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Estudo epidemiológico de recidiva de tumor de células gigantes no Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia Trabalho desenvolvido no Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into), Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

RESUMO

OBJETIVOS:

O tumor de células gigantes (TCG) é uma neoplasia óssea benigna relativamente rara em adultos, porém seu comportamento biológico ainda é imprevisível. A incidência de recidiva local apresenta variação entre 0-65% em estudos internacionais, porém há poucos dados referentes a essa complicação em nossa população.

MÉTODOS:

Foram coletadas informações sobre 155 pacientes com diagnóstico histológico confirmado de TCG, acompanhados no serviço de oncologia ortopédica da nossa instituição, de janeiro de 2000 a julho de 2014. As características demográficas foram avaliadas e comparadas entre os pacientes que apresentaram recidiva local durante o seguimento clínico.

RESULTADOS:

Houve recidiva local em 26 pacientes (16,7%), dos quais 22 eram do sexo feminino (84,6%). A localização mais comum de recidiva local foi o fêmur distal (38,4%). Onze pacientes apresentaram recidiva precoce, enquanto 15 casos foram diagnosticados após 15 meses, o que representa, respectivamente, 42,3% e 57,7%. Metástases foram identificadas em cinco pacientes (3,2%).

CONCLUSÃO:

Os fatores relacionados ao tumor não evidenciaram aumento da incidência de recidiva local de tumor de células gigantes. O tratamento cirúrgico com margem intralesional é uma opção válida no tratamento de recidivas locais e não apresenta diferença de sobrevida livre de doença entre outros tipos de procedimentos. Tratamento clínico é reservado em casos de tumores irressecáveis ou impossibilidade de tratamento cirúrgico.

Palavras-chave:
Tumores de células gigantes; Recidiva; Epidemiologia

ABSTRACT

OBJECTIVE:

Giant cell tumors are benign bone neoplasms that are relatively rare in adults and their biological behavior is still unpredictable. The incidence of local recurrence has presented variation between 0% and 65% in studies conducted worldwide, but few data are available on this complication in the Brazilian population.

METHODS:

Information on 155 patients with confirmed histological diagnoses of giant cell tumor who were treated in our institution's orthopedic oncology service between January 2000 and July 2014 was gathered. Demographic characteristics were evaluated and compared between patients who presented local recurrence during the clinical follow-up.

RESULTS:

Local recurrence was observed in 26 patients (16.7%), of whom 22 were female (84.6%). The most common site of local recurrence was the distal femur (38.4%). Eleven patients presented early recurrence, while 15 cases were diagnosed after 15 months, representing 42.3% and 57.7%, respectively. Metastases were identified in five patients (3.2%).

CONCLUSION:

Tumor-related factors did not show any increased incidence of local recurrence of giant cell tumors. Surgical treatment with an intralesional margin is a valid option for treating local recurrences and does not show any difference in disease-free survival in relation to other types of procedures. Clinical treatment is reserved for cases of unresectable tumors or when surgical treatment is impossible.

Keywords:
Giant cell tumor; Recurrence; Epidemiology

Introdução

O tumor de células gigantes (TCG) ou osteoclastoma é uma neoplasia de malignidade indeterminada com comportamento localmente agressivo, composto por tecido mononuclear ovoide neoplásico interposto uniformemente por numerosas células gigantes.11. Schajowicz F. Neoplasias osseas e lesões pseudotumorais. Rio de Janeiro: Revinter; 2000.,22. Greenspan A. Radiologia ortopédica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006.and33. Reid R, Banerjee SS, Sciot R. Giant cell tumour. In: Fletcher CD, Unni KK, Mertens F, editors. Pathology and genetics of tumours of soft tissues and boné. Lyon: IARC Press; 2002. p. 310-3.

