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Avaliação do desempenho in vivo de pinos porosos de hidrogel para preenchimento de defeito osteocondral em coelhos Trabalho desenvolvido no Laboratório de Biomateriais, Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde de Sorocaba, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Sorocaba, SP, Brasil.

RESUMO

OBJETIVO:

Trabalho experimental para avaliar o desempenho biológico de arcabouços de hidrogel poli (L-co-D, L ácido lático)-co-trimetileno carbonato/poli (álcool vinílico) (PLDLA-co-TMC/PVA) como implante no preenchimento, e não no reparo, de defeito osteocondral em coelhos Nova Zelândia e verificar a influência do material na proteção tecidual in vivo.

MÉTODOS:

Foram usados 12 coelhos divididos em grupos de nove e 16 semanas. Em cada animal foi criado um defeito osteocondral em ambos os côndilos femorais mediais, em um foi implantado um arcabouço de hidrogel (grupo pino) e no outro foi mantido o defeito (grupo controle). Após o sacrifício dos animais, foi feita análise histológica do material.

RESULTADOS:

Os côndilos do grupo pino não evidenciaram reação inflamatória e estavam rodeados por cápsula fibrosa. Já no grupo controle, uma maior proliferação óssea foi observada nas áreas do defeito, porém com cartilagem articular desorganizada, fibrose evidente, atrofia com exposição óssea e proliferação de membrana sinovial.

CONCLUSÃO:

Os pinos de hidrogel são promissores na função de preenchimento de defeitos osteocondrais, não ocasionam, de modo geral, reação inflamatória e não são eficazes no reparo de defeitos osteocondrais.

Palavras-chave:
Cartilagem articular; Hidrogéis/química; Coelhos

ABSTRACT

OBJECTIVE:

This experimental study aimed to evaluate the biological performance of poly (l-co-D, l-lactic acid)-co-trimetilene carbonate/poly (vinyl alcohol) (PLDLA-co TMC/PVA), hydrogel scaffolds, as an implant in the filling (and not in the repair) of osteochondral defects in New Zealand rabbits, assessing the influence of the material in tissue protection in vivo.

METHODS:

Twelve rabbits were divided into groups of nine and 16 weeks. In each animal, an osteochondral defect was created in both medial femoral condyles. In one knee, a hydrogel scaffold was implanted (pin group) and in the other, the defect was maintained (control group). A histological analysis of the material was performed after euthanasia.

RESULTS:

The condyles of the pin group showed no inflammatory reaction and were surrounded by a fibrous capsule. The control group presented higher bone growth in the areas of the defect, but with disorganized articular cartilage, evident fibrosis, bone exposure, atrophy, and proliferation of synovial membrane.

CONCLUSION:

The hydrogel pins are promising in filling osteochondral defects, generally do not cause inflammatory reactions, and are not effective in the repair of osteochondral defects.

