Acessibilidade / Reportar erro

Pesquisa bibliográfica em ciências biomédicas

PÓS-GRADUAÇÃO

Pesquisa bibliográfica em ciências biomédicas

ENILZE DE SOUZA NOGUEIRA VOLPATO1 1 . Supervisora Técnica ¾ Seção de Referência, Atendimento ao Usuário e Documentação. Divisão de Biblioteca e Documentação, Unesp ¾ Campus de Botucatu.

Pesquisa bibliográfica, levantamento bibliográfico ou revisão da literatura é uma das etapas da investigação científica.

Segundo Strohl(1), as condições para se realizar um trabalho científico profícuo são: a) formulação clara e exata do problema, b) observação perspicaz e c) conhecimento do que já foi feito sobre o assunto, sendo, esta última condição de domínio especial da bibliografia. Para Campana(2), na formulação de um problema científico, é preciso considerar o acervo de dados, o embasamento teórico e as premissas e incógnitas e afirma que o acesso a esses conhecimentos é obtido mediante a revisão da literatura.

Além de ser parte da investigação científica, a pesquisa bibliográfica é um importante instrumento na educação continuada do profissional da saúde, sobretudo com a disseminação da medicina baseada em evidências.

Na década de setenta, Ferraz(3) e Polke(4) sugeriram roteiros para desenvolvimento da pesquisa bibliográfica, caracterizando diferentes estágios desse processo. Os avanços da tecnologia aplicada à ciência da informação e o crescimento de recursos de informação na área médica facilitaram esse trabalho e ampliaram os recursos para a pesquisa bibliográfica. Por outro lado, o acesso a esses recursos ainda é desigual em virtude das próprias características e diferenças existentes em nosso país. O objetivo deste trabalho é oferecer diretrizes àqueles profissionais da saúde que pretendem desenvolver uma pesquisa bibliográfica de forma sistematizada, considerando a atual gama de possibilidades e as diversidades de acesso aos recursos disponíveis.

FASES DA PESQUISA BIBLIOGRÁFICA

1. Identificação

1.1.Identificação e delimitação do assunto

Nesta fase o pesquisador deve formular um título para seu levantamento bibliográfico e identificar os termos que expressem o seu conteúdo, não só no idioma português, como também em outros, sobretudo em inglês. Poderá utilizar dicionários médicos e bilíngües, enciclopédias especializadas e até compêndios ou tratados da área.

A maioria das fontes de pesquisa disponíveis é em inglês ou apresenta uma versão para esse idioma. As revistas científicas também são, na grande maioria, em inglês, e muitas revistas nacionais adotaram o inglês, por ser um idioma de grande acesso mundial. Garfield(5), mediante um mapeamento da ciência no Terceiro Mundo, detectou que 85% dos artigos desses países são em inglês, e afirma que o inglês é a língua franca da ciência, mesmo nessas regiões. Portanto a identificação prévia da terminologia em inglês facilitará o trabalho do pesquisador.

1.2.Delimitação do período, área geográfica e idioma

Além da questão temática, nesta fase, deve-se delimitar também o período da pesquisa, os idiomas dos artigos e, se necessário, as áreas geográficas de interesse.

1.3.Identificação das fontes disponíveis

Depois de estabelecer o assunto, devem-se escolher as fontes mais adequadas à pesquisa. Indicamos a seguir as principais fontes de informação na área médica:

Index Medicus e Medline

Index Medicus é uma publicação impressa, editada pela National Library of Medicine, em Washington, a partir de 1966. Indexa trabalhos publicados em 3.188 revistas, organizados por assuntos. Faz parte da base de dados Medline, que inclui também as publicações impressas Index Dental Literature e Index to Nursing, que cobrem as áreas de odontologia e enfermagem, respectivamente. As versões impressas trazem apenas a referência bibliográfica, enquanto que a versão eletrônica, disponível on-line ou em cd-rom, traz outras informações, como, por exemplo, um resumo do trabalho (abstract) e endereço do autor, para correspondência.

O Index Medicus é facilmente encontrado nas bibliotecas de medicina e a base Medline está disponibilizada, gratuitamente, em alguns endereços:

http:www.biomednet.com/db/medline

http:www.ncbi.nlm.nih.gov/PubMed/index.htlm

Excerpta Medica ou Embase

A Excerpta Medica é a versão impressa da base de dados Embase e indexa aproximadamente 3.500 títulos de revistas biomédicas. É dividida em 42 seções, sendo uma intitulada Chest Diseases, Thoracic Surgery & Tuberculosis, na qual são encontrados trabalhos sobre Pneumologia. Traz, além da referência bibliográfica, um resumo, em inglês, dos trabalhos e o endereço do autor para correspondência. É uma fonte forte em drogas e publicações européias. Não está disponível gratuitamente. Para ter acesso é preciso fazer assinatura.

