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Reconstrução do ligamento cruzado anterior pelo portal anteromedial e fixação femoral com Rigidfix Trabalho desenvolvido no Instituto de Ortopedia e Traumatologia de Passo Fundo, Passo Fundo, RS, Brasil.

Resumos

Objetivo:

Avaliar uma série de pacientes submetidos à cirurgia de reconstrução do ligamento cruzado anterior com tendões flexores pela técnica transportal anteromedial com o uso de Rigidfix para fixação femoral e analisar o posicionamento dos pinos por meio de tomografia.

Métodos:

Foram incluídos no estudo 32 pacientes. A avaliação clínica foi feita com os escores de Lysholm, IKDC subjetivo e Rolimeter. Todos foram submetidos a tomografia computadorizada com reconstrução em 3D para avaliação do ponto de entrada e do posicionamento dos pinos do Rigidfix em relação à cartilagem articular do côndilo lateral do fêmur.

Resultados:

A média do escore de Lysholm obtido foi de 87,81 e do IKDC subjetivo, de 83,72. Dos 32 pacientes avaliados, 43% retornaram a atividades consideradas muito vigorosas, 9% a vigorosas, 37,5% a moderadas e 12,5% a leves. Em 16 pacientes (50%), o ponto de entrada do pino distal do Rigidfix foi localizado fora da cartilagem (extracartilagem), em sete (21,87%) o pino distal lesou a cartilagem articular (intracartilagem) e em nove (28,12%) ficou na borda da cartilagem articular do côndilo lateral do fêmur.

Conclusão:

Os pacientes submetidos à reconstrução do LCA com o sistema Rigidfix pela técnica transportal anteromedial apresentaram um resultado clínico satisfatório no tempo de seguimento avaliado. Entretanto, o risco de lesão da cartilagem articular pelo pino distal do Rigidfix deve ser considerado quando a técnica via portal anteromedial é usada. Outros estudos com maior número de pacientes e com um tempo de seguimento mais longo devem ser feitos para melhor avaliação.

Joelho/cirurgia; Ligamento cruzado anterior; Reconstruçã


Objective:

To evaluate a series of patients who underwent surgery for reconstruction of the anterior cruciate ligament with flexor tendons, by means of the anteromedial transportal technique using Rigidfix for femoral fixation, and to analyze the positioning of the pins by means of tomography.

Methods:

Thirty-two patients were included in the study. The clinical evaluation was done using the Lysholm, subjective IKDC and Rolimeter. All of them underwent computed tomography with 3D reconstruction in order to evaluate the entry point and positioning of the Rigidfix pins in relation to the joint cartilage of the lateral condyle of the femur.

Results:

The mean Lysholm score obtained was 87.81 and the subjective IKDC was 83.72. Among the 32 patients evaluated, 43% returned to activities that were considered to be very vigorous, 9% vigorous, 37.5% moderate and 12.5% light. In 16 patients (50%), the distal entry point of the Rigidfix pin was located outside of the cartilage (extracartilage); in seven (21.87%), the distal pin injured the joint cartilage (intracartilage); and in nine (28.12%), it was at the border of the lateral condyle of the femur.

Conclusion:

The patients who underwent ACL reconstruction by means of the anteromedial transportal using the Rigidfix system presented satisfactory clinical results over the length of follow-up evaluated. However, the risk of lesions of the joint cartilage from the distal Rigidfix pin needs to be taken into consideration when the technique via an anteromedial portal is used. Further studies with larger numbers of patients and longer follow-up times should be conducted for better evaluation.

Knee/surgery; Anterior cruciate ligament; Reconstruction


Introdução

A lesão do ligamento cruzado anterior (LCA) é uma das lesões ligamentares mais comuns do joelho. Diferentes técnicas com diferentes tipos de enxerto e diferentes métodos de fixação têm sido descritos para o tratamento cirúrgico, todos com resultados clínicos satisfatórios. Atualmente, a reconstrução do LCA com uso de enxertos autólogos dos tendões do grácil e semitendíneo ganha popularidade por causa da menor morbidade do sítio doador do enxerto, menor incidência de sintomas femoropatelares e menor incidência de contraturas em flexão.11. Beynnon BD, Johnson RJ, Abate JA, Fleming BC, Nichols CE. Treatment of anterior cruciate ligament injuries, part I. Am J Sports Med. 2005;33(10):1579–602.,22. Webster KE, Feller JA, Hameister KA. Bone tunnel enlargement following anterior cruciate ligament reconstruction: a randomised comparison of hamstring and patellar tendon grafts with 2-year follow-up. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 2001;9(2):86–91.