Keywords:
Articular cargilage; Hydrogels/chemistry; Rabbits

Introdução

A osteoartrose ou osteoartrite é uma das afecções que mais acometem o homem.11. Redman SN, Oldfield SF, Archer CW. Current strategies for articular cartilage repair. Eur Cell Mater. 2005;9:23-32. Sua prevalência aumenta com o passar dos anos, é comum após os 60 anos.22. Swieszkowski W, Tuan BH, Kurzydlowski KJ, Hutmacher DW. Repair and regeneration of osteochondral defects in the articular joints. Biomol Eng. 2007;24(5):489-95. A cartilagem articular e o osso subcondral formam um sistema de lubrificação, estabilização e distribuição uniforme de carga, absorvem choques e permitem movimentação com baixa fricção por várias décadas.22. Swieszkowski W, Tuan BH, Kurzydlowski KJ, Hutmacher DW. Repair and regeneration of osteochondral defects in the articular joints. Biomol Eng. 2007;24(5):489-95.,33. Buckwalter JA, Einhorn TA, Simon SR, editors. Orthopaedic basic science. Biology and biomechanics of the musculoskeletal system. 2nd ed. Rosemont, IL: AAOS; 2000.and44. Garrido LF. Avaliação do desempenho de implantes de polietileno e de fosfato tricalcio, recobertos por hidrogel, em defeitos osteocondrais no joelho de cães. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas; 2007. Dissertação. Dessa forma, a cartilagem protege o osso subcondral de alto estresse e reduz a pressão normal de contato.22. Swieszkowski W, Tuan BH, Kurzydlowski KJ, Hutmacher DW. Repair and regeneration of osteochondral defects in the articular joints. Biomol Eng. 2007;24(5):489-95.and55. Little K. Nature of osteopetrosis. Br Med J. 1969;2(5648):49-50. A cartilagem degradada evolui com dor, rigidez e diminuição do movimento articular. Graças à baixa capacidade de regeneração condral, a osteoartrose é um dos mais importantes problemas na ortopedia. Com o aumento da longevidade humana e da prática esportiva nas últimas décadas observamos cada vez mais lesões osteocondrais.22. Swieszkowski W, Tuan BH, Kurzydlowski KJ, Hutmacher DW. Repair and regeneration of osteochondral defects in the articular joints. Biomol Eng. 2007;24(5):489-95.

A cartilagem articular normal apresenta uma fase sólida constituída principalmente por colágeno e proteoglicanos (15-32%) e uma fase fluida composta predominantemente por água (68-85%).22. Swieszkowski W, Tuan BH, Kurzydlowski KJ, Hutmacher DW. Repair and regeneration of osteochondral defects in the articular joints. Biomol Eng. 2007;24(5):489-95. A cartilagem hialina compõe-se de 10% de células (condrócitos) e densa matriz extracelular, com 60 a 80% de água, 10 a 20% de fibras de colágeno tipo IIe 10 a 15% de proteoglicanos. As propriedades mecânicas da cartilagem articular a tornam capaz de transmitir carga de aproximadamente oito vezes o peso corporal, graças à exsudação e ao movimento do fluído pelos poros da cartilagem, e conferem um coeficiente de fricção de 0,008 µ (mi).44. Garrido LF. Avaliação do desempenho de implantes de polietileno e de fosfato tricalcio, recobertos por hidrogel, em defeitos osteocondrais no joelho de cães. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas; 2007. Dissertação.and66. Ding M, Dalstra M, Linde F, Hvid I. Mechanical properties of the normal human tibial cartilage-bone complex in relation to age. Clin Biomech (Bristol Avon). 1998;13(4-5):351-8.

O osso subcondral é uma fina camada de osso denso e duro em contato com a cartilagem articular, enquanto o osso trabecular é composto por abundante matriz (fibras de colágeno e minerais) que age na transmissão de carga.66. Ding M, Dalstra M, Linde F, Hvid I. Mechanical properties of the normal human tibial cartilage-bone complex in relation to age. Clin Biomech (Bristol Avon). 1998;13(4-5):351-8.

Por ser avascular, a cartilagem depende da vascularização proveniente da medula óssea para que ocorra migração de células mesenquimais, responsáveis pelo processo de cicatrização.77. Souza TD, Del Carlo RJ, Viloria MIV. Efeitos da eletroterapia no processo da reparação da superfície articular de coelhos. Ciênc Rural. 2001;31:819-24.and88. Lammi PE, Lammi MJ, Tammi RH, Helminen HJ, Espanha MM. Strong hyaluronan expression in the full- thickness rat articular cartilage repair tissue. Histochem Cell Biol. 2001;115(4):301-8. Além disso, as lesões superficiais da cartilagem articular, que não envolvem o osso subcondral, têm pouca capacidade intrínseca de reparação.9

Tanto na osteoartrose primária como na secundária, a cartilagem é o tecido que sofre as maiores aberrações. Dentre as alterações morfológicas ocorrem perda de sua natureza homogênea, fragmentação, fibrilação, fissuras e ulcerações. Com a progressão da doença, ocasionalmente não resta nenhuma e áreas de osso subcondral ficam expostas.1010. Rezende UM, Hernandez AJ, Camanho GL, Amatuzzi MM. Cartilagem articular e osteoartrose. Acta Ortop Bras. 2000;8(2):100-4.

