Acessibilidade / Reportar erro

Correlação entre dados antropométricos e comprimento e espessura dos tendões dos músculos semitendinoso e grácil usados como enxerto na reconstrução do ligamento cruzado anterior Trabalho desenvolvido no Hospital São Lucas, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), Hospital Mãe de Deus e Hospital Divina Providência, Porto Alegre, RS, Brasil.

Resumos

OBJETIVO:

A estimativa pré-operatória do comprimento e do diâmetro dos tendões semitendinoso (ST) e grácil (G) pode auxiliar e permitir que os cirurgiões tenham a oportunidade de escolher opções de enxerto. O objetivo deste estudo foi pesquisar se existe correlação entre as medidas antropométricas, como altura, peso, índice de massa corpórea (IMC), idade e sexo do paciente, com a espessura e o comprimento dos tendões ST e G.

MÉTODOS:

Entre junho de 2012 e agosto de 2013, foram coletados os dados de 64 pacientes que se submeteram ao procedimento cirúrgico de reconstrução do ligamento cruzado anterior em que se usaram como enxerto os tendões dos músculos ST e G. Foram analisadas variáveis como idade, sexo, peso, altura e índice de massa corporal (IMC), comprimento e diâmetro dos tendões dos músculos ST e G.

RESULTADOS:

Houve uma correlação positiva entre altura e diâmetro total do enxerto de quádruplo (r = 0,254 p = 0,043), comprimento total do tendão ST (r = 0,450, p < 0,01), diâmetro do ST duplo (r = 0,270 p = 0,031), ST triplo (r = 0,347 p = 0,005), comprimento do tendão G (r = 0,249 p = 0,047) e diâmetro do G duplo (r = 0,258 p = 0,039). No entanto, idade (r = -0,015 p = 0,908), peso (r = 0,165 p = 0,193) e índice de massa corporal (r = 0,012 p = 0,926) não apresentaram correlação.

CONCLUSÃO:

Nossos resultados mostram que idade, peso e IMC não se correlacionaram com o diâmetro e comprimento do enxerto, enquanto a altura tinha uma correlação positiva com o comprimento total dos tendões flexores e com o diâmetro do enxerto dos flexores (ST e G).

Ligamento cruzado anterior; Antropometria; Transplante autólogo; Tendões


OBJECTIVE:

Preoperative estimation of the length and diameter of the semitendinosus (ST) and gracilis (G) tendons can assist surgeons and allow them to have the opportunity to choose alternative grafts. The aim of this study was to investigate whether anthropometric measurements such as height, weight and body mass index (BMI) or the patient's age and sex have any correlation with the thickness and the length of ST and G tendons.

METHODS:

Data were gathered from 64 patients who underwent the surgical procedure of anterior cruciate ligament reconstruction using the tendons of the ST and G muscles as grafts, between June 2012 and August 2013. Variables such as age, sex, weight, height, body mass index (BMI) and length and diameter of the tendons of the ST and G muscles were analyzed.

RESULTS:

There was a positive correlation between the height and total diameter of the quadruple graft (r = 0.254; p = 0.043), total length of the ST tendon (r = 0.450; p < 0.01), diameter of the double ST (r = 0.270; p = 0.031), triple ST (r = 0.347; p = 0.005), length of G tendon (r = 0.249; p = 0.047) and diameter of the double-G (r = 0.258; p = 0.039). However, age (r = -0.015; p = 0.908), weight (r = 0.165; p = 0.193) and body mass index (r = 0.012; p = 0.926) showed no correlation.

CONCLUSION:

Our results show that age, weight and BMI did not correlate with the diameter and length of the graft, while the height had a positive correlation with the total length of the flexor tendons and the diameter of the graft from the flexors (ST and G).