O TCG representa cerca de 5% dos tumores ósseos primários e aproximadamente 23% dos tumores ósseos benignos.22. Greenspan A. Radiologia ortopédica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006.and44. Canalle ST. Cirurgia ortopédica de Campbell. Barueri, SP: Manole; 2006. Ocorre mais frequentemente na faixa entre 20 e 40 anos, com predomínio discreto no sexo feminino (proporção de 1,2:1. É considerado um tumor raro em crianças e adolescentes55. Campanacci M. Giant cell tumor of bone. In: Bone and soft tissue tumors. 2nd ed. Springer Verlag: Berlin; 1999. p. 99-132. e menos de 10% dos casos ocorrem em pacientes acima de 65 anos.66. Coley BL. Neoplasms of bone and related conditions. 2nd ed. Nova Iorque: Hoeber; 1960. p. 196-235.

A localização mais comum é a região epifisária de ossos longos de indivíduos esqueleticamente maduros, pode acometer também a região metafisária de pacientes com fise aberta.11. Schajowicz F. Neoplasias osseas e lesões pseudotumorais. Rio de Janeiro: Revinter; 2000.and22. Greenspan A. Radiologia ortopédica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006. Os locais mais afetados são fêmur distal, tíbia proximal e rádio distal. O acometimento axial é incomum.77. Scott DL, Pedlow FX, Hecht AC, Hornicek FJ. Primary benign and malignant extradural spine tumors. In: Frymoyer JW, Wiesel SW, editors. The adult and pediatric spine. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2003. p. 191-245. Apesar do comportamento benigno, essa patologia pode evoluir com complicações locais e metástases, principalmente em localização pulmonar.44. Canalle ST. Cirurgia ortopédica de Campbell. Barueri, SP: Manole; 2006.,88. O'Donnell RJ, Springfield DS, Motwani HK, Ready JE, Gebhardt MC, Mankin HJ. Recurrence of giant-cell tumors of the long bones after curettage and packing with cement. J Bone Joint Surg Am. 1994;76(12):1827-33.and99. Rock MG, Pritchard DJ, Unni KK. Metastases from histologically benign giant-cell tumor of bone. J Bone Joint Surg Am. 1984;66(2):269-74.

A recidiva é definida como evidência sintomática ou radiológica de doença, a partir de três meses após o tratamento, e, em geral, é detectada nos primeiros dois anos de seguimento clínico.1010. Dahlin DC, Cupps RE, Johnson EW Jr. Giant-cell tumor: a study of 195 cases. Cancer. 1970;25(5):1061-70. As taxas de recorrência do TCG primário variam de 0% a 65%, dependem do tipo de tratamento e da apresentação local do tumor. Apesar de sua natureza benigna, metástases pulmonares ocorrem em 2 a 5% dos casos.1111. Klenke FM, Wenger DE, Inwards CY, Rose PS, Sim FH. Recurrent giant cell tumor of long bones: analysis of surgical management. Clin Orthop Relat Res. 2011;469(4):1181-7.

O TCG representa uma neoplasia benigna relativamente rara em adultos; porém, seu comportamento biológico ainda é imprevisível. Há muitos trabalhos publicados que relatam as experiências de grupos internacionais em países desenvolvidos, porém há pouca informação sobre o comportamento da doença em países em desenvolvimento. O presente trabalho apresenta dados epidemiológicos com seguimento de 14 anos de 155 pacientes em um instituto de referência em ortopedia no Brasil.

Métodos

Foram coletadas informações sobre pacientes com diagnóstico histológico confirmado de TCG, acompanhados no serviço de Oncologia Ortopédica de janeiro de 2000 a julho de 2014. O estudo foi previamente aprovado pelo comitê de ética em pesquisa da instituição.

A investigação diagnóstica foi feita por meio de avaliação clínica e radiológica, que incluiu radiografia convencional, tomografia computadorizada e ressonância magnética. Posteriormente, os pacientes foram submetidos a biópsia por agulha, para definição histopatológica.

Os critérios de exclusão foram: recorrência local com menos de três meses após tratamento cirúrgico; perda do seguimento ambulatorial; e registro clínico-radiológico incompleto.

Avaliou-se o local acometido, a presença de metástases e/ou de fraturas patológicas, o tempo de evolução dos sintomas, o estadiamento clínico-radiológico e o diagnóstico histopatológico, assim como o tipo de cirurgia realizada, a margem cirúrgica e o uso de adjuvantes. Foram analisados o tempo de seguimento, o tempo livre de doença e o local/número de recidivas.