Podemos considerar três fases no processo de regeneração tecidual: necrose, inflamação e reparo.1111. Mankin HJ. The response of articular cartilage to mechanical injury. J Bone Joint Surg Am. 1982;64(3):460-6.and1212. Cook SD, Patron LP, Salkeld SL, Rueger DC. Repair of articular cartilage defects with osteogenic protein-1 (BMP-7) in dogs. J Bone Joint Surg Am . 2003;85 Suppl. 3:116-23. Porém, a cicatrização de lesão restrita à cartilagem hialina pode não ocorrer dessa forma.1313. Ribeiro JL, Camanho GL, Takita LC. Estudo macroscópico e histológico de reparos osteocondrais biologicamente aceitáveis. Acta Ortop Bras . 2004;12(1):16-21. Lesões superficiais da cartilagem hialina que não atinjam o osso subcondral tendem a não cicatrizar.99. Slatter D. Manual de cirurgia de pequenos animais. Baureri, SP: Manole; 1998. Nessa lesão ocorre degeneração da cartilagem a partir da zona superficial e observam-se finas porções de fibras de colágeno com aspecto descamativo. Com a progressão da lesão é possível visualizar fissuras verticais na cartilagem articular, que produzem aspecto irregular e sem brilho.44. Garrido LF. Avaliação do desempenho de implantes de polietileno e de fosfato tricalcio, recobertos por hidrogel, em defeitos osteocondrais no joelho de cães. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas; 2007. Dissertação.and1414. Espósito AR, Bonadio AC, Pereira NO, Cardoso TP, Barbo MLP, Duek EAR. The use of PLDLA/PCL-T scaffold to repair osteochondral defects in vivo. Mat Res. 2013;16(1):105-15.

A lesão condral desencadearia um processo inflamatório e o hematoma rapidamente se organizaria em coágulos de fibrina, glóbulos brancos e elementos da medula óssea.

Células indiferenciadas da medula e do endotélio vascular são transformadas em fibroblastos primitivos que, com o aporte de capilares e coágulos de fibrina, se transformam em tecido fibroblástico vascularizado de reparação.1111. Mankin HJ. The response of articular cartilage to mechanical injury. J Bone Joint Surg Am. 1982;64(3):460-6. Esse tecido fibrocartilaginoso, a depender dos estímulos mecânicos e biológicos, formará um tecido cartilaginoso.13 A neoformação óssea migra da base do defeito para a superfície articular na região em contato com o osso subcondral. Um tecido fibrocartilaginoso preenche a zona de transição e interrompe a formação de tecido ósseo.44. Garrido LF. Avaliação do desempenho de implantes de polietileno e de fosfato tricalcio, recobertos por hidrogel, em defeitos osteocondrais no joelho de cães. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas; 2007. Dissertação.,1111. Mankin HJ. The response of articular cartilage to mechanical injury. J Bone Joint Surg Am. 1982;64(3):460-6.and1414. Espósito AR, Bonadio AC, Pereira NO, Cardoso TP, Barbo MLP, Duek EAR. The use of PLDLA/PCL-T scaffold to repair osteochondral defects in vivo. Mat Res. 2013;16(1):105-15.

