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Continuidade da gestão clínica entre níveis assistenciais: experiências dos usuários de uma rede municipal de saúde

Continuity of care between care levels: experiences of users in a municipal health network

Continuidad de la atención entre niveles asistenciales: experiencias de usuarios de una red municipal de salud

Resumos

Este estudo analisa as experiências dos usuários sobre a continuidade da gestão clínica entre níveis assistenciais. Trata-se de um estudo transversal, quantitativo, que utiliza dados de um inquérito realizado com 407 usuários de uma rede pública de saúde de Recife, Pernambuco, Brasil, nos anos de 2017 e 2018. As experiências sobre a continuidade da gestão clínica foram exploradas a partir de duas dimensões: coerência da atenção e acessibilidade entre níveis assistenciais. Os usuários apresentaram opiniões mais positivas sobre a coerência da atenção que sobre a acessibilidade. Quanto à coerência da atenção, a maioria dos usuários referiu que os médicos da atenção primária e da especializada concordam entre si quanto a diagnóstico, tratamento e recomendações, e que o médico da atenção primária encaminha ao especialista quando necessário. Apenas 43% dos usuários relataram existir colaboração entre os médicos para resolução dos seus problemas de saúde. Quanto à acessibilidade, a maioria dos usuários (77,2%) referiu um longo tempo de espera para a consulta com o especialista e menos da metade (48,9%) referiu demora para atendimento na atenção primária. Os resultados deste estudo coincidem com outras investigações e evidenciam a necessidade de fomentar estratégias para alcançar uma integração efetiva das redes assistenciais e assim conferir ao usuário uma maior continuidade dos cuidados em saúde.

Palavras-chave:
Rede de Cuidados Continuados de Saúde; Níveis de Atenção à Saúde; Continuidade da Assistência ao Paciente; Qualidade da Assistência à Saúde; Gestão Clínica


This study analyzes the experiences of users on the continuity of clinical management between care levels. This is a cross-sectional quantitative study that uses data from a survey conducted with 407 users of a public health network in Recife, Pernambuco State, Brazil, in 2017 and 2018. The experiences on the continuity of clinical management were explored from two dimensions: coherence of care and accessibility between levels of care. Users presented more positive opinions about coherence of care than accessibility. Regarding coherence of care, most users reported that primary and specialized care physicians agree on diagnosis, treatment, and recommendations, and that the primary care physician refers them to a specialist when necessary. Only 43% of users reported collaboration between physicians to solve their health problems. Concerning accessibility, most users (77.2%) reported a long waiting time for the consultation with a specialist and less than half (48.9%) reported delay for primary care. The results of this study coincide with other investigations and highlight the need to promote strategies for achieving effective integration of care networks and thus provide users with greater continuity of health care.

Keywords:
Delivery of Health Care; Health Care Levels; Continuity of Patient Care; Quality of Health Care; Clinical Governance


Este estudio analiza las experiencias de los usuarios sobre la continuidad de la gestión clínica entre los niveles asistenciales. Se trata de un estudio transversal, de carácter cuantitativo, realizado con datos de una encuesta aplicada a 407 usuarios de una red pública de salud en Recife, Pernambuco, Brasil, en los años de 2017 y 2018. Las experiencias sobre la continuidad de la gestión clínica fueron exploradas desde dos dimensiones: la consistencia de la atención y la accesibilidad entre niveles asistenciales. Los usuarios tenían opiniones más positivas sobre la consistencia de la atención que sobre la accesibilidad. En cuanto a la consistencia de la atención, la mayoría de los usuarios reportó que los médicos de atención primaria y de la atención especializada concuerdan entre sí en el diagnóstico, tratamiento y recomendaciones, y que los médicos de atención primaria realizan la derivación al especialista cuando necesario. Solamente el 43% de los usuarios reportaron percibir una colaboración entre los médicos para la búsqueda de soluciones a sus problemas de salud. Respecto a la accesibilidad, la mayoría de los encuestados (77,2%) refirió un largo tiempo de espera para la consulta con el especialista y menos de la mitad (48,9%) mencionó que tardaba la atención primaria. Los resultados de este estudio coinciden con el de otras investigaciones y muestran la necesidad de promover estrategias para lograr una efectiva integración de las redes de atención y, así, brindarle al usuario una mayor continuidad de la atención en salud.

Palabras-clave:
Prestación de Atención de Salud; Niveles de Atención de Salud; Continuidad de la Atención al Paciente; Calidad de la Atención de Salud; Gestión Clínica


Introdução

A oferta de cuidados contínuos e em tempo oportuno aos usuários é um dos principais desafios enfrentados pelos sistemas universais de saúde devido à insuficiente integração entre os serviços dos diferentes níveis assistenciais 11. Luján AIC, Rojas VG, Cinta DL, Juárez GR. Percepción sobre continuidade asistencial de usuários com enfermedades crónicas en dos redes de servicios de salud. Revista del Instituto de Salud Pública de la Universidad Veracruzana 2017; 13:7-24.. A descontinuidade da atenção é especialmente prejudicial aos pacientes acometidos por condições crônicas de saúde devido às características específicas dessas doenças, como o curso prolongado, a existência de múltiplas comorbidades, a necessidade de atendimento por diferentes prestadores de serviço e de um tratamento de abordagem integral e longitudinal, apoiada no autocuidado e na construção do vínculo com os usuários 22. Ollé-Espluga L, Vargas I, Mogollón-Pérez A, Soares-de-Jesus RPF, Eguiguren P, Cisneros AI, et al. Care continuity across levels of care perceived by patients with chronic conditions in six Latin-American countries. Gac Sanit 2020; 35:411-9..

Por sua vez, pacientes com condições crônicas de saúde estão mais vulneráveis aos problemas decorrentes da fragmentação assistencial, visto que interagem mais frequentemente com os sistemas de saúde 22. Ollé-Espluga L, Vargas I, Mogollón-Pérez A, Soares-de-Jesus RPF, Eguiguren P, Cisneros AI, et al. Care continuity across levels of care perceived by patients with chronic conditions in six Latin-American countries. Gac Sanit 2020; 35:411-9.,33. Vargas I, Garcia-Subirats I, Mogollón-Pérez AS, De Paepe P, da Silva M, Unger JP, et al. Patient perceptions of continuity of healthcare and associated factors. Cross-sectional study in municipalities of central Colombia and north-eastern Brazil. Health Policy Plan 2017; 32:549-62., estando mais sujeitos aos longos tempos de espera para o atendimento 44. Garcia-Subirats I, Vargas I, Mogollón-Pérez AS, De Paepe P, da Silva MR, Unger JP, et al. Barriers in access to healthcare in countries with different health systems. A cross-sectional study in municipalities of central Colombia and north-eastern Brazil. Soc Sci Med 2014; 106:204-13., aos baixos níveis de compartilhamento de informações clínicas entre os profissionais envolvidos no seu cuidado, às discordâncias nos acordos sobre sua gestão clínica 22. Ollé-Espluga L, Vargas I, Mogollón-Pérez A, Soares-de-Jesus RPF, Eguiguren P, Cisneros AI, et al. Care continuity across levels of care perceived by patients with chronic conditions in six Latin-American countries. Gac Sanit 2020; 35:411-9. e ao papel limitado da atenção primária à saúde (APS) na coordenação do cuidado em saúde 55. Doubova SV, Guanais FC, Pérez-Cuevas R, Canning D, Macinko J, Reich MR. Attributes of patient-centered primary care associated with the public perception of good healthcare quality in Brazil, Colombia, Mexico and El Salvador. Health Policy Plan 2016; 31:834-43.. Tais problemas podem levar ao agravamento do quadro clínico, inclusive possibilitando o aparecimento de comorbidades que podem elevar os custos assistenciais tanto para o sistema de saúde como para o próprio usuário, quando são evidenciadas deficiências no acesso e na resolutividade dos serviços 11. Luján AIC, Rojas VG, Cinta DL, Juárez GR. Percepción sobre continuidade asistencial de usuários com enfermedades crónicas en dos redes de servicios de salud. Revista del Instituto de Salud Pública de la Universidad Veracruzana 2017; 13:7-24..

