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Benefícios auxílio-doença concedidos aos trabalhadores empregados no ramo de carne e pescado no Brasil em 2008

Sick leave benefits for workers in the Brazilian meat and fish industries in 2008

Prestaciones sociales por enfermedad, concedidas por el Seguro Social, a los empleados en el sector de la carne y pescado en Brasil durante el año 2008

Resumos

Este estudo objetivou identificar fatores associados à incidência de concessão de benefícios entre trabalhadores na atividade de carne e pescado no Brasil. Foram estudados os benefícios auxílio-doença concedidos pela Previdência Social aos empregados em carne e pescado no Brasil em 2008. As incidências por 10 mil vínculos empregatícios foram estratificadas por sexo, idade, diagnóstico, atividade econômica, unidade federada, espécie e duração dos benefícios auxílio-doença. Foram concedidos 31.913 benefícios auxílio-doença, com incidência de 788,7. O ramo abate de bovinos, equinos, ovinos e caprinos apresentou a maior incidência (1.223,2); o pescado, a maior duração (61 dias) de benefícios auxílio-doença. As mulheres apresentaram maior incidência, enquanto os homens, maior duração de benefícios auxílio-doença. Os grupos Lesões, doenças osteomusculares e transtornos mentais representaram 67,2% dos benefícios auxílio-doença. Os diagnósticos mais incidentes foram as dorsopatias, hemorragia no início da gravidez e episódios depressivos. O ramo de atividade, sexo, e a idade representaram importantes fatores associados à incidência de benefícios auxílio-doença, sugerindo uma precarização das condições/relações de trabalho.

Previdência Social; Salários e Benefícios; Saúde do Trabalhor; Matadouros; Industria Pesqueira


This study aims to analyze factors associated with sick leave rates among workers in the meat, fish, and seafood industries in Brazil. The study analyzed all sick leave benefits granted by the country's social security system to workers in these industries in 2008. Incidence of sick leave per 10 thousand jobs was stratified by sex, age, diagnosis, job position, State, and nature and length of benefits. The study analyzed 31,913 sick leaves, with an annual incidence of 788.7. Meat processing and packaging showed the highest incidence, and fish and seafood processing and packaging showed the longest mean length of sick leave. Women showed a higher sick leave incidence, while men received longer average sick leaves. Injuries, musculoskeletal disorders, and mental disorders accounted for 67.2% of sick leaves. The most common diagnoses were lower back pain, first-trimester bleeding in pregnancy, and depression. The data suggest poor job protection and adverse working conditions in these industries.

Social Security; Salaries and Fringe Benefits; Occupational Health; Abattoirs; Fishing Industry


El objetivo del presente estudio fue identificar factores asociados a la incidencia de concesión prestaciones sociales por enfermedad a los trabajadores del sector cárnico y pesquero en Brasil. Se estudiaron las prestaciones sociales por enfermedad, concedidas por el Seguro Social, a los empleados de los sectores anteriormente mencionados durante el año 2008. Las incidencias por cada 10 mil empleados fueron estratificadas por sexo, edad, diagnóstico, actividad económica, departamento, tipo y duración de las prestaciones por enfermedad. Se concedieron 31.913 prestaciones sociales por enfermedad, con una incidencia de 788,7. El colectivo perteneciente a mataderos de ganado vacuno, equino, bovino y caprino presentó la mayor incidencia (1.223,2) y el de pesca la mayor duración (61 días de prestaciones sociales por enfermedad). Las mujeres presentaron una mayor incidencia, mientras los hombres una mayor duración de las prestaciones por enfermedad. Los grupos de lesiones, enfermedades osteomusculares y trastornos mentales representaron un 67,2% de los beneficios de auxilio por enfermedad. Los diagnósticos más incidentes fueron las dorsopatías, hemorragias en el principio de la gestación y episodios depresivos, según las ramas de la actividad ejercida, el sexo y la edad son importantes factores, sugiriendo precariedad en las condiciones de trabajo.

Seguridad Social; Salarios y Beneficios; Salud Laboral; Mataderos; Industria Pesquera


Introdução

A indústria frigorífica faz parte da indústria de transformação e representa um sistema contínuo de "desmontagem" do animal, o que torna o trabalho exaustivo e perigoso 11. Campoamor MM. Estudo da ocorrência de acidentes entre trabalhadores de uma indústria frigorífica do Estado de São Paulo [Dissertação de Mestrado]. Ribeirão Preto: Universidade de São Paulo; 2006.. Nessa atividade existem fortes indícios de precarização do emprego e das condições de trabalho 22. Vasconcelos MC, Pignatti MG, Pignatti WA. Emprego e acidentes de trabalho na indústria frigorífica em áreas de expansão do agronegócio. Mato Grosso, Brasil. Saúde Soc 2009; 18:662-72..

As condições de trabalho constituem importante fator para a incapacidade para o trabalho 33. Barbosa-Branco A, Bültmann U, Steenstra I. Sickness benefit claims due to mental disorders in Brazil: associations in a population-based study. Cad Saúde Pública 2012; 28:1854-66.. A maioria das empresas frigoríficas possuem fatores de risco que devem ser considerados no contexto da saúde do trabalhador e da incapacidade para o trabalho, como as características do processo produtivo, a organização de trabalho, as características socioeconômicas e educacionais, os sistemas de compensações e gratificações e as relações de poder entre empregador/empregado 44. Bonde JP, Mikkelsen S, Andersen JH, Fallentin N, Baelum J, Svendsen SW, et al. Prognosis of shoulder tendonitis in repetitive work: a follow up study in a cohort of Danish industrial and service workers. Occup Environ Med 2003; 60:E8..

Vários são os fatores de risco presentes nos ambientes de trabalho em frigoríficos, com destaque para agentes físicos (ruído, temperaturas extremas, umidade, vibração), biológicos, químicos e ergonômicos (força, repetitividade, posturas estereotipadas, linha de produção). Associados a esses existem fatores psicossociais relacionados tanto às características das condições de produção (elevada demanda de trabalho, longas jornadas, dessincronismo do ritmo biológico, baixa mecanização, equipamento de trabalho inadequado, baixa escolaridade, baixos salários), quanto à percepção de sofrimento no trabalho representado pela matança de animais, muitas vezes de formas cruéis, odor desagradável etc. Tais fatores psicossociais contribuem para o aumento da tensão psicológica, violência e angústia, traduzidos como sofrimento no trabalho 55. Dejours C, Abdoucheli E, JAyet C. Psicodinâmica do trabalho. São Paulo: Editora Atlas; 1994. , 66. Khalt M, Chau N. Social disparities in musculoskeletal disorders and associated mental malaise: findings from a population-based survey in France. Scand J Public Health 2010; 38:495-501..

Recentes estudos brasileiros sobre incapacidade para o trabalho no Brasil apontaram o ramo econômico fabricação de produtos alimentícios como o sexto na incidência de incapacidade para o trabalho (657,3/10 mil vínculos empregatícios) independentemente do grupo diagnóstico e da espécie de benefício; e quinto em acidentes do trabalho 33. Barbosa-Branco A, Bültmann U, Steenstra I. Sickness benefit claims due to mental disorders in Brazil: associations in a population-based study. Cad Saúde Pública 2012; 28:1854-66. , 77. Barbosa-Branco A, Souza WR, Steenstra IA. Incidence of work and non-work related disability claims in Brazil. Am J Ind Med 2011; 54:858-71. , 88. Vieira ER, Albuquerque-Oliveira PR, Barbosa-Branco A. Work disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private sector workers. BMJ Open 2011; 1:000003.. Quando considerado por grupos diagnósticos específicos como as doenças osteomusculares (176,9) 88. Vieira ER, Albuquerque-Oliveira PR, Barbosa-Branco A. Work disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private sector workers. BMJ Open 2011; 1:000003. e os transtornos mentais (62,6) 33. Barbosa-Branco A, Bültmann U, Steenstra I. Sickness benefit claims due to mental disorders in Brazil: associations in a population-based study. Cad Saúde Pública 2012; 28:1854-66., nesse ranking, ficou em 10º e 12º lugares, respectivamente.