O tecido de reparação do defeito osteocondral tem composição diferente da cartilagem normal.1515. Huntley JS, McBirnie JM, Simpson AH, Hall AC. Cutting-edge design to improve cell viability in osteochondral grafts. Osteoarthritis Cartilage. 2005;13(8):665-71. O condrócito sintetiza proteoglicanos de menor peso molecular. Como as fibras de colágeno do tipo II têm menor diâmetro e disposição mais irregular, esse arranjo favorece a permeabilidade à água. Esse tecido neoformado apresenta menor módulo de elasticidade quando comparado com o tecido cartilaginoso normal.44. Garrido LF. Avaliação do desempenho de implantes de polietileno e de fosfato tricalcio, recobertos por hidrogel, em defeitos osteocondrais no joelho de cães. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas; 2007. Dissertação.,1616. Henderson I, Francisco R, Oakes B, Cameron J. Autologous chondrocyte implantation for treatment of focal chondral defects of the knee - a clinical, arthroscopic, MRIn and histologic evaluation at 2 years. Knee. 2005;12(3):209-16.and1717. Hattori K, Takakura Y, Ohgushi H, Habata T, Uematsu K, Ikeuchi K. Novel ultrasonic evaluation of tissue-engineered cartilage for large osteochondral defects - non- invasive judgment of tissue-engineered cartilage. J Orthop Res. 2005;23(5):1179-83.

O tratamento cirúrgico de lesões condrais e osteocondrais representa um grande desafio. Podemos tentar a estimulação da formação de tecido cartilaginoso ou fibrocartilaginoso, que seria a reparação ou a substituição dessas lesões por tecidos com características semelhantes.44. Garrido LF. Avaliação do desempenho de implantes de polietileno e de fosfato tricalcio, recobertos por hidrogel, em defeitos osteocondrais no joelho de cães. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas; 2007. Dissertação.and1313. Ribeiro JL, Camanho GL, Takita LC. Estudo macroscópico e histológico de reparos osteocondrais biologicamente aceitáveis. Acta Ortop Bras . 2004;12(1):16-21.

Não existem tecidos de substituição com propriedades mecânicas similares ao tecido original.1818. Buma P, Ramrattan NN, van Tienen TG, Veth RP. Tissue engineering of the meniscus. Biomaterials. 2004;25(9):1523-32. Pesquisas com engenharia de tecido que usa sistemas tridimensionais sintéticos com arcabouços porosos têm sido feitas.1919. Martin I, Miot S, Barbero A, Jakob M, Wendt D. Osteochondral tissue engineering. J Biomech. 2007;40(4):750-65.and2020. Jansen EJ, Pieper J, Gijbels MJ, Guldemond NA, Riesle J, Van Rhijn LW, et al. PEOT/PBT based scaffolds with low mechanical properties improve cartilage repair tissue formation in osteochondral defects. J Biomed Mater Res A. 2009;89(2):444-52.

Polímeros como poli(p-dioxanona) - PPD, o poli (ácido lático) - PLA, poli (ácido glicólico) - PGA e seus copolímeros PLLA e PLGA e poli (a-hidroxi ácidos) com características de degradação, biorreabsorção e biocompatibilidade têm sido exaustivamente estudados.44. Garrido LF. Avaliação do desempenho de implantes de polietileno e de fosfato tricalcio, recobertos por hidrogel, em defeitos osteocondrais no joelho de cães. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas; 2007. Dissertação.,2121. Duek EA, Zavaglia CA, Belangero WD. In vitro study of poly(lactic acid) pin degradation. Polymer. 1999;40:6465-73.,2222. Rahman MS, Tsuchiya T. Enhancement of chondrogenic differentiation of human articular chondrocytes by biodegradable polymers. Tissue Eng. 2001;7(6):781-90.,2323. Zhao K, Deng Y, Chun Chen J, Chen GQ. Polyhydroxyalkanoate (PHA) scaffolds with good mechanical properties and biocompatibility. Biomaterials . 2003;24(6):1041-5.and2424. Sakata MM, Alberto-Rincon MC, Duek EA. Estudo da interação polímero/cartilagem/osso utilizando poli(ácido lático-co-ácido glicólico) e poli(p-dionaxona) em côndilofemoral de coelhos. Polímeros. 2004;14(3):176-80.

No nosso estudo empregamos um hidrogel não poroso e não absorvível (PLDLA-co-TMC/PVA) para preenchimento do defeito osteocondral, e não para reparação que permita crescimento de neotecido.

