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Aloenxerto circunferencial de fêmur proximal em cirurgias de revisão de artroplastia total de quadril

Resumos

OBJETIVO: Avaliar os resultados clínicos e radiográficos de pacientes submetidos à reconstrução femoral secundária a afrouxamento de artroplastia total de quadril, com utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal e implante cimentado. MÉTODOS: Foi efetuado um estudo retrospectivo com 32 pacientes (33 quadris) submetidos à reconstrução femoral secundária a afrouxamento de artroplastia total de quadril, com utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal e implante cimentado. Desses pacientes, 28 (29 quadris) preencheram todos os requisitos necessários. O seguimento médio foi de cinco anos e dois meses. A avaliação clínica foi realizada de acordo com o Harris Hip Score. Radiograficamente, os pacientes foram avaliados quanto à reabsorção e consolidação do aloenxerto, migração do trocânter maior, estabilidade do componente femoral e calcificação heterotópica. RESULTADOS: O Harris Hip Score apresentou resultado pré-operatório médio de 32 pontos e pós-operatório tardio de 82 pontos. Considerando-se a reabsorção do aloenxerto, visibilizou-se nove quadris (31%) com presença de reabsorção em algum grau. Com relação à consolidação, observou-se 24 casos (82,8%) consolidados, três (10,3%) consolidados parcialmente e dois (6,9%) com pseudoartrose. Conforme os critérios estabelecidos, consideraram-se 27 casos (93,1%) como sucesso da reconstrução em seguimento médio de cinco anos e dois meses. CONCLUSÕES: Com base nos resultados obtidos, conclui-se que a utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal em casos selecionados de reconstrução femoral secundária a afrouxamento de artroplastia, apresenta alto índice de sobrevida da reconstrução em seguimento médio de cinco anos e dois meses.

Artroplastia do Quadril; Fêmur; Transplante homólogo; Falha de Prótese


OBJECTIVE: To evaluate the clinical and radiographic results from patients who underwent femoral reconstruction secondary to loosening of total hip arthroplasty, using circumferential proximal femoral allografts and cemented implants. METHODS: A retrospective study was conducted on 32 patients (33 hips) who underwent femoral reconstruction secondary to loosening of total hip arthroplasty, using circumferential proximal femoral allografts and cemented implants. Among these patients, 28 (29 hips) fulfilled all the requirements for this study. The mean follow- up was five years and two months. The clinical evaluation was done in accordance with the Harris Hip Score. Radiographically, the patients were assessed regarding reabsorption and consolidation of the allograft, migration of the greater trochanter, stability of the femoral component and heterotypic calcification. RESULTS: The average preoperative Harris Hip Score was 32 points. At the last postoperative follow-up, the average score was 82 points. Allograft resorption of some degree was seen in nine hips (31%). Regarding consolidation, 24 cases (82.8%) showed full consolidation, three (10.3%) showed partial consolidation and two (6.9%) showed pseudarthrosis. All femoral components were stable. According to the criteria established, 27 cases (93.1%) were considered to be successful reconstructions after a mean follow-up of five years and two months. CONCLUSIONS: From the results obtained, it was concluded that use of circumferential proximal femoral allografts in selected cases of femoral reconstruction secondary to loosening of arthroplasty presented a high survival rate from the reconstruction over an average follow-up of five years and two months.