O conceito de continuidade assistencial perpassa pela compreensão de diversos autores em diferentes campos do saber em saúde 66. Haggerty JL. Continuity of care: a multidisciplinary review. BMJ 2003; 327:1219-21.. Entretanto, para este estudo, a continuidade da atenção é compreendida como o grau de coerência e união das experiências no cuidado que o usuário percebe ao longo do tempo 77. Reid R, Haggerty J, Mckendry R. Defusing the confusion: concepts and measures of continuity of healthcare. Final report. Ottawa: Canadian Health Services Research Foundation; 2002.. Representa o modo como o indivíduo experimenta a conexão entre os serviços de saúde, percebendo o acesso adequado, o relacionamento entre os profissionais responsáveis pelo cuidado e o fluxo e a qualidade das informações que circulam entre os serviços e organizações 77. Reid R, Haggerty J, Mckendry R. Defusing the confusion: concepts and measures of continuity of healthcare. Final report. Ottawa: Canadian Health Services Research Foundation; 2002.,88. Amarilla DI, Puzzolo J, Colautti M, Pellegrini N, Rovere M. Percepción de los usuarios sobre la continuidad asistencial entre niveles de atención en la red de servicios de salud municipal de la ciudad de Rosario. Rev Salud Pública (Córdoba) 2020; 24:19-32..

Analisar a continuidade assistencial pela ótica dos usuários é essencial para melhorar a qualidade da atenção, visto que os pacientes são capazes de fornecer um quadro ampliado da assistência prestada, por meio das suas experiências de acesso aos serviços, e sobre os cuidados ofertados pelos diferentes prestadores durante o contínuo assistencial. O resgate de suas perspectivas possibilita a identificação de lacunas na coordenação assistencial, bem como de barreiras no acesso aos serviços, permitindo a sugestão de estratégias para melhoria 33. Vargas I, Garcia-Subirats I, Mogollón-Pérez AS, De Paepe P, da Silva M, Unger JP, et al. Patient perceptions of continuity of healthcare and associated factors. Cross-sectional study in municipalities of central Colombia and north-eastern Brazil. Health Policy Plan 2017; 32:549-62.,88. Amarilla DI, Puzzolo J, Colautti M, Pellegrini N, Rovere M. Percepción de los usuarios sobre la continuidad asistencial entre niveles de atención en la red de servicios de salud municipal de la ciudad de Rosario. Rev Salud Pública (Córdoba) 2020; 24:19-32..

Reid et al. 77. Reid R, Haggerty J, Mckendry R. Defusing the confusion: concepts and measures of continuity of healthcare. Final report. Ottawa: Canadian Health Services Research Foundation; 2002. distinguem três tipos de continuidade que identificam a percepção do paciente sobre: a continuidade da informação (se os profissionais conhecem a história clínica pregressa e se trocam informações); a continuidade da gestão clínica (se o usuário recebe atenção dos diferentes serviços de forma coordenada, complementar e sem duplicações); e a continuidade da relação (se existe uma relação profissionais-paciente sustentada ao longo do tempo).

A continuidade da gestão clínica, conforme o referencial teórico descrito, será abordada neste estudo pelas seguintes dimensões: (i) coerência da atenção, definida pela percepção do usuário quanto à colaboração e comunicação entre os profissionais dos distintos níveis, envolvendo também uma sequência adequada de cuidados entre os pontos de cuidado; e (ii) acessibilidade entre níveis, definida pela percepção dos usuários quanto ao uso oportuno dos serviços ao longo do contínuo assistencial, de acordo com suas necessidades 77. Reid R, Haggerty J, Mckendry R. Defusing the confusion: concepts and measures of continuity of healthcare. Final report. Ottawa: Canadian Health Services Research Foundation; 2002..