Anterior cruciate ligament; Anthropometry; Transplantation autologous; Tendons


Introdução

A crescente tendência à prática esportiva aliada à maior complexidade dos gestos esportivos vem provocando o surgimento crescente de lesões articulares do joelho. O ligamento cruzado anterior (LCA) está entre os mais comumente acometidos e o tratamento cirúrgico é a escolha na maioria dos pacientes que apresentam dor e instabilidade.11. Dunn WR, Lyman S, Lincoln AE, Amoroso PJ, Wickiewicz T, Marx RG. The effect of anterior cruciate ligament reconstruction on the risk of knee reinjury. Am J Sports Med. 2004;32(8):1906-14. Os enxertos autólogos mais frequentemente usados nas reconstruções do LCA são o tendão patelar, os tendões do grácil (G) e semitendinoso (ST) e o tendão quadriciptal. Cada técnica tem seus adeptos e suas indicações e a seleção do enxerto vai depender de muitos fatores, incluindo a preferência do cirurgião, a idade do paciente e o nível de atividade. A técnica cirúrgica que usa como enxerto os tendões dos músculos semitendinoso (ST) e grácil (G) apresenta resultados semelhantes à técnica do tendão patelar e permite uma reabilitação mais tranquila e menos dolorosa. As principais desvantagens dessa incluem a variabilidade individual do comprimento e da espessura do enxerto dos tendões e as potenciais complicações durante a coleta e retirada do enxerto.22. Prodromos CC, Han YS, Keller BL, Bolyard RJ. Stability results of hamstring anterior cruciate ligament reconstruction at 2- to 8 -year follow- up. Arthroscopy. 2005;21(2):138-46., 33. Biau DJ, Tournoux C, Katsahian S, Schranz PJ, Nizard RS. Bone-patellar tendon-bone autografts versus hamstring autografts for reconstruction of anterior cruciate ligament: meta- analysis. BMJ. 2006;332(7548):995-1001.,44. Aglietti P, Giron F, Buzzi R, Biddau F, Sasso F. Anterior cruciate ligament reconstruction: bone-patellar tendon-bone compared with double semitendinosus and gracilis tendon grafts. A prospective, randomized clinical trial. J Bone Joint Surg Am. 2004;86-A(10):2143-55.and55. Fu FH, Bennett CH, Lattermann C, Ma CB. Current trends in anterior cruciate ligament reconstruction. Part 1: biology and biomechanics of reconstruction. Am J Sports Med. 1999;27(6):821-30. Após a retirada dos tendões dos músculos semitendinoso e grácil, antes da confecção do enxerto, o cirurgião se depara com inúmeras possibilidades para a configuração final do enxerto, entre elas o uso do tendão semitendinoso duplo, triplo ou quádruplo isolado ou duplo associado ao tendão do músculo grácil duplo (sendo assim um enxerto quádruplo) ou ainda outras confecções. A estimativa pré-operatória do comprimento e do diâmetro dos tendões semitendinoso (ST) e grácil (G) pode auxiliar e permitir que os cirurgiões tenham a oportunidade de escolher uma opção de enxerto se o tendão potencialmente coletado não atender às necessidades para um determinado paciente. No entanto, ainda não há na literatura método descrito capaz de determinar, precisamente, o diâmetro e o comprimento dos tendões ST e G antes que a cirurgia de reconstrução de LCA seja feita.

O objetivo deste estudo foi pesquisar se existe correlação entre as medidas antropométricas, como altura, peso, índice de massa corpórea (IMC), idade e sexo do paciente, com a espessura e o comprimento dos tendões isquiotibiais (ST e G).

Materiais e métodos

A amostra conta com pacientes que consultaram com um dos três cirurgiões credenciados pela Sociedade Brasileira de Cirurgia de Joelho (SBCJ) de nossa equipe e que tiveram indicação cirúrgica de reconstrução do LCA. Entre junho de 2012 e agosto de 2013, de 200 cirurgias de reconstrução de LCA, foram coletados os dados de 64 pacientes que se submeteram ao procedimento cirúrgico de reconstrução do ligamento cruzado anterior em que se usaram como enxerto os tendões dos músculos semitendinoso (ST) e grácil (G). As cirurgias foram feitas em três hospitais da rede privada de Porto Alegre, por três cirurgiões especializados em cirurgia do joelho e membros da Sociedade Brasileira de Cirurgia do Joelho (SBCJ). Indivíduos que tiveram cirurgias prévias no mesmo joelho que foi operado, com outras lesões ligamentares associadas, em que não foi usado o tendão do grácil (G) na confecção do enxerto, que não concordaram em participar do trabalho ou não assinaram o termo de consentimento informado foram excluídos da amostra. A pesquisa foi feita em pacientes avaliados por anamnese, exame físico e ressonância magnética e que apresentavam indicação cirúrgica de reconstrução do LCA, na qual foram usados os tendões do ST e G para confecção do enxerto. Essa não sofreu alteração na rotina dos passos a serem seguidos durante o procedimento cirúrgico indicado. A coleta dos dados não acrescentou risco ao procedimento. Este estudo foi aprovado pela nossa universidade e pelos Comitês de Ética e Pesquisa das instituições envolvidas.