Arthroplasty; Replacement; Hip; Femur; Homologous Transplant; Prosthesis Failure


ARTIGO ORIGINAL

Aloenxerto circunferencial de fêmur proximal em cirurgias de revisão de artroplastia total de quadril

Bruno Dutra RoosI; Milton Valdomiro RoosII; Antero Camisa JúniorI; Henrique Bonotto LampertIII; Matheus Luis da SilvaIII

IPreceptor do Programa de Residência Médica em Ortopedia e Traumatologia do Hospital Ortopédico de Passo Fundo - HOPF; Membro do Grupo de Cirurgia e Reconstrução do Quadril do HOPF - Passo Fundo, RS, Brasil

IIChefe do Programa de Residência Médica em Ortopedia e Traumatologia do HOPF; Membro do Grupo de Cirurgia e Reconstrução do Quadril do HOPF - Passo Fundo, RS, Brasil

IIIResidente do 3o ano do Programa de Treinamento em Ortopedia e Traumatologia do HOPF - Passo Fundo, RS, Brasil

Correspondência Correspondência: Av. Sete de Setembro, 817, Centro 99010-121 - Passo Fundo, RS, Brasil E-mail: brunodroos@gmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar os resultados clínicos e radiográficos de pacientes submetidos à reconstrução femoral secundária a afrouxamento de artroplastia total de quadril, com utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal e implante cimentado.

MÉTODOS: Foi efetuado um estudo retrospectivo com 32 pacientes (33 quadris) submetidos à reconstrução femoral secundária a afrouxamento de artroplastia total de quadril, com utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal e implante cimentado. Desses pacientes, 28 (29 quadris) preencheram todos os requisitos necessários. O seguimento médio foi de cinco anos e dois meses. A avaliação clínica foi realizada de acordo com o Harris Hip Score. Radiograficamente, os pacientes foram avaliados quanto à reabsorção e consolidação do aloenxerto, migração do trocânter maior, estabilidade do componente femoral e calcificação heterotópica.

RESULTADOS: O Harris Hip Score apresentou resultado pré-operatório médio de 32 pontos e pós-operatório tardio de 82 pontos. Considerando-se a reabsorção do aloenxerto, visibilizou-se nove quadris (31%) com presença de reabsorção em algum grau. Com relação à consolidação, observou-se 24 casos (82,8%) consolidados, três (10,3%) consolidados parcialmente e dois (6,9%) com pseudoartrose. Conforme os critérios estabelecidos, consideraram-se 27 casos (93,1%) como sucesso da reconstrução em seguimento médio de cinco anos e dois meses.

CONCLUSÕES: Com base nos resultados obtidos, conclui-se que a utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal em casos selecionados de reconstrução femoral secundária a afrouxamento de artroplastia, apresenta alto índice de sobrevida da reconstrução em seguimento médio de cinco anos e dois meses.

Descritores: Artroplastia do Quadril/métodos; Fêmur/cirurgia; Transplante homólogo/efeitos adversos; Falha de Prótese

INTRODUÇÃO

O afrouxamento do implante após artroplastia total de quadril pode levar, a longo prazo, a osteólise femoral extensa. Nesses casos, a utilização de técnicas convencionais de revisão não obtém resultados satisfatórios(1-3).

Encontram-se inúmeros métodos de tratamento cirúrgico descritos na literatura para superar esse problema, porém ainda não há consenso em relação a melhor técnica a ser aplicada. Aloenxerto circunferencial de fêmur proximal ou distal, enxerto ósseo fragmentado associado a telas de sustentação, enxertia óssea estrutural cortical, endopróteses e hastes femorais de fixação distal são algumas das alternativas existentes(1-3).

O uso de aloenxerto femoral circunferencial permite a reconstrução de defeitos de grande extensão, corrigindo o mecanismo abdutor do quadril e a discrepância de comprimento do membro(1,2). Apresenta também potencial osteocondutivo, na medida em que permite substituição gradual por osso hospedeiro, com consequente reposição do estoque ósseo, fornecendo leito favorável para futuras revisões, se necessário.

O objetivo do presente artigo é avaliar os resultados clínicos, radiográficos e a sobrevida da reconstrução femoral secundária a afrouxamento de artroplastia total de quadril, com a utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal e implante cimentado.