A coincidência de registros encontrados na Excerpta Medica e Medline é de 30%(3), o que pode justificar a pesquisa em ambas as bases.

Biological Abstracts ou Biosis

Biological Abstracts começou a ser publicado em 1926. A base cobre sete mil publicações seriadas, incluindo artigos de revistas, trabalhos publicados em eventos, relatórios técnicos e toda publicação sobre nomenclatura e taxonomia. É a maior base de dados em ciências biológicas, sendo, portanto, uma fonte muito rica. Tanto a versão automatizada como a impressa trazem, além das referências, um abstract, em inglês, do trabalho e endereço do autor para correspondência.

Lilacs

É uma base de dados regional em ciências da saúde, cobrindo os países da América do Sul e Caribe. Reúne, além de artigos de periódicos, teses, dissertações, trabalhos apresentados em eventos, relatórios técnicos, etc., publicados a partir de 1982. A versão impressa, chamada IMLA: Index Medicus Latino-Americano, foi publicada apenas no período de 1979 a 1991. Esta é também uma base de dados facilmente encontrada nas bibliotecas médicas. É resultante do esforço cooperativo de várias bibliotecas sob coordenação do Bireme: Sistema Latino-americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde. Endereço para acesso: http://www.bireme.br

Current Contents

É um banco de dados multidisciplinar, que indexa sete mil revistas e ainda livros e publicações de eventos científicos. É produzida nos Estados Unidos pelo ISI: Institute for Scientific Information. A forma impressa é publicada semanalmente, dividida em sete seções, sendo duas delas de particular interesse para pesquisadores da área de saúde: Clinical Medicine (1.075 revistas) e Life Sciences (1.380 revistas). Traz os sumários das publicações indexadas e endereço do autor para correspondência. Os formatos automatizados (disquete, cd-rom, on-line) incluem resumo em inglês. Também é freqüentemente encontrado nas bibliotecas médicas. Disponível mediante assinatura.

Science Citation Index

É também uma publicação do ISI. O que a caracteriza e a diferencia das outras publicações é que, além das referências bibliográficas para uma revisão da literatura, informa os trabalhos que citaram cada referência apresentada, permitindo avaliar o alcance de um determinado trabalho. A versão eletrônica inclui o endereço eletrônico do autor.

Brazilian Cochrane Center

Instalado no Brasil em 1996, com o objetivo de manter e atualizar uma base de dados de revisões sistematizadas e atualizadas e ensaios clínicos randomizados. O endereço é:

Escola Paulista de Medicina

Rua Pedro de Toledo, 598

04039-001 ¾ São Paulo, SP

fone: (11) 575-2970; fax: (11) 570-0469

e-mail: cochrane.dmed@epm.br

Home page: http://www.epm.br/cochrane

Na home page existem links para acessar as bases de dados Medline, Lilacs, SeCS e SiELO, gratuitamente.

SciELO

É um consórcio que oferece a versão eletrônica de revistas nacionais com textos integrais. A cobertura cronológica varia de acordo com cada título.

Endereço: http://www.scielo.br

2.Execução

2.1.Publicações impressas

2.1.1.Manuseio

As publicações impressas trazem, em geral, nas primeiras páginas ou no verso da capa, uma explicação sobre o arranjo utilizado (por exemplo, ordem alfabética de assunto), como utilizar a fonte e quais as informações oferecidas. É importante que o pesquisador leia essas orientações e planeje a sua pesquisa.

Algumas publicações utilizam um cabeçalho de assunto controlado e, quando se procura um termo, encontra-se uma indicação remissiva.

Por exemplo: DOENÇAS RESPIRATÓRIAS use PNEUMOPATIAS ¾ o pesquisador deve procurar o termo pneumopatias, pois não encontrará nenhum registro no assunto doenças respiratórias.

2.1.2.Anotação e armazenamento

Os dados a serem anotados são aqueles que permitam a identificação e localização do trabalho, para posterior obtenção, ou seja, os dados que compõem a referência bibliográfica.

Para um artigo de periódico: autor, título do trabalho, título da revista, ano, volume, fascículo e páginas inicial e final.