Apesar da importância atribuída à continuidade do cuidado em termos de redução dos gastos com saúde e hospitalizações 99. Bazemore A, Petterson S, Peterson LE, Bruno R, Chung Y, Phillips RL. Higher primary care physician continuity is associated with lower costs and hospitalizations. Ann Fam Med 2018; 16:492-7., do impacto na melhoria da qualidade de vida 1010. Chen HM, Tu YH, Chen CM. Effect of continuity of care on quality of life in older adults with chronic diseases: a meta-analysis. Clin Nurs Res 2017; 26:266-84. e na redução da mortalidade 1111. Gray DJP, Sidaway-Lee K, White E, Thorne A, Evans PH. Continuity of care with doctors - a matter of life and death? A systematic review of continuity of care and mortality. BMJ Open 2018; 8:e021161., ainda são escassos os estudos no contexto latino-americano 11. Luján AIC, Rojas VG, Cinta DL, Juárez GR. Percepción sobre continuidade asistencial de usuários com enfermedades crónicas en dos redes de servicios de salud. Revista del Instituto de Salud Pública de la Universidad Veracruzana 2017; 13:7-24.,33. Vargas I, Garcia-Subirats I, Mogollón-Pérez AS, De Paepe P, da Silva M, Unger JP, et al. Patient perceptions of continuity of healthcare and associated factors. Cross-sectional study in municipalities of central Colombia and north-eastern Brazil. Health Policy Plan 2017; 32:549-62.. As principais pesquisas apontam descontinuidades na coordenação da gestão clínica, com destaque para os problemas relacionados à acessibilidade e ausência de mecanismos formais de comunicação entre níveis 11. Luján AIC, Rojas VG, Cinta DL, Juárez GR. Percepción sobre continuidade asistencial de usuários com enfermedades crónicas en dos redes de servicios de salud. Revista del Instituto de Salud Pública de la Universidad Veracruzana 2017; 13:7-24.,88. Amarilla DI, Puzzolo J, Colautti M, Pellegrini N, Rovere M. Percepción de los usuarios sobre la continuidad asistencial entre niveles de atención en la red de servicios de salud municipal de la ciudad de Rosario. Rev Salud Pública (Córdoba) 2020; 24:19-32.,1212. Chávez JC, Martínez MS, Lara SCV, Mogollón-Pérez AS, Sabater J, Unger JP. La continuidade asistencial en las redes de servicios de salud. Estudio de caso de usuárias con cáncer de mama y diabetes mellitus tipo 2. In: Vázquez ML, Vargas IL, Mogollón-Pérez AS, da Silva MR, Unger JP, de Paepe P, editores. Redes integradas de servicios de salud en Colombia y Brasil. Un estudio de casos. Bogotá: Editorial Universidad del Rosario; 2018. p. 147-81.,1313. Silva MRF, Braga JPR, Moura JFP, Lima JTO. Continuidade assistencial a mulheres com câncer de colo de útero em redes de atenção à saúde: estudo de caso, Pernambuco. Saúde Debate 2016; 40:107-19.,1414. Silva MRF, Vasconcelos ALR, Nascimento AX, Brito ESV, Nascimento WS, Unger J-P. A continuidade assistencial nas redes de serviços de saúde. Estudo de caso de usuárias com câncer de mama e diabetes mellitus do tipo 2. In: Vázquez ML, Vargas IL, Mogollón-Pérez AS, da Silva MR, Unger JP, de Paepe P, editores. Redes integradas de servicios de salud en Colombia y Brasil. Un estudio de casos. Bogotá: Editorial Universidad del Rosario; 2018. p. 259-93.. Já no Brasil, a maioria dos estudos analisa a continuidade do cuidado como parte de uma avaliação da qualidade da APS 55. Doubova SV, Guanais FC, Pérez-Cuevas R, Canning D, Macinko J, Reich MR. Attributes of patient-centered primary care associated with the public perception of good healthcare quality in Brazil, Colombia, Mexico and El Salvador. Health Policy Plan 2016; 31:834-43.,1515. Almeida MHM, Pacheco S, Krebs S, Oliveira AM, Samelli A, Molini-Avejonas DR, et al. Avaliação da atenção primária em saúde por usuários com e sem deficiência. CoDAS 2017; 29:e20160225.,1616. Pinto LF, Harzeim E, Hauser L, D'Ávila OP, Gonçalves MR, Travassos P, et al. A qualidade da atenção primária à saúde na Rocinha - Rio de Janeiro, Brasil, na perspectiva dos cuidadores de crianças e dos usuários adultos. Ciênc Saúde Colet 2017; 22:771-81.,1717. Silva CB, Paula CC, Lopes LFD, Harzeim E, Magnago TSBS, Schimith MD. Atenção à saúde de criança e adolescente com HIV: comparação entre serviços. Rev Bras Enferm 2016; 69:522-31.,1818. Harzheim E, Pinto LF, Hauser L, Soranz D. Avaliação dos usuários crianças e adultos quanto ao grau de orientação para atenção primária à saúde na cidade do Rio de Janeiro, Brasil. Ciênc Saúde Colet 2016; 21:1399-408.,1919. Silva SA, Fracolli LA. Avaliação da assistência à criança na Estratégia de Saúde da Família. Rev Bras Enferm 2016; 69:54-61., verificando aspectos que influenciam na continuidade assistencial, como a formação do vínculo médico-paciente, a utilização e a acessibilidade aos serviços - aspectos da longitudinalidade -, sem, no entanto, abordar questões centrais como a colaboração e a comunicação entre níveis, e a coerência da atenção que é prestada.

Considerando os impactos negativos da fragmentação assistencial nos pacientes acometidos por doenças crônicas no Sistema Único de Saúde (SUS), bem como a importância de estudos que tratem da continuidade assistencial, este artigo se propõe a analisar as experiências de usuários acerca da continuidade da gestão clínica entre níveis de atenção em uma rede de saúde pública municipal.

Métodos

Este é um estudo transversal, quantitativo e descritivo, desenvolvido a partir da análise do banco de dados da pesquisa multicêntrica: Impacto de Estratégias de Integração da Atenção no Desempenho das Redes de Serviços de Saúde em Diferentes Sistemas de Saúde da América Latina (Equity-LA II), que avaliou a efetividade de diferentes estratégias de integração da atenção na melhoria da coordenação e da qualidade do serviço nas redes de atenção à saúde na América Latina 2020. Vázquez ML, Vargas I, Unger JP, Paepe P, Mogollón Perez AS, Samico I, et al. Evaluating the effectiveness of care integration strategies in different healthcare systems in Latin America: the EQUITY-LA II quasi-experimental study protocol. BMJ Open 2015; 5:e007037..

Para este artigo, o recorte refere-se à rede pública de saúde dos Distritos Sanitários (DS) III e VII do Município de Recife, Pernambuco, Brasil. Essa rede foi selecionada de acordo com os seguintes critérios: (i) prestação de um contínuo de serviços, incluindo ao menos a APS e a atenção especializada (AE); (ii) prestação de serviços a uma população definida; (iii) prestação de serviços em áreas urbanas de baixa renda; (iv) disposição em participar da pesquisa e implementar as intervenções necessárias; e (v) liderança com competência para implementar as estratégias planejadas.

Em 2017, o território correspondente aos DS III e VII possuía abrangência populacional de 326.121 habitantes, contando com 30 unidades de APS (unidades de saúde da família e unidades básicas tradicionais) e 12 unidades de AE (hospitais, maternidades, serviços de pronto atendimento, policlínicas e outras unidades especializadas). Possuía ainda 55 equipes de saúde da família, 38 equipes de saúde bucal, 17 equipes da estratégia de agentes comunitários de saúde e 4 equipes do núcleo ampliado de saúde da família 2121. Secretaria de Saúde do Recife. Plano Municipal de Saúde 2018-2021. Recife: Secretaria de Saúde do Recife; 2018..

A população deste estudo foi composta por usuários dos serviços de saúde da rede selecionada com mais de 18 anos de idade, acometidos por pelo menos uma doença crônica, e que tivessem se consultado nos últimos seis meses com um médico da APS e da AE pelo mesmo motivo (qualquer episódio agudo ou crônico de doença ou problema de saúde). Como a pesquisa Equity-LA II coletou dados em duas redes de saúde (uma rede caso e a outra, controle) de seis países da América Latina 2020. Vázquez ML, Vargas I, Unger JP, Paepe P, Mogollón Perez AS, Samico I, et al. Evaluating the effectiveness of care integration strategies in different healthcare systems in Latin America: the EQUITY-LA II quasi-experimental study protocol. BMJ Open 2015; 5:e007037., uma amostra de 388 pacientes foi estimada para cada rede de atenção à saúde, de forma a garantir a detecção de uma variação de 10% na experiência dos pacientes sobre a continuidade do cuidado entre as redes. O tamanho amostral considerou um poder estatístico de 80% (β = 0,20) e um nível de confiança bicaudal de 95% (α = 0,05) em contraste bilateral. Os usuários foram selecionados aleatoriamente nas salas de espera das unidades de APS, antes ou depois de receber o serviço pelo qual procuravam. Caso o usuário cumprisse os critérios de inclusão e aceitasse participar do estudo, o questionário era aplicado. Na rede de estudo, dos 3.308 usuários contactados, 407 (13,4%) foram entrevistados (Tabela 1).

Tabela 1
Composição da amostra de usuários na rede de estudo. Distritos Sanitários III e VII, Recife, Pernambuco, Brasil, 2017/2018.