MATERIAIS E MÉTODOS

Foi realizado um estudo retrospectivo com 32 pacientes (33 quadris) submetidos à reconstrução femoral secundária a afrouxamento de artroplastia total de quadril, com a utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal e implante cimentado, de março de 1988 a fevereiro de 2008. Todas as reconstruções foram realizadas pelo mesmo cirurgião do Serviço (MVR). Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Passo Fundo.

Foram incluídos no estudo pacientes com uma ou mais artroplastias prévias, os quais foram submetidos à reconstrução femoral utilizando aloenxerto circunferencial de fêmur proximal (não irradiado) associado a implante cimentado, e que apresentavam seguimento mínimo de um ano.

Os critérios de exclusão foram perdas de seguimento (dois casos) e falecimento antes do seguimento mínimo (dois casos).

De acordo com os critérios estabelecidos, 28 pacientes (29 quadris) preencheram todos os requisitos necessários para este trabalho, sendo 23 pacientes do sexo feminino e cinco, do masculino. Destes, 27 casos foram submetidos a tratamento cirúrgico por afrouxamento asséptico de artroplastia e dois por infecção (afrouxamento séptico, com reconstrução em dois tempos). O lado direito foi o predominante em 21 quadris.

A média de idade dos pacientes no momento da cirurgia foi de 61,4 anos (28 a 85 anos). O seguimento médio foi de 5,15 anos (61,8 meses), sendo o seguimento máximo de 20 anos e seis meses. O comprimento médio do aloenxerto foi de 13,4cm (8 a 20cm), aferição realizada a partir do ápice do trocânter maior.

Os métodos utilizados para fixação do aloenxerto foram: 12 casos com enxerto estrutural cortical associado a cerclagens, oito casos com placa e parafusos, três casos com cerclagens isoladamente, três casos com placa e parafusos associados a cerclagens, dois casos com placa e parafusos associado a enxerto estrutural e cerclagens, e um caso com enxerto estrutural cortical e parafusos.

Os pacientes foram classificados clinicamente no pré e pós-operatório pelo Harris Hip Score(4). Sucesso clínico foi definido como aumento de 20 pontos no Harris Hip Score(4) pós-operatório em relação ao pré-operatório, implante estável e ausência de necessidade de nova cirurgia na época da revisão(3).

Os defeitos ósseos foram determinados de acordo com a classificação de D'Antonio, adotada pela Ameri can Academy of Orthopaedic Surgeons (AAOS)(5).

A presença de reabsorção endosteal e periosteal do enxerto foram avaliadas nas zonas femorais descritas por Gruen et al(6). As zonas um e quatro foram excluídas devido à ausência do trocânter maior (zona um) e à junção enxerto-hospedeiro (zona quatro)(3). Reabsorção leve foi definida por absorção parcial da espessura cortical com comprimento menor que 1cm; reabsorção moderada como absorção parcial da espessura cortical maior que 1cm; e reabsorção severa como absorção de toda a espessura cortical em qualquer comprimento(3).

A consolidação do aloenxerto foi avaliada em radiografias pós-operatórias tardias, sendo considerados consolidados os casos em que não havia linha de radioluscência na interface enxerto-osso hospedeiro; consolidação parcial quando havia linha de radioluscência parcial; e união fibrosa ou pseudoartrose quando havia linha de radioluscência em toda extensão da interface(3).

Em radiografias realizadas no pós-operatório imediato e tardio comparou-se a migração do trocânter maior hospedeiro. Migração maior de 1cm foi considerada pseudoartrose trocantérica(3).

A estabilidade do implante femoral foi avaliada quanto à presença de linhas radioluscentes na interface cimento-osso e de migração do mesmo. Foi definido afrouxamento do componente quando evidenciado migração vertical maior de 3mm ou fratura do cimento(3).

A presença de calcificação heterotópica do quadril foi classificada conforme Brooker et al(7).

Para evitar erros inter e intraobservadores, as aferições foram acompanhadas por dois cirurgiões do Grupo de Cirurgia e Reconstrução do Quadril (BDR e ACJr). No caso de haver discordância, uma nova avaliação era executada, agora por um terceiro cirurgião (MVR), procedendo-se, então, a um consenso da aferição.