Foram analisadas variáveis como a idade, sexo, peso, altura e índice de massa corporal (IMC), comprimento do tendão do músculo semitendinoso, comprimento do tendão do músculo grácil, diâmetro do tendão do músculo semitendinoso quando dobrado ao meio (duplo) e em três partes iguais (triplo), diâmetro do tendão do músculo grácil quando dobrado ao meio (duplo) e o diâmetro dos tendões dos músculos semitendinoso e grácil quando dobrado ao meio e agrupados (quádruplo).

Inicialmente foram obtidas as informações demográficas (idade, sexo) e antropométricas (peso e altura) relatadas no momento da cirurgia e anotadas em prontuário; logo após, durante o ato cirúrgico, foram coletadas e aferidas as medidas dos tendões dos músculos semitendinoso e grácil usados para a confecção do enxerto.

A técnica de obtenção dos enxertos durante a cirurgia de reconstrução do LCA compreendeu uma incisão anteromedial oblíqua na tíbia proximal, no nível da inserção dos músculos semitendinoso (ST) e grácil (G). Logo após fez-se a dissecção do tendão do músculo semitendinoso, desinserção justaóssea do mesmo e retirada com extrator de enxertos. O mesmo procedimento foi repetido em relação ao tendão do músculo grácil. Após ter sido feito o preparo dos tendões com retirada da camada muscular foram obtidos o comprimento (cm) e o diâmetro (mm) dos enxertos por meio de uma régua e cilindros de mensuração previamente esterilizados. O diâmetro do enxerto semitendinoso e grácil foi medido em tubos cilíndricos com dimensionamento de 6 a 12 mm, com 0,5 mm de aumento entre cada cilindro. Ambos os tendões foram medidos. No caso do tendão derivado do músculo semitendinoso, esse teve comprimento total e seu diâmetro aferido em dois momentos. Primeiramente esse tendão foi dobrado ao meio (duplo) e em seguida foi dobrado em três partes (triplo). O enxerto derivado do músculo grácil teve comprimento total e seu diâmetro foi aferido com ele dobrado ao meio (duplo). Por fim, foi feita a medida do comprimento e do diâmetro de ambos os tendões dobrados ao meio e agrupados (quádruplo). As medidas foram mensuradas sem os fios de sutura que poderiam atrapalhar nas dimensões reais dos tendões (Figura 1 and Figura 2).

Figura 1
- Retirada dos tendões flexores.

Figura 2
- Aferição do diâmetro do enxerto.

Os dados coletados foram analisados por meio de estatística descritiva e analítica. Na fase descritiva, foram usadas médias e desvios padrão. Na fase analítica, os dados variáveis foram comparados entre os diferentes comprimentos e diâmetros dos tendões dos músculos semitendinoso e grácil. O teste t para amostras independentes foi usado para identificar diferenças entre as variáveis clínicas e intraoperatórias. Os coeficientes de correlação de Pearson (r) e linear simples de regressão foram usados para determinar a relação entre as variáveis de resultado (diâmetro do enxerto quádruplo, comprimento do tendão semintendinoso e do grácil) e as variáveis preditoras (idade, sexo, a altura, peso e IMC). As diferenças foram consideradas significativas quando os valores de P foram abaixo de 0,05. A análise foi feita com o programa SPSS versão 17.0.

Resultados

Dos 64 indivíduos analisados entre junho de 2012 e agosto de 2013, 60 (94%) eram do sexo masculino e quatro (6%) do feminino. A idade média dos pacientes foi de 31,78 ± 8,26 anos (15-48 anos), no sexo feminino de 32 ± 13,49 anos e no masculino de 31,76 ± 7,97 anos. A altura média foi de 1,77 ± 0,08 cm (1,52-1,96 cm), peso médio de 82,43 ± 12,89 Kg (56-115 Kg), IMC médio de 26,14 ± 3,74 (21,60-37,55). A média, aferida no intraoperatório, do comprimento do tendão semitendinoso foi de 28,75 ± 2,91 cm (23-36 cm) e a média do tendão grácil foi de 25,28 ± 3,81 cm (14-34 cm). A média, medida pelos diâmetros, da espessura do tendão semitendinoso duplo foi de 6,24 ± 0,75 mm (4,5-8 mm), semitendinoso triplo de 7,32 ± 0,76 mm (6-9 mm) e do grácil duplo de 6,24 ± 0,75 mm (4,5-8 mm). A média do diâmetro total do enxerto quádruplo dos tendões (ST e G) foi de 8,03 ± 0,72 mm (7-10 mm). Durante o período de pesquisa não obtivemos enxertos quádruplos de flexores menores do que 7 mm e nem maiores do que 10 mm (tabela 1).

