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Coisas da vida de um ortopedista maduro

EDITORIAL

Nós, ortopedistas que passamos da provável metade de nossas vidas, dedicamos uma parcela razoável do tempo à nossa especialidade. Como profissionais, como alunos, como professores, como escritores, como leitores, como membros de sociedades de classe, como plateia de congressos, como expositores de congressos, como estagiários, como viajantes para estágios, alguns mais, outros menos, mas, seguramente, mais da metade de nossas vidas dedicamos a coisas relativas à ortopedia.

Toda esta atividade gera alegrias, tristezas, prazeres, desprazeres, amigos, inimigos e tantas outras coisas iguais ou opostas. Eu estou na faixa daqueles que tiveram grande dedicação à nossa especialidade; então, tenho um acervo enorme de coisas adquiridas nesses anos de ortopedia.

Os amigos sempre marcaram muito. Alguns amigos ortopédicos, de convívio essencialmente profissional esporádico e outros que ultrapassaram esta barreira e transformaram-se em amigos para a vida. Felizmente, fiz muito mais amigos ortopédicos do que inimigos, e tenho grandes amigos para a vida, oriundos de minha atividade profissional, acadêmica ou societária.

Recentemente, perdi um que eu prezava muito. Sua honestidade profissional e científica me impressionava, sua clareza de ideias me fascinava e a sua capacidade profissional sempre foi respeitada por todos.

Não sei em que dia ele nasceu, nem quando ele se formou ou se fez mestrado, ou doutorado, nem quando se transformou em professor. Este texto não é um necrológico, tenho certeza que alguém fará um perfeito com todos os dados. É um adeus de pesar e saudade ao amigo.

Político acadêmico, que sempre soube valorizar o médico, o pesquisador e o redator; foi um conselheiro muito importante no início de minha gestão na RBO.

Amigo de carreira universitária, que, quando atravessei o momento mais difícil de minha vida acadêmica, me aconselhou e me entusiasmou. Naquela ocasião, pensei várias vezes em desistir, e sempre fui estimulado a continuar na carreira, estímulo que veio com conselhos e convites para diversas atividades científicas para me motivar a ficar no meio acadêmico. Professor de vocação, dedicou-se, em tempo integral, a ensinar e pesquisar e sempre acreditou nesta tarefa.

Companheiro de sociedade médica que me demonstrou que o convívio com a indústria de material cirúrgico era necessário e poderia ser saudável. Membro importante da AO, soube valorizar e dignificar, como ninguém, a convivência da educação médica continuada e do patrocínio ético.

Cirurgião habilidoso, sempre pronto a melhorar e inovar, foi responsável por um sem número de táticas operatórias que vieram para simplificar e facilitar as cirurgias do trauma e do joelho, áreas nas quais tinha mais interesse.

Parceiro de golfe que, desde o início da prática, embora tardia como foi a minha, se destacou como jogador técnico de grande progresso. Pude usufruir de sua companhia por horas agradáveis nos diversos fairway dos campos que jogamos, ouvindo-o filosofar ou tentar me convencer que tudo o que havia de bom na ortopedia brasileira havia começado na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Apaixonado pelas suas origens, considerava que usufruía o que havia de melhor no mundo, desde o campo de golfe até a comida do Pirâmide, na sua cidade.

Caro amigo, vou me lembrar de você na sala de aula, no centro cirúrgico, nas orientações de teses, nas bancas examinadoras, na redação da RBO, no campo de golfe e todas as vezes que tiver que decidir algo. Perdê-lo foi coisa da vida de um ortopedista maduro.

Vá em paz caro amigo Paccola.

  • Coisas da vida de um ortopedista maduro

    Gilberto Camanho
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Out 2011
    • Data do Fascículo
      2011
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