A análise estatística foi realizada para se estabelecerem comparações entre as medidas do pré e do pós-operatório em relação ao Harris Hip Score(4), utilizando-se o teste de Wilcoxon.

Realizou-se a curva de Kaplan-Meier para análise de sobrevida cumulativa por mês da reconstrução. Falha do aloenxerto foi definida como necessidade de remoção da enxertia ou do implante femoral, ou ainda reabsorção cortical severa(3).

Técnica cirúrgica

Para escolha do aloenxerto mais adequado e que mais se adapte ao fêmur do paciente avalia-se pré-operatoriamente cada caso e mensura-se a dimensão do defeito femoral.

Utilizamos abordagem cirúrgica anterolateral associada à osteotomia do trocânter maior, em todos os casos. A técnica cirúrgica utilizada é semelhante à descrita previamente por Blackley et al(3). Atualmente, preferimos o método de telescopagem do aloenxerto circunferencial femoral dentro do osso hospedeiro sempre que possível, devido à grande estabilidade da reconstrução (Figura 1). Se necessário, utilizamos enxerto estrutural cortical e amarrias com cerclagens como elementos acessórios à fixação.


Manejo pós-operatório

Os pacientes são mantidos em repouso no leito por aproximadamente 48h (com variações de acordo com as circunstâncias transoperatórias) e, após esse período, é permitida a posição sentada (fora do leito). Utiliza-se profilaxia tromboembólica mecânica no pós-operatório imediato, antiagregante plaquetário durante 30 dias e antibioticoterapia endovenosa com Vancomicina por 10 dias. Além disso, em cada dose de cimento ósseo utilizado é adicionado um grama de Vancomicina. Realiza-se avaliação radiográfica nove semanas após o procedimento cirúrgico; a partir desse momento, é permitido apoio total com uma muleta como elemento acessório de equilíbrio (Figura 2).


RESULTADOS

A classificação clínica dos pacientes de acordo com o Harris Hip Score(4) apresentou resultado pré-operatório médio de 32 pontos (20 a 46 pontos). No pós-operatório tardio a média foi de 82 pontos (59 a 98 pontos). A avaliação dos resultados obtidos mostrou diferença estatisticamente significativa (p < 0,05) entre as medidas pré e pós-operatórias.

De acordo com a classificação da AAOS(5), dos 29 quadris avaliados, 25 (86,2%) defeitos femorais foram considerados combinados e quatro (13,8%) segmentares. Quanto à localização dos defeitos, dois casos (6,9%) foram classificados como nível I (proximais à região inferior do trocânter menor) e o restante nível II (até 10cm distal a região inferior do trocânter menor). Todos os pacientes apresentavam perda óssea grau III (ausência de contato implante-osso hospedeiro).

Considerando-se a reabsorção do aloenxerto, constataram-se três casos (10,3%) com reabsorção leve, cinco (17,2%) com reabsorção moderada e um (3,4%) com reabsorção grave (Figura 3). As zonas de Gruen et al(6) mais frequentemente acometidas foram a dois e a seis, sendo que em dois casos (6,9%) elas foram simultaneamente comprometidas. Não houve relação entre tempo de seguimento e grau de reabsorção.


Com relação à consolidação do aloenxerto, observou-se 24 casos (82,8%) consolidados, três casos (10,3%) consolidados parcialmente e dois casos (6,9%) com união fibrosa ou pseudoartrose (não consolidados) (Figura 4). Dos pacientes sem evidência de consolidação, um apresenta-se assintomático em seguimento de 12 meses. O outro foi submetido a novo tratamento cirúrgico com fixação do aloenxerto com placa e parafusos associado a enxerto estrutural cortical aos 12 meses de seguimento e, atualmente, encontra-se novamente sintomático e sem evidência de consolidação do enxerto circunferencial aos 31 meses de seguimento.