A resposta biológica in vivo com pinos de hidrogel PLDLA-co-TMC/PVA no preenchimento de defeitos osteocondrais é desconhecida.

O objetivo deste trabalho foi avaliar o desempenho biológico de arcabouços de hidrogel PLDLA-co-TMC/PVA como implante no preenchimento, e não no reparo, de defeito osteocondral em coelhos Nova Zelândia e verificar a influência do material na proteção tecidual in vivo.

Material e métodos

O presente estudo foi aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa de nossa instituição (CEUA/FCMS/PUCSP, número 2013/10).

Preparação dos arcabouços poliméricos (pinos de hidrogel)

Os pinos de hidrogel são compostos por polímeros semi-interpenetrantes baseados em Poli (Álcool Vinílico) (PVA) e poli(L-co-D,L ácido lático)-co-trimetileno carbonato (PLDLA-TMC). O hidrogel foi feito com uma solução de 10% m/v de PVA em água e 10% do composto PLDLA-TMC em relação à massa de PVA usada. A solução foi então vertida em moldes de PTFE (politetrafluoretileno) com diâmetro de 4,1 mm, deixados em processo de congelamento-descongelamento durante dois dias. Após esse processo os pinos foram retirados do molde, cortados no sentido do comprimento com 13 mm, esterilizados em radiação UV e implantados (fig. 1).

Figura 1 -
Pinos de hidrogel PLDLA-co-TMC/PVA e molde usado para confecção dos dispositivos.

Estudo in vivo com implante dos pinos e controles

Foram usados 12 coelhos Nova Zelândia, de ambos os sexos, entre 120 e 150 dias e 3,5 kg a 4,5 kg.

Após jejum pré-operatório de oito horas, submetemos os animais à anestesia geral via intramuscular com cloridrato de cetamina (30 mg/kg de peso) associado a cloridrato de xilazina (5 mg/kg de peso). Feita tricotomia da área operada, os coelhos foram posicionados em mesa cirúrgica apropriada, em decúbito dorsal horizontal. A assepsia foi feita com solução de clorexidina alcoólica 0,5% aplicada com gazes estéreis. O cirurgião fez uso de luvas cirúrgicas estéreis e materiais cirúrgicos esterilizados em autoclave a 180 °C por duas horas.

Usamos incisão para patelar medial com dissecção por planos (subcutâneo e capsulotomia para patelar medial). Procedeu-se à luxação lateral da patela que expôs os côndilos femorais. Com o joelho fletido a 90°, criou-se um defeito cilíndrico na cartilagem articular e no osso subcondral no côndilo femoral medial com o emprego uma broca trefina metálica de 3,3 mm/38,5 mm e foi retirado um cilindro osteocondral de 1 cm de profundidade de ambos os joelhos77. Souza TD, Del Carlo RJ, Viloria MIV. Efeitos da eletroterapia no processo da reparação da superfície articular de coelhos. Ciênc Rural. 2001;31:819-24.and1313. Ribeiro JL, Camanho GL, Takita LC. Estudo macroscópico e histológico de reparos osteocondrais biologicamente aceitáveis. Acta Ortop Bras . 2004;12(1):16-21. (Figura 2 and Figura 3).

Figura 2 -
Implante de Hidrogel e trefina.

Figura 3 -
Implante e cilindro osteocondral.

O defeito condral foi criado em ambos os côndilos femorais mediais, em um dos lados foi implantado o pino de hidrogel (lado implante), enquanto no outro (lado controle) foi apenas mantido o defeito (fig. 4).

Figura 4 -
A, defeito osteocondral in situ; B, defeito após retirada do cilindro osteocondral; C, defeito preenchido com pino de hidrogel implantado.

Foi feita sutura por planos após a lavagem com soro fisiológico 0,9% e não foram usados curativos ou imobilizações. Todos os animais foram mantidos individualmente em gaiolas metálicas, com água e ração ad libitum.

