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Motivos e tempo de internação e o tipo de saída em hospitais de tuberculose do Estado de São Paulo, Brasil -- 1981 a 1995

Reasons for the admission, length of stay and type of discharge in tuberculosis hospitals in the State of São Paulo, Brazil -- 1981 to 1995

Resumos

Introdução: A partir de 1981, a Secretaria da Saúde assumiu o tratamento e a internação de todos os casos de tuberculose no Estado de São Paulo, na região Sudeste do Brasil. Nesses anos foi observada a diminuição da incidência e da percentagem de internações por essa doença. Objetivo: Analisar a evolução dos motivos que levaram os doentes de tuberculose a internação e correlacionar esses motivos com o tempo de internação e com o tipo de alta. Material e métodos: Uma amostra de 1.805 prontuários pertencentes a cinco hospitais de tisiologia, que tratam de tuberculosos, entre os anos de 1981 e 1995 foi analisada. Resultados: O principal motivo de internação foi o mau estado geral seguido pela caquexia, tendo sido registrado o crescimento do alcoolismo. Entre os que ficaram internados menos de uma semana, destacaram-se aqueles com "outras patologias" e "insuficiência respiratória". Os motivos que levaram ao maior tempo médio de internação foram o social e a falência do tratamento. Os pacientes com insuficiência respiratória apresentaram o maior abandono e óbito. Os internados devido à intolerância medicamentosa e motivo social apresentaram maior proporção de alta a pedido; o motivo social e o alcoolismo tiveram maior taxa de alta disciplinar. O hospital que internou pacientes do sexo feminino teve o maior número de altas a pedido e os do sexo masculino se destacaram por apresentar maior freqüência de alta disciplinar e abandono.

Tuberculose pulmonar; Tempo de internação; Pesquisa sobre serviços de saúde; Hospitais especializados; Alta do paciente


Introduction: Since 1981 the State Health Office has taken over the treatment and hospitalization of all tuberculosis cases in the State of São Paulo, southeastern Brazil. A decrease in both the incidence and the percentage of admissions due to tuberculosis has been observed during this period. Objective: To analyze the evolution of the reasons that led tuberculosis patients to hospitalization and correlate these reasons with hospitalization length and the type of discharge. Material and methods: A sample of 1,805 patients' records compiled between 1981 and 1995 at five tuberculosis hospitals in the State of São Paulo was reviewed. Results: The main reason for admission was general poor health, followed by cachexy. Increasing alcoholism was also observed. Among those who stayed in hospital for less than one week, the most frequent reasons for hospitalization were "other pathologies" and "respiratory insufficiency". These cases also showed the shortest average hospitalization length whereas the longest was presented by the patients admitted for social reasons and treatment failure. The patients with respiratory insufficiency presented the highest rate of dropouts and death. The highest rate of requested discharge was observed among the patients admitted due to drug intolerance whereas those admitted due to social reasons and alcoholism showed the highest rate of disciplinary release. The hospital that admitted females was the one with the highest rate of requested release, whereas in the hospitals that admitted males disciplinary release and dropouts were the most frequent types of discharge.

Pulmonary tuberculosis; Length of stay; Health services research; Specialized hospitals; Patient discharge


ARTIGO ORIGINAL

Motivos e tempo de internação e o tipo de saída em hospitais de tuberculose do Estado de São Paulo, Brasil ¾ 1981 a 1995* * Trabalho realizado na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. Projeto de Pesquisa Financiado pela Fapesp, Proc. Nº 97/5.636-6.

PÉRICLES ALVES NOGUEIRA1 * Trabalho realizado na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. Projeto de Pesquisa Financiado pela Fapesp, Proc. Nº 97/5.636-6.

