base na Atenção Primária à Saúde e Promoção da Saúde, e (iii) satisfação da população com seus sistemas de saúde. Além disso, sinaliza para a perspectiva da Cooperação Técnica em Promoção da Saúde pela Organização Mundial da Saúde.

Conclui que não há como assegurar a implementação da promoção da saúde pelos países, dados as resistências e o jogo de poder existente reconhecendo que a participação social efetiva mediante conhecimento sobre as políticas vigentes pode propiciar o empowerment capaz de mudar realidades iníquas. Advoga a Atenção Primária a Saúde como base da promoção da saúde na medida em que reoriente o sistema de saúde na direção de alcance da equidade, integralidade, defesa da causa da saúde, empowerment, referência e contra-referência.

Assim, contendo estudos de elevada qualidade científica o livro propicia material analítico e crítico relevante para identificação de fatores que intervêm no desenvolvimento das ações intersetoriais, bem como, dos desafios relacionados ao planejamento, à organização e ao gerenciamento das ações de promoção da saúde garantindo coerência entre propósitos e metas.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Out 2011
  • Data do Fascículo
    Set 2011
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