A coleta de dados foi realizada no período de novembro de 2017 a janeiro de 2018, a partir da aplicação do questionário de continuidade entre níveis de atenção (CCAENA-BR 2017). Este instrumento foi adaptado em conteúdo e idioma e, posteriormente, submetido a um pré-teste, seguido de um estudo piloto, para avaliar a compreensão das questões, o ritmo, a duração da entrevista e outros possíveis problemas na sua aplicação. Informações detalhadas sobre o desenho e a estrutura dos questionários aplicados no estudo multicêntrico foram publicadas anteriormente 2222. García-Subirats I, Aller MB, Vargas I, Vázquez ML. Adaptación y validación de la escala CCAENA(r) para evaluar la continuidad asistencial entre niveles de atención en Colombia y Brasil. Gac Sanit 2015; 29:88-96.. Para assegurar a qualidade dos dados, procedeu-se à revisão de todos os instrumentos aplicados, seguida da supervisão de 20% dos questionários (selecionados aleatoriamente), na qual os usuários foram contactados novamente (por telefone ou presencialmente) para que algumas perguntas fossem repetidas e verificadas. Por fim, foi realizada a dupla digitação de todos os dados para minimizar erros na entrada das informações no banco. As inconsistências encontradas nessa fase foram reparadas pela checagem dos dados nos questionários.

Para caracterização da amostra, foram selecionadas variáveis das seções “Problemas de saúde” e “Dados de morbidade geral e sociodemográficos” do instrumento CCAENA-BR 2017: sexo, idade, nacionalidade, raça/cor autorreferida, tempo de residência na área sob responsabilidade da rede estudada, estado civil, nível de escolaridade, renda familiar no último mês, percepção de saúde autorrelatada, existência de plano privado de saúde, quantidade e prevalência de enfermidades crônicas de saúde. Com base no plano de análise da pesquisa Equity-LA II 2020. Vázquez ML, Vargas I, Unger JP, Paepe P, Mogollón Perez AS, Samico I, et al. Evaluating the effectiveness of care integration strategies in different healthcare systems in Latin America: the EQUITY-LA II quasi-experimental study protocol. BMJ Open 2015; 5:e007037., foram identificadas na seção “Percepção de continuidade entre níveis de atenção” as variáveis que apresentam as experiências dos usuários sobre a continuidade da gestão clínica entre níveis, de acordo com as suas dimensões (Quadro 1).

Quadro 1
Variáveis de interesse selecionadas e suas características, por dimensão da continuidade da gestão clínica.

A análise dos dados foi realizada por meio de estatística descritiva univariada e bivariada. Na análise univariada, foram obtidas tabelas de frequências absolutas e relativas para cada variável. As respostas coletadas por meio de escala Likert foram dicotomizadas: sempre e muitas vezes foram consideradas como “sim”, e poucas vezes e nunca foram consideradas como “não”. Para as variáveis abertas (“motivos para o não encaminhamento oportuno” e “motivos para a colaboração entre níveis”), as respostas foram agrupadas e categorizadas por meio de análise descritiva.

Foi construído um índice sintético de medição composto pelas sete variáveis quantitativas, cuja resposta encontra-se em formato de escala Likert (Concordância com a AE; Concordância com a APS; Encaminhamento à AE; Colaboração entre níveis; Tempo de espera para consulta com a AE; Tempo de espera para consulta com a APS; e Marcação da consulta pela disponibilidade do paciente). O índice foi calculado de forma que cada item da escala Likert foi avaliado de 0 a 3 pontos (0 - nunca; 1 - raramente; 2 - muitas vezes; e 3 - sempre). Os valores ausentes foram imputados com o valor médio de cada item dessas observações, com apenas um ausente para cada fator. As pontuações do item em cada fator foram somadas e divididas por sua pontuação mais alta possível. O índice foi transformado em uma variável categórica representando a alta percepção de continuidade da gestão clínica (mais da metade da pontuação máxima) ou a baixa percepção de continuidade da gestão clínica (menos da metade da pontuação máxima).

Para avaliar a existência de associação entre os fatores sociodemográficos (sexo, estado civil, raça/cor autorreferida, renda familiar no último mês, nível de escolaridade, usuário titular de plano privado de saúde) e de morbidade (percepção de saúde autorrelatada, cujos resultados foram agrupados em “muito bom ou bom” e “regular, ruim ou muito ruim”) da amostra com o índice sintético de percepção de continuidade da gestão clínica, além das tabelas cruzadas foram utilizados os testes de qui-quadrado e, quando necessário, o teste exato de Fisher. Também foram calculados os respectivos odds ratio (OR) e seus intervalos de confiança, com nível de 95% de confiança (IC95%). Durante as análises, foi considerado um nível de significância de 5%. Os dados foram processados no programa R, versão 4.0.0 (http://www.r-project.org).

Este estudo obedeceu aos preceitos éticos das Resoluções nº 466/2012 e nº 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde, sendo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Pernambuco (parecer nº 4.213.652/2020).

Resultados

Caracterização da amostra

A amostra de usuários foi composta por 407 entrevistados, brasileiros, de maioria feminina (83,1%), parda (56,8%), com 40 anos ou mais (86%), casada (43%). Quanto à escolaridade, predominou o nível Fundamental incompleto (47,9%), seguido do Ensino Médio completo (22,9%). A maioria dos usuários (51,4%) referiu que a renda mensal da família no último mês foi inferior a um salário mínimo. A maior parte (85,8%) relatou residir há mais de 10 anos na região. Quanto à percepção sobre o próprio estado de saúde, 58% dos usuários a consideraram como regular. A maioria (52,1%) afirmou ter pelo menos três doenças crônicas, sendo as mais prevalentes a hipertensão não complicada (59,5%), os distúrbios musculoesqueléticos (29,5%) e a diabetes não insulino-dependente (27,3%). Expressiva parcela dos respondentes (98,8%) referiu não possuir plano de saúde privado (Tabela 2).

Tabela 2
Características da amostra de usuários. Distritos Sanitários (DS) III e VII, Recife, Pernambuco, Brasil, 2017/2018.

Experiência dos usuários sobre a continuidade da gestão clínica entre níveis assistenciais

Quanto à coerência da atenção, a maioria dos usuários (72,2%) referiu que o médico da APS estava de acordo com diagnóstico, tratamento e recomendações dadas pelo especialista. A maioria (67,6%) também possuía opinião semelhante a respeito do especialista estar de acordo com as indicações do médico da APS. Cerca de 90% dos usuários referiram que o médico da APS o encaminhava ao especialista quando havia necessidade. Dentre os usuários que informaram que o médico da APS nem sempre realizavam os encaminhamentos ao especialista, 25,7% explicitaram a ausência de vagas (Tabela 3).

A respeito da colaboração entre níveis (Tabela 3), os usuários apresentaram opiniões divergentes, onde 43% acreditavam que os especialistas e os médicos da APS colaboravam entre si para resolver os seus problemas de saúde, e 47,7% acreditavam que essa colaboração não existia. Entre os usuários que afirmaram que os médicos não colaboravam entre si, os principais motivos apontados foram: os médicos não se comunicam (32%) e os médicos não se conhecem ou não têm contato (23,7%). Para os usuários que acreditavam que os médicos colaboravam entre si, os motivos mais citados foram: o acompanhamento e o tratamento estão corretos (36,6%) e os médicos conversam entre si (18,9%).

Quanto às experiências de acessibilidade entre níveis assistenciais (Tabela 3), 77,2% dos usuários referiram esperar muito até o dia da consulta com o especialista. Em contraste, apenas 48,9% dos usuários relataram que a espera para a consulta com o médico da APS era elevada. Acrescenta-se que 49,6% dos entrevistados referiram que a marcação da consulta sem a verificação de sua disponibilidade dificultava o comparecimento.