Os benefícios auxílio-doença constituem-se num bom indicador das condições de saúde da população trabalhadora segurada, particularmente daqueles que resultam em condição clínica mais severa com afastamento maior de 15 dias e num maior risco para aposentadoria por invalidez e mortalidade 77. Barbosa-Branco A, Souza WR, Steenstra IA. Incidence of work and non-work related disability claims in Brazil. Am J Ind Med 2011; 54:858-71..

Este estudo objetivou identificar fatores associados à incidência de concessão de benefícios entre trabalhadores na atividade de carne e pescado no Brasil.

Métodos

Trata-se de um estudo epidemiológico de base populacional, baseado nos benefícios auxílio-doença concedidos pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) aos trabalhadores empregados no ramo de atividade econômica da indústria de transformação na fabricação de produtos alimentícios no sub-ramo de abate e fabricação de produtos de carne e da preservação do pescado e fabricação de produtos do pescado (carne e pescado), no Brasil, em 2008.

A população do estudo compreendeu todos os trabalhadores empregados nas atividades de carne e pescado, obtida pela média mensal dos registros de emprego declarados pelos empregadores ao Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), em 2008. Maiores detalhes sobre o cálculo da população e o processo de concessão dos benefícios auxílio-doença encontram-se descritos em outros estudos 33. Barbosa-Branco A, Bültmann U, Steenstra I. Sickness benefit claims due to mental disorders in Brazil: associations in a population-based study. Cad Saúde Pública 2012; 28:1854-66. , 77. Barbosa-Branco A, Souza WR, Steenstra IA. Incidence of work and non-work related disability claims in Brazil. Am J Ind Med 2011; 54:858-71. , 88. Vieira ER, Albuquerque-Oliveira PR, Barbosa-Branco A. Work disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private sector workers. BMJ Open 2011; 1:000003. , 99. Almeida PCA, Barbosa-Branco A. Acidentes de trabalho no Brasil: prevalência, duração e despesa previdenciária dos auxílios-doença. Rev Bras Saúde Ocup 2011; 36:195-207..

Os dados dos benefícios são provenientes do Sistema Único de Benefícios do INSS e compreenderam todos os benefícios auxílio-doença concedidos aos trabalhadores dos seguintes sub-ramos (Cadastro Nacional de Atividades Econômicas - CNAE-classe 10): 1011 - abate de bovinos, equinos, ovinos e caprinos - frigoríficos; 1012 - abate de suínos, aves e pequenos animais - frigoríficos; 1013 - fabricação de produtos de carne e preparo de subprodutos do abate; e 1020 - preservação do pescado e fabricação de produtos de pescado, iniciados no período de 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2008.

Os dados foram tabulados e analisados no programa Microsoft Office Excel (Microsoft Corp., Estados Unidos) e no IBM SPSS Statistics Standard versão 19 (IBM Corp., Armonk, Estados Unidos). A taxa de incidência (por 10 mil vínculos empregatícios) foi calculada pela soma dos benefícios auxílio-doença, dividida pela média mensal dos vínculos empregatícios em 2008.

A incidência de benefícios foi estratificada por sexo (masculino e feminino); idade (faixas etárias < 20; 20-29; 30-39; 40-49; 50-59; ≥ 60 anos); Classificação Internacional de Doenças - 10ª revisão (CID-10) (grupo, agrupamento e categoria diagnóstica); atividade econômica (CNAE-classe); Unidade Federativa (UF); e espécie de benefício (auxílio-doença previdenciário, auxílio-doença acidentário). A duração do benefício foi calculada por meio da curva de sobrevivência do benefício (Kaplan-Meier) e de medida de tendência central (mediana). A análise da duração dos benefícios auxílio-doença utilizou metodologia não paramétrica, devido à ausência de distribuição normal.

As distorções geradas por valores numéricos (n) muito pequenos, tanto para o CNIS (denominador) quanto para os benefícios (numerador), representam um viés de cálculo importante. Antes de fazer o ranking das prevalências, foram separadas da análise individual as CNAE-classe com CNIS menor que 500 trabalhadores e/ou menos de 20 benefícios, critérios esses independentes, definidos como parâmetros de corte. Esses dados foram agrupados na categoria "outros", consolidando o total de benefícios. Os resultados agrupados em "outros" não foram considerados na análise individualizada das categorias.

Aspectos éticos

Este projeto de pesquisa foi aprovado pelo Parecer Consubstanciado nº 135.115 do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) das Faculdades Integradas Aparício Carvalho, Porto Velho, Rondônia em 30/Out/2012.

Resultados

Em 2008, o INSS concedeu 31.913 benefícios auxílio-doença aos 404.636 trabalhadores das atividades de carne e pescado, que resultou em incidência de 788,7 benefícios/10 mil vínculos empregatícios. A incidência de benefícios previdenciários foi de 537,0 e a de benefícios acidentários foi de 251,7.

As variações de incidências entre o conjunto das unidades federativas foram de até 250%; as unidades da Região Sul do Brasil apresentaram as maiores taxas (Tabela 1).

Tabela 1
Prevalência * de benefícios auxílio-doença segundo atividade econômica Cadastro Nacional de Atividades Econômicas (CNAE-classe) e Unidade Federativa (UF) no sub-ramo carne e pescado. Brasil, 2008.

Quanto à CNAE-classe, observou-se (Tabela 1) grande variabilidade nas taxas de incidência de benefícios auxílio-doença, variando de 411,8 na fabricação de produtos de carne e preparo de subprodutos do abate (CNAE 1013) a 1.223,2 no abate de bovinos, equinos, ovinos e caprinos - frigoríficos (CNAE 1011). A incidência de BAD entre os trabalhadores da CNAE 1011 foi 55% superior à média do conjunto carne e pescado e 197% superior a do CNAE 1013 (fabricação de produtos de carne e preparo de subprodutos do abate).

Ao analisar esse indicador em relação ao CNAE-classe e à unidade da federação, encontrou-se maior incidência de benefícios auxílio-doença entre os trabalhadores de abate de bovinos, equinos, ovinos e caprinos - frigoríficos nos estados das regiões Sul e Sudeste, exceto no Espírito Santo e Rio de Janeiro, uma vez que nesses estados predominaram os benefícios auxílio-doença no ramo de pescado. O estado do Maranhão destacou-se por apresentar maiores incidências de benefícios auxílio-doença nos ramos de abate de suínos, aves e pequenos animais e no de fabricação de produtos de carne e preparo de subprodutos do abate.

A CNAE 1011 apresentou a maior incidência de benefícios, independentemente do diagnóstico, espécie de benefício, idade e de sexo. Essa CNAE, quando analisado segundo sexo e idade, mostrou maior incidência entre as mulheres (64%) do que entre os homens, com aumento progressivo com a idade. A maior caracterização de nexo técnico (relação com o trabalho) segundo a idade e a atividade econômica foi verificada na faixa etária menor que 20 anos, independente da CNAE-classe (Tabela 2).