Os pacientes foram divididos em três grupos, A, B e C, segundo a localização tumoral, conforme descrito por Takeuchi et al. 1212. Takeuchi A, Tsuchiya H, Niu X, Ueda T, Jeon DG, Wang EH, et al. The prognostic factors of recurrent GCT: a cooperative study by the Eastern Asian Musculoskeletal Oncology Group. J Orthop Sci. 2011;16(2):196-202. O grupo A incluiu lesões em fêmur, tíbia, úmero e rádio. O grupo B foi composto pelos tumores localizados em escápula, fíbula, ulna e ossos das mãos ou pés. Tumores situados no esqueleto axial formaram o grupo C.

O estadiamento do tumor foi feito segundo Campanacci et al.,1313. Campanacci M, Baldini N, Boriani S, Sudanese A. Giant-cell tumor of bone. J Bone Joint Surg Am. 1987;69(1):106-14. dividido da seguinte maneira: I - quiescente, intraósseo; II - ativo com periósteo intacto; III - agressivo, quando se observou o rompimento da cortical e a invasão das partes moles. Essa classificação tem utilidade terapêutica e foi usada para auxiliar a definição da margem cirúrgica em intralesional, marginal, ampla ou radical.

O tratamento cirúrgico seguiu o protocolo preconizado pela Instituição, que prioriza cirurgias menos agressivas que promovam a manutenção da articulação. Dentre os tratamentos cirúrgicos foi feita a ressecção intralesional associada ao uso de fresa odontológica esférica, seguida de preenchimento dos defeitos ósseos locais com polimetilmetacrilato (PMMA), enxerto ósseo autólogo ou enxerto alogênico. A cirurgia ampla foi realizada nos casos em que a extensão tumoral impossibilitou a ressecção intralesional ou nos tumores localizados em ossos dispensáveis, como a cabeça da fíbula ou ulna distal.

O seguimento clínico foi feito após 1, 3, 6, 12, 18 e 24 meses. Após 24 meses, as avaliações foram feitas de acordo com as recomendações do médico assistente. As avaliações incluíram exame físico e investigação radiológica (radiografia convencional e radiografia de tórax), com o objetivo de fazer o diagnóstico precoce de recidivas ou de metástases. Em caso de suspeita de recorrência local, foram solicitados exames de imagem complementares, que incluíram tomografia computadorizada e ressonância magnética.

O desfecho dos pacientes incluídos nessa pesquisa foi classificado como favorável ou desfavorável, de acordo com o seguimento clínico. O desfecho favorável indicou que o paciente não apresentou recidiva local ou metástase durante o seguimento. Pacientes que apresentaram essas complicações foram considerados no grupo desfecho desfavorável.

As informações obtidas foram incluídas em banco de dados no Programa Excel 2013 (Microsoft) e avaliadas estatisticamente. O perfil demográfico foi descrito por meio de porcentagens, média, desvio padrão e valores mínimo e máximo. A comparação das características demográficas dos pacientes com e sem recidiva foi feita pelo teste Mann-Whitney e de associação pelo qui-quadrado, no nível de significância de 95%. A sobrevida livre de evento foi analisada em função do tempo de seguimento em meses, considerando-se a data da primeira consulta até a ocorrência do evento (metástase ou recidiva). Foram censurados os pacientes que permaneceram vivos e foi considerada a data da última consulta como término do tempo de seguimento. As probabilidades de sobrevida acumulada foram estimadas com o método Kaplan-Meier e para a análise estatística das curvas entre os grupos clínicos usou-se o teste log-rank. Todos os testes estatísticos foram feitos no programa GraphPad Prism versão 5.00 para Windows (GraphPad Software, San Diego California USA, www.graphpad.com). Considerou-se p < 0,05 estatisticamente significativo.

Resultados

De janeiro de 2000 a julho de 2014, 158 pacientes foram diagnosticados na instituição com TCG, entre os quais três foram excluídos da pesquisa, seguindo os critérios de exclusão citados.