Tabela 3
Experiências dos usuários sobre a continuidade da gestão clínica entre níveis. Distritos Sanitários (DS) III e VII, Recife, Pernambuco, Brasil, 2017/2018.

Fatores associados aos níveis percebidos de continuidade da gestão clínica

Mulheres (85,3%), usuários casados (45,1%), pardos (58,3%), com renda familiar no último mês inferior a um salário mínimo (52,9%), com o Ensino Fundamental incompleto (50,6%), que não possuíam plano privado de saúde (98,8%) e que avaliaram sua saúde como regular, ruim ou muito ruim (85,5%) foram mais propensos a relatar altos níveis de continuidade da gestão clínica. Entretanto, o valor de p se mostrou insignificante (p > 0,05) para todas as associações (Tabela 4).

Tabela 4
Fatores sociodemográficos e de morbidade associados aos níveis percebidos de continuidade da gestão clínica. Distritos Sanitários III e VII, Recife, Pernambuco, Brasil, 2017/2018.

Discussão

Os resultados deste estudo ampliam uma temática pouco discutida no contexto brasileiro: a continuidade da gestão clínica entre níveis de atenção, explorada a partir do relato de pacientes acometidos por doenças crônicas. Na ótica desses usuários, observou-se opinião mais negativa acerca da acessibilidade entre níveis, devido aos elevados tempos de espera relatados, especialmente para atendimento na AE e, em menor frequência, para a APS. Ainda observaram-se relatos de marcação de consultas para AE sem considerar a disponibilidade do usuário, dificultando o comparecimento. Tais pontos constituem barreiras de acesso aos serviços, impactando a continuidade do cuidado. Em contraponto, a dimensão de coerência da atenção apresentou experiências mais positivas no que diz respeito à concordância no diagnóstico, tratamento e recomendações, e nos encaminhamentos oportunos para a AE, restando opiniões divergentes apenas no que se refere à existência de colaboração entre os médicos dos diferentes níveis. Além disso, não foram evidenciadas influências das características sociodemográficas e de morbidade dos usuários nos níveis percebidos de continuidade da gestão clínica.

A continuidade da atenção pode ser entendida como a conexão dos cuidados que o paciente recebe de várias fontes de provisão, sendo o reflexo de uma boa coordenação assistencial. Uma maior continuidade da atenção é resultado de uma melhor coordenação de atenção, medida pelo reconhecimento dos pacientes 66. Haggerty JL. Continuity of care: a multidisciplinary review. BMJ 2003; 327:1219-21.,2323. Terraza-Núñez R, Vargas IL, Vázquez ML. La coordinación entre niveles asistenciales: una sistematización de sus instrumentos y medidas. Gac Sanit 2006; 20:485-95.. Nesse sentido, analisar a continuidade do cuidado implica entender o modo como o paciente percebe a atenção que lhe é ofertada. Para os usuários, a continuidade está intimamente relacionada com a construção do vínculo com os médicos que lhe prestam cuidados, em que a comunicação e a confiança são fortemente valorizadas. A facilidade e a rapidez com que os pacientes obtêm acesso aos cuidados e a qualidade com que são oferecidos também são aspectos que se relacionam intrinsecamente com sua percepção de continuidade. Pode-se dizer que a continuidade do cuidado está diretamente relacionada à satisfação dos usuários com os serviços e, ainda, com a atuação dos profissionais, visto que minimizam-se os erros, as duplicações, os seguimentos inadequados, bem como a assimetria de informação entre o paciente e o prestador de cuidados 2424. Mendes FRP, Gemito MLGP, Caldeira EC, Serra IC, Casas-Novas MV. A continuidade de cuidados de saúde na perspetiva dos utentes. Ciênc Saúde Colet 2017; 22:841-53..

A coerência da atenção é a percepção do usuário acerca da colaboração e da comunicação entre os profissionais dos distintos níveis, envolvendo também a sequência de cuidados adequada, com um objetivo comum 77. Reid R, Haggerty J, Mckendry R. Defusing the confusion: concepts and measures of continuity of healthcare. Final report. Ottawa: Canadian Health Services Research Foundation; 2002.. No que se refere à existência de objetivos clínicos comuns, os entrevistados apontaram a inexistência de discordâncias quanto aos diagnósticos, tratamentos e recomendações que lhe são oferecidos em ambos os níveis de atenção. Assim como em outras investigações 22. Ollé-Espluga L, Vargas I, Mogollón-Pérez A, Soares-de-Jesus RPF, Eguiguren P, Cisneros AI, et al. Care continuity across levels of care perceived by patients with chronic conditions in six Latin-American countries. Gac Sanit 2020; 35:411-9.,33. Vargas I, Garcia-Subirats I, Mogollón-Pérez AS, De Paepe P, da Silva M, Unger JP, et al. Patient perceptions of continuity of healthcare and associated factors. Cross-sectional study in municipalities of central Colombia and north-eastern Brazil. Health Policy Plan 2017; 32:549-62.,88. Amarilla DI, Puzzolo J, Colautti M, Pellegrini N, Rovere M. Percepción de los usuarios sobre la continuidad asistencial entre niveles de atención en la red de servicios de salud municipal de la ciudad de Rosario. Rev Salud Pública (Córdoba) 2020; 24:19-32., os médicos da APS demonstram estar de acordo com o diagnóstico e o tratamento indicado pelos especialistas numa frequência maior do que o oposto.

Por outro lado, a inexistência de discordâncias entre níveis evidenciada neste estudo contrasta com relatos de outras investigações nas quais as incompatibilidades entre os critérios diagnósticos e tratamentos utilizados pelos profissionais contribuíram para o sentimento de descontinuidade da atenção por parte dos pacientes 11. Luján AIC, Rojas VG, Cinta DL, Juárez GR. Percepción sobre continuidade asistencial de usuários com enfermedades crónicas en dos redes de servicios de salud. Revista del Instituto de Salud Pública de la Universidad Veracruzana 2017; 13:7-24.,1212. Chávez JC, Martínez MS, Lara SCV, Mogollón-Pérez AS, Sabater J, Unger JP. La continuidade asistencial en las redes de servicios de salud. Estudio de caso de usuárias con cáncer de mama y diabetes mellitus tipo 2. In: Vázquez ML, Vargas IL, Mogollón-Pérez AS, da Silva MR, Unger JP, de Paepe P, editores. Redes integradas de servicios de salud en Colombia y Brasil. Un estudio de casos. Bogotá: Editorial Universidad del Rosario; 2018. p. 147-81.,1414. Silva MRF, Vasconcelos ALR, Nascimento AX, Brito ESV, Nascimento WS, Unger J-P. A continuidade assistencial nas redes de serviços de saúde. Estudo de caso de usuárias com câncer de mama e diabetes mellitus do tipo 2. In: Vázquez ML, Vargas IL, Mogollón-Pérez AS, da Silva MR, Unger JP, de Paepe P, editores. Redes integradas de servicios de salud en Colombia y Brasil. Un estudio de casos. Bogotá: Editorial Universidad del Rosario; 2018. p. 259-93.. No estudo realizado por Luján et al. 11. Luján AIC, Rojas VG, Cinta DL, Juárez GR. Percepción sobre continuidade asistencial de usuários com enfermedades crónicas en dos redes de servicios de salud. Revista del Instituto de Salud Pública de la Universidad Veracruzana 2017; 13:7-24., uma das possíveis causas apontadas pelos especialistas para o uso de diferentes critérios farmacológicos e nutricionais foi a falta de atualização dos clínicos gerais, levando os usuários a dúvidas e inseguranças quanto às recomendações que deveriam seguir e influenciando negativamente na sua percepção de coerência do cuidado recebido. A solução para a conciliação de tratamentos perpassa tanto pela realização de treinamentos e capacitações para os profissionais, como pela necessidade de aumentar os níveis de relacionamento entre médicos de ambos os níveis para o estabelecimento de relações de respeito e parceria entre esses profissionais.