Introdução: A partir de 1981, a Secretaria da Saúde assumiu o tratamento e a internação de todos os casos de tuberculose no Estado de São Paulo, na região Sudeste do Brasil. Nesses anos foi observada a diminuição da incidência e da percentagem de internações por essa doença. Objetivo: Analisar a evolução dos motivos que levaram os doentes de tuberculose a internação e correlacionar esses motivos com o tempo de internação e com o tipo de alta. Material e métodos: Uma amostra de 1.805 prontuários pertencentes a cinco hospitais de tisiologia, que tratam de tuberculosos, entre os anos de 1981 e 1995 foi analisada. Resultados: O principal motivo de internação foi o mau estado geral seguido pela caquexia, tendo sido registrado o crescimento do alcoolismo. Entre os que ficaram internados menos de uma semana, destacaram-se aqueles com "outras patologias" e "insuficiência respiratória". Os motivos que levaram ao maior tempo médio de internação foram o social e a falência do tratamento. Os pacientes com insuficiência respiratória apresentaram o maior abandono e óbito. Os internados devido à intolerância medicamentosa e motivo social apresentaram maior proporção de alta a pedido; o motivo social e o alcoolismo tiveram maior taxa de alta disciplinar. O hospital que internou pacientes do sexo feminino teve o maior número de altas a pedido e os do sexo masculino se destacaram por apresentar maior freqüência de alta disciplinar e abandono. (J Pneumol 2001;27(3):123-129)

Reasons for the admission, length of stay and type of discharge in tuberculosis hospitals in the State of São Paulo, Brazil ¾ 1981 to 1995

Introduction: Since 1981 the State Health Office has taken over the treatment and hospitalization of all tuberculosis cases in the State of São Paulo, southeastern Brazil. A decrease in both the incidence and the percentage of admissions due to tuberculosis has been observed during this period. Objective: To analyze the evolution of the reasons that led tuberculosis patients to hospitalization and correlate these reasons with hospitalization length and the type of discharge. Material and methods: A sample of 1,805 patients' records compiled between 1981 and 1995 at five tuberculosis hospitals in the State of São Paulo was reviewed. Results: The main reason for admission was general poor health, followed by cachexy. Increasing alcoholism was also observed. Among those who stayed in hospital for less than one week, the most frequent reasons for hospitalization were "other pathologies" and "respiratory insufficiency". These cases also showed the shortest average hospitalization length whereas the longest was presented by the patients admitted for social reasons and treatment failure. The patients with respiratory insufficiency presented the highest rate of dropouts and death. The highest rate of requested discharge was observed among the patients admitted due to drug intolerance whereas those admitted due to social reasons and alcoholism showed the highest rate of disciplinary release. The hospital that admitted females was the one with the highest rate of requested release, whereas in the hospitals that admitted males disciplinary release and dropouts were the most frequent types of discharge.

Descritores ¾ Tuberculose pulmonar. Tempo de internação. Pesquisa sobre serviços de saúde. Hospitais especializados. Alta do paciente.
Key words ¾ Pulmonary tuberculosis. Length of stay. Health services research. Specialized hospitals. Patient discharge. Siglas e abreviaturas utilizadas neste trabalho
INAMPS ¾ Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social
SES ¾ Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo

INTRODUÇÃO

A política de controle da tuberculose, até a década de 1960, esteve baseada em quimioterapia não normatizada, aliada à internação do doente, com alimentação reforçada e repouso.

No final da década de 50 houve a comprovação da vantagem do tratamento domiciliar sobre o hospitalar(1,2).

No Brasil, o Ministério da Saúde padroniza a internação hospitalar e recomenda o tratamento ambulatorial(3,4).

No Estado de São Paulo, até o ano de 1980, quase todos os casos de tuberculose eram internados sem obedecer às normas federais.

As atividades de controle da tuberculose no Estado, até 1981, eram desenvolvidas por órgãos da Secretaria de Estado da Saúde (SES), por unidades próprias ou conveniadas do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS) e também por serviços particulares.

Visando a melhoria e a intensificação da assistência médico-social ao tuberculoso e um sistema de controle da doença mais forte e eficaz, foi assinado em 24 de outubro de 1980 convênio entre o INAMPS e o Governo do Estado de São Paulo, através da SES (extrato publicado no "Diário Oficial da União" de 19/11/1980).

Em 1981 havia, no Estado de São Paulo, 1.600 leitos destinados aos tuberculosos; esse número foi reduzido para 618 leitos em 1995.

Nesse período foi verificada redução de 62,5% do total de leitos. Essa redução ocorreu, exclusivamente, nos leitos da SES, pois dos 1.300 existentes em 1981, havia apenas 313 em 1995; os hospitais conveniados mantiveram praticamente o mesmo número de leitos, passando de 300 em 1981 para 305 em 1995.

Nesses 15 anos observou-se que as atividades do Programa de Controle da Tuberculose foram influenciadas pelas diferentes transformações ocorridas na SES, por fatores socioeconômicos e pelo surgimento da AIDS. Porém, a prioridade do Programa sempre foi a busca de casos com tratamento completo, destinando os leitos hospitalares aos casos graves, aos sociais e àqueles com intolerância medicamentosa de difícil solução ambulatorial.