Tabela 1
- Resultados dos dados antropométricos aferidos

No total, 75% dos pacientes tinham enxerto quádruplo de flexores de diâmetro entre 7 e 8 mm, enquanto que 25% eram maiores do que 8 mm. A frequência do tamanho dos diâmetros do enxerto quádruplo de flexores foi de 7 mm (22%), 7,5 mm (3%), 8 mm (50%), 9 mm (23,5%), 10 mm (1,5%) (fig. 3).

Figura 3
- Distribuição dos diâmetros do enxerto quádruplo de flexores.

Houve uma correlação positiva entre a altura e o diâmetro total do enxerto quádruplo dos tendões flexores (r = 0,254, p = 0,043), comprimento total do tendão semitendinoso (r = 0,450, p < 0,01), diâmetro do semitendinoso duplo (r = 0,270, p = 0,031), diâmetro do semitendinoso triplo (r = 0,347 p = 0,005), comprimento total do tendão grácil (r = 0,249, p = 0,047) e diâmetro do grácil duplo (r = 0,258, p = 0,039). No entanto, idade (r = -0,015, p = 0,908), peso (r = 0,165, p = 0,193) e índice de massa corporal (r = 0,012, p = 0,926) não apresentaram correlação com o diâmetro total do enxerto quádruplo nem com o comprimento dos tendões semintendinoso e grácil (tabela 2).

Tabela 2
- Correlação das dimensões dos tendões grácil e semitendinoso com variáveis antropométricas e idade

Discussão

O uso de enxerto de tendões flexores tem se tornado uma escolha cada vez mais popular entre os cirurgiões ortopedistas nas reconstruções do LCA.66. Gianotti SM, Marshall SW, Hume PA, Bunt L. Incidence of anterior cruciate ligament injury and other knee ligament injuries: a national population-based study. J Sci Med Sport. 2009;12(6):622-7. Estudos anatômicos demonstraram que a média do diâmetro do LCA normal é de aproximadamente 11 mm, variação de 6-12 mm. Embora os parâmetros do tamanho aceitável do enxerto necessário para se obter um resultado satisfatório após a reconstrução do LCA não tenham sido claramente definidos, tradicionalmente tem sido recomendado um diâmetro do enxerto de no mínimo 7 mm.77. Hamada M, Shino K, Horibe S, Mitsuoka T, Toritsuka Y, Nakamura N. Changes in cross-sectional area of hamstring anterior cruciate ligament grafts as a function of time following transplantation. Arthroscopy. 2005;21(8): 917-22.,88. Grood ES, Walz-Hasselfeld KA, Holden JP, Noyes FR, Levy MS, Butler DL, et al. The correlation between anterior-posterior translation and cross-sectional area of anterior cruciate ligament reconstructions. J Orthop Res. 1992;10(6):878-85.and99. Scott WN, Insall JN. Injuries of the knee. In: Rockwood DP Jr, Green DP, Bucholz RW, editors. Rockwood and Green's fractures in adults. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 1996. p. 1799-816. No entanto, em um estudo recente, mostrou-se uma maior incidência de falhas em reconstruções de LCA com enxertos menores do que 8 mm.1010. Magnussen RA, Lawrence JT, West RL, Toth AP, Taylor DC, Garrett WE. Graft size and patient age are predictors of early revision after anterior cruciate ligament reconstruction with hamstring autograft. Arthroscopy. 2012;28(4):526-31. Estudos em modelos animais que avaliaram a influencia do diâmetro do enxerto na força e na resistência do enxerto demonstraram que em enxertos menores do que 8 mm há falhas com ruptura intrasubstancial do tendão, enquanto que em enxertos maiores do que 10 mm as falhas ocorreram no parafuso de fixação, por tração.1111. Teli M, Chiodini F, Sottocasa R, Villa T. Influence of the diameters of tendon graft and bone tunnel in hamstring ACL reconstruction. A bovine model. Chir Organi Mov. 2005;90(3):281-5. Desse modo, a capacidade de prever os pacientes com maior risco de terem tendões isquiotibiais com diâmetros insuficientes no pré-operatório poderia ser benéfica para o planejamento da cirurgia pelo cirurgião e evitar, assim, intercorrências desagradáveis durante o transoperatório.77. Hamada M, Shino K, Horibe S, Mitsuoka T, Toritsuka Y, Nakamura N. Changes in cross-sectional area of hamstring anterior cruciate ligament grafts as a function of time following transplantation. Arthroscopy. 2005;21(8): 917-22., 88. Grood ES, Walz-Hasselfeld KA, Holden JP, Noyes FR, Levy MS, Butler DL, et al. The correlation between anterior-posterior translation and cross-sectional area of anterior cruciate ligament reconstructions. J Orthop Res. 1992;10(6):878-85.,99. Scott WN, Insall JN. Injuries of the knee. In: Rockwood DP Jr, Green DP, Bucholz RW, editors. Rockwood and Green's fractures in adults. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 1996. p. 1799-816.and1010. Magnussen RA, Lawrence JT, West RL, Toth AP, Taylor DC, Garrett WE. Graft size and patient age are predictors of early revision after anterior cruciate ligament reconstruction with hamstring autograft. Arthroscopy. 2012;28(4):526-31.