A respeito da existência de colaboração e comunicação entre os níveis assistenciais, é preocupante o percentual de usuários que relataram que os profissionais não colaboram entre si para a resolução dos seus problemas de saúde. Os entrevistados relacionam a ausência de colaboração principalmente à falta de comunicação entre os médicos, corroborando resultados de estudos realizados em contextos semelhantes 11. Luján AIC, Rojas VG, Cinta DL, Juárez GR. Percepción sobre continuidade asistencial de usuários com enfermedades crónicas en dos redes de servicios de salud. Revista del Instituto de Salud Pública de la Universidad Veracruzana 2017; 13:7-24.,22. Ollé-Espluga L, Vargas I, Mogollón-Pérez A, Soares-de-Jesus RPF, Eguiguren P, Cisneros AI, et al. Care continuity across levels of care perceived by patients with chronic conditions in six Latin-American countries. Gac Sanit 2020; 35:411-9.,33. Vargas I, Garcia-Subirats I, Mogollón-Pérez AS, De Paepe P, da Silva M, Unger JP, et al. Patient perceptions of continuity of healthcare and associated factors. Cross-sectional study in municipalities of central Colombia and north-eastern Brazil. Health Policy Plan 2017; 32:549-62..

A comunicação entre médicos de distintos níveis é um tema bastante citado na literatura. Alguns estudos 2525. Oliveira CRF, Samico IC, Mendes MFM, Vargas I, Vázquez ML. Conhecimento e uso de mecanismos para articulação clínica entre níveis em duas redes de atenção à saúde de Pernambuco, Brasil. Cad Saúde Pública 2019; 35:e00119318.,2626. Almeida HB, Vanderlei LCM, Mendes MFM, Frias PG. As relações comunicacionais entre os profissionais de saúde e sua influência na coordenação da atenção. Cad Saúde Pública 2021; 37:e00022020.,2727. Vargas I, Mogollón-Pérez AS, Paepe P, Silva MRF, Unger JP, Vázquez ML. Barriers to healthcare coordination in market-based and decentralized public health systems: a qualitative study in healthcare networks of Colombia and Brazil. Health Policy Plan 2016; 31:736-48.,2828. Esteve-Matalí L, Vargas I, Amigo F, Plaja P, Cots F, Mayer EF, et al. Understanding how to improve the use of clinical coordination mechanisms between primary and secondary care doctors: clues from Catalonia. Int J Environ Res Public Health 2021; 18:3224. sugerem que, quando a comunicação entre níveis é deficiente, a implantação de mecanismos de coordenação e compartilhamento de informações pode fornecer soluções, favorecendo o contato e a colaboração entre os profissionais. A comunicação entre os profissionais pode ser facilitada pela utilização de tecnologias de informação em saúde, como o prontuário eletrônico do paciente, que possibilita o acesso às informações sobre o paciente e o compartilhamento do plano de cuidados entre os níveis 2929. Ávila GS, Cavalcante RB, Gontijo TL, Carbogim FC, Brito MJM. Prontuário eletrônico na gestão do cuidado em Equipes de Saúde da Família. Cogitare Enferm 2022; 27:e79641.,3030. Ribeiro SP, Cavalcanti MLT. Atenção primária e coordenação do cuidado: dispositivo para ampliação do acesso e a melhoria da qualidade. Ciênc Saúde Colet 2020; 25:1799-808..

Entretanto, é necessário que os profissionais tratem a comunicação e a troca de informações sobre o paciente como aspecto primordial para a qualidade dos cuidados em saúde 11. Luján AIC, Rojas VG, Cinta DL, Juárez GR. Percepción sobre continuidade asistencial de usuários com enfermedades crónicas en dos redes de servicios de salud. Revista del Instituto de Salud Pública de la Universidad Veracruzana 2017; 13:7-24.. Nesse aspecto, encontros que propiciem a comunicação e o compartilhamento de saberes, como reuniões de matriciamento e discussão de casos clínicos, podem auxiliar na construção de capacidades e contribuir para a continuidade da atenção e a qualidade do cuidado que é ofertado 2626. Almeida HB, Vanderlei LCM, Mendes MFM, Frias PG. As relações comunicacionais entre os profissionais de saúde e sua influência na coordenação da atenção. Cad Saúde Pública 2021; 37:e00022020.,2727. Vargas I, Mogollón-Pérez AS, Paepe P, Silva MRF, Unger JP, Vázquez ML. Barriers to healthcare coordination in market-based and decentralized public health systems: a qualitative study in healthcare networks of Colombia and Brazil. Health Policy Plan 2016; 31:736-48..

Há que se pensar ainda nas questões atitudinais, visto que é possível que alguns especialistas não valorizem adequadamente o papel dos profissionais da APS como coordenadores do cuidado, estando menos dispostos a colaborar e compartilhar informações com este nível 2727. Vargas I, Mogollón-Pérez AS, Paepe P, Silva MRF, Unger JP, Vázquez ML. Barriers to healthcare coordination in market-based and decentralized public health systems: a qualitative study in healthcare networks of Colombia and Brazil. Health Policy Plan 2016; 31:736-48.. Baixos níveis de reconhecimento, confiança e colaboração entre médicos da APS e especialistas refletem negativamente na comunicação entre esses profissionais e na qualidade do cuidado prestado. A desconfiança nas habilidades clínicas dos médicos da APS, a baixa disponibilidade ao diálogo por parte dos especialistas e uma sensação de inferioridade entre os profissionais da APS são aspectos que influenciam no manejo e no compartilhamento de pacientes. Para estabelecer a comunicação eficiente, é necessária a participação simétrica e ausente de hierarquias entre os médicos envolvidos, o que não é possível sem o respeito e o reconhecimento recíproco entre os profissionais 2626. Almeida HB, Vanderlei LCM, Mendes MFM, Frias PG. As relações comunicacionais entre os profissionais de saúde e sua influência na coordenação da atenção. Cad Saúde Pública 2021; 37:e00022020..