O sucesso da cirurgia de reconstrução do LCA está relacionado a vários fatores pré-operatórios, transoperatórios e pós-operatórios. Dentre eles, o posicionamento dos túneis ósseos na cirurgia de reconstrução do LCA e, consequentemente, do enxerto tendíneo é considerado um dos fatores isolados mais importantes. Estudos recentes mostram que o túnel femoral, quando posicionado de forma mais anatômica em relação à inserção femoral do LCA, proporciona um melhor controle rotacional do joelho, uma melhor mobilidade do joelho e uma menor chance de impacto do LCA sobre o ligamento cruzado posterior (LCP) durante a flexão.33. Cha PS, Chhabra A, Harner CD. Single-bundle anterior cruciate ligament reconstruction using the medial portal technique. Oper Tech Orthop. 2005;15:89–95. Existem três técnicas para a confecção do túnel femoral: a transtibial, a de fora para dentro, ou técnica das duas incisões, e a transportal (anteromedial ou medial acessória). Alguns estudos mostram que com a técnica transtibial, na qual o túnel femoral é feito através do túnel tibial, é mais difícil o posicionamento anatômico do túnel femoral.44. Gelber PE, Reina F, Torres R, Pelfort X, Tey M, Monllau JC. Anatomic single-bundle anterior cruciate ligament reconstruction from the anteromedial portal: evaluation of transverse femoral fixation in a cadaveric model. Arthroscopy. 2010;26(5):651–7.,55. Gavriilidis I, Motsis EK, Pakos EE, Georgoulis AD, Mitsionis G, Xenakis TA. Transtibial versus anteromedial portal of the femoral tunnel in ACL reconstruction: a cadaveric study. Knee. 2008;15(5):364–7. Por isso, a técnica transportal anteromedial, com os túneis feitos de maneira independente e sem a necessidade de incisão adicional no aspecto lateral do fêmur, é foco de constante discussão.

Os diferentes tipos de enxerto tendíneo e a busca de um túnel femoral mais horizontal no côndilo femoral lateral ocasionam uma readequação nos métodos de fixação tradicionalmente usados na reconstrução do LCA com tendões flexores. Assim, métodos de fixação transversa com ângulo fixo de entrada dos implantes no aspecto lateral do fêmur são reavaliados, pois podem pôr em risco estruturas posterolaterais e intra-articulares do joelho.44. Gelber PE, Reina F, Torres R, Pelfort X, Tey M, Monllau JC. Anatomic single-bundle anterior cruciate ligament reconstruction from the anteromedial portal: evaluation of transverse femoral fixation in a cadaveric model. Arthroscopy. 2010;26(5):651–7.

O sistema Rigidfix (Mytek, Norwood, MA) consiste em dois pinos de ácido polilático de 2,7 mm de diâmetro para a fixação femoral do enxerto no túnel femoral. O sistema transfixa o enxerto em dois pontos, o comprime contra a parede do túnel e permite uma ampla área de contato enxerto-osso.66. Rodeo SA, Arnoczky SP, Torzilli PA, Hidaka C, Warren RF. Tendon-healing in a bone tunnel. A biomechanical and histological study in the dog. J Bone Joint Surg Am. 1993;75(12):1795–803. Em um estudo anatômico, Castoldi et al.77. Castoldi F, Bonasia DE, Marmotti A, Dettoni F, Rossi R. ACL reconstruction using the Rigidfix femoral fixation device via the anteromedial portal: a cadaver study to evaluate chondral injuries. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 2008;16(3):275–8. avaliaram o posicionamento de entrada do Rigidfix no côndilo lateral com a técnica via portal anteromedial. Os autores concluíram que o risco de lesão condral decorrente da entrada do implante varia de acordo com a angulação dos guias de inserção dos pinos e também de acordo com o tamanho dos côndilos femorais.

O presente estudo tem como objetivo avaliar uma série de pacientes submetidos à cirurgia de reconstrução do LCA com tendões flexores pela técnica transportal anteromedial com o sistema Rigidfix para fixação femoral. Como objetivo secundário avalia o posicionamento de entrada dos pinos do Rigidfix por meio de tomografia em 3D.