Segundo a Secretaria da Saúde, a incidência da doença era de 69,8 por 100.000 habitantes em 1981, com um percentual de internação em hospitais tisiológicos de 27,7%, e de 56,4 em 1995 com 10,3% de internação. Em números absolutos foram notificados 17.783 casos de tuberculose em 1981 e 19.019 em 1995.

Nesse período houve ¾ e continua havendo ¾ a tentativa de internar o paciente tuberculoso no hospital geral, até ser contornado o motivo que o levou a procurar o hospital. Porém, o que se observa é que, uma vez diagnosticada a tuberculose ou mesmo havendo a suspeita, é imediatamente solicitada a transferência para um hospital especializado; fazem exceção os pacientes imunodeprimidos, que têm hospitalização e tratamento adequados e em locais especializados na causa da queda de sua imunidade.

OBJETIVOS

Analisar a evolução dos motivos que levaram os doentes de tuberculose à internação e correlacionar esses motivos com o tempo de internação e com o tipo de saída.

MATERIAL E MÉTODOS

Foi verificado que, dos 19 hospitais que em 1981 internavam pacientes com tuberculose encaminhados por outras unidades de saúde ou pelos seus ambulatórios, apenas 11 ainda internam esses doentes; consultando esses hospitais, foi observado que apenas cinco deles ainda possuíam todos os prontuários e as radiografias dos casos internados com diagnóstico ou com suspeita de tuberculose.

Desses cinco hospitais, dois são próprios da SES e estão localizados no interior do Estado de São Paulo, um deles destinado a pacientes do sexo masculino (denominado Hospital A) e o outro para o sexo feminino (Hospital B).

Os outros três são conveniados com a SES e estão localizados na cidade de Campos de Jordão, sendo dois destinados a pacientes do sexo masculino (Hospitais C e E) e o outro, misto (Hospital D).

Para análise dos prontuários dos doentes de tuberculose dos cinco hospitais, foi realizada uma amostra sistemática dos mesmos, para cada hospital, com estratificação implícita para um grupo de três anos. Para a estimação das proporções de interesse no estudo, admitiu-se como aceitável uma precisão tal que em 95% das possíveis amostras o erro máximo de amostragem (em valor absoluto) não ultrapassasse 5%.

Dessa maneira, foram calculados o tamanho mínimo de cada amostra por hospital, em cada triênio, e o intervalo entre um prontuário e o seguinte a ser consultado. Foi obtido o número esperado de prontuários, sempre com arredondamento para cima.

Calculado o tamanho da amostra, foi feito teste e validada a ficha utilizada na coleta dos dados sobre aquele prontuário. Entre outras, foram anotadas as variáveis: duração da internação, tipo de saída e motivos da internação.

Foi observado que todos os pacientes tinham, além da tuberculose, outro motivo anotado no seu prontuário que justificava aquela internação. Esse motivo podia ser: de ordem clínica ¾ como mau estado geral, hemoptise, caquexia, insuficiência respiratória entre outros; relacionado à medicação ¾ como intolerância às drogas ou falência do tratamento; razões sociais ¾ como pacientes sem residência fixa, moradores em albergues, pessoas sem família, etc.; alcoolistas e outras causas ¾ que englobava diferentes agravos à saúde; entre eles se destacou a doença mental.

O tipo de saída anotado nos prontuários podia ser: por iniciativa médica ¾ quando havia concordância em que o paciente estava em condição de fazer tratamento ambulatorial; por abandono ou fuga; por óbito ¾ tendo a tuberculose como causa básica ou como associada; a pedido ¾ alta contra a orientação médica; disciplinar ¾ quando a sua conduta estava em desacordo com as normas daquele hospital e o paciente era convidado a se retirar; mudança de diagnóstico ¾ quando o paciente foi internado com suspeita de tuberculose e que não se confirmou; e transferência para outro hospital especializado.

O tempo de internação, em dias, foi calculado pela diferença entre a data da internação e a da saída do paciente; a duração média da internação foi calculada somando os dias de hospitalização dos em alta e dividindo-se pelo número de pacientes de saída (altas e óbitos); esse tempo foi dividido em: menor que 1 dia a 7 dias, pacientes com saídas precoces; de 8 a 30 dias; de 31 a 90 dias; de 91 a 180 dias; e acima de 180 dias, período superior ao tempo máximo de tratamento da tuberculose segundo as normas da SES.