A análise incluiu 155 pacientes, 60 (38,7%) do sexo masculino e 95 (61,3%) do feminino. O tempo de seguimento médio dos pacientes foi de 56,7 meses (3,9 a 158,9). Fratura patológica ocorreu em 20 pacientes, o que representou 12,9% dos casos.

Os tumores foram encontrados principalmente em ossos longos, 32,9% no fêmur (51/155), 29% na tíbia (45/155) e 16,7% no rádio (26/155), conforme tabela 1. Os pacientes incluídos no grupo A totalizaram 123 casos (79,3%), enquanto o grupo B apresentou 25 (16,2%). A minoria dos pacientes foi incluída no grupo C, sete casos, que representaram 4,5% dos pacientes.

Tabela 1
Características demográficas e do tumor de 155 pacientes portadores de tumor de células gigantes

Segundo a classificação radiológica de Campanacci, os graus I, II e III representaram, respectivamente, 2,7% (4/150), 30% (45/150) e 67,3% (101/150) dos casos. Cinco pacientes foram excluídos por esse critério, pois não havia registros radiográficos no banco de imagens.

O tratamento cirúrgico da lesão primária foi feito em 150 pacientes, três deles em outra instituição. Um dos casos não foi contabilizado em nossa análise, pois não obtivemos informações sobre o procedimento realizado (tabela 2). Cinco pacientes não foram submetidos ao tratamento cirúrgico, pois não aceitaram o procedimento proposto. Ressecção com margem intralesional foi feita em 39,3% (59/150) dos pacientes; 44% (66/150) foram submetidos a tratamento com margem ampla, enquanto margens marginais e radicais representaram, respectivamente, 7,3% (11/150) e 8,6% (13/150) dos casos. O tipo de procedimento mais feito foi curetagem associada ao uso de polimetilmetacrilato (PMMA) (36%; 54/150), seguida por ressecção ampla com uso de endoprótese não convencional (20%; 30/150) e amputação (15,3%; 23/150).

Tabela 2
Tratamento cirúrgico de 149 pacientes portadores de tumor de células gigantes

A recidiva local ocorreu em 26 pacientes (16,7%). Foram comparadas as características demográficas e os dados de tratamento dos pacientes com e sem recidiva. Lesão em tecidos moles foi evidenciada em seis casos. Quinze pacientes, entre 20 e 40 anos ao diagnóstico do tumor primário, foram identificados e representaram 57,7% dos casos de recidiva. Oito pacientes (30,7%) apresentavam idade acima de 40 anos ao diagnóstico inicial. Quanto ao gênero, 22 pacientes eram do sexo feminino (84,6%).

Um paciente do grupo com recidiva apresentou metástase pulmonar. Em cinco anos, a sobrevida livre de evento foi de 88% (fig. 1). Considerando os grupos de Campanacci, não houve diferença na sobrevida livre de evento em cinco anos, 88,5% para Campanacci II e 91,5% para Campanacci III (fig. 2A). Da mesma forma, considerando-se os grupos de topografia, também não foi observada diferença na sobrevida livre de eventos (fig. 2B).

Figura 1
Sobrevida livre de evento em cinco anos.

Figura 2
Sobrevida livre de evento em pacientes portadores de tumor de células gigantes quanto à classificação de Campanacci (A) e topografia (B).O grupo A incluiu lesões em fêmur, tíbia, úmero e rádio. O grupo B foi composto pelos tumores localizados em escápula, fíbula, ulna e ossos das mãos ou pés. Tumores situados no esqueleto axial formaram o grupo C.

A maior quantidade de recorrências ocorreu no grupo A (n = 22; 84,6%), seguido pelo grupo B (n = 3; 11,5%) e grupo C (n = 1; 3,8%). A localização mais comum de recidiva local foi o fêmur distal (n = 10; 38,4%). Onze pacientes apresentaram recidiva precoce, enquanto 15 casos foram diagnosticados após 15 meses e representaram, respectivamente, 42,3% e 57,7%. Quinze pacientes, previamente submetidos a curetagem e uso de PMMA, evoluíram com diagnóstico de recidiva local.