Materiais e métodos

Foram selecionados para o estudo 32 pacientes. Todos foram operados pela mesma equipe cirúrgica entre janeiro de 2009 e julho de 2010. Foram incluídos pacientes submetidos à cirurgia de reconstrução do LCA com enxerto quádruplo autólogo de tendões flexores (grácil e semitendíneo) com Rigidfix para fixação femoral e Biointrafix (Mitek, Norwood, MA) para a fixação tibial, operados por meio da técnica transportal anteromedial88. Hantes ME, Dailiana Z, Zachos VC, Varitimidis SE. Anterior cruciate ligament reconstruction using the Bio-TransFix femoral fixation device and anteromedial portal technique. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 2006;14(5):497–501. com pelo menos 24 meses de seguimento pós-operatório. Excluímos do estudo pacientes em que se usou outro tipo de enxerto para a reconstrução do LCA (tendão patelar, quadríceps ou aloenxerto), casos em que se usou outra via que não a transportal anteromedial para a confecção do túnel femoral e seguimento menor do que 24 meses ou outro método de fixação femoral do enxerto. O estudo teve a aprovação do Comitê de Bioética em Pesquisa da instituição e todos os indivíduos avaliados assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Para a avaliação do posicionamento do ponto de entrada e dos pinos do Rigidfix, todos os pacientes foram submetidos a exame de tomografia computadorizada multislice com reconstrução em 3D (Toshiba de 64 canais modelo Aquilion TSX-101) em até seis semanas após a cirurgia. O posicionamento do ponto de entrada dos pinos proximal e distal do Rigidfix no aspecto lateral do côndilo femoral lateral e na superfície articular do côndilo lateral foi classificado como "intracartilagem" (IC), "na borda da cartilagem" (BC) e "extra-cartilagem" (EC) (fig. 1).

Figura 1
Imagem tomográfica com reconstrução 3D do joelho que mostra as referências usadas para definição dos pontos de entrada dos pinos Rigidfix no côndilo lateral do fêmur e relacionados à cartilagem articular. (Ponto verde – extracartilagem, amarelo – borda da cartilagem, vermelho – intracartilagem.

Para avaliação clínica, os pacientes foram submetidos a aferição objetiva da translação anterior e funcional pré e pós-operatórias com o uso das escalas de Lysholm99. Lysholm J, Gillquist J. Evaluation of knee ligament surgery results with special emphasis on use of a scoring scale. Am J Sports Med. 1982;10(3):150–4.,1010. Peccin MS, Ciconelli R, Cohen M. Questionário específico para sintomas do joelho Lysholm Knee Score Scale – Tradução e validação para a língua portuguesa. Acta Ortop Bras. 2006;14(5):268–72. e IKDC subjetivo.1111. Irrgang J. ACL outcomes. Paper presented at International Society of Arthroscopy, Knee Surgery and Orthopaedic Sports Medicine, 2001. Montreux, Switzerland: International Knee Documentation Committee; 2000. Available in http://www.udel.edu/PT/PT%20Clinical%20Services/journalclub/sojc/0304/sep03/IKDC.pdf
http://www.udel.edu/PT/PT%20Clinical%20S...
O escore de Lysholm usa a forma ordinal de avaliação e são definidos como "excelente" valores entre 95 e 100 pontos, "bom" entre 84 e 94 pontos, "regular" entre 65 e 83 pontos e "ruim" abaixo de 64 pontos.99. Lysholm J, Gillquist J. Evaluation of knee ligament surgery results with special emphasis on use of a scoring scale. Am J Sports Med. 1982;10(3):150–4.,1010. Peccin MS, Ciconelli R, Cohen M. Questionário específico para sintomas do joelho Lysholm Knee Score Scale – Tradução e validação para a língua portuguesa. Acta Ortop Bras. 2006;14(5):268–72. O escore obtido com IKDC subjetivo pode variar de zero a 100 e considera melhor função quanto maior o valor obtido. A avaliação objetiva da translação tibial anterior foi feita com Rolimeter (Aircast).1212. Ganko A, Engebretsen L, Ozer H. The rolimeter: a new arthrometer compared with the KT-1000. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 2000;8(1):36–9. A avaliação clínica foi feita por avaliador independente sem o conhecimento do posicionamento dos pinos obtidos no exame de tomografia.

