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Observe a distância entre a linha de fratura e o comprimento da área de trabalho: análise bidimensional de elementos finitos em modelo de fixação extramedular Trabalho desenvolvido no Hospital Municipal Miguel Couto, Serviço de Ortopedia e Traumatologia Prof. Nova Monteiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

RESUMO

Objetivo:

Determinar qual é a área de trabalho ideal em uma fratura de traço simples transverso tratada com placa em ponte.

Métodos:

Foi feita uma análise bidimensional de elementos finitos em um fêmur hipotético para avaliação quantitativa de uma placa bloqueada para grandes fragmentos feita de liga de titânio, usada com o princípio de estabilidade relativa em uma fratura diafisária de traço simples e transverso. Foram analisadas duas simulações, uma de deformação e outra de distribuição de tensão, de acordo com a teoria de von Mises, em três situações distintas. Foram observadas as distribuições de carga quando o osso foi submetido a uma carga monotônica vertical de 1.000 N.

Resultados:

Quanto maior o comprimento de flexão do implante, o que coincidiu com a área de trabalho da placa, maior a flexão dele. A maior concentração de tensão na placa foi observada na região dos parafusos mais próximos do defeito ósseo. Quanto mais próximos os parafusos do foco de fratura, maior a demanda sobre a placa.

Conclusão:

Ao usar uma placa bloqueada para grandes fragmentos feita de liga de titânio para estabilizar uma fratura de traço simples e transverso pelo princípio de estabilidade relativa (placa em ponte), a distância entre os parafusos mais próximos do traço de fratura proximal e distalmente deve ser longa. Quanto mais distante essa fixação, menor a concentração de tensão na placa e maior a dissipação de esforços na forma de deflexão.

Palavras-chave:
Análise de elementos finitos; Osteossíntese; Placas ósseas; Regeneração óssea

ABSTRACT

Objective:

To determine the ideal working area for a simple transverse fracture line treated with a bridge plate.

Methods:

A 2-D finite element analysis of a hypothetical femur was performed for the quantitative evaluation of a large-fragment titanium alloy locking plate based on the precept of relative stability in a case of a simple transverse diaphyseal fracture. Two simulations (one case of strain and another case of stress distribution) were analyzed in three unique situations according to the von Mises stress theory. Load distributions were observed when the bone was subjected to a single vertical load of 1000 N.

Results:

The longer the length of the implant flexion, which coincided with the working area of the plate, the greater the flexion of the implant. The highest concentrations of stress on the plate occurred in the region around the screws closest to the bone gap. The closer the screws to the fracture site, the greater the demands on the plate.

Conclusion:

When using a large-fragment titanium alloy locking plate to stabilize a simple transverse fracture based on the precept of relative stability (bridge plate), there must be considerable distance between the proximal and distal screws closest to the fracture line. The farther away this fixation is, the lower the stress on the plate and the greater the dissipation of force in the form of deflection.

Keywords:
Finite element analysis; Osteosynthesis; Bone plates; Bone regeneration

Introdução

No sistema esquelético, o ambiente biomecânico desempenha um papel fundamental na reparação e na remodelação do osso, de modo que possa cumprir suas exigências funcionais.11 Frost HM. The Utah paradigm of skeletal physiology: an overview of its insights for bone, cartilage and collagenous tissue organs. J Bone Miner Metab. 2000;18(6):305-16. Nesse contexto, é crítica a relação entre os fatores físicos e as respostas celulares, de tal maneira que o sucesso do processo de consolidação requer a manutenção de forças apropriadas sobre um osso capaz de responder adequadamente.22 Einhorn TA. The science of fracture healing. J Orthop Trauma. 2005;19 10 Suppl:S4-6. Já há algum tempo é conhecido o conceito da mecanorregulação, que descreve a razão do desvio relativo das bordas de fratura versus a largura do defeito inicial e que determina as características morfológicas do reparo ósseo.33 Perren SM. Physical and biological aspects of fracture healing with special reference to internal fixation. Clin Orthop Rel Res. 1979;(138):175-96. A interpretação e a aplicação corretas desse conceito permitem ao ortopedista escolher o melhor princípio de fixação, facilita decisões terapêuticas importantes, como, por exemplo, o método de redução e o tipo de implante.

Independentemente do princípio de fixação, no que diz respeito à reparação do tecido ósseo, as características mecânicas importantes do produto final são força e rigidez. A cicatrização primária, observada geralmente após redução anatômica do foco de fratura e fixação interna rígida com placa e parafusos - estabilidade absoluta -, assemelha-se à remodelação fisiológica do osso, é um processo lento. Sua indicação é absoluta no manejo de fraturas articulares, embora atualmente seu uso tenha sido abandonado na maioria das fraturas diafisárias. Uma vez que diversos investigadores demonstraram que forças de compressão axiais e cíclicas aplicadas à diáfise dos ossos longos melhora a cicatrização através da formação de um calo cartilaginoso maior e de uma ponte óssea mais precoce, manter e proteger a redução da fratura e permitir um certo grau deformação elástica - estabilidade relativa - parece bastante racional.44 Claes LE, Heigele CA. Magnitudes of local stress and strain along bony surfaces predict the course and type of fracture healing. J Biomech. 1999;32(3):255-66.

5 Hutzschenreuter P, Perren SM, Steinemann S, Geret V, Klebl M. Some effects of rigidity of internal fixation on the healing pattern of osteotomies. Injury. 1969;1(1):77-88.