Para um capítulo de livro: autor do capítulo, título do capítulo, autor do livro, título do livro, edição, cidade de publicação, editora, ano de publicação e página do capítulo.

Os dados podem ser transcritos. Neste caso o melhor é utilizar fichas de papel com gramatura alta, como cartolina, por exemplo, no tamanho do arquivo em que serão armazenadas. As fichas devem ser organizadas em ordem alfabética, permitindo identificar duplicações. Deve-se deixar um espaço no alto da ficha, caso o pesquisador queira anotar o assunto principal do trabalho para, posteriormente, na fase de redação, manter uma organização temática das fichas.

Outro recurso é fotocopiar as páginas referentes ao assunto e organizar as cópias em pasta do tipo A-Z, que permitem a inserção de novas folhas e podem ser classificadas com folhas-guias com a indicação do assunto. Esse método não propicia muitas facilidades no rearranjo e anotações posteriores.

2.2.Fontes eletrônicas

Para fazer uma pesquisa numa base de dados eletrônica é importante: a) conhecer e saber usar os recursos disponíveis para operar o sistema de forma otimizada e b) elaborar a estratégia de busca que permita a identificação dos trabalhos.

Os critérios para o levantamento são relevância e amplitude. Um levantamento relevante é bem específico, identifica menos trabalhos e não exige muito descarte. O levantamento amplo é bastante abrangente, identificando muitos trabalhos, que precisam passar por um processo de seleção e requer alto descarte de referências. A escolha do tipo de levantamento depende, sobretudo, do número de artigos disponíveis sobre o assunto. Para um tema muito estudado, o levantamento deve ser mais específico; para um tema pouco estudado, mais abrangente. A especificidade ou abrangência desejada é obtida com a utilização adequada dos operadores booleanos and e or, que combinam os termos identificados na primeira fase da pesquisa.

2.2.1.Estratégia de busca

2.2.1.1.Operador booleano or

É utilizado para agrupar termos, ou seja, ampliar a pesquisa, e deve ser utilizado nos seguintes casos:

a)sinônimos: câncer or tumor or neoplasia;

b)acrônimos: diabetes mellitus insulino-dependente or DMID;

c)variantes: honney bee or honeybee or apis mellifica;

d)grafias diferentes: raios X or raios-X or raio X or raio-X;

e)relacionados: pneumopatias obstrutivas or asma or bronquite or enfisema pulmonar.

O uso de um termo genérico não garante a amplitude do levantamento, pois o sistema procura uma palavra, um conjunto de sinais e não uma idéia. Por exemplo, se o pesquisador está interessado em trabalhos sobre incidência de pneumopatias obstrutivas e usar esse termo na pesquisa, poderá não recuperar trabalhos sobre a incidência de asma ou bronquite ou enfisema pulmonar, que são indexados com o termo referente à doença estudada. Neste caso o autor deve usar, além do termo genérico, os termos específicos.

2.2.1.2.Operador booleano and

Usado para restringir a pesquisa, fazendo a intersecção dos conjuntos de trabalhos que possuem os termos combinados.

Para a pesquisa: uso de oxigenoterapia no tratamento de insuficiência respiratória, use: insuficiência respiratória and oxigenoterapia.

Para diminuir o número de trabalhos ou restringir a amplitude da pesquisa pode-se usar mais um termo de interesse.

Para a pesquisa: uso de oxigenoterapia em câmara hiperbárica no tratamento de insuficiência respiratória, use: insuficiência respiratória and oxigenoterapia and câmara hiperbárica.

2.2.1.3.Truncagem:

Utilizada para formas derivadas ou plurais. Ex.: imunossupres* para imunossupressão, imunossupressor, imunossupressores.

2.2.2.Captura e armazenamento

Cada sistema possui operações específicas para capturar as informações desejadas. Em geral permitem impressão e cópia. Oferecem diferentes formatos de saída. Em forma de texto, os arquivos podem ser editados e impressos posteriormente por meio de editores de texto de uso comum. Outros formatos permitem migrar para programas que gerenciam bases de dados referenciais. Existem vários programas de armazenamento eletrônico de referências bibliográficas. Essas referências podem ser digitadas pelo próprio usuário ou importadas diretamente das bases de dados consultadas. Permitem organização e seleção por palavras-chaves, autor, data, etc., e geração de listas de referências bibliográficas impressas em formatos definidos pelo usuário de acordo com a sua necessidade. Entre esses programas estão: Pro-Cite, Endnote e Reference Manager(3).