Todos os pacientes foram submetidos ao mesmo protocolo de reabilitação pós-operatória. Suporte parcial de peso com muletas foi permitido após o primeiro dia após a cirurgia e mantido por duas semanas. Nenhum tipo de órtese foi usado. Exercícios para obter amplitude completa de movimento da articulação foram permitidos conforme o tolerado. Exercícios de cadeia cinética fechada foram iniciados quatro semanas após a cirurgia. Corrida e exercícios de cadeia cinética aberta foram iniciados após três meses e o retorno aos esportes de contato foi permitido após oito meses.

A avaliação estatística foi feita com o programa Excel (Microsoft) e foram consideradas estatística descritiva e distribuição de frequências.

Técnica cirúrgica

O paciente é posicionado em decúbito dorsal sob raquianestesia associada a bloqueio periférico do nervo femoral ipsilateral. Um garrote pneumático é usado no terço proximal da coxa do membro inferior envolvido. Após assepsia, antissepsia e colocação dos campos estéreis, o membro inferior é posicionado com 45° de flexão do quadril e 90° de flexão do joelho.

É feita a retirada de forma usual de enxerto dos tendões dos músculos grácil e semitendíneo. Preparamos um enxerto quádruplo com pontos do tipo Krackow.1313. Krackow KA, Thomas SC, Jones LC. A new stitch for ligament-tendon fixation. J Bone Joint Surg Am. 1986;68(5):764–6. Brief note. São feitos então a inspeção articular e o desbridamento dos cotos do LCA, bem como tratamento das demais lesões presentes de forma artroscópica. Um fio guia é inserido pelo portal anteromedial e introduzido na inserção femoral do LCA com o joelho em 120° de flexão, na busca do que seria a inserção da banda anteromedial do LCA. Através do portal anteromedial é feito o túnel femoral com 30 mm de comprimento e essa medida é marcada na extremidade proximal do enxerto tendíneo. O túnel tibial é feito com auxílio do guia tibial com 45° de angulação e colocado no centro da inserção tibial do LCA. O guia femoral de Rigidfix é introduzido pelo portal anteromedial dentro do túnel femoral. Através do guia femoral, duas cânulas-guias para introdução do Rigidfix são fixadas na face lateral do côndilo lateral por incisões acessórias. O enxerto tendíneo quádruplo é passado pelos túneis ósseos sob orientação artroscópica. A fixação femoral do enxerto tendíneo é feita com o sistema Rigidfix 2,7 mm. A fixação tibial é feita com 30° de flexão do joelho com o sistema Biointrafix.

Resultados

Foram selecionados para o estudo 32 pacientes com uma média de seguimento pós-operatório de 30 meses (24-36 meses). Eram do sexo masculino 28 e quatro do feminino. A idade média foi de 33,1 anos (16-56) no momento da cirurgia. Apresentavam lesão meniscal 29 pacientes (90,6%), 20 eram lesões do menisco medial isoladas (68,9%), cinco eram lesões do menisco lateral isoladas (17,2%) e em quatro observou-se lesão em ambos os meniscos (13,8%). Em todos foi feita meniscectomia parcial das lesões.

Quanto à avaliação funcional, o escore Lysholm médio pré-operatório encontrado foi de 74,53 (43-83) e pós-operatório de 87,81 (53-95), resultado que pode ser considerado bom.99. Lysholm J, Gillquist J. Evaluation of knee ligament surgery results with special emphasis on use of a scoring scale. Am J Sports Med. 1982;10(3):150–4.,1010. Peccin MS, Ciconelli R, Cohen M. Questionário específico para sintomas do joelho Lysholm Knee Score Scale – Tradução e validação para a língua portuguesa. Acta Ortop Bras. 2006;14(5):268–72. O IKDC subjetivo médio foi de 74,16 (37,93-91,95) no pré-operatório e de 83,72 (57,5-100) no pós-operatório.

Quanto ao retorno à atividade física, 14 pacientes (43,75%) relataram atividades regulares consideradas muito vigorosas, como futebol ou basquete; três (9,3%) citaram atividades vigorosas, como vôlei e tênis; doze (37,5%) referiram atividades moderadas, como academia ou corrida; e quatro (12,5%) mencionaram atividades leves, como caminhadas e trabalhos domésticos.