Vinte e quatro pacientes diagnosticados com recidiva local foram tratados cirurgicamente, dos quais seis (25%) fizeram nova curetagem associada ao uso de PMMA. Cinco casos (20,8%) foram tratados por meio de ressecção ampla e uso de endoprótese, enquanto quatro pacientes (16,6%) foram submetidos a amputação. Dois pacientes não foram submetidos a procedimento cirúrgico, pois não aceitaram a indicação cirúrgica, os quais foram submetidos a tratamento clínico com uso de bifosfonatos (alendronato). Quatro pacientes apresentaram nova recorrência, após o segundo procedimento cirúrgico, e ocorreu terceira recidiva em um caso.

Metástases foram identificadas em cinco pacientes (3,2%), entre os quais somente um apresentou recidiva local durante a evolução. Todos os casos foram diagnosticados em localização pulmonar.

Após seguimento clínico, trinta pacientes diagnosticados com TCG primário (19,3%) apresentaram desfecho desfavorável, 25 com diagnóstico de recidiva local, quatro com metástases e um evoluiu com ambas as complicações.

Discussão

Gouin et al.1414. Gouin F, Dumaine V, French Sarcoma and Bone Tumor Study Groups GSF- GETO. Local recurrence after curettage treatment of giant cell tumors in peripheral bones: retrospective study by the GSF- GETO (French Sarcoma and Bone Tumor Study Groups). Orthop Traumatol Surg Res. 2013;99 6 Suppl:S313-8. não evidenciaram fatores de risco relacionados ao tumor que aumentem a incidência de recorrência local após tratamento intralesional em lesões do esqueleto apendicular. Isso indica que os fatores relacionados a risco reduzido de recorrência local foram eficácia e precocidade do tratamento cirúrgico.1212. Takeuchi A, Tsuchiya H, Niu X, Ueda T, Jeon DG, Wang EH, et al. The prognostic factors of recurrent GCT: a cooperative study by the Eastern Asian Musculoskeletal Oncology Group. J Orthop Sci. 2011;16(2):196-202.and1414. Gouin F, Dumaine V, French Sarcoma and Bone Tumor Study Groups GSF- GETO. Local recurrence after curettage treatment of giant cell tumors in peripheral bones: retrospective study by the GSF- GETO (French Sarcoma and Bone Tumor Study Groups). Orthop Traumatol Surg Res. 2013;99 6 Suppl:S313-8. O risco de recorrência local em tumores localizados em rádio distal e fêmur proximal foi maior, apesar de não ter sido comprovado estatisticamente. O uso de enxerto autólogo foi considerado um fator de risco independente para recorrência local.1414. Gouin F, Dumaine V, French Sarcoma and Bone Tumor Study Groups GSF- GETO. Local recurrence after curettage treatment of giant cell tumors in peripheral bones: retrospective study by the GSF- GETO (French Sarcoma and Bone Tumor Study Groups). Orthop Traumatol Surg Res. 2013;99 6 Suppl:S313-8. Extensão para tecidos moles e agressividade radiológica também foram relatados como fatores prognósticos, o que evidencia a importância da classificação de Campanacci.1313. Campanacci M, Baldini N, Boriani S, Sudanese A. Giant-cell tumor of bone. J Bone Joint Surg Am. 1987;69(1):106-14.,1414. Gouin F, Dumaine V, French Sarcoma and Bone Tumor Study Groups GSF- GETO. Local recurrence after curettage treatment of giant cell tumors in peripheral bones: retrospective study by the GSF- GETO (French Sarcoma and Bone Tumor Study Groups). Orthop Traumatol Surg Res. 2013;99 6 Suppl:S313-8.and1515. Becker WT, Dohle J, Bernd L, Braun A, Cserhati M, Enderle A, et al. Local recurrence of giant cell tumor of bone after intralesional treatment with and without adjuvant therapy. J Bone Joint Surg Am. 2008;90(5):1060-7. Em metanálise, Li et al.1616. Li R, Hu Y. Meta- analysis of risk factors of recurrence in patients with giant cell tumor on extremities. Zhonghua Yi Xue Za Zhi. 2014;94(47):3778-83. indicaram que idade menor do que 20 anos, tumores localizados em rádio distal e cirurgia intralesional com ou sem enxertia óssea podem ser fatores de risco para recidiva em tumores apendiculares, porém não houve comprovação estatística.1616. Li R, Hu Y. Meta- analysis of risk factors of recurrence in patients with giant cell tumor on extremities. Zhonghua Yi Xue Za Zhi. 2014;94(47):3778-83. Em nosso estudo, os locais que apresentaram maior taxa de recidiva local foram fêmur distal, tíbia proximal e rádio distal. Os parâmetros demográficos avaliados em nosso estudo, como sexo, idade, localização e classificação radiológica, não apresentaram significância estatística relacionada com o desfecho clínico.