Tabela 2
Prevalência * de benefícios auxílio-doença segundo atividade econômica Cadastro Nacional de Atividades Econômicas (CNAE-classe), espécie de beneficio, sexo e idade entre trabalhadores empregados no sub-ramo carne e pescado. Brasil, 2008.

A razão de incidência entre as espécies de benefícios nas diversas CNAE-classe apresentou discreta variação (máximo de 20%), independentemente do sexo, com predomínio de benefícios auxílio-doença previdenciário.

Esses dados mostram que os homens caracterizam mais agravos como relacionados com o trabalho do que as mulheres, exceto no ramo pescado (Tabela 3).

Tabela 3
Prevalência * de benefícios auxílio-doença concedidos aos trabalhadores empregados do sub-ramo de atividades de carne e pescado, segundo a atividade econômica Cadastro Nacional de Atividades Econômicas (CNAE-classe), sexo espécie de benefício. Brasil, 2008.

Ao analisar a incidência de benefícios auxílio-doença segundo os grupos (capítulos) da CID-10, observou-se que 67,2% dos benefícios foram em razão de apenas três grupos da CID-10: lesões; doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo; e transtornos mentais e comportamentais. Diferentes rankings de incidência para os grupos CID-10 foram encontrados para homens e mulheres, tanto para benefícios previdenciários quanto acidentários. Entre os benefícios previdenciários (B31), houve maior predomínio de lesões entre os homens e de doenças mentais entre mulheres, enquanto entre os benefícios acidentários (B91) as Lesões também predominaram entre os homens e as doenças osteomusculares e do tecido conjuntivo entre as mulheres. Ao considerar apenas benefícios auxílio-doença acidentários, as taxas foram mais elevadas entre as mulheres do que entre os homens (Tabela 4).

Tabela 4
Prevalência * de benefícios auxílios-doença segundo os capítulos da 10a revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-10), sexo e espécie de benefício no sub-ramo de carne e pescado. Brasil, 2008.

Chama a atenção a elevada razão de feminilidade (6,3:1,0) observada entre os sexos para o grupo das neoplasias. Nesse grupo, os benefícios auxílio-doença ficaram restritos aos benefícios previdenciários (Tabela 4).

A Tabela 5 apresenta a incidência de benefícios auxílio-doença segundo a categoria diagnóstica da CID-10 e mostra a preponderância das hemorragias do início da gravidez (55,3) das dorsopatias (50,8) e dos episódios depressivos (44,8), no entanto, se forem considerados os episódios depressivos (F32) e os transtornos depressivos recorrentes (F33), constata-se que a "depressão" representa a principal categoria diagnóstica, totalizando uma incidência de 57,1/10 mil vínculos empregatícios. Quanto às espécies de benefícios, observou-se que entre os previdenciários se destacaram as mesmas três categorias anteriores, enquanto entre os acidentários o destaque foi para lesões de ombro, dorsopatias e sinovite e tenossinovite.

Tabela 5
Prevalência * de benéficos auxílios-doença segundo a categoria diagnóstica CID-10, a espécie de benefício e a atividade econômica Cadastro Nacional de Atividades Econômicas (CNAE-classe) no sub-ramo de carne e pescado. Brasil, 2008.

Ao analisar esse conjunto de categorias diagnósticas segundo o sexo e a idade (Tabela 6), encontra-se que a diferença entre as faixas etárias no geral é maior no sexo feminino (58% comparada a 35% entre os homens), porém a tendência dessa diferença entre as faixas etárias foi semelhante em ambos os sexos. Foi possível identificar dois grupos de categorias: aquelas nas quais a influência da idade é clara e aquelas nas quais o avanço da idade parece não representar um fator de risco para o aumento da incidência, ou ainda nas quais ser mais jovem é que representa um fator de risco. Entre as categorias mais influenciadas pela idade destacam-se as dorsopatias, lesões do ombro, mononeuropatias dos membros superiores e varizes dos membros inferiores. Em todas essas categorias a incidência entre os trabalhadores com 40 ou mais anos foi no mínimo 100% maior do que entre aqueles com menos de 40 anos. Por outro lado, entre aquelas categorias que apresentaram pouca diferença ou que a incidência foi maior na faixa etária < 40 anos, merecem destaque os episódios depressivos, independentemente do sexo; fratura no nível do punho e da mão, tendinite e tenossinovite, e fratura da perna, incluindo o tornozelo (Tabela 6). Ao se fazer essa análise de forma mais específica em relação ao sexo e à idade, observou-se que entre homens jovens (< 40 anos) as maiores incidências decorreram das fraturas do punho e da mão (54,8%), das dorsopatias (33%) e das fraturas da perna, incluindo tornozelo (31,7%), enquanto entre os homens adultos (≥ 40 anos) predominaram as dorsopatias, hérnias inguinais e as lesões do ombro. Entre as mulheres as maiores incidências foram decorrentes de episódios depressivos, hemorragia do início da gravidez, e lesões do ombro, enquanto entre aquelas com 40 anos ou mais, foram as dorsopatias, lesões do ombro e as mononeuropatias dos membros superiores. Observa-se, portanto, a forte presença das lesões do ombro entre as causas clínicas de incapacidade para o trabalho, independentenebte do sexo e da idade (Tabela 6).

Tabela 6
Incidência * dos benefícios auxílio-doença segundo a categoria diagnóstica da 10a revisão da Classificação Internacional

Ao analisar a duração dos benefícios, utilizando-se da curva de sobrevivência de Kaplan-Meier, verificou-se que os benefícios concedidos ao sexo masculino apresentaram maior sobrevida quando comparados ao feminino, (p < 0,0001). Homens e mulheres apresentaram maior duração de benefício em diferentes espécies, sendo esta, entre os homens, maior entre os benefícios previdenciários, enquanto entre as mulheres foram mais longos nos acidentários. A diferença de duração entre as espécies de benefícios foram estatisticamente significativas (p < 0,0001) em ambos os sexos.

O ramo pescados apresentou maior sobrevida de benefícios auxílio-doença, independentemente do sexo do trabalhador e da espécie de benefício (p < 0,0001).

Mais de três quartos (80%) dos benefícios auxílio-doença receberam alta em até 100 dias. No geral, a mediana da duração dos benefícios foi de 52 dias, sendo esta maior entre os benefícios auxílio-doença acidentários (55 dias), e no ramo pescado, porém sem significância estatística.

Discussão

Este estudo mostrou que o coeficiente de incidência de benefícios auxílio-doença no ramo de atividade econômica de carne e pescado em 2008 foi quase o dobro daquela apresentada pela média dos trabalhadores empregados no Brasil 33. Barbosa-Branco A, Bültmann U, Steenstra I. Sickness benefit claims due to mental disorders in Brazil: associations in a population-based study. Cad Saúde Pública 2012; 28:1854-66., contudo são mais próximas das taxas de incidência de benefícios encontradas em países europeus como a Holanda 1111. Roelen CAM, Koopmans PC, Hoedeman R, Bültmann U, Groothoff JW, van der Klink JJ. Trends in the incidence of sickness absence due to common mental disorders between 2001 and 2007 in the Netherlands. Eur J Public Health 2009; 19:625-30. [1050,0] e na França 1212. Ferrie JE, Vahtera J, Kivimäki M, Westerlund H, Melchior M, Alexanderson K et al. Diagnose-specific sickness absence and all cause mortality in the GAZEL study. J Epidemiol Community Health 2009; 63:50-5. [1370,0], especialmente quando comparadas com as incidências apresentadas por atividade econômica como o abate de bovinos, equinos, ovinos e caprinos - e preservação e fabricação de produtos de pescado - Pescado.