Após a coleta das informações desses prontuários, elas foram transcritas para fichas pré-codificadas e, a seguir, digitadas.

Concluídas as tabulações, foram realizados testes estatísticos de qui-quadrado e de análise de variância das médias (teste F).

RESULTADOS

Todos os hospitais tiveram número de prontuários consultados igual ou superior ao esperado. Foram consultados 1.805 prontuários, 104,3% do esperado, que era de 1.731 e representou 10,8% das 18.168 internações ocorridas nesses cinco hospitais entre 1981 e 1995.

No 1º triênio (1981 a 83), com um total de 4.271 prontuários, foi obtida uma amostra de 352; no 2º (1984 a 86), com 3.407 prontuários, uma amostra de 345; no 3º (1987 a 89), com 3.028 prontuários, uma amostra de 341; no 4º (1990 a 92), de 2.919 prontuários, uma amostra de 339; e no 5º triênio (1993 a 95), de 4.543 prontuários, uma amostra de 354.

Na Tabela 1 observa-se a distribuição dos principais motivos de internação por ano. Verifica-se que o principal motivo que levou o paciente a ser internado foi o mau estado geral, com maior número de citações em todos esses anos.

Em segundo lugar encontra-se a caquexia e a hemoptise esteve em terceiro lugar até 1984; em 1985, a insuficiência respiratória ocupou esse lugar e de 1986 em diante esta posição foi ocupada pelo alcoolismo.

A Tabela 2 mostra a relação entre o motivo que levou o paciente a ser internado, o tempo em que ficou no hospital e o tempo médio de internação; nesta tabela o teste do qui-quadrado foi estatisticamente significante, mostrando haver diferenças entre os valores estudados; a análise da variância das médias demonstrou haver diferenças estatisticamente significantes entre as médias.

Nessa tabela pode-se observar que, dos pacientes que ficaram internados por até sete dias, as causas que mais se destacaram foram: o grupo das outras patologias, a insuficiência respiratória e a intolerância medicamentosa.

Os motivos que levaram ao maior tempo médio de internação foram: o social, e o mau estado geral e a falência do tratamento.

A Tabela 3 mostra a relação entre o motivo da internação e o tipo de saída; nesta tabela o teste do qui-quadrado foi significante; portanto, os seus valores são diferentes.

Dos 1.805 prontuários estudados, em 1.060 deles (58,7%) estava anotado que a saída foi por iniciativa médica. Esse tipo de saída foi o mais freqüente entre todos os motivos.

Foi observada a saída por abandono em 136 pacientes. Os internados devido a insuficiência respiratória (97 pacientes) foram os que tiveram maior percentual de abandono (12,4%), sendo a intolerância medicamentosa o de menor abandono.

Entre os 216 pacientes que foram a óbito, os internados por insuficiência respiratória (97 pacientes) foram os que tiveram maior percentual de mortes devido à tuberculose.

Nos 189 com saída a pedido, o motivo mais freqüente foi a intolerância medicamentosa (com 27 pacientes).

A saída disciplinar foi observada em 63 pacientes (3,5% do total).

A distribuição dos tipos de saída pelos hospitais está demonstrada na Tabela 4, na qual o teste do qui-quadrado também demonstrou que seus valores têm diferenças estatisticamente significantes.

Todos os hospitais tiveram um índice semelhante de saída por indicação médica, tendo o Hospital D o maior percentual dessa saída adequada.

Quanto ao abandono, o Hospital A apresentou o percentual mais elevado, seguido pelo C; o B foi o que teve menor taxa.

O maior percentual de óbitos ocorreu nos hospitais de Campos do Jordão (C, D e E) e o menor no B, que teve, também, o maior percentual de saídas a pedido.

A saída disciplinar foi semelhante nos hospitais masculinos e pequena no feminino (B) e no misto (C).

DISCUSSÃO

Na análise desses 15 anos, pode-se notar em primeiro lugar a maneira irresponsável como são cuidados os prontuários dos pacientes, pois, dos 11 hospitais, que desde 1981 têm leitos destinados a tuberculosos, somente cinco conservam essa documentação. Desses, em apenas um, o B, os prontuários não estavam em bom estado de conservação, fato esse justificado pela reforma de seu prédio.