Diversos fatores são importantes na interpretação dos resultados. Em nossa pesquisa, foram incluídos três pacientes tratados previamente em outras instituições. Esse fato pode limitar conclusões sobre a taxa de recidiva desses pacientes, uma vez que não podemos obter dados intraoperatórios consistentes. Além disso, a instituição de referência recebe pacientes de outras localidades, o que pode afetar as condições de seguimento clínico.

O tratamento cirúrgico com controle local de doença, associado a adjuvantes locais, tem sido usado em nosso serviço como padrão para lesões apendiculares. O risco de recorrência nesses casos é 12-18%, compatível com os dados obtidos.1414. Gouin F, Dumaine V, French Sarcoma and Bone Tumor Study Groups GSF- GETO. Local recurrence after curettage treatment of giant cell tumors in peripheral bones: retrospective study by the GSF- GETO (French Sarcoma and Bone Tumor Study Groups). Orthop Traumatol Surg Res. 2013;99 6 Suppl:S313-8.and1515. Becker WT, Dohle J, Bernd L, Braun A, Cserhati M, Enderle A, et al. Local recurrence of giant cell tumor of bone after intralesional treatment with and without adjuvant therapy. J Bone Joint Surg Am. 2008;90(5):1060-7. O tratamento usado para lesões primárias foi curetagem intralesional seguida por ampliação da cavidade com fresa odontológica esférica. Essa opção cirúrgica é menos invasiva e normalmente fornece a possibilidade de preservar a articulação e os tecidos adjacentes livres de doença. As opções de adjuvantes são polimetilmetacrilato (PMMA), peróxido de hidrogênio, fenol e crioterapia. O PMMA é o composto mais usado em nossa instituição, devido à disponibilidade, facilidade de aplicação e eficácia comprovada. O impacto do PMMA está relacionado aos efeitos tóxicos e térmicos que ocorrem após sua aplicação, que promovem melhor controle local.1515. Becker WT, Dohle J, Bernd L, Braun A, Cserhati M, Enderle A, et al. Local recurrence of giant cell tumor of bone after intralesional treatment with and without adjuvant therapy. J Bone Joint Surg Am. 2008;90(5):1060-7. Cirurgia ampla foi indicada em casos em que a extensão tumoral impossibilitou ressecção intralesional ou tumores que acometiam ossos dispensáveis, como a cabeça da fíbula ou ulna distal.1111. Klenke FM, Wenger DE, Inwards CY, Rose PS, Sim FH. Recurrent giant cell tumor of long bones: analysis of surgical management. Clin Orthop Relat Res. 2011;469(4):1181-7.

Lesões pélvicas são raras, representam cerca de 1,5-6,1% dos casos, porém são associadas à recidiva precoce e metástase (respectivamente, 7-75% e 2-9,1% dos pacientes). Devido a sua localização, alguns casos podem ser considerados irressecáveis. Não há tratamento padronizado para TCG em localização pélvica. Embora a curetagem preserve a integridade da pelve, a taxa de recorrência local varia entre 6,3 e 43%. Ressecção ampla destina-se a prevenir recorrência, mas está associada a altos índices de complicações.1717. Guo W, Sun X, Zang J, Qu H. Intralesional excision versus wide resection for giant cell tumor involving the acetabulum: which is better? Clin Orthop Relat Res. 2012;470(4):1213-20. Foram registrados três casos de lesões pélvicas (1,9%), dois no ísquio e um no acetábulo. Recidiva local ocorreu em um caso, após ressecção de tumor em ísquio. Segundo Guo et al.,1717. Guo W, Sun X, Zang J, Qu H. Intralesional excision versus wide resection for giant cell tumor involving the acetabulum: which is better? Clin Orthop Relat Res. 2012;470(4):1213-20. a ressecção ampla de lesões pélvicas apresenta menor taxa de recidivas, além de bons resultados funcionais. Esses dados são compatíveis com o desfecho clínico observado em nosso estudo.