Quando considerados os benefícios auxíliodoença de origem ocupacional (acidentária) no ramo Carne e Pescado, de certa forma, corrobora as particularidades e variedade dos fatores de risco presentes nesse ramo de atividade ao apresentar incidência de benefícios acidentários superior 2,7 vezes à média nacional dos trabalhadores empregados 77. Barbosa-Branco A, Souza WR, Steenstra IA. Incidence of work and non-work related disability claims in Brazil. Am J Ind Med 2011; 54:858-71. , 99. Almeida PCA, Barbosa-Branco A. Acidentes de trabalho no Brasil: prevalência, duração e despesa previdenciária dos auxílios-doença. Rev Bras Saúde Ocup 2011; 36:195-207..

As maiores incidências de benefícios nas UFs da Região Sul podem decorrer tanto de uma maior notificação quanto de condições inadequadas de trabalho. Um importante fator é a existência de uma maior concentração de grandes empresas (incluindo certo monopólio) do ramo nessa região geográfica. Algumas empresas da Região Sul do ramo de carnes e pescado têm, inclusive, sido alvo de denúncias por parte das instituições fiscalizadoras e sindicais em relação às péssimas condições/relações de trabalho, apontando uma verdadeira epidemia de agravos à saúde dos trabalhadores. Outras possibilidades que ajudam a explicar esse quadro é a maior conscientização dos trabalhadores, melhor nível de escolaridade, sindicalização e acesso à previdência social. Em outras regiões e unidades federativas onde ocorreram menores incidências de benefícios é possível que elas sofram o efeito dos vários filtros socioeconômicos 77. Barbosa-Branco A, Souza WR, Steenstra IA. Incidence of work and non-work related disability claims in Brazil. Am J Ind Med 2011; 54:858-71. , 1212. Ferrie JE, Vahtera J, Kivimäki M, Westerlund H, Melchior M, Alexanderson K et al. Diagnose-specific sickness absence and all cause mortality in the GAZEL study. J Epidemiol Community Health 2009; 63:50-5.. Quadro semelhante foi encontrado em estudo brasileiro de base populacional que incluiu todos os trabalhadores empregados no Brasil, o qual avaliou os benefícios auxílio-doença decorrente de doenças osteomusculares 88. Vieira ER, Albuquerque-Oliveira PR, Barbosa-Branco A. Work disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private sector workers. BMJ Open 2011; 1:000003.. Essa semelhança corrobora a tese de que esse é um fenômeno relacionado tanto à concessão de benefícios quanto a quadros de doenças ou ramos de atividades específicos.

As altas taxas de desemprego em 2008 e a falta de sindicatos fortes para proteger os direitos do trabalhador poderiam ter levado alguns trabalhadores a continuar trabalhando ou retornar ao trabalho antes de 15 dias, enquanto ainda doentes, a fim de evitar o benefício. A alta probabilidade de demissão no retorno ao trabalho, especialmente nos casos de benefícios previdenciários, e a dificuldade em encontrar outro emprego, em particular durante períodos de recessão econômica, também são importantes na decisão dos trabalhadores em solicitar ou não um benefício junto à Previdência Social, caracterizando assim o presenteísmo.

Apesar de as taxas desses sub-ramos de atividade se apresentarem bem acima da média nacional, é possível que ainda estejam subnotificadas. Tal suspeita se fortalece ao comparar essas taxas com as apresentadas em países desenvolvidos 1111. Roelen CAM, Koopmans PC, Hoedeman R, Bültmann U, Groothoff JW, van der Klink JJ. Trends in the incidence of sickness absence due to common mental disorders between 2001 and 2007 in the Netherlands. Eur J Public Health 2009; 19:625-30. , 1212. Ferrie JE, Vahtera J, Kivimäki M, Westerlund H, Melchior M, Alexanderson K et al. Diagnose-specific sickness absence and all cause mortality in the GAZEL study. J Epidemiol Community Health 2009; 63:50-5.. Se por um lado a instituição do Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP) 77. Barbosa-Branco A, Souza WR, Steenstra IA. Incidence of work and non-work related disability claims in Brazil. Am J Ind Med 2011; 54:858-71. , 1313. Barbosa-Branco A. O impacto do NTEP na caracterização dos acidentes de trabalho no Brasil. Revista CIPA 2008; 345:50-55. contribuiu para o aumento da caracterização da relação trabalho-doença, aumentando os benefícios acidentários, por outro, incentivou os empregadores a instituírem medidas "de saúde e segurança no trabalho" caracterizadas pela premiação coletiva de grupos específicos para os chamados "acidente zero", "zero dias perdidos", "afastamento zero" etc., nos quais está embutido o conceito da responsabilidade coletiva pelo afastamento.

A grande diferença (48%) entre as incidências de benefício auxílio-doença encontradas nas CNAE Carne-1011 e Pescado-1020 pode decorrer das características dos processos produtivos, da organização de trabalho, das características socioeconômicas e educacionais dos trabalhadores, dos sistemas de compensação e gratificações e das relações de poder entre empregador/empregado, caracterizadas particularmente pela presença/ausência de sindicatos fortes, oferta de empregos e grau de especificidade da atividade.

A incapacidade para o trabalho tem sido associada a diversos fatores psicossociais como a elevada demanda de trabalho físico, tensão psicológica, violência e angústia, recursos inadequados para o desenvolvimento do trabalho e a percepção de baixa qualidade de saúde física e psicológica, longa jornada de trabalho e trabalho em turnos com comprometimento do ciclo circadiano e baixo nível educacional. Esses fatores de risco associados ao estresse e outros transtornos mentais como depressão e ansiedade contribuem sobremaneira para a deterioração da funcionalidade física e mental 55. Dejours C, Abdoucheli E, JAyet C. Psicodinâmica do trabalho. São Paulo: Editora Atlas; 1994. , 66. Khalt M, Chau N. Social disparities in musculoskeletal disorders and associated mental malaise: findings from a population-based survey in France. Scand J Public Health 2010; 38:495-501..

Em relação às elevadas incidências de lesões e de doenças osteomusculares identificadas nesses ramos de atividades, é possível que fatores como a alta velocidade das linhas de produção de carne e frango e seus subprodutos, o manuseio de ferramentas afiadas, o esforço físico elevado, combinado com movimentos repetitivos e longas jornadas contribuam diretamente para a ocorrência delas 1414. Food Empowerment Project. Slaughterhouse workers. http://www.foodispower.org/slaughterhouse_workers.php (acessado em 10/Fev/2012).
http://www.foodispower.org/slaughterhous...
, 1515. Albuquerque PP, Settineri FS. Doenças do trabalho nos frigoríficos de carne: omissão e transferência de responsabilidade. Pelotas: CNTA-SUL, 2011. http://www.sticap.org.br/downloads/outros/Teias.pdf (acessado em 20/Jul/2011).
http://www.sticap.org.br/downloads/outro...
.

A automação e a mecanização em frigoríficos são restritas, em sua maioria, destinadas apenas ao levantamento e movimentação de animais abatidos, mas o corte e procedimentos de separação das partes permanecem como um trabalho físico braçal, com grande sobrecarrega muscular, sobretudo dos membros superiores e da região escapular do trabalhador 1616. Roto P, Kivi P. Prevalence of epicondylitis and tenosynovitis among meatcutters. Scand J Work Environ Health 1984; 10:203-5. , 1717. Elders LA, Heinrich J, Burdorf A. Risk factors for sickness absence because of low back pain among scaffolders: a 3-year follow-up study. Spine (Phila Pa 1976) 2003; 28:1340-6..