Em nossos pacientes usamos combinações variadas de enxerto, como ST triplo isolado, ST quádruplo isolado, ST duplo com G duplo, ST triplo com G duplo, ST triplo com G triplo; sempre em busca de enxertos maiores do que 8 mm de diâmetro e com comprimento adequado.

A capacidade de prever o diâmetro e um comprimento do enxerto pode ser útil para certas técnicas cirúrgicas e possibilitar opções ao médico cirurgião. Hamner et al.,1212. Hamner DL, Brown CH, Steiner ME, Hecker AT, Hayes WC. Hamstring tendon grafts for reconstruction of the anterior cruciate ligament: biomechanical evaluation of the multiple strands and tensioning techniques. J Bone Joint Surg Am. 1999;81(4):549-57. por meio de seus estudos biomecânicos, demonstrou que a resistência, a rigidez e as propriedades biomecânicas do tendão de enxerto são afetadas pelo seu diâmetro. No entanto, ainda existem poucos estudos e com resultados contraditórios na literatura que correlacionem os dados antropométricos do paciente com o comprimento e o diâmetro dos enxertos flexores.

Em nosso estudo, investigamos o valor preditivo de medidas antropométricas simples, como altura, peso, IMC e idade, sobre o comprimento dos tendões flexores semitendinoso e grácil e o diâmetro do enxerto quádruplo de flexores. Nossos resultados mostram que idade, peso e IMC não se correlacionam com o comprimento nem com o diâmetro do enxerto, enquanto a altura tinha uma correlação positiva com o comprimento total do enxerto de semitendinoso (r = 0,450, p < 0,01) e grácil (r = 0,249, p = 0,047), assim como com o diâmetro do enxerto quádruplo de flexores (r = 0,254, p = 0,043). Uma análise mais aprofundada com a regressão passo a passo revelou que a altura era o dado clínico mais importante preditor para a espessura do enxerto.

Tuman et al.1313. Tuman JM, Diduch DR, Rubino LJ, Baumfeld JA, Nguyen HS, Hart JM. Predictors for hamstring graft diameter in anterior cruciate ligament reconstruction. Am J Sports Med. 2007;35(11):1945-9. analisaram 106 pacientes que se submeteram a reconstrução do LCA e relataram que entre os dados antropométricos analisados nos seus estudos, como altura, peso, gênero e idade, a altura seria o melhor preditor para o diâmetro do enxerto de isquiotibiais em ambos os sexos, principalmente em mulheres. Baseados em sua análise, eles concluíram que as mulheres apresentaram um enxerto diâmetro significativamente menor do que os homens e que em pacientes com menos de 147 cm de altura é provável que haja um enxerto insuficiente, com menos de 7 mm de diâmetro.

Ma et al.1414. Ma CB, Keifa E, Dunn W, Fu FH, Harner CD. Can pre- operative measures predict quadruple hamstring graft diameter? Knee. 2010;17(1):81-3. analisaram retrospectivamente os dados antropométricos pré-operatórios de 536 pacientes. Os resultados de seu estudo demonstraram que a altura e o gênero mostraram ser preditores significantes para o diâmetro do enxerto de tendões flexores. Pacientes do sexo masculino tinham enxertos significativamente maiores do que do sexo feminino. Também foi demonstrado que a altura é um indicador específico exclusivamente nos homens, sem resultados significativos nas mulheres.