Em relação aos sintomas, 11 dos 32 pacientes referiram dor ao fazer esforços (34,4%) e seis relataram edema esporádico (18,75%). No exame físico, foi encontrada atrofia do músculo quadríceps da coxa em 20 pacientes (62,5%), mas em somente um paciente a atrofia foi considerada intensa (> 2 cm diferença em relação ao lado oposto).

Quanto à avaliação do posicionamento do ponto de entrada dos pinos do Rigidfix, em todos os pacientes o pino proximal teve seu ponto de entrada fora da cartilagem articular (fig. 2). O ponto de entrada do pino distal estava na região periférica da cartilagem articular em sete pacientes (21,87%) (fig. 3), na borda da cartilagem em nove (28,12%) e fora da cartilagem em 16 (50%) (tabela 1).

Figura 2
Imagem tomográfica que demonstra o ponto de entrada do pino proximal fora da cartilagem articular e do pino distal do Rigidfix na borda da cartilagem articular da face lateral do côndilo femoral lateral.
Figura 3
Imagem tomográfica que demonstra o ponto de entrada do pino distal do Rigidfix na cartilagem articular da face lateral do côndilo femoral lateral.
Tabela 1
Posição dos pinos de Rigidfix no côndilo lateral em relação à cartilagem articular

Quando analisamos conjuntamente a posição dos pinos em relação à cartilagem articular e os resultados dos escores de Lysholm e IKDC subjetivo, encontramos que nos pacientes em que o pino distal do Rigidfix foi posicionado intracartilagem a média do Lysholm foi de 89,85 (89-93) e do IKDC de 79,95 (65,5-95,4); nos em que o pino distal ficou na borda da cartilagem a média foi de 88,33 para o Lysholm (53-95) e 86,2 para o IKDC (69-100), enquanto que nos em que o pino distal foi posicionado extracartilagem a média do Lysholm foi de 87,2 (68-95) e do IKDC de 83,82 (62-98,9) (tabela 2).

Tabela 2
Relação entre a posição do pino distai do Rigidfix e as médias dos escores de Lysholm e IKDC subjetivo

A avaliação da translação anterior da tíbia em relação ao fêmur resultou em uma média de 2,09 mm em relação ao lado contralateral (1-6mm). Um paciente apresentou um aumento na translação de 6 mm relacionado à rerruptura do LCA e foi submetido a cirurgia de revisão após a avaliação e inclusão dos dados para análise.

Discussão

Existem várias técnicas cirúrgicas e diferentes métodos de fixação para a cirurgia de reconstrução do ligamento cruzado anterior. Entretanto, nenhuma recria a anatomia e o comportamento tensional das fibras que compõem o LCA nativo.1414. Van Eck CF, Lesniak BP, Schreiber VM, Fu FH. Anatomic single and double-bundle anterior cruciate ligament reconstruction flowchart. Arthroscopy. 2012;26(2):258–68. O objetivo do cirurgião com a cirurgia de reconstrução do LCA é somente o de recriar o padrão funcional do ligamento.1515. Hefzy MS, Grood ES, Noyes FR. Factors affecting the region of most isometric femoral attachments. Part II: the anterior cruciate ligament. Am J Sports Med. 1989;17(2):208–16.

O ideal posicionamento dos túneis ósseos na cirurgia de reconstrução do LCA é foco de constante discussão na literatura. Alguns estudos mostram que as alterações no posicionamento do túnel femoral têm um efeito maior no comportamento tensional do enxerto quando comparadas com as alterações no posicionamento do túnel tibial.1515. Hefzy MS, Grood ES, Noyes FR. Factors affecting the region of most isometric femoral attachments. Part II: the anterior cruciate ligament. Am J Sports Med. 1989;17(2):208–16.,1616. Woo SL, Kanamori A, Zeminski J, Yagi M, Papageorgiou C, Fu FH. The effectiveness of reconstruction of the anterior cruciate ligament with hamstrings and patellar tendon. A cadaveric study comparing anterior tibial and rotational loads. J Bone Joint Surg Am. 2002;84(6):907–14. Poucas fibras do LCA são isométricas durante todo o arco de movimento do joelho.1414. Van Eck CF, Lesniak BP, Schreiber VM, Fu FH. Anatomic single and double-bundle anterior cruciate ligament reconstruction flowchart. Arthroscopy. 2012;26(2):258–68. Quando se deseja um enxerto mais isométrico, o túnel femoral deve ser posicionado o mais perto possível da inserção femoral da banda anteromedial do LCA.1717. Amis AA, Dawkins GP. Functional anatomy of the anterior cruciate ligament. Fibre bundle actions related to ligament replacements and injuries. J Bone Joint Surg Br. 1991;73(2):260–7.,1818. Bradley J, Fitzpatrick D, Daniel D, Shercliff T, O'Connor J. Orientation of the cruciate ligament in the sagittal plane. A method of predicting its length-change with flexion. J Bone Joint Surg Br. 1988;70(1):94–9.