No que se refere à percepção da oferta de cuidados sequenciados, a maior parte dos entrevistados relatam ter sido encaminhados aos especialistas sempre que necessitavam de cuidados de saúde que extrapolavam o primeiro nível de atenção, assim como observado em outras investigações 11. Luján AIC, Rojas VG, Cinta DL, Juárez GR. Percepción sobre continuidade asistencial de usuários com enfermedades crónicas en dos redes de servicios de salud. Revista del Instituto de Salud Pública de la Universidad Veracruzana 2017; 13:7-24.,88. Amarilla DI, Puzzolo J, Colautti M, Pellegrini N, Rovere M. Percepción de los usuarios sobre la continuidad asistencial entre niveles de atención en la red de servicios de salud municipal de la ciudad de Rosario. Rev Salud Pública (Córdoba) 2020; 24:19-32.. Houve poucas menções à falta de encaminhamento para a AE quando necessário, o que foi relacionado à ausência de vagas para o atendimento de especialidades; à falta de responsabilidade do médico da APS para com o estado de saúde dos pacientes; e ainda à decisão do médico generalista em conduzir o tratamento.

A acessibilidade entre os níveis assistenciais é caracterizada pela oportuna transposição de nível, de acordo com as necessidades clínicas do paciente. O acesso aos serviços de saúde assume posição de destaque para a continuidade do cuidado, tendo em vista a facilidade com que os usuários reconhecem a importância do acesso ágil e da oferta de uma variedade de serviços 88. Amarilla DI, Puzzolo J, Colautti M, Pellegrini N, Rovere M. Percepción de los usuarios sobre la continuidad asistencial entre niveles de atención en la red de servicios de salud municipal de la ciudad de Rosario. Rev Salud Pública (Córdoba) 2020; 24:19-32.,2424. Mendes FRP, Gemito MLGP, Caldeira EC, Serra IC, Casas-Novas MV. A continuidade de cuidados de saúde na perspetiva dos utentes. Ciênc Saúde Colet 2017; 22:841-53.. Na rede de estudo, a acessibilidade entre os diferentes níveis não se encontra facilitada, configurando-se como questão preocupante para os usuários, que precisam esperar muito para obter acesso ao atendimento na AE. Quanto ao tempo de espera para consulta de contrarreferência na APS, os entrevistados apresentaram experiências polarizadas, em que cerca de metade dos participantes considera que o tempo de espera é alto e a outra metade não.

O Município de Recife ocupa lugar de destaque no desenho da rede de saúde de Pernambuco, pois é uma referência macrorregional do estado, o que configura expressiva responsabilidade na organização das ações e serviços de média e alta densidade tecnológica. Além disso, por comportar parte significativa dos serviços diagnósticos e assistenciais de alta densidade tecnológica, pertencentes, sobretudo, a rede estadual, federal e filantrópica de serviços de saúde, localizada em seu território, Recife é referência na oferta de diversos serviços em nível macrorregional e mesmo em nível estadual, que compõem as linhas de cuidado prioritárias no estado: cardiologia, oncologia, urgência/emergência com ênfase em trauma, materno-infantil, nefrologia, saúde mental, saúde bucal e oftalmologia. Essa concentração de serviços localizados em Recife, com fluxos assistenciais definidos para o seu território, leva a constantes pressões pela utilização dos estabelecimentos de saúde, especialmente na AE do município 2121. Secretaria de Saúde do Recife. Plano Municipal de Saúde 2018-2021. Recife: Secretaria de Saúde do Recife; 2018..

Na literatura, longos tempos de espera para a realização de consultas e exames diagnósticos na AE foram relacionados à repetição de exames devido à perda de validade 11. Luján AIC, Rojas VG, Cinta DL, Juárez GR. Percepción sobre continuidade asistencial de usuários com enfermedades crónicas en dos redes de servicios de salud. Revista del Instituto de Salud Pública de la Universidad Veracruzana 2017; 13:7-24.,88. Amarilla DI, Puzzolo J, Colautti M, Pellegrini N, Rovere M. Percepción de los usuarios sobre la continuidad asistencial entre niveles de atención en la red de servicios de salud municipal de la ciudad de Rosario. Rev Salud Pública (Córdoba) 2020; 24:19-32.,1313. Silva MRF, Braga JPR, Moura JFP, Lima JTO. Continuidade assistencial a mulheres com câncer de colo de útero em redes de atenção à saúde: estudo de caso, Pernambuco. Saúde Debate 2016; 40:107-19.; ao aumento dos custos para os serviços de saúde e para os usuários, que terminavam por buscar serviços particulares 11. Luján AIC, Rojas VG, Cinta DL, Juárez GR. Percepción sobre continuidade asistencial de usuários com enfermedades crónicas en dos redes de servicios de salud. Revista del Instituto de Salud Pública de la Universidad Veracruzana 2017; 13:7-24.,44. Garcia-Subirats I, Vargas I, Mogollón-Pérez AS, De Paepe P, da Silva MR, Unger JP, et al. Barriers in access to healthcare in countries with different health systems. A cross-sectional study in municipalities of central Colombia and north-eastern Brazil. Soc Sci Med 2014; 106:204-13.,88. Amarilla DI, Puzzolo J, Colautti M, Pellegrini N, Rovere M. Percepción de los usuarios sobre la continuidad asistencial entre niveles de atención en la red de servicios de salud municipal de la ciudad de Rosario. Rev Salud Pública (Córdoba) 2020; 24:19-32.,1414. Silva MRF, Vasconcelos ALR, Nascimento AX, Brito ESV, Nascimento WS, Unger J-P. A continuidade assistencial nas redes de serviços de saúde. Estudo de caso de usuárias com câncer de mama e diabetes mellitus do tipo 2. In: Vázquez ML, Vargas IL, Mogollón-Pérez AS, da Silva MR, Unger JP, de Paepe P, editores. Redes integradas de servicios de salud en Colombia y Brasil. Un estudio de casos. Bogotá: Editorial Universidad del Rosario; 2018. p. 259-93.; a atrasos ou interrupções no diagnóstico e tratamento de pacientes 22. Ollé-Espluga L, Vargas I, Mogollón-Pérez A, Soares-de-Jesus RPF, Eguiguren P, Cisneros AI, et al. Care continuity across levels of care perceived by patients with chronic conditions in six Latin-American countries. Gac Sanit 2020; 35:411-9.,1414. Silva MRF, Vasconcelos ALR, Nascimento AX, Brito ESV, Nascimento WS, Unger J-P. A continuidade assistencial nas redes de serviços de saúde. Estudo de caso de usuárias com câncer de mama e diabetes mellitus do tipo 2. In: Vázquez ML, Vargas IL, Mogollón-Pérez AS, da Silva MR, Unger JP, de Paepe P, editores. Redes integradas de servicios de salud en Colombia y Brasil. Un estudio de casos. Bogotá: Editorial Universidad del Rosario; 2018. p. 259-93.,3131. Vázquez ML, Vargas IL, Mogollón-Pérez AS, da Silva MR, Unger JP, de Paepe P, editores. Redes integradas de servicios de salud em Colombia y Brasil. Un estudio de casos. Bogotá: Editorial Universidad del Rosario; 2018.; e ainda ao agravamento da condição clínica dos pacientes 88. Amarilla DI, Puzzolo J, Colautti M, Pellegrini N, Rovere M. Percepción de los usuarios sobre la continuidad asistencial entre niveles de atención en la red de servicios de salud municipal de la ciudad de Rosario. Rev Salud Pública (Córdoba) 2020; 24:19-32.,1414. Silva MRF, Vasconcelos ALR, Nascimento AX, Brito ESV, Nascimento WS, Unger J-P. A continuidade assistencial nas redes de serviços de saúde. Estudo de caso de usuárias com câncer de mama e diabetes mellitus do tipo 2. In: Vázquez ML, Vargas IL, Mogollón-Pérez AS, da Silva MR, Unger JP, de Paepe P, editores. Redes integradas de servicios de salud en Colombia y Brasil. Un estudio de casos. Bogotá: Editorial Universidad del Rosario; 2018. p. 259-93.. Relatos anteriores evidenciaram sentimentos de ansiedade, angústia, insatisfação e sofrimento por parte dos usuários devido às incertezas no acesso a consultas, exames e medicamentos necessários ao tratamento de suas condições de saúde 1414. Silva MRF, Vasconcelos ALR, Nascimento AX, Brito ESV, Nascimento WS, Unger J-P. A continuidade assistencial nas redes de serviços de saúde. Estudo de caso de usuárias com câncer de mama e diabetes mellitus do tipo 2. In: Vázquez ML, Vargas IL, Mogollón-Pérez AS, da Silva MR, Unger JP, de Paepe P, editores. Redes integradas de servicios de salud en Colombia y Brasil. Un estudio de casos. Bogotá: Editorial Universidad del Rosario; 2018. p. 259-93..