Schwartzberg et al.,1515. Schwartzberg R, Burkhart B, Lariviere C. Prediction of hamstring tendon autograft diameter and length for anterior cruciate ligament reconstruction. Am J Orthop (Belle Mead NJ). 2008;37(3):157-9. em seu estudo com 119 pacientes submetidos a reconstrução de LCA, relatou que houve uma forte correlação entre o comprimento da perna e o comprimento dos tendões flexores usados como enxerto (r = 0,73, p < 001). No mesmo estudo, o peso (r = 0,51, p < 0,001) e o comprimento da perna (r = 0,42, p < 0,001) tiveram apenas correlações moderadas com diâmetro do enxerto. Todas as outras correlações foram fracas em relação com a altura, não se encontrou relação entre as medidas de peso e idade com o comprimento e o diâmetro dos tendões flexores. Em nosso estudo, não foi encontrada relação do diâmetro dos tendões flexores com peso ou idade, em concordância com o estudo de Schwartzberg et al.1515. Schwartzberg R, Burkhart B, Lariviere C. Prediction of hamstring tendon autograft diameter and length for anterior cruciate ligament reconstruction. Am J Orthop (Belle Mead NJ). 2008;37(3):157-9.

Nas análises de Treme et al.1616. Treme G, Diduch DR, Billante MJ, Miller MD, Hart JM. Hamstring graft size prediction: a prospective clinical evaluation. Am J Sports Med. 2008;36(11):2204-9. sobre o comprimento e o diâmetro dos tendões semitendinoso e grácil de 50 pacientes submetidos a reconstrução do LCA, foi encontrada forte correlação entre o comprimento do enxerto com a altura e o comprimento dos membros inferiores do paciente. O diâmetro do enxerto estava correlacionado com o peso e a circunferência da coxa do paciente.

Embora nosso estudo não confirme todas as correlações positivas dos outros estudos,1212. Hamner DL, Brown CH, Steiner ME, Hecker AT, Hayes WC. Hamstring tendon grafts for reconstruction of the anterior cruciate ligament: biomechanical evaluation of the multiple strands and tensioning techniques. J Bone Joint Surg Am. 1999;81(4):549-57., 1313. Tuman JM, Diduch DR, Rubino LJ, Baumfeld JA, Nguyen HS, Hart JM. Predictors for hamstring graft diameter in anterior cruciate ligament reconstruction. Am J Sports Med. 2007;35(11):1945-9., 1414. Ma CB, Keifa E, Dunn W, Fu FH, Harner CD. Can pre- operative measures predict quadruple hamstring graft diameter? Knee. 2010;17(1):81-3., 1515. Schwartzberg R, Burkhart B, Lariviere C. Prediction of hamstring tendon autograft diameter and length for anterior cruciate ligament reconstruction. Am J Orthop (Belle Mead NJ). 2008;37(3):157-9.,1616. Treme G, Diduch DR, Billante MJ, Miller MD, Hart JM. Hamstring graft size prediction: a prospective clinical evaluation. Am J Sports Med. 2008;36(11):2204-9.and1717. Pichler W, Tesch NP, Schwantzer G, Fronhöfer G, Boldin C, Hausleitner L, et al. Differences in length and cross-section of semitendinosus and gracilis tendons and their effect on anterior cruciate ligament reconstruction: a cadaver study. J Bone Joint Surg Br. 2008;90(4):516-9. nossos resultados se mostram favoráveis a que as variáveis antropométricas individuais, como altura, podem ser preditoras do comprimento e do diâmetro dos tendões flexores (ST e G) usados na reconstrução do LCA. Nossos resultados mostraram que a altura tinha uma correlação positiva com o comprimento total dos tendões semitendinoso e grácil e com o diâmetro do ST duplo, ST triplo, G duplo e do enxerto quádruplo e concordaram com os achados de Tuman et al.1313. Tuman JM, Diduch DR, Rubino LJ, Baumfeld JA, Nguyen HS, Hart JM. Predictors for hamstring graft diameter in anterior cruciate ligament reconstruction. Am J Sports Med. 2007;35(11):1945-9. Eles demonstraram que a altura era também o variável mais importante, principalmente nas mulheres, enquanto que Schwatzberg et al.1515. Schwartzberg R, Burkhart B, Lariviere C. Prediction of hamstring tendon autograft diameter and length for anterior cruciate ligament reconstruction. Am J Orthop (Belle Mead NJ). 2008;37(3):157-9. encontraram fraca correlação com a altura e o diâmetro da coxa e moderada correlação entre o peso e o comprimento do membro inferior com diâmetro do enxerto.

Há evidências limitada na literatura que correlacionam a aptidão e o nível de atividade física praticada pelo paciente com o comprimento e o diâmetro dos tendões flexores. Treme et al.1616. Treme G, Diduch DR, Billante MJ, Miller MD, Hart JM. Hamstring graft size prediction: a prospective clinical evaluation. Am J Sports Med. 2008;36(11):2204-9. relataram que não houve em seu estudo correlação entre o diâmetro dos enxertos de flexores com esportes e níveis de atividades praticados pelo paciente. Resultados semelhantes foram registrados por Pichler et al.1717. Pichler W, Tesch NP, Schwantzer G, Fronhöfer G, Boldin C, Hausleitner L, et al. Differences in length and cross-section of semitendinosus and gracilis tendons and their effect on anterior cruciate ligament reconstruction: a cadaver study. J Bone Joint Surg Br. 2008;90(4):516-9. em seu estudo com cadáveres.