Todo o manuseio de produtos perecíveis, em especial em carne e pescado, obriga os trabalhadores a permanente corrida contra o relógio, visando diminuir o risco de deterioração e contaminação do produto, o que, associado a fatores como ambientes com inadequados níveis de iluminação, ruído e temperatura, frequente manipulação de instrumentos cortantes (faca, motosserra) e a exigência de intensa concentração durante a atividade pode influenciar, em grande escala, o quadro de saúde e segurança dos trabalhadores, e consequentemente, as taxas de incapacidade para o trabalho 1717. Elders LA, Heinrich J, Burdorf A. Risk factors for sickness absence because of low back pain among scaffolders: a 3-year follow-up study. Spine (Phila Pa 1976) 2003; 28:1340-6.. A organização do trabalho e o processo produtivo nos ramos de atividade estudados não permitem que o trabalhador tenha controle sobre seu modo de trabalhar, podendo tornar o trabalho extremamente estressante, o que contribui para o aumento do risco de agravos físicos e mentais no trabalhador, especialmente para a ocorrência de lesões e doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo identificadas neste estudo 33. Barbosa-Branco A, Bültmann U, Steenstra I. Sickness benefit claims due to mental disorders in Brazil: associations in a population-based study. Cad Saúde Pública 2012; 28:1854-66. , 44. Bonde JP, Mikkelsen S, Andersen JH, Fallentin N, Baelum J, Svendsen SW, et al. Prognosis of shoulder tendonitis in repetitive work: a follow up study in a cohort of Danish industrial and service workers. Occup Environ Med 2003; 60:E8. , 88. Vieira ER, Albuquerque-Oliveira PR, Barbosa-Branco A. Work disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private sector workers. BMJ Open 2011; 1:000003. , 1818. Rios AO, Rego RCF, Pena PGL. Doenças em trabalhadores da pesca. Rev Baiana Saúde Pública 2011; 35:175-88..

A elevada representatividade das Lesões, doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo e transtornos mentais e comportamentais, assim como a maior prevalência de lesões entre os homens e de doenças osteomusculares e de mentais entre as mulheres, encontradas neste estudo, são corroborados tanto pela literatura nacional 33. Barbosa-Branco A, Bültmann U, Steenstra I. Sickness benefit claims due to mental disorders in Brazil: associations in a population-based study. Cad Saúde Pública 2012; 28:1854-66. , 77. Barbosa-Branco A, Souza WR, Steenstra IA. Incidence of work and non-work related disability claims in Brazil. Am J Ind Med 2011; 54:858-71. , 88. Vieira ER, Albuquerque-Oliveira PR, Barbosa-Branco A. Work disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private sector workers. BMJ Open 2011; 1:000003. , 99. Almeida PCA, Barbosa-Branco A. Acidentes de trabalho no Brasil: prevalência, duração e despesa previdenciária dos auxílios-doença. Rev Bras Saúde Ocup 2011; 36:195-207. quanto internacional 44. Bonde JP, Mikkelsen S, Andersen JH, Fallentin N, Baelum J, Svendsen SW, et al. Prognosis of shoulder tendonitis in repetitive work: a follow up study in a cohort of Danish industrial and service workers. Occup Environ Med 2003; 60:E8. , 1919. Gluck JV, Oleinick A. Claim rates of compensable back injuries by age, gender, occupation, and industry. Do they relate to return-to-work experience? Spine (Phila Pa 1976) 1998; 23:1572-87. , 2020. Islam SS, Velilla AM, Doyle EJ, Ducatman AM. Gender differences in work-related injury/illness: analysis of workers compensation claims. Am J Ind Med 2001; 39:84-91. , 2121. Lindqvist K, Schelp L, Timpka T. Gender aspects of work-related injuries in a Swedish municipality. Safety Science 1999; 31:183-96. , 2222. Bekkera MHJ, Rutteb CG, Rijswijkc KV. Sickness absence: a gender-focused review. Psychol Health Med 2009; 14:405-18. , 2323. Silverstein B, Welp E, Nelson N, Kalat J. Claims incidence of work-related disorders of the upper extremities: Washington state, 1987 through 1995. Am J Public Health 1998; 88:1827-33..

Tanto os transtornos mentais quanto as doenças osteomusculares apresentam em sua maioria etiologia multifatorial, envolvendo características de natureza genética e psicossocial, além de fatores biomecânicos e podem agir como agentes sinérgicos no desenvolvimento/agravamento dessas enfermidades.

No ramo de atividade carne e pescado, dentre os fatores biomecânicos sabidamente presentes no processo de trabalho e associados ao desenvolvimento de distúrbios osteomusculares, destacam-se a alta repetitividade, elevação das mãos associada a peso e força, ausência ou limitação de pausas, alta demanda psicológica, baixo apoio social, movimentos de flexão/extensão, e de pronosupinação, assim como manuseio de ferramentas vibratórias 2424. Roquelaure Y, Ha C, Leclerc A, Touranchet A, Sauteron M, Melchior M, et al. Epidemiologic surveillance of upper-extremity musculoskeletal disorders in the working population. Arthritis Rheum 2006; 55:765-78..

O estresse relacionado com o trabalho pode contribuir para o aumento da criminalidade e ocorrências de outros transtornos mentais como depressão, ansiedade e distúrbios de humor, alcoolismo, abuso de drogas/dependência 2525. Fitzgerald AJ, Kalof L, Dietz T. Slaughterhouses and increased crime rates: an empirical analysis of spillover from 'The Jungle' into the surrounding community. Organization and Environment 2009; 22:158-84..

A natureza multifatorial e multidimensional da dor musculoesquelética tem sido objeto de vários estudos que demonstram que o estresse psicológico e outros sintomas somáticos estão relacionados com queixas de dores inespecíficas. Andersen et al. 2626. Andersen JH, Kaergaard A, Mikkelsen S, Jensen UF, Frost P, Bonde JP, et al. Risk factors in the onset of neck/shoulder pain in a prospective study of workers in industrial and service companies. Occup Environ Med 2003;60:649-54. estudaram os fatores de risco no local de trabalho para dores no ombro e pescoço em trabalhadores dinamarqueses. Destacaram-se os fatores físicos: as posturas inadequadas (o trabalho sentado e a flexão do pescoço), as tarefas manuais repetitivas (esforços repetitivos com o ombro elevado), a carga física elevada, e os fatores psicossociais: alto nível de estresse mental (demanda excessiva de trabalho, baixo controle sobre o trabalho, altos níveis de angústia). Esses fatores de risco são preditores do aparecimento de dores no pescoço e nos ombros nos trabalhadores.