A avaliação da migração do trocânter maior evidenciou um caso (3,4%) com migração maior de 1cm (pseudoartrose trocantérica). Em dois quadris (6,9%) não foi possível realizar a aferição devido à ausência do trocânter maior hospedeiro.

Não se observou migração vertical do implante femoral maior que 3mm ou fratura do cimento, o que indicou estabilidade dos componentes.

A classificação de Brooker et al(7) que avalia a presença de calcificação heterotópica do quadril considerou 23 pacientes (79,3%) como grau 0, cinco (17,2%) como grau I e um (3,4%) como grau II.

Dessa maneira, de acordo com a definição proposta, obtiveram-se 27 casos (93,1%) de sucesso clínico. Dos dois casos de insucesso, um dos pacientes apresentou infecção tardia (aos sete anos e dois meses de seguimento) e o outro apresentou pseudoartrose com necessidade de nova intervenção.

Conforme os critérios estabelecidos para falha do aloenxerto, consideraram-se 27 casos (93,1%) como sucesso da reconstrução em seguimento médio de cinco anos e dois meses. Em um dos casos de falha, evidenciou-se a presença de reabsorção grave na zona dois de Gruen et al(6) (aos 19 anos e seis meses de seguimento); no outro, houve necessidade de remoção do implante femoral devido à infecção (manteve-se o aloenxerto).

As complicações mais frequentemente encontradas foram: seis casos (20,7%) de luxação protética, três casos (10,3%) de fratura periprotética, dois casos (6,9%) de união fibrosa ou pseudoartrose, um caso (3,4%) de lesão no nervo ciático (com recuperação completa) e um caso (3,4%) de infecção (que ocorreu tardiamente aos sete anos e dois meses de seguimento) (Tabela 1).

Na análise da sobrevida, estimada em 20 anos, constatou-se 83,3% de probabilidade de sucesso em 86 meses (IC95% = [69,63; 97,03%]), e de 41,67% aos 234 meses (IC95% = [23,77; 59,57%]) (Figura 5).


DISCUSSÃO

Existem inúmeros métodos de reconstrução femoral para revisão de artroplastia total de quadril descritos na literatura. Dentre eles, a utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal ou distal, enxerto ósseo fragmentado associado ou não a telas de sustentação, enxertia óssea estrutural cortical, endopróteses e hastes femorais de fixação distal(1-3). Contudo, poucas opções podem ser aplicadas em casos de defeitos ósseos circunferenciais extensos (maior que 5cm)(3). Nesses pacientes, as técnicas mais utilizadas são as endopróteses e os aloenxertos femorais circunferenciais.

A utilização de endopróteses apresenta complicações como instabilidade devido à má fixação de partes moles, fratura por fadiga do implante e afrouxamento precoce. Também não auxiliam na reposição do estoque ósseo(1-3,8,9).

O uso de aloenxertos femorais circunferenciais permanece controverso na literatura. Muitas dessas publicações apresentam um número pequeno de pacientes, com variadas técnicas cirúrgicas e tipos de aloenxertos utilizados, além de diferentes implantes. Somado a isso, poucos autores relatam seguimentos de médio a longo prazo(1-3,8,10-15). Na literatura nacional, ao nosso conhecimento, não há artigos que avaliam este tipo de técnica de reconstrução femoral.

Blackley et al(3) avaliaram 63 quadris submetidos à reconstrução femoral com a utilização de aloenxerto femoral circunferencial associado a implante cimentado e constataram sobrevida da reconstrução de 86% em seguimento médio de 10 anos. Houve 13 complicações (21% dos pacientes) que necessitaram de nova intervenção cirúrgica.