Tumores de células gigantes localizados em esqueleto axial representam 3 a 7% dos casos de TCG ósseo e até 4% dos tumores ósseos vertebrais. O tratamento dessas lesões constitui um desafio terapêutico, pois a cirurgia com margem intralesional é considerada procedimento tecnicamente complexo e pouco efetivo. Ressecção ampla com margem livre é pouco factível devido ao risco associado. A embolização pode reduzir o sangramento intraoperatório. Radioterapia tem sido empregada com sucesso em algumas lesões sacrais, particularmente aquelas em que há recidiva.1818. Raskin KA, Schwab JH, Mankin HJ, Springfield DS, Hornicek FJ. Giant cell tumor of bone. J Am Acad Orthop Surg. 2013;21(2):118-26. Relatamos dois tumores sacrais e dois lombares, com incidência total de 2,5% dos casos. Dois pacientes foram submetidos a tratamento cirúrgico, foram feitas corpectomia e artrodese anterior e posterior. Um paciente fez seguimento com uso de radioterapia e embolização arterial. Apenas um paciente não foi submetido a procedimento cirúrgico, pois não aceitou o tratamento proposto. Não houve evidência de recidiva durante seguimento clínico (média de 3,8 anos).

Yanagisawa et al.1919. Yanagisawa M, Okada K, Tajino T, Torigoe T, Kawai A, Nishida J. A clinicopathological study of giant cell tumor of small bones. Ups J Med Sci. 2011;116(4):265-8. descreveram 11 casos de TCG distais às articulações radiocárpica e tibiotársica, cinco pacientes do sexo masculino e seis do feminino, com média de 24,7 anos. A localização e a classificação radiológica mais frequentes foram, respectivamente, os metacarpos (45,45%) e Campanacci II (54,54%). Em nosso estudo, foram diagnosticados 13 pacientes com lesões na topografia citada. Os sítios mais comuns foram metacarpos (4/13) e ossos do tarso (4/13). Os pacientes que apresentavam lesões classificadas como Campanacci I ou II foram tratados cirurgicamente com margem intralesional. Os casos classificados como Campanacci III foram tratados com margem radical - amputação ou ressecção em bloco (27,2%). Houve dois casos de recidiva local e uma metástase pulmonar. Os dados obtidos foram compatíveis com estudos prévios.1919. Yanagisawa M, Okada K, Tajino T, Torigoe T, Kawai A, Nishida J. A clinicopathological study of giant cell tumor of small bones. Ups J Med Sci. 2011;116(4):265-8.

O tratamento de recidivas tumorais é considerado controverso. Segundo Klenke et al.,1111. Klenke FM, Wenger DE, Inwards CY, Rose PS, Sim FH. Recurrent giant cell tumor of long bones: analysis of surgical management. Clin Orthop Relat Res. 2011;469(4):1181-7. ressecção com margens amplas é a opção mais adequada, devido as menores taxas de recorrência e maior tempo de sobrevida livre de doença. Apesar disso, cirurgia com margem intralesional é uma opção válida no tratamento de TCGs recorrentes. Esse tratamento deve ser usado independentemente da extensão tumoral para as partes moles, reserva-se a ressecção ampla para os casos em que há extenso acometimento ósseo ou lesão de estruturas neurovasculares. Ressecção ampla exige, frequentemente, reconstruções ósseas complexas associadas a maiores taxas de complicações cirúrgicas e déficit funcional. Risco potencial de metástases pulmonares não está relacionado ao tipo de tratamento cirúrgico feito.1111. Klenke FM, Wenger DE, Inwards CY, Rose PS, Sim FH. Recurrent giant cell tumor of long bones: analysis of surgical management. Clin Orthop Relat Res. 2011;469(4):1181-7.and1212. Takeuchi A, Tsuchiya H, Niu X, Ueda T, Jeon DG, Wang EH, et al. The prognostic factors of recurrent GCT: a cooperative study by the Eastern Asian Musculoskeletal Oncology Group. J Orthop Sci. 2011;16(2):196-202.