Ao considerar apenas os benefícios acidentários, este estudo apresentou taxas mais elevadas entre as mulheres em carne e pescado, discordando dos resultados de outras pesquisas 22. Vasconcelos MC, Pignatti MG, Pignatti WA. Emprego e acidentes de trabalho na indústria frigorífica em áreas de expansão do agronegócio. Mato Grosso, Brasil. Saúde Soc 2009; 18:662-72. , 77. Barbosa-Branco A, Souza WR, Steenstra IA. Incidence of work and non-work related disability claims in Brazil. Am J Ind Med 2011; 54:858-71. , 99. Almeida PCA, Barbosa-Branco A. Acidentes de trabalho no Brasil: prevalência, duração e despesa previdenciária dos auxílios-doença. Rev Bras Saúde Ocup 2011; 36:195-207. , 2727. Nelson DI, Concha-Barrientos M, Driscoll T, Steenland K, Fingerhut M, et al. The Global burden of selected occupational diseases and injury risks: methodology and summary. Am J Ind Med 2005; 48:400-18.. Segundo Nelson et al. 2727. Nelson DI, Concha-Barrientos M, Driscoll T, Steenland K, Fingerhut M, et al. The Global burden of selected occupational diseases and injury risks: methodology and summary. Am J Ind Med 2005; 48:400-18., a carga de doenças, por causa da exposição ocupacional, nos países em desenvolvimento é maior para os homens, refletindo diferenças na exposição e atividades econômicas. A elevada incidência de benefícios auxílio-doença acidentários entre as trabalhadoras na atividade econômica de carne e pescado pode estar associada ao tipo de trabalho manual, principalmente aqueles com movimentos repetitivos e rotação do ombro e do tronco 11. Campoamor MM. Estudo da ocorrência de acidentes entre trabalhadores de uma indústria frigorífica do Estado de São Paulo [Dissertação de Mestrado]. Ribeirão Preto: Universidade de São Paulo; 2006. , 22. Vasconcelos MC, Pignatti MG, Pignatti WA. Emprego e acidentes de trabalho na indústria frigorífica em áreas de expansão do agronegócio. Mato Grosso, Brasil. Saúde Soc 2009; 18:662-72. , 88. Vieira ER, Albuquerque-Oliveira PR, Barbosa-Branco A. Work disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private sector workers. BMJ Open 2011; 1:000003. , 99. Almeida PCA, Barbosa-Branco A. Acidentes de trabalho no Brasil: prevalência, duração e despesa previdenciária dos auxílios-doença. Rev Bras Saúde Ocup 2011; 36:195-207. , 1616. Roto P, Kivi P. Prevalence of epicondylitis and tenosynovitis among meatcutters. Scand J Work Environ Health 1984; 10:203-5. , 1717. Elders LA, Heinrich J, Burdorf A. Risk factors for sickness absence because of low back pain among scaffolders: a 3-year follow-up study. Spine (Phila Pa 1976) 2003; 28:1340-6. , 2626. Andersen JH, Kaergaard A, Mikkelsen S, Jensen UF, Frost P, Bonde JP, et al. Risk factors in the onset of neck/shoulder pain in a prospective study of workers in industrial and service companies. Occup Environ Med 2003;60:649-54..

A maior ocorrência de incapacidade para o trabalho entre as mulheres e o aumento de tal ocorrência com a idade, encontrada neste estudo, é confirmada tanto pela literatura nacional 33. Barbosa-Branco A, Bültmann U, Steenstra I. Sickness benefit claims due to mental disorders in Brazil: associations in a population-based study. Cad Saúde Pública 2012; 28:1854-66. , 77. Barbosa-Branco A, Souza WR, Steenstra IA. Incidence of work and non-work related disability claims in Brazil. Am J Ind Med 2011; 54:858-71. , 88. Vieira ER, Albuquerque-Oliveira PR, Barbosa-Branco A. Work disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private sector workers. BMJ Open 2011; 1:000003. , 99. Almeida PCA, Barbosa-Branco A. Acidentes de trabalho no Brasil: prevalência, duração e despesa previdenciária dos auxílios-doença. Rev Bras Saúde Ocup 2011; 36:195-207. quanto internacional 44. Bonde JP, Mikkelsen S, Andersen JH, Fallentin N, Baelum J, Svendsen SW, et al. Prognosis of shoulder tendonitis in repetitive work: a follow up study in a cohort of Danish industrial and service workers. Occup Environ Med 2003; 60:E8. , 1111. Roelen CAM, Koopmans PC, Hoedeman R, Bültmann U, Groothoff JW, van der Klink JJ. Trends in the incidence of sickness absence due to common mental disorders between 2001 and 2007 in the Netherlands. Eur J Public Health 2009; 19:625-30. , 1919. Gluck JV, Oleinick A. Claim rates of compensable back injuries by age, gender, occupation, and industry. Do they relate to return-to-work experience? Spine (Phila Pa 1976) 1998; 23:1572-87. , 2020. Islam SS, Velilla AM, Doyle EJ, Ducatman AM. Gender differences in work-related injury/illness: analysis of workers compensation claims. Am J Ind Med 2001; 39:84-91. , 2121. Lindqvist K, Schelp L, Timpka T. Gender aspects of work-related injuries in a Swedish municipality. Safety Science 1999; 31:183-96. , 2222. Bekkera MHJ, Rutteb CG, Rijswijkc KV. Sickness absence: a gender-focused review. Psychol Health Med 2009; 14:405-18. , 2323. Silverstein B, Welp E, Nelson N, Kalat J. Claims incidence of work-related disorders of the upper extremities: Washington state, 1987 through 1995. Am J Public Health 1998; 88:1827-33..

Em geral, nessas atividades, homens e mulheres estão envolvidos em trabalhos com características de exigências e demandas mentais e emocionais distintas, que podem contribuir para o aumento do risco de incapacidade para o trabalho e, assim, para as diferenças de sexo observadas no afastamento do trabalho 2222. Bekkera MHJ, Rutteb CG, Rijswijkc KV. Sickness absence: a gender-focused review. Psychol Health Med 2009; 14:405-18..

Existem diferenças importantes nas condições de trabalho, sejam elas envolvendo aspectos físicos, psicológicos, familiares, ergonômicos, econômicos e organizacionais que podem explicar o diferencial entre os sexos 77. Barbosa-Branco A, Souza WR, Steenstra IA. Incidence of work and non-work related disability claims in Brazil. Am J Ind Med 2011; 54:858-71. , 1111. Roelen CAM, Koopmans PC, Hoedeman R, Bültmann U, Groothoff JW, van der Klink JJ. Trends in the incidence of sickness absence due to common mental disorders between 2001 and 2007 in the Netherlands. Eur J Public Health 2009; 19:625-30. , 1212. Ferrie JE, Vahtera J, Kivimäki M, Westerlund H, Melchior M, Alexanderson K et al. Diagnose-specific sickness absence and all cause mortality in the GAZEL study. J Epidemiol Community Health 2009; 63:50-5. , 2222. Bekkera MHJ, Rutteb CG, Rijswijkc KV. Sickness absence: a gender-focused review. Psychol Health Med 2009; 14:405-18.. Outros fatores específicos descritos por pesquisadores franceses 1111. Roelen CAM, Koopmans PC, Hoedeman R, Bültmann U, Groothoff JW, van der Klink JJ. Trends in the incidence of sickness absence due to common mental disorders between 2001 and 2007 in the Netherlands. Eur J Public Health 2009; 19:625-30. e holandeses 1212. Ferrie JE, Vahtera J, Kivimäki M, Westerlund H, Melchior M, Alexanderson K et al. Diagnose-specific sickness absence and all cause mortality in the GAZEL study. J Epidemiol Community Health 2009; 63:50-5. como exposição a abuso e violências doméstica, sexual, sejam físicas e/ou psicológicas, baixa renda, responsabilidade exclusiva pela criação e manutenção dos filhos, podem contribuir para essa maior incidências de benefícios entre as mulheres.