Haddad et al(10) relataram sobrevida da reconstrução de quadril com a utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal de 89%, em 55 quadris avaliados, com seguimento médio de 8,8 anos. Houve um grande número de complicações, dentre elas 22 pseudoartrose trocantéricas e seis casos de instabilidade. O artigo apresentou análise combinada de casos de implantes cimentados e não cimentados.

A literatura descreve um grande número de complicações relacionadas a este tipo de técnica de reconstrução(1-3,8,10-11,15). As que mais frequentemente requerem novo procedimento cirúrgico são infecção, pseudoartrose, fratura do aloenxerto e instabilidade. Além disso, a utilização de enxerto homólogo apresenta risco potencial de transmissão de doenças, que é mínimo com os métodos atuais de captação, processamento e armazenamento dos tecidos musculoesqueléticos(16).

A incidência de infecção, complicação mais temida, pode variar de 3(15) a 20%(17) dos casos. Os principais fatores relacionados são o tempo de duração do procedimento, o grau de dano tecidual no momento da intervenção e a quantidade de perda sanguínea(2,11).

A pseudoartrose da junção enxerto-osso hospedeiro pode ocorrer em 3,5(15) a 23%(13) das reconstruções. Tal desfecho pode ser evitado proporcionando-se o maior contato possível entre o enxerto e o osso hospedeiro (através de osteotomias que aumentem a superfície de contato e evitando-se a presença de cimento ósseo local), fixação interna rígida com a utilização de enxerto estrutural cortical associado a cerclagens, uso do autoenxerto disponível no transoperatório (femoral ou acetabular) para preenchimento da interface, e manutenção da inserção de partes moles no osso remanescente (que deve ser fixado em torno do aloenxerto femoral)(3).

A fratura do aloenxerto é uma complicação descrita entre 0(3) e 16,5%(12) das séries. Segundo a literatura, pode-se diminuir a sua incidência com a utilização de implantes femorais que ultrapassem a junção enxerto-osso hospedeiro (alcançando a diáfise do fêmur remanescente) e evitando-se a presença de parafusos ou placas no aloenxerto (que podem causar enfraquecimento do mesmo)(3).

Outra potencial complicação é a instabilidade, que em cirurgias de reconstrução do quadril está relacionada principalmente à deficiência do mecanismo abdutor (que muitas vezes está gravemente acometido) e discrepância de comprimento dos membros. Sua incidência pode variar de 6(3) a 22,7%(17) dos casos. Alguns autores indicam a utilização de componentes acetabulares constritos quando a estabilidade é precária(18-20).

No presente trabalho, a utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal apresentou resultados clínicos satisfatórios e sobrevida da reconstrução de 93,1% em seguimento médio de cinco anos e dois meses. A complicação mais frequente foi a luxação protética (20,7%), que também foi encontrada em estudos de outros autores(3,16).

Uma das limitações do presente estudo é o número restrito de pacientes, porém este tipo de reconstrução femoral é considerado de exceção. Outra limitação é a utilização de diferentes métodos de fixação do aloenxerto circunferencial, o que pode refletir em resultados não homogêneos.

CONCLUSÃO

Com base nos resultados obtidos, conclui-se que a utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal em reconstrução femoral secundária a afrouxamento de artroplastia de quadril apresenta alto índice de sobrevida e resultados clínicos satisfatórios em seguimento médio de cinco anos e dois meses, em pacientes selecionados. Existe grande número de complicações associadas, o que é inerente à gravidade e complexidade dos casos.

Trabalho recebido para publicação: 12/02/2012, aceito para publicação: 12/04/2012.

Os autores declaram inexistência de conflito de interesses na realização deste trabalho

Trabalho realizado no Hospital Ortopédico de Passo Fundo, Faculdade de Medicina da Universidade de Passo Fundo - Passo Fundo, RS.

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    99010-121 - Passo Fundo, RS, Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Fev 2013
    • Data do Fascículo
      2012

    Histórico

    • Recebido
      12 Fev 2012
    • Aceito
      12 Abr 2012
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