Existem três técnicas que podem ser usadas para a feitura do túnel femoral na reconstrução artroscópica do LCA: a transtibial, a transportal anteromedial e a que usa duas incisões, ou de fora para dentro (outside-in). Na transtibial, o túnel femoral é feito através do túnel tibial e, dessa forma, o posicionamento do túnel femoral é restringido pelo posicionamento do túnel tibial. Há um comportamento tensional mais isométrico do neoligamento. Entretanto, há uma maior tendência de posteriorização do túnel tibial e verticalização do túnel femoral, o que não parece ser uma posição considerada mais anatómica.1919. Arnold MP, Kooloos J, van Kampen A. Single-incision technique misses anatomical femoral anterior cruciate ligament insertion: a cadaver study. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 2001;9(4):194–9. Na técnica das duas incisões, os túneis ósseos são posicionados de maneira independente, mas são necessárias uma incisão adicional no aspecto lateral do túnel femoral e a feitura de um túnel femoral ao longo de todo o côndilo femoral lateral.88. Hantes ME, Dailiana Z, Zachos VC, Varitimidis SE. Anterior cruciate ligament reconstruction using the Bio-TransFix femoral fixation device and anteromedial portal technique. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 2006;14(5):497–501.

A técnica transportal anteromedial proporciona um posicionamento mais anatômico do túnel femoral e, assim, um melhor controle rotacional e menor chance de impacto sobre o LCP durante a flexão do joelho.88. Hantes ME, Dailiana Z, Zachos VC, Varitimidis SE. Anterior cruciate ligament reconstruction using the Bio-TransFix femoral fixation device and anteromedial portal technique. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 2006;14(5):497–501. Não há a necessidade de incisões adicionais e o túnel femoral é mais curto quando comparado a técnica das duas incisões. Com novos conceitos de posicionamento do túnel femoral, há a necessidade de uma nova readequação dos métodos de fixação femoral usados e a fixação do enxerto em um túnel femoral mais anatômico, mais baixo e com o ponto de entrada na parede medial do côndilo lateral.2020. Ahn JH, Park JS, Lee YS, Cho YJ. Femoral bioabsorbable cross-pin fixation in anterior cruciate ligament reconstruction. Arthroscopy. 2007;23(10):1093–9.2626. Yasuda K, van Eck CF, Hoshino Y, Fu FH, Tashman S. Anatomic single- and double-bundle anterior cruciate ligament reconstruction, part 1: basic science. Am J Sports Med. 2011;39(8):1789–99. Segundo Chang et al.,2727. Chang CB, Yoo JH, Chung BJ, Seong SC, Kim TK. Oblique femoral tunnel placement can increase risks of short femoral tunnel and cross-pin protrusion in anterior cruciate ligament reconstruction. Am J Sports Med. 2010;38(6):1237–45. o atual esforço para horizontalizar o túnel femoral na parede medial do côndilo lateral pode comprometer a fixação pelos métodos de pinos transversos como o Rigidfix e levar a uma protrusão deles. Os métodos de fixação transversa tradicionalmente usados são desenvolvidos para ser usados via técnica do portal anteromedial e apresentam um ângulo fixo de entrada, o que pode pôr em risco as estruturas laterais do joelho, bem como a superfície articular do côndilo femoral lateral.44. Gelber PE, Reina F, Torres R, Pelfort X, Tey M, Monllau JC. Anatomic single-bundle anterior cruciate ligament reconstruction from the anteromedial portal: evaluation of transverse femoral fixation in a cadaveric model. Arthroscopy. 2010;26(5):651–7.,2020. Ahn JH, Park JS, Lee YS, Cho YJ. Femoral bioabsorbable cross-pin fixation in anterior cruciate ligament reconstruction. Arthroscopy. 