Outros estudos na literatura têm usado exames radiológicos de imagem como tomografia computadorizada e ressonância magnética na tentativa de prever o comprimento e o diâmetro dos enxertos flexores no pré-operatório. Embora alguns trabalhos apontem uma boa correlação entre a medida da área transversal e a espessura do tendão, outros não mostram qualquer correlação.1818. Wernecke G, Harris IA, Houang MT, Seeto BG, Chen DB, MacDessi SJ. Using magnetic resonance imaging to predict adequate graft diameters for autologous hamstring double-bundle anterior cruciate ligament reconstruction. Arthroscopy. 2011;27(8):1055-9.,1919. Yasumoto M, Deie M, Sunagawa T, Adachi N, Kobayashi K, Ochi M. Predictive value of preoperative 3-dimensional computer tomography measurement of semitendinosus tendon harvested for anterior cruciate ligament reconstruction. Arthroscopy. 2006;22(3):259-64.and2020. Hamada M, Shino K, Mitsuoka T, Abe N, Horibe S. Cross-sectional area measurement of the semitendinosus tendon for anterior cruciate ligament reconstruction. Arthroscopy. 1998;14(7):696-701. No entanto, a falta de padronização em relação ao nível das medições e de confiabilidade e precisão dos exames provoca limitações que tornam questionáveis os resultados obtidos. Yasumoto et al.1919. Yasumoto M, Deie M, Sunagawa T, Adachi N, Kobayashi K, Ochi M. Predictive value of preoperative 3-dimensional computer tomography measurement of semitendinosus tendon harvested for anterior cruciate ligament reconstruction. Arthroscopy. 2006;22(3):259-64. analisaram o comprimento pré-operatório do tendão do semitendíneo com tomografia computadorizada 3 D e conseguiram predizer o comprimento do tendão. Mas não encontraram qualquer relação das imagens com os diâmetros. Os estudos de Hamada et al.2020. Hamada M, Shino K, Mitsuoka T, Abe N, Horibe S. Cross-sectional area measurement of the semitendinosus tendon for anterior cruciate ligament reconstruction. Arthroscopy. 1998;14(7):696-701. mostraram que a RM não era prática para avaliar o tamanho dos tendões, uma vez que requer um longo tempo de varredura e tem um alto custo.

Conclusão

A capacidade de prever com precisão o comprimento e o diâmetro dos tendões isquiotibiais (ST e G) usados na reconstrução do LCA continua a ser um fator importante na tomada de decisão e na escolha da melhor técnica cirúrgica e do enxerto adequado. Nossos resultados mostram que idade, peso e IMC não se correlacionaram com o diâmetro e comprimento do enxerto, enquanto a altura tinha uma correlação positiva com o comprimento total dos tendões flexores e com o diâmetro do enxerto dos flexores (ST e G).

Agradecimentos

Agradecimento especial aos médicos Luiz Antonio Silveira Simões Pires e Guilherme Isler Pereira que contribuiram igualmente na coleta de dados e realização deste trabalho.