Ao estudar as barreiras ao acesso dos serviços de saúde no Brasil e na Colômbia, Garcia-Subirats et al. 44. Garcia-Subirats I, Vargas I, Mogollón-Pérez AS, De Paepe P, da Silva MR, Unger JP, et al. Barriers in access to healthcare in countries with different health systems. A cross-sectional study in municipalities of central Colombia and north-eastern Brazil. Soc Sci Med 2014; 106:204-13. identificaram como principais causas dos longos tempos de espera para a AE os baixos níveis de acessibilidade para a APS e problemas de resolutividade que resultam em encaminhamento desnecessários de usuários com problemas de saúde que deveriam ser resolvidos no primeiro nível de atenção. Além disso, no SUS, a escassez de serviços de média complexidade, a falta de recursos humanos em saúde, o não cumprimento dos horários de trabalho por parte dos poucos trabalhadores existentes e o excessivo enfoque nos cuidados curativos também constituem importantes barreiras de acesso aos serviços, que impactam na percepção de continuidade da atenção por parte dos usuários.

Amarilla et al. 88. Amarilla DI, Puzzolo J, Colautti M, Pellegrini N, Rovere M. Percepción de los usuarios sobre la continuidad asistencial entre niveles de atención en la red de servicios de salud municipal de la ciudad de Rosario. Rev Salud Pública (Córdoba) 2020; 24:19-32., em estudo realizado no México, identificaram que problemas de acessibilidade, em especial o elevado tempo entre as transições de níveis e a escassez de vagas, podem impactar negativamente a percepção sobre a coerência do cuidado. Em outras palavras, esperar muito para receber atendimento pode comprometer a percepção do usuário sobre a sequência assistencial adequada. Nesse sentido, a ausência de vagas na AE em conjunto com os excessivos tempos de espera, problemas evidenciados nesse estudo, podem ter causado impactos negativos na percepção dos usuários sobre a coerência da atenção.

A percepção de acessibilidade entre níveis, analisada pela ótica dos usuários, perpassa também pela existência de acessibilidade administrativa, verificada, entre outras formas, na marcação da consulta mediante a disponibilidade do usuário no dia e horário agendado. Na rede em questão, as experiências de acessibilidade administrativas são negativas para cerca de metade dos respondentes, evidenciando a necessidade de considerar a disponibilidade do paciente para a realização das marcações.

Estudos anteriores 11. Luján AIC, Rojas VG, Cinta DL, Juárez GR. Percepción sobre continuidade asistencial de usuários com enfermedades crónicas en dos redes de servicios de salud. Revista del Instituto de Salud Pública de la Universidad Veracruzana 2017; 13:7-24.,88. Amarilla DI, Puzzolo J, Colautti M, Pellegrini N, Rovere M. Percepción de los usuarios sobre la continuidad asistencial entre niveles de atención en la red de servicios de salud municipal de la ciudad de Rosario. Rev Salud Pública (Córdoba) 2020; 24:19-32. expuseram problemas de descontinuidade do atendimento devido à marcação de consultas, atribuídas principalmente à existência de turnos pré-estabelecidos em alguns centros de saúde, tanto para o atendimento na APS como na AE. Em alguns relatos, caso o paciente não pudesse comparecer no turno pré-estabelecido, perderia a vez, tendo que entrar novamente na fila de espera, o que foi visto como uma questão incômoda que dificulta o acesso aos serviços, além de influenciar no tempo de espera 88. Amarilla DI, Puzzolo J, Colautti M, Pellegrini N, Rovere M. Percepción de los usuarios sobre la continuidad asistencial entre niveles de atención en la red de servicios de salud municipal de la ciudad de Rosario. Rev Salud Pública (Córdoba) 2020; 24:19-32..

Como limitações do estudo, é importante mencionar que as perspectivas dos usuários expressam a realidade da rede de saúde em questão. Estudos que abordem a continuidade do cuidado sob a perspectiva de outros atores, para além dos usuários do serviço, podem ser complementares a este estudo. Ademais, a escolha de um desenho descritivo transversal não permite verificar relações de causa e efeito. A continuidade do cuidado se estabelece mediante uma relação de cuidados sustentada, sendo um fenômeno que ganha mais compreensão com o passar do tempo. Nesse sentido, investigações longitudinais podem ser complementares a este estudo. Além disso, mais que a coerência da atenção e a acessibilidade entre níveis, há que se preocupar em verificar como os usuários percebem a qualidade da atenção. Estudos que se aprofundem nesse aspecto podem complementar a discussão sobre a continuidade da gestão clínica entre níveis assistenciais.

Considerações finais

A análise da continuidade do cuidado em saúde através das experiências relatadas pelos usuários é uma fonte de informação essencial para a melhoria da articulação entre níveis assistenciais, visto que fornece uma perspectiva única sobre as barreiras de acesso, as falhas na coordenação assistencial e, ainda, a satisfação com os serviços prestados. As experiências de continuidade podem auxiliar os gestores na tomada de decisão sobre a reorganização dos serviços de saúde, especialmente devido às informações que produzem sobre a utilização dos serviços e a limitação do acesso aos cuidados especializados.

Acerca da rede em questão, os usuários apresentam boas experiências em alguns atributos da continuidade da gestão clínica, especialmente no que se refere à coerência da atenção. As dificuldades identificadas acerca da acessibilidade entre níveis são elementos críticos para melhorar as experiências de continuidade. São necessárias intervenções eficazes para melhorar o acesso aos serviços de saúde, centradas na qualificação e na resolutividade da APS, e na oferta de serviços de saúde com quantitativo suficiente de profissionais atuantes, especialmente no que se refere à AE. Estratégias que propiciem maior acesso, como o atendimento em demanda espontânea e a marcação da consulta mediante a disponibilidade do paciente, podem melhorar as experiências de continuidade. Ainda, faz-se necessário o fomento de estratégias que fortaleçam a articulação entre níveis, estimulando o conhecimento pessoal, a comunicação, o respeito mútuo e a colaboração entre os diferentes profissionais envolvidos no cuidado.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Out 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    14 Mar 2022
  • Revisado
    05 Jul 2022
  • Aceito
    22 Jul 2022
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