2007;23(10):1093–9. No presente estudo, optamos por avaliar uma série de pacientes nos quais o Rigidfix foi usado para a fixação do enxerto quádruplo de tendões flexores em um túnel femoral feito através do portal anteromedial. O sistema Rigidfix, teoricamente, proporciona uma fixação mais justarticular pela presença de um segundo pino mais perto da abertura intra-articular do túnel femoral quando comparado a outros métodos de fixação transversa e, além disso, permite uma maior área de contato enxerto-osso quando comparado com os métodos de fixação intratúnel, como os parafusos de interferência.77. Castoldi F, Bonasia DE, Marmotti A, Dettoni F, Rossi R. ACL reconstruction using the Rigidfix femoral fixation device via the anteromedial portal: a cadaver study to evaluate chondral injuries. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 2008;16(3):275–8.,2020. Ahn JH, Park JS, Lee YS, Cho YJ. Femoral bioabsorbable cross-pin fixation in anterior cruciate ligament reconstruction. Arthroscopy. 2007;23(10):1093–9. Inicialmente, o Rigidfix foi desenvolvido para fixação pela técnica transtibial.66. Rodeo SA, Arnoczky SP, Torzilli PA, Hidaka C, Warren RF. Tendon-healing in a bone tunnel. A biomechanical and histological study in the dog. J Bone Joint Surg Am. 1993;75(12):1795–803. Segundo Castoldi et al.,77. Castoldi F, Bonasia DE, Marmotti A, Dettoni F, Rossi R. ACL reconstruction using the Rigidfix femoral fixation device via the anteromedial portal: a cadaver study to evaluate chondral injuries. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 2008;16(3):275–8. em um estudo em cadáveres, o risco de lesão condral com o uso dessa técnica é alto, entre 80% e 100%, de se ter pelo menos um pino dentro da cartilagem articular do côndilo femoral lateral. Não recomendam, portanto, o uso do Rigidfix pela técnica transportal na reconstrução do LCA.

O presente estudo é o primeiro com o objetivo de avaliar clinicamente os pacientes submetidos à reconstrução do LCA com Rigidfix usado via portal anteromedial. Observamos um resultado funcional satisfatório na maioria dos pacientes dentro do curto período de seguimento avaliado. Entretanto, o risco de lesão da cartilagem articular deve ser considerado. Em 50% dos pacientes avaliados nesta série, o ponto de entrada do pino distal do Rigidfix foi posicionado extracartilagem e mesmo nos pacientes em que esse ponto de entrada foi localizado na borda (fig. 2) ou intracartilagem (fig. 3) os resultados dos escores clínicos funcionais foram considerados satisfatórios. Nos outros 50% dos pacientes houve inserção do pino distal na borda ou na cartilagem articular, com alguma lesão condral. Isso gera a preocupação de, em longo prazo, se produzir artrose de joelho. Futuros estudos, com um período de seguimento mais longo e com um maior número de pacientes, poderão avaliar se a presença da lesão condral iatrogênica na borda da cartilagem articular interfere nos resultados funcionais.

O estudo apresenta algumas limitações. Trata-se de um estudo descritivo dos resultados preliminares de uma série de casos. O acompanhamento por um período de tempo mais prolongado em um maior número de pacientes e em um estudo prospectivo com melhor delineamento são necessários para obtermos informações mais precisas se a presença da lesão condral, em alguns pacientes, é responsável pela pioria dos resultados clínicos.

Conclusão

Os pacientes submetidos à reconstrução do LCA com o sistema Rigidfix pela técnica transportal anteromedial apresentaram um resultado clínico satisfatório. O risco de lesão da cartilagem articular pelo pino distal do Rigidfix deve ser considerado, mas, no presente estudo, a presença da lesão condral não interferiu nos resultados no curto tempo de seguimento avaliado.

  • Trabalho desenvolvido no Instituto de Ortopedia e Traumatologia de Passo Fundo, Passo Fundo, RS, Brasil.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    25 Jun 2013
  • Aceito
    15 Out 2013
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