Nos dias de hoje a hospitalização dos casos de tuberculose continua sendo uma necessidade em todos os países. A diferença é que, nos mais desenvolvidos, a principal causa de internação é a falência do tratamento conseqüente à não adesão ao mesmo. Este fato ocorre principalmente entre os alcoólatras e os usuários de drogas(5).

Nos países em desenvolvimento, as principais causas de hospitalização continuam sendo o mau estado geral e a caquexia(6), quadros indicativos de uma fase mais adiantada da doença. Isso ocorre, principalmente, por falhas no processo de busca do caso, que não consegue identificá-lo nas fases iniciais da tuberculose.

Quanto aos principais motivos de internação, observou-se que o mais freqüente foi o mau estado geral, pois esses pacientes são encaminhados numa fase avançada da doença e com complicações graves da mesma, o que justifica o percentual de óbitos. Além disso, também exigem maior atenção médico-hospitalar, resultando em maior tempo de internação.

A caquexia, que foi a segunda causa mais citada entre os motivos de internação, demonstra não só um grau adiantado da tuberculose como também uma má condição social. Esses doentes tiveram o tempo de internação e o percentual de saída por iniciativa médica próximo ao valor médio observado em cada variável.

A insuficiência respiratória teve um número de doentes não tão elevado como as duas causas anteriores. Porém, foi percebido que os pacientes com esse sintoma devem merecer um cuidado especial, pois neste grupo notou-se que ocorreu o mais alto percentual de óbitos e um dos menores tempos de internação, com maior proporção de altas precoces, com elevada taxa de abandono e um dos mais altos percentuais de saída por mudança de diagnóstico.

O alcoolismo e os casos sociais representam uma das mais justificadas causas de internação, tanto nos países desenvolvidos como nos em desenvolvimento.

A dependência ao álcool sempre foi causa importante de agravamento do quadro da tuberculose, não só pela desnutrição e pouco cuidado com a saúde geralmente observados nesses doentes e a conseqüente queda da sua imunidade, conforme referido por vários autores(5-12).

Os etilistas, quando internados, são afastados da bebida, podendo desencadear uma crise de abstinência que poderia levar à fuga do hospital e ao conseqüente abandono ou à saída disciplinar por brigas internas.

Da mesma maneira, os casos sociais são compostos em sua maioria por pessoas sem residência fixa, que, pela liberdade que desfrutavam na rua, não se adaptam ao regime de confinamento hospitalar, solicitando saída a pedido ou abandonando o hospital.

Os alcoolistas e os casos sociais que não tiveram saída do hospital por abandono, por indisciplina ou por solicitação foram dos que permaneceram mais tempo internados, pois havia concordância entre as Unidades de Saúde, a Coordenação do Programa de Tuberculose e dos Hospitais, além de pressão da sociedade para que esses doentes ficassem internados durante todo o tratamento, pois fora do hospital não seguem corretamente as orientações da equipe de saúde.

Os pacientes internados com hemoptise tiveram tempo médio de internação em um valor próximo ao valor médio e um percentual elevado de saídas por iniciativa médica, indicando bons resultados do tratamento dessa urgência.

Embora 16 (59,3%) dos 27 pacientes internados devido à intolerância medicamentosa tenham recebido alta por iniciativa médica, foi observado que sete deles (25,9%) solicitaram alta a pedido, o mais alto percentual desta modalidade de saída.

Entre os doentes agrupados na categoria de "outras", oito (19,5%) deles foram internados com suspeita de, além da patologia de base, estarem com tuberculose, fato este não confirmado após a internação. Isto explica esse percentual de saídas por mudança de diagnóstico.

Merecem destaque nesta categoria os pacientes internados com doença mental associada à tuberculose; eles deveriam merecer atenção especial devido ao alto percentual de óbitos e fugas observados nesse grupo, havendo a necessidade, portanto, de um hospital especializado no tratamento dessa associação. Infelizmente, o único hospital que havia no Estado de São Paulo, apto a receber e tratar os doentes mentais com tuberculose diagnosticados nas unidades de saúde e os transferidos de outros sanatórios, foi fechado no inicio de 1996.

Em relação ao tipo de saída, segundo os hospitais, notou-se que, nos cinco hospitais estudados, as saídas por iniciativa médica tiveram um percentual muito aquém do esperado; o desejável seria o mais próximo possível da totalidade dos casos, mas a percentagem mais alta alcançada foi de 68,8%, em apenas um hospital (D), sendo que a média foi de 58,7%.