3.Obtenção

Para obter os trabalhos identificados o pesquisador deve recorrer às bibliotecas médicas, onde existem catálogos em forma de fichas em arquivos, impressos ou automatizados. Em geral os livros podem ser procurados pelo sobrenome do autor, título ou assunto do livro e as revistas, pelo título da revista, ano, volume e fascículo.

Os artigos de revistas não disponíveis na biblioteca podem ser obtidos pelos serviços de comutação bibliográfica, que têm cobertura nacional, regional ou internacional. O Comut é o programa nacional de comutação do qual participam as principais bibliotecas do Brasil. Outro sistema é o Bireme on-line, que agrupa bibliotecas da área de saúde da América Latina e Caribe e tem convênio com outras bibliotecas, como National Library of Medicine e British Library, aumentando a cobertura do sistema. Além de bibliotecas, atende também usuários individuais. Os interessados podem fazer seu cadastro acessando a homepage http:www.bireme.br, ou obter informações pelo telefone (0 xx 11) 576-9800.

Para saber que biblioteca possui o trabalho e pedir de maneira informal, por telefone ou fax, o pesquisador pode consultar a base SeCS. Essa base também está disponível gratuitamente na homepage do Bireme e apresenta os títulos das revistas e as bibliotecas com a indicação completa das coleções e endereço de cada uma.

O controle do estado de obtenção do artigo pode ser feito nas fichas ou nos registros do banco de dados pessoal, com indicações do tipo: fotocopiado; em processo de obtenção; localização na biblioteca pessoal, etc.

4.Leitura

Nesta fase são descartados os trabalhos não relevantes, feitas anotações temáticas nas fichas ou registros do banco de dados pessoal que podem incluir:

a)um resumo das idéias do autor que se aplicam ao trabalho em desenvolvimento;

b)citações diretas, entre aspas, com reticências para indicar supressões e colchetes para indicar acréscimos do próprio pesquisador;

c)comentários e observações do pesquisador.

5.Redação

Se a pesquisa bibliográfica foi feita com o objetivo de se escrever um trabalho, durante a redação, é importante que o pesquisador indique sempre, no texto, a fonte da informação utilizada. A indicação poderá ser numérica ou alfabética (por autor e ano).

Uma dúvida que pode surgir nesta etapa é se todos os trabalhos identificados têm que ser citados ou não. Para que um trabalho seja considerado completo deve mencionar todas as eventualidades e contradições encontradas e não, necessariamente, citar todos os trabalhos que corroboram os eventos relatados(4). Cabe, portanto, ao autor, fazer sua opção conforme o objetivo do seu trabalho.

O pesquisador deve procurar o meio mais apropriado para a divulgação do seu trabalho, de acordo com a área, o tipo de trabalho (original, revisão, relato de caso, etc.) e identificar as normas para publicação, às quais o trabalho deverá ser adequado.

Endereço para correspondência ¾ Caixa Postal 502 ¾ 18818-000 ¾ Rubião Jr., SP. Tel. (14) 820-6131; fax (14) 821-3276; E-mail: enilze@btu.unesp.br

  • 1. Strohl J. The scope of bibliographies. Science 1926;63:218-221.
  • 2. Campana AO. Metodologia da investigação científica aplicada à área biomédica: 1. O método científico. J Pneumol 1999;25:25-34.
  • 3. Ferraz TA. Pesquisa bibliográfica nas ciências médicas. In: Moraes IN, Correa Neto A, eds. Metodização da pesquisa científica. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1970;125-148.
  • 4. Polke AMA. Pesquisa bibliográfica. Rev Esc Bibliotecon 1972;1:43-54.
  • 5. Garfield E. Mapping science in the Third World. Sci Public Policy 1983; jun:112-127.
  • 6. Jones RG. Personal computer software for handling references from cd-rom and mainframe sources for scientific and medical reports. BMJ 1993;307:180-184.
  • 1
    . Supervisora Técnica ¾ Seção de Referência, Atendimento ao Usuário e Documentação. Divisão de Biblioteca e Documentação, Unesp ¾ Campus de Botucatu.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Out 2003
    • Data do Fascículo
      Abr 2000
    Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Departamento de Patologia, Laboratório de Poluição Atmosférica, Av. Dr. Arnaldo, 455, 01246-903 São Paulo SP Brazil, Tel: +55 11 3060-9281 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: jpneumo@terra.com.br