A maior incidência de transtornos de discos intervertebrais e outras entesopatias, assim como de lesões musculoesqueléticas entre as mulheres encontradas no presente estudo foram também identificadas em outros estudos 77. Barbosa-Branco A, Souza WR, Steenstra IA. Incidence of work and non-work related disability claims in Brazil. Am J Ind Med 2011; 54:858-71. , 88. Vieira ER, Albuquerque-Oliveira PR, Barbosa-Branco A. Work disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private sector workers. BMJ Open 2011; 1:000003. , 99. Almeida PCA, Barbosa-Branco A. Acidentes de trabalho no Brasil: prevalência, duração e despesa previdenciária dos auxílios-doença. Rev Bras Saúde Ocup 2011; 36:195-207. , 1212. Ferrie JE, Vahtera J, Kivimäki M, Westerlund H, Melchior M, Alexanderson K et al. Diagnose-specific sickness absence and all cause mortality in the GAZEL study. J Epidemiol Community Health 2009; 63:50-5..

A maior incidência de sinovite e tenossinovite apresentada pelas trabalhadoras do ramo pescado pode estar associada ao trabalho repetitivo e em baixas temperaturas comumente presentes nessa atividade. Por outro lado, a elevada prevalência de episódios depressivos entre os homens nesse ramo de atividade pode ser influenciada pelas características das atividades entre os sexos. Enquanto entre as mulheres predominam atividades de limpeza e processamento do pescado, entre os homens inclui, entre outras, a atividade de pesca, o que pode ser caracterizado por longos e repetidos períodos de isolamento social, além do risco constante de intempéries climáticas e outros perigos presentes nos rios e oceanos. O isolamento social tem sido apontado como importante fator de risco para o desenvolvimento/agravamento de episódios depressivos 2828. Allan J, Alston M, Dowling J, Ball P, Clifford A. Alcohol and drug use amongst fishing and farming workers: preliminary indications, perceptions and implications. In: 11th National Rural Health Conference; http://nrha.org.au/11nrhc/papers/11th%20NRHC%20Allan_Julaine_C7.pdf (acessado em 04/Abr/2013).
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A elevada incidência de neoplasias entre o sexo feminino e a ausência de nexo técnico nesse grupo de doenças pode ser melhor entendido ao considerar uma série de aspectos já destacados por outros autores. Corrêa 2929. Corrêa MJM. A construção social do silêncio epidemiológico do benzenismo: uma história negada [Dissertação de Mestrado]. Porto Alegre: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; 2008. infere a existência de um verdadeiro silêncio epidemiológico no câncer relacionado ao trabalho no Brasil. A invisibilidade do câncer relacionado ao trabalho pode ser avaliada pela irrisória participação das neoplasias relacionadas ao trabalho dentre os auxílios-doença acidentários concedidos pela Previdência Social. O lapso de tempo e o desconhecimento do assunto dificultam o nexo técnico e o seu registro adequado no sistema de notificação 3030. Instituto Nacional de Câncer. Diretrizes para a vigilância do câncer relacionado ao trabalho. Rio de Janeiro: Instituto Nacional de Câncer; 2012.. Acrescenta-se a esses fatores o fato de a incidência de câncer na população geral ser maior no sexo feminino do que no masculino, podendo influenciar muitos profissionais da saúde a perceberem o sexo (feminino) como um fator de risco mais importante do que a potencial exposição a agentes químicos ou outros riscos ocupacionais. Dessa forma, contribuem para aumentar a subnotificação da relação da doença com o trabalho.

Os homens adultos (≥ 40 anos) apresentaram maiores incidências em relação aos homens adultos jovens (< 40 anos). As incidências atingiram um pico de idade na faixa de 50-59 anos, seguindo os achados de trabalho holandês 1111. Roelen CAM, Koopmans PC, Hoedeman R, Bültmann U, Groothoff JW, van der Klink JJ. Trends in the incidence of sickness absence due to common mental disorders between 2001 and 2007 in the Netherlands. Eur J Public Health 2009; 19:625-30.. O aumento das prevalências dos benefícios e o envelhecimento que foi encontrada neste estudo reiteram pesquisas anteriores 77. Barbosa-Branco A, Souza WR, Steenstra IA. Incidence of work and non-work related disability claims in Brazil. Am J Ind Med 2011; 54:858-71. , 1212. Ferrie JE, Vahtera J, Kivimäki M, Westerlund H, Melchior M, Alexanderson K et al. Diagnose-specific sickness absence and all cause mortality in the GAZEL study. J Epidemiol Community Health 2009; 63:50-5. , 1616. Roto P, Kivi P. Prevalence of epicondylitis and tenosynovitis among meatcutters. Scand J Work Environ Health 1984; 10:203-5. , 1717. Elders LA, Heinrich J, Burdorf A. Risk factors for sickness absence because of low back pain among scaffolders: a 3-year follow-up study. Spine (Phila Pa 1976) 2003; 28:1340-6., demonstrando que a idade é forte fator de risco para a incapacidade para o trabalho.

O efeito da idade sobre a incapacidade para o trabalho parece ser mais claro para algumas categorias diagnósticas, tais como distúrbios osteomusculares, neoplasias e doenças do aparelho circulatório, em que o aumento com idade é evidente. Todavia, os transtornos mentais e lesões apresentaram padrões de idade de distribuição distintos 77. Barbosa-Branco A, Souza WR, Steenstra IA. Incidence of work and non-work related disability claims in Brazil. Am J Ind Med 2011; 54:858-71..

Segundo estudo brasileiro 88. Vieira ER, Albuquerque-Oliveira PR, Barbosa-Branco A. Work disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private sector workers. BMJ Open 2011; 1:000003., a prevalência de benefícios decorrentes de distúrbios osteomusculares foi de 93,6, sendo os quatro benefícios mais comuns aqueles devidos à lombalgia, discopatia intervertebral, sinovite/tenossinovite e distúrbios do ombro. A prevalência aumentou com a idade. A menor idade é fator de risco para doenças osteomusculares como dor lombar enquanto a idade avançada é fator de risco para dor em ombro e de pulso/mão (incluindo sinovite/tenossinovite).

Quando se analisaram os benefícios segundo o diagnóstico CID específico, o sexo, a idade e a espécie de beneficio, chamou a atenção a predominância de benefícios B91 para vários agravos à saúde, com destaque para as lesões do ombro, dorsopatias, sinovite e tenossinovite, fratura no nível do punho e da mão e síndrome do túnel do carpo. Resultados similares foram publicados por diversos autores nacionais e internacionais 11. Campoamor MM. Estudo da ocorrência de acidentes entre trabalhadores de uma indústria frigorífica do Estado de São Paulo [Dissertação de Mestrado]. Ribeirão Preto: Universidade de São Paulo; 2006. , 22. Vasconcelos MC, Pignatti MG, Pignatti WA. Emprego e acidentes de trabalho na indústria frigorífica em áreas de expansão do agronegócio. Mato Grosso, Brasil. Saúde Soc 2009; 18:662-72. , 88. Vieira ER, Albuquerque-Oliveira PR, Barbosa-Branco A. Work disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private sector workers. BMJ Open 2011; 1:000003. , 1717. Elders LA, Heinrich J, Burdorf A. Risk factors for sickness absence because of low back pain among scaffolders: a 3-year follow-up study. Spine (Phila Pa 1976) 2003; 28:1340-6. , 3131. Kines P, Hannerz H, Mikkelsen KL, Tüchsen F. Industrial sectors with high risk of women's hospital-treated injuries. Am J Ind Med 2007;50:13-21..