Retirada do material - Eutanásia e coleta de tecido

Após nove semanas foram sacrificados sete animais e cinco após 16 semanas.

Usamos inalação com halotano. Após a constatação da morte, o animal foi posicionado em decúbito dorsal horizontal. Dessa maneira foram ressecados os côndilos femorais mediais dos dois joelhos, por via de acesso para patelar medial.

Avaliação macroscópica

Os côndilos foram individualmente identificados, observados macroscopicamente e fotografados (fig. 5). De acordo com a classificação de Outerbridge modificada, o grupo pino, tanto com nove como 16 semanas - considerou-se que não houve crescimento de tecido sobre o pino -grupo não pôde ser incluído na classificação. Já no grupo controle, com nove ou 16 semanas, observaram-se alterações características de Outerbridge II.

Figura 5 -
A, com pino de hidrogel; B, sem pino (grupo controle).

Processamento do material - Análise histológica

Os côndilos femorais foram colocados em recipientes de vidro com solução de Bouin (composta de ácido pícrico, ácido acético e formaldeído) para fixação por 24 horas que mantém a integridade dos tecidos após a morte.

O material foi descalcificados em EDTA 4,13% (solução descalcificadora composta de EDTA tetrassódico, tartarato de sódio, tartarato de sódio e potássio, ácido clorídrico e água destilada) por 21 dias.

Para processamento histológico foram feitos cortes paralelos longitudinais (craniocaudais) e identificados sequencialmente para cada amostra. Essa técnica permitiu avaliação precisa de toda área do côndilo, incluindo a inicialmente lesada e toda a superfície ao redor da lesão.

As amostras, devidamente identificadas, foram desidratadas em uma sequência de soluções alcoólicas, diafanizadas sequencialmente em xilol I, II e III e incluídas em parafina a 70 °C. Após o corte de 3 µm, as amostras foram coradas com Hematoxilina-Eosina e analisadas por microscopia de luz convencional.

Avaliação microscópica

No exame histológico qualitativo das secções do fêmur distal, a atenção foi dirigida, particularmente, para os seguintes elementos:

  1. 1. tipo de tecido que recobria a superfície articular: cartilagem hialina, fibrocartilagem, tecido ósseo ou tecido fibroso; 2. estado da superfície cartilaginosa: lisa, com depressão ou irregular com presença de fissuras ou fragmentos; 3. padrão do osso subcondral; 4. presença ou não de necrose e resposta inflamatória propriamente dita; 5. encontro ou não de alterações hiperplásicas da cartilagem ou tecido ósseo; 6. avaliação das membranas sinoviais, quando possível.

Resultados

Na avaliação de resultados foram considerados quantidade de fibrose, neoformação óssea e presença de tecido cartilaginoso na superfície condilar.

No grupo pino, sacrificado nove semanas após o implante, encontramos fibrose discreta em quatro animais, fibrose acentuada em dois e nenhum com fibrose moderada.

No grupo controle, sacrificado nove semanas após a criação do defeito osteocondral, encontramos fibrose discreta em dois animais, moderada em dois e acentuada em dois.

No grupo pino, sacrificado após nove semanas do implante, um animal apresentou neoformação óssea e em cinco ela não foi encontrada. Já no grupo controle, a neoformação óssea estava presente em quatro animais, contra ausência em um animal.

Com relação à presença de cartilagem na superfície articular, não foi encontrada em quatro coelhos do grupo controle e estava presente em um caso. Em um dos coelhos foi encontrada uma superfície que não pôde ser definida como tecido cartilaginoso organizado. No grupo pino ocorreu presença de tecido cartilaginoso em quatro casos, enquanto em dois coelhos não foi encontrada cartilagem (tabela 1 e Figura 6 and Figura 7).

Tabela 1-
Coelhos do grupo com nove semanas

Figura 6 -
Lâmina histológica do grupo pino nove semanas com ausência de reaçãoinflamatória e leve fibrose.