Teixeira(13) encontrou 40,1% desse tipo de saída entre 1954 e 1956, apesar de naquela época a internação ser compulsória a todos os tuberculosos recém-diagnosticados e de não haver tantos recursos terapêuticos. Singleton et al.(5) relataram que, na hospitalização obrigatória de pacientes tuberculosos, a saída por iniciativa médica foi de 98%.

Uma das razões que pode levar um paciente ao abandono é a distância entre a sua residência e o hospital. Foi verificado que a maioria desses doentes era proveniente da cidade de São Paulo, que, pela carência de leitos especializados, transferia os tuberculosos residentes nessa região para o interior do Estado. Essa distância pode ter influenciado no abandono, pois esse fato já foi estudado por Rouillon(14) e apontado, no trabalho de Madras(2), como uma das principais causas de abandono.

Os três hospitais conveniados tiveram percentual maior de óbitos que os da SES. O motivo provável é que esses hospitais, por se localizarem em Campos do Jordão, estância climática de grande tradição na luta contra a tuberculose, estariam recebendo doentes que os procuravam, sem passar por uma unidade de saúde e, muitas vezes, provenientes de outros Estados, em mau estado geral. Também devido à proximidade da Capital, os hospitais de Campos do Jordão recebiam pacientes triados pelo único hospital especializado em tuberculose da região da Grande São Paulo, em estado geral de saúde bastante precário, pois, por falta de leitos suficientes para atender à demanda dessa importante e populosa região, era obrigado a encaminhar os doentes antes mesmo de reequilibrar suas condições físicas.

Convém ressaltar que o percentual de óbitos observado, 12,0%, está bem próximo dos 14,1% observados por Teixeira(13) nos hospitais das regiões Norte e Nordeste entre 1954 e 1956.

A alta a pedido foi maior no hospital B, que recebe exclusivamente mulheres. A tendência de mulheres requisitarem a saída, em maior proporção que os homens, já foi demonstrada por Almeida et al.(15) em 1958, no Rio de Janeiro; a principal causa apontada pelos autores foi o afastamento do lar, com conseqüências no casamento ou ainda por imposição do marido.

O percentual de saída disciplinar foi maior no Hospital C, seguido pelo A. Esses dois hospitais têm em comum o fato de se localizarem em área central das respectivas cidades, o que facilitava a fuga e o comércio clandestino de bebidas alcoólicas e drogas. Os pacientes, quando surpreendidos nessas infrações, eram punidos com alta disciplinar.

A saída por mudança de diagnóstico foi maior nos hospitais que internavam pacientes do sexo masculino (A, C e E).

A saída por transferência predominou entre os hospitais da SES e esse fato se deve, provavelmente, por receberem doentes com indicação de cirurgia tisiológica, para os cuidados necessários de pré-operatório e posterior encaminhamento ao Hospital do Mandaqui, o único apto a realizar esse procedimento.

A Cidade de São Paulo deveria dispor de um número maior de leitos ou enfermarias especializadas em tuberculose, evitando a transferência precoce para os hospitais do Interior e, assim, muitas saídas indesejáveis seriam evitadas. A SES deveria reativar os leitos destinados a doentes psiquiátricos com tuberculose e também dispor de enfermarias especializadas no tratamento de alcoolistas tuberculosos e pacientes sem residência fixa. Dessa maneira, por meio de tratamento e orientações específicas, teriam a motivação de fazer um tratamento correto como, também, aproveitariam esse período de internação para sua recuperação e integração na sociedade.

1. Médico; Doutor em Saúde Pública; Professor Doutor do Departamento de Epidemiologia.

Endereço para correspondência ¾ Av. Dr. Arnaldo, 715 ¾ 01246-904 ¾ São Paulo, SP. E-mail: pericles@usp.br

Recebido para publicação em 18/5/00. Reapresentado em 31/8/00. Aprovado, após revisão, em 19/1/01.

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    Trabalho realizado na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. Projeto de Pesquisa Financiado pela Fapesp, Proc. Nº 97/5.636-6.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Out 2002
    • Data do Fascículo
      Maio 2001

    Histórico

    • Recebido
      18 Maio 2000
    • Aceito
      19 Jan 2001
    Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Departamento de Patologia, Laboratório de Poluição Atmosférica, Av. Dr. Arnaldo, 455, 01246-903 São Paulo SP Brazil, Tel: +55 11 3060-9281 - São Paulo - SP - Brazil
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