A mediana da duração dos benefícios foi de 52 dias de afastamento do trabalho. Lipton et al. 3232. Lipton B, Porter K, Nelson G. Workers compensation temporary total disability indemnity benefit duration. https://www.ncci.com/nccimain/industryinformation/researchoutlook/pages/wc-temp-benefit-2012-upate.aspx (acessado em 07/Dez/2012).
https://www.ncci.com/nccimain/industryin...
estimaram que a mediana da duração dos benefícios nos Estados Unidos no ano de 2010 foi de 42 dias. Um estudo brasileiro 99. Almeida PCA, Barbosa-Branco A. Acidentes de trabalho no Brasil: prevalência, duração e despesa previdenciária dos auxílios-doença. Rev Bras Saúde Ocup 2011; 36:195-207. constatou a média de 59 dias em benefícios acidentários no Brasil no ano de 2008.

Comparativamente à pesquisa de Elders et al. 1717. Elders LA, Heinrich J, Burdorf A. Risk factors for sickness absence because of low back pain among scaffolders: a 3-year follow-up study. Spine (Phila Pa 1976) 2003; 28:1340-6., que estudou a duração de afastamentos em trabalhadores braçais holandeses, utilizando curvas de Kaplan Mayer, evidenciando que 76% dos trabalhadores haviam retornado ao trabalho em 35 dias, a mediana brasileira foi superior. Porém, essa diferença entre as durações apresentadas entre Brasil e Holanda pode decorrer da diferença entre os sistemas de pagamento de absenteísmo-doença/benefícios. Enquanto no Brasil o empregador paga os primeiros 15 dias de afastamento e a partir desse período essa responsabilidade passa para a previdência social, na Holanda, o empregador paga o benefício auxílio-doença por até dois anos, e no primeiro ano corresponde a 100% dos vencimentos. Baseado nesse elevado encargo, o empregador acompanha o tratamento e a recuperação do trabalhador, visando otimizar o retorno ao trabalho, o que inclui perícia com o médico do trabalho a cada 4-6 semanas 1111. Roelen CAM, Koopmans PC, Hoedeman R, Bültmann U, Groothoff JW, van der Klink JJ. Trends in the incidence of sickness absence due to common mental disorders between 2001 and 2007 in the Netherlands. Eur J Public Health 2009; 19:625-30.. Vale ressaltar que na Holanda os auxílios-doença são computados apenas a partir do 28º dia de afastamento 1111. Roelen CAM, Koopmans PC, Hoedeman R, Bültmann U, Groothoff JW, van der Klink JJ. Trends in the incidence of sickness absence due to common mental disorders between 2001 and 2007 in the Netherlands. Eur J Public Health 2009; 19:625-30.. Se forem considerados os períodos de benefício nos dois países, observa-se que a diferença entre as durações totais do afastamento é pequena (63 dias na Holanda x 67 dias no Brasil).

Os homens apresentaram mais benefícios auxílio-doença de longa duração, enquanto entre as mulheres predominaram os afastamentos de curta duração. Tais achados de benefícios auxílio-doença corroboraram com o estudo dos benefícios concedidos pelo INSS no Brasil em 2008 77. Barbosa-Branco A, Souza WR, Steenstra IA. Incidence of work and non-work related disability claims in Brazil. Am J Ind Med 2011; 54:858-71.. Resultados semelhantes foram também encontrados em estudos europeus 2222. Bekkera MHJ, Rutteb CG, Rijswijkc KV. Sickness absence: a gender-focused review. Psychol Health Med 2009; 14:405-18. , 3333. Laaksonen M, Martikainen P, Rahkonen O, Lahelma E. Explanations for gender differences in sickness absence: evidence from middle-aged municipal employees from Finland. Occup Environ Med 2008; 65:325-30..

Entre os homens, a duração foi maior entre os benefícios previdenciários - B31 (55 dias) do que entre os acidentários - B91, ocorrendo o contrário entre as mulheres, dentre as quais os benefícios acidentários (60 dias) apresentaram maior duração.

Ao analisar a duração dos benefícios, comparando entre si os CNAE-classe, foi encontrada a constante predominância da CNAE 1020 sobre os outros. A preservação do pescado e fabricação de produtos de pescado [CNAE 1020] apresentou sobrevida maior, isto é, uma duração maior de benefícios (61 dias), podendo indicar uma maior gravidade das doenças nessa atividade econômica.

As empresas com altas taxas de exigência, percepção da alta demanda de trabalho, baixo controle de trabalho e apoio social deficitário no local de trabalho foram associadas com a recuperação mais tardia e lenta das doenças incapacitantes, como lesões de ombro. Mas isso pode ser uma consequência e não uma causa da doença 44. Bonde JP, Mikkelsen S, Andersen JH, Fallentin N, Baelum J, Svendsen SW, et al. Prognosis of shoulder tendonitis in repetitive work: a follow up study in a cohort of Danish industrial and service workers. Occup Environ Med 2003; 60:E8..

A alta demanda de trabalho físico e os sintomas depressivos moderados a graves são fatores associados à maior duração da incapacidade para o trabalho e benefícios concedidos. Sabe-se que a violência e o medo no trabalho constituem importantes fatores de risco para diversas doenças mentais e a violência, podendo contribuir para aumento da prevalência e da gravidade de um transtorno mental, resultando em maior duração de benefícios por incapacidade observada entre os trabalhadores em frigoríficos e matadouros 33. Barbosa-Branco A, Bültmann U, Steenstra I. Sickness benefit claims due to mental disorders in Brazil: associations in a population-based study. Cad Saúde Pública 2012; 28:1854-66..

Outros fatores não estritamente médicos, como posição socioeconômica baixa, idade abaixo de 39 anos, expectativa alta de retorno ao trabalho e reposição de renda pelo INSS menor ou igual a 100% (salário mínimo), podem justificar em parte a menor duração dos benefícios com consequente retorno ao trabalho 3434. Souza NSS, Santana VS. Fatores associados à duração dos benefícios por incapacidade: um estudo de coorte. Rev Saúde Pública 2012; 46:425-34.. A associação entre a incapacidade para o trabalho e a idade tem sido reportada na maioria dos estudos e reflete tanto características intrínsecas quanto extrínsecas. Entre as intrínsecas destacam-se as comorbidades, decréscimo hormonal e alteração nas características de colágeno e elastina, típicas do envelhecimento humano 3535. Cheadle A, Franklin G, Wolfhagen C, Savarino J, Liu PY, Salley C, et al. Factors influencing the duration of work-related disability: a population-based study of Washington State workers' compensation. Am J Public Health 1994;84:190e6..

A maior limitação desta pesquisa está relacionada à população de estudo, que não compreendeu a totalidade da população trabalhadora, na medida em que excluiu os trabalhadores autônomos, os servidores públicos e os trabalhadores informais.

Conclusões

A atividade econômica carne e pescado possui importantes características ocupacionais que contribuem para as elevadas demandas de benefícios auxílio-doença junto à Previdência Social.

As taxas de incidência de benefícios apontam para fortes indícios da precarização do emprego e das condições de trabalho, e a maior duração de benefícios pode indicar tanto uma maior gravidade das doenças nesses setores produtivos, quanto uma assistência à saúde mais precária do que em outros ramos industriais.

Este trabalho fornece informações que podem ser úteis na implantação de políticas previdenciárias e de saúde do trabalhador a fim de reduzir as incapacidades para o trabalho e as consequências econômicas e sociais decorrentes.

Referências

  • 1
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan 2015

Histórico

  • Recebido
    17 Abr 2013
  • Revisado
    29 Jul 2014
  • Aceito
    08 Ago 2014
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