Figura 7 -
Lâmina histológica do grupo controle com nove semanas com neoformação óssea, fibrose exuberante e desorganização tecidual.

Um dos animais incluído no grupo sacrificado com 16 semanas apresentou infecção no sítio cirúrgico e foi excluído do trabalho.

Quatro coelhos do grupo pino apresentaram fibrose de grau discreto e um não teve fibrose.

A neoformação óssea ocorreu em quatro coelhos do grupo controle e em um deles ocorreu fragmentação do material, o que inviabilizou a análise correta. Já no grupo pino não foi observada presença de neoformação óssea.

No grupo controle, com 16 semanas ocorreu degeneração de cartilagem em um caso, enquanto naquele com fragmentação do material não foi possível analisar a presença ou não de cartilagem. Em dois coelhos do grupo controle encontramos cartilagem na superfície articular contra um que não a apresentava. No grupo pino, cinco coelhos tinham cartilagem presente, contra um ausente (tabela 2 e Figura 8 and Figura 9).

Tabela 2-
Coelhos do grupo com 16 semanas

Figura 8 -
Lâmina histológica do grupo pino de 16 semanas que mostra discreta fibrose, sem neoformação óssea.

Figura 9 -
Lâmina histológica do grupo controle de 16 semanas que mostra neoformação óssea e fibrose.

Discussão

Dos 12 coelhos estudados, apenas um do grupo sacrificado com nove semanas foi excluído por apresentar infecção local. Portanto, 11 animais fizeram parte deste estudo.

A análise histológica dos implantes de arcabouços de PLDLA-co-TMC/PVA após nove semanas evidenciou que o pino não induz reação inflamatória, tampouco estimula a neoformação óssea. Há estimulo para proliferação fibrosa nas bordas da lesão a partir da cartilagem articular com formação principalmente de fibrocartilagem e tentativa de fechamento da lesão.

No grupo controle após nove semanas há mais fibrose, mais neoformação óssea, seja a partir da cartilagem articular das bordas da lesão como a partir das trabéculas do osso compacto rodeadas de células osteoprogenitoras. Porém, sem evidências de reparo da lesão condral.

Após 16 semanas os côndilos com implantes de hidrogel não evidenciaram reação inflamatória e estavam rodeados por cápsula fibrosa. O osso trabecular ao seu redor tem aspecto conservado e há fechamento da superfície articular com presença de cartilagem hialina ou então cartilagem atrófica de aspecto fibro-hialino.

Nas lesões do grupo controle com 16 semanas houve mais proliferação óssea nas áreas do defeito. No entanto, com cartilagem articular desorganizada, com fibrose evidente, houve atrofia com exposição óssea e proliferação de membrana sinovial.

Com relação à neoformação óssea, no grupo de nove semanas, para nossa surpresa, um dos animais do grupo pino apresentou crescimento de tecido ósseo com padrão fibroso. Já os outros coelhos desse grupo não apresentaram crescimento ósseo, enquanto em todos do grupo controle ocorreu neoformação óssea.

No grupo controle sacrificado com 16 semanas encontrou-se, como esperado, preenchimento ósseo no defeito osteocondral, muito provavelmente devido ao maior tempo decorrido entre a cirurgia e o sacrifício. Entretanto, nos animais do grupo pino não houve crescimento ósseo no defeito. Isso sugere que a presença do pino implantado causou preenchimento de todo o espaço criado pelo defeito.

Conclusão

Os pinos de hidrogel demonstraram superioridade com relação à proteção da superfície cartilaginosa articular, como artefatos de preenchimento dos defeitos osteocondrais. No entanto, não apresentaram qualquer efeito reparador. Por outro lado, no grupo controle, verificou-se degradação da cartilagem tanto no defeito quanto na periferia.

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  • Trabalho desenvolvido no Laboratório de Biomateriais, Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde de Sorocaba, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Sorocaba, SP, Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2017

Histórico

  • Recebido
    14 Jan 2016
  • Aceito
    29 Mar 2016
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