Estudos recentes indicam o uso de tratamento clínico específico em casos de tumores considerados irressecáveis, principalmente em sacro e coluna. As drogas preconizadas incluem os bifosfonatos e o Denosumab, que inibem o sistema receptor ativador do fator nuclear kapa B (RANK).2020. Cornelis F, Truchetet ME, Amoretti N, Verdier D, Fournier C, Pillet O, et al. Bisphosphonate therapy for unresectable symptomatic benign bone tumors: a long-term prospective study of tolerance and efficacy. Bone. 2014;58:11-6.and2121. Xu SF, Adams B, Yu XC, Xu M. Denosumab and giant cell tumour of bone - a review and future management considerations. Curr Oncol. 2013;20(5):e442-7. Em nosso estudo, dois pacientes diagnosticados com recidiva local não fizeram tratamento cirúrgico, pois não aceitaram procedimento proposto. Uso de bifosfonatos (Alendronato) foi oferecido como opção terapêutica nesses casos e foi obtido bom controle local ao longo do seguimento clínico.

A taxa de metástases encontrada em nosso estudo é compatível com a literatura. Foram identificados cinco pacientes (3,2%) com metástases pulmonares, entre os quais somente um apresentou recidiva local durante o seguimento.44. Canalle ST. Cirurgia ortopédica de Campbell. Barueri, SP: Manole; 2006.and2222. Viswanathan S, Jambhekar NA. Metastatic giant cell tumor of bone: are there associated factors and best treatment modalities? Clin Orthop Relat Res. 2010;468(3):827-33.

As metástases ocorrem principalmente em pulmões, apresentam incidência entre 1 e 9%.2222. Viswanathan S, Jambhekar NA. Metastatic giant cell tumor of bone: are there associated factors and best treatment modalities? Clin Orthop Relat Res. 2010;468(3):827-33. Os fatores de risco para esse evento incluem sítio primário, recidiva local e modalidade de tratamento do tumor primário. O intervalo entre o diagnóstico de tumor primário e a detecção de metástases varia entre 0 e 10 anos (média de 3,5). Os sítios primários com predileção para metástase incluem o rádio distal, seguido de fêmur e sacro. Agressividade local e múltiplas recorrências têm sido associados com aumento na incidência de metástases.2222. Viswanathan S, Jambhekar NA. Metastatic giant cell tumor of bone: are there associated factors and best treatment modalities? Clin Orthop Relat Res. 2010;468(3):827-33. Foram identificados cinco pacientes (3,2%) com metástases pulmonares, entre os quais houve um caso de recidiva local durante o seguimento. Os sítios primários foram tíbia distal (2/5), rádio distal (1/5), metacarpo (1/5) e úmero proximal (1/5). Não houve relação estatística entre recidiva local ou localização do tumor primário sobre incidência de metástase.

Conclusão

A recidiva de tumor de células gigantes ocorreu em 26 pacientes (16,7%). Os fatores relacionados ao tumor não evidenciaram aumento da incidência dessa complicação, apesar de ter sido mais comum no sexo feminino. O tratamento cirúrgico com margem intralesional é uma opção válida no tratamento de recidivas locais e não apresenta diferença de sobrevida livre de doença entre outros tipos de procedimentos. O tratamento clínico é usado em casos de tumores irressecáveis ou de impossibilidade de tratamento cirúrgico.

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  • Trabalho desenvolvido no Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into), Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2016

Histórico

  • Recebido
    13 Ago 2015
  • Aceito
    25 Ago 2015
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