References

  • 1
    Dunn WR, Lyman S, Lincoln AE, Amoroso PJ, Wickiewicz T, Marx RG. The effect of anterior cruciate ligament reconstruction on the risk of knee reinjury. Am J Sports Med. 2004;32(8):1906-14.
  • 2
    Prodromos CC, Han YS, Keller BL, Bolyard RJ. Stability results of hamstring anterior cruciate ligament reconstruction at 2- to 8 -year follow- up. Arthroscopy. 2005;21(2):138-46.
  • 3
    Biau DJ, Tournoux C, Katsahian S, Schranz PJ, Nizard RS. Bone-patellar tendon-bone autografts versus hamstring autografts for reconstruction of anterior cruciate ligament: meta- analysis. BMJ. 2006;332(7548):995-1001.
  • 4
    Aglietti P, Giron F, Buzzi R, Biddau F, Sasso F. Anterior cruciate ligament reconstruction: bone-patellar tendon-bone compared with double semitendinosus and gracilis tendon grafts. A prospective, randomized clinical trial. J Bone Joint Surg Am. 2004;86-A(10):2143-55.
  • 5
    Fu FH, Bennett CH, Lattermann C, Ma CB. Current trends in anterior cruciate ligament reconstruction. Part 1: biology and biomechanics of reconstruction. Am J Sports Med. 1999;27(6):821-30.
  • 6
    Gianotti SM, Marshall SW, Hume PA, Bunt L. Incidence of anterior cruciate ligament injury and other knee ligament injuries: a national population-based study. J Sci Med Sport. 2009;12(6):622-7.
  • 7
    Hamada M, Shino K, Horibe S, Mitsuoka T, Toritsuka Y, Nakamura N. Changes in cross-sectional area of hamstring anterior cruciate ligament grafts as a function of time following transplantation. Arthroscopy. 2005;21(8): 917-22.
  • 8
    Grood ES, Walz-Hasselfeld KA, Holden JP, Noyes FR, Levy MS, Butler DL, et al. The correlation between anterior-posterior translation and cross-sectional area of anterior cruciate ligament reconstructions. J Orthop Res. 1992;10(6):878-85.
  • 9
    Scott WN, Insall JN. Injuries of the knee. In: Rockwood DP Jr, Green DP, Bucholz RW, editors. Rockwood and Green's fractures in adults. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 1996. p. 1799-816.
  • 10
    Magnussen RA, Lawrence JT, West RL, Toth AP, Taylor DC, Garrett WE. Graft size and patient age are predictors of early revision after anterior cruciate ligament reconstruction with hamstring autograft. Arthroscopy. 2012;28(4):526-31.
  • 11
    Teli M, Chiodini F, Sottocasa R, Villa T. Influence of the diameters of tendon graft and bone tunnel in hamstring ACL reconstruction. A bovine model. Chir Organi Mov. 2005;90(3):281-5.
  • 12
    Hamner DL, Brown CH, Steiner ME, Hecker AT, Hayes WC. Hamstring tendon grafts for reconstruction of the anterior cruciate ligament: biomechanical evaluation of the multiple strands and tensioning techniques. J Bone Joint Surg Am. 1999;81(4):549-57.
  • 13
    Tuman JM, Diduch DR, Rubino LJ, Baumfeld JA, Nguyen HS, Hart JM. Predictors for hamstring graft diameter in anterior cruciate ligament reconstruction. Am J Sports Med. 2007;35(11):1945-9.
  • 14
    Ma CB, Keifa E, Dunn W, Fu FH, Harner CD. Can pre- operative measures predict quadruple hamstring graft diameter? Knee. 2010;17(1):81-3.
  • 15
    Schwartzberg R, Burkhart B, Lariviere C. Prediction of hamstring tendon autograft diameter and length for anterior cruciate ligament reconstruction. Am J Orthop (Belle Mead NJ). 2008;37(3):157-9.
  • 16
    Treme G, Diduch DR, Billante MJ, Miller MD, Hart JM. Hamstring graft size prediction: a prospective clinical evaluation. Am J Sports Med. 2008;36(11):2204-9.
  • 17
    Pichler W, Tesch NP, Schwantzer G, Fronhöfer G, Boldin C, Hausleitner L, et al. Differences in length and cross-section of semitendinosus and gracilis tendons and their effect on anterior cruciate ligament reconstruction: a cadaver study. J Bone Joint Surg Br. 2008;90(4):516-9.
  • 18
    Wernecke G, Harris IA, Houang MT, Seeto BG, Chen DB, MacDessi SJ. Using magnetic resonance imaging to predict adequate graft diameters for autologous hamstring double-bundle anterior cruciate ligament reconstruction. Arthroscopy. 2011;27(8):1055-9.
  • 19
    Yasumoto M, Deie M, Sunagawa T, Adachi N, Kobayashi K, Ochi M. Predictive value of preoperative 3-dimensional computer tomography measurement of semitendinosus tendon harvested for anterior cruciate ligament reconstruction. Arthroscopy. 2006;22(3):259-64.
  • 20
    Hamada M, Shino K, Mitsuoka T, Abe N, Horibe S. Cross-sectional area measurement of the semitendinosus tendon for anterior cruciate ligament reconstruction. Arthroscopy. 1998;14(7):696-701.
  • Trabalho desenvolvido no Hospital São Lucas, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), Hospital Mãe de Deus e Hospital Divina Providência, Porto Alegre, RS, Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2016

Histórico

  • Recebido
    01 Set 2014
  • Aceito
    05 Maio 2015
Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia Al. Lorena, 427 14º andar, 01424-000 São Paulo - SP - Brasil, Tel.: 55 11 2137-5400 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbo@sbot.org.br