6 Wolf S, Janousek A, Pfeil J, Veith W, Haas F, Duda G, et al. The effects of external mechanical stimulation on the healing of diaphyseal osteotomies fixed by flexible external fixation. Clin Biomech (Bristol, Avon). 1998;13(4-5):359-64.
-77 Yamaji T, Ando K, Wolf S, Augat P, Claes L. The effect of micromovement on callus formation. J Orthop Sci. 2001;6(6):571-5. A quantidade de formação de tecido ósseo depende dessa tensão interfragmentar.33 Perren SM. Physical and biological aspects of fracture healing with special reference to internal fixation. Clin Orthop Rel Res. 1979;(138):175-96.,55 Hutzschenreuter P, Perren SM, Steinemann S, Geret V, Klebl M. Some effects of rigidity of internal fixation on the healing pattern of osteotomies. Injury. 1969;1(1):77-88.,88 Palomares KT, Gleason RE, Mason ZD, Cullinane DM, Einhorn TA, Gerstenfeld LC, et al. Mechanical stimulation alters tissue differentiation and molecular expression during bone healing. J Orthop Res. 2009;27(9):1123-32.

Mecanicamente, no entanto, comparativamente à osteossíntese com placa de compressão interfragmentar, a fixação extramedular com placa em ponte sofre maiores cargas de flexão e de torção, resulta em altas tensões sobre o implante.99 Nassiri M, MacDonald B, O'Byrne JM. Computational modelling of long bone fractures fixed with locking plates - how can the risk of implant failure be reduced? J Orthop. 2013;10(1):29-37. Assim, prever o desempenho mecânico do dispositivo de fixação torna-se indispensável e depende de vários fatores. Um dos mais importantes é o cálculo do comprimento da área de trabalho durante a fixação da fratura, definida pela distância entre os parafusos mais próximos ao foco da fratura proximal e distalmente.1010 Claes L. Biomechanical principles and mechanobiologic aspects of flexible and locking plating. J Orthop Trauma. 2011;25 1 Suppl:S4-7. Acredita-se que a tensão é mais baixa na placa quando a área de trabalho é pequena.99 Nassiri M, MacDonald B, O'Byrne JM. Computational modelling of long bone fractures fixed with locking plates - how can the risk of implant failure be reduced? J Orthop. 2013;10(1):29-37.

Idealmente, em uma fratura de traço simples transverso, espera-se que a mobilidade interfragmentar seja igualmente dividida entre o implante e o lado oposto do osso, quando uma carga é exercida de forma axial. No entanto, esse tipo de comportamento parece ter sido avaliado somente em condições de estabilidade absoluta, mas não em um modelo de estabilidade relativa. Este estudo foi desenvolvido para examinar os esforços e deformações durante a feitura de uma flexão gradual numa placa bloqueada fixada segundo o princípio de estabilidade relativa em uma fratura de traço simples transverso. Foram idealizadas três situações de colocação dos parafusos, a área de trabalho variou em distância do foco de fratura. O objetivo dos autores é determinar qual é a área de trabalho ideal em uma fratura de traço simples transverso tratada com placa em ponte.

Métodos

Modelo computacional

Foi feita análise de elementos finitos 2 D de um fêmur hipotético para análise quantitativa de uma placa bloqueada usada com o princípio de estabilidade relativa em uma fratura diafisária de traço simples e transverso. O modelo ósseo usado foi virtualmente mapeado de um fêmur por meio de estudo de elemento finito computacional. Com o fêmur mapeado, foram observadas as distribuições de estresse em todo o osso quando submetido a uma carga monotônica vertical de 1000 N (fig. 1).1111 Kreith F. Frontmatter - mechanical engineering handbook. Boca Raton: CRC Press LLC; 1999.

Figura 1
Distribuição de tensão de von Mises (expressas em N/mm2) num modelo de fêmur intacto, mapeado virtualmente por meio de elemento finito computacional.1111 Kreith F. Frontmatter - mechanical engineering handbook. Boca Raton: CRC Press LLC; 1999. Notar que na região subtrocantérica ocorre o esforço máximo registrado, de 16.372 N/mm2.

Caracterização do defeito ósseo (gap) e da placa

Foi idealizado um defeito ósseo (traço de fratura) de 2 mm, que mimetizou um traço simples transverso. A placa usada no estudo foi de grandes fragmentos, reta e com parafusos bloqueados. As propriedades mecânicas das partes metálicas (placa e parafusos) foram adotadas do titânio liga (Ti6Al4 V), conforme ASTM-T136. Nas condições estudadas, a placa reagiu como corpo rígido e único tanto em relação aos parafusos quanto ao osso nas regiões mais afastadas do defeito ósseo. O objetivo foi limitar o estudo ao espaço compreendido entre os dois parafusos mais próximos superior e inferiormente ao traço de fratura - área de trabalho da placa. Na figura 2 pode-se ver a ilustração do desenho do estudo.

Figura 2
Com o objetivo de estudar somente a área de trabalho da placa, foi construído um modelo 2 D em que a placa reagiu como corpo rígido em relação aos parafusos e ao osso em suas regiões mais afastadas. Na imagem mais à esquerda, pode-se ver como foram distribuídos os parafusos nas simulações da área de trabalho. Na imagem logo à esquerda, nota-se o comportamento de corpo rígido da placa-parafusos-osso, fora da região analisada.

Simulações

Foram analisadas duas simulações, uma de deformação e outra de distribuição de tensão, de acordo com a teoria de von Mises, em três situações distintas. A análise de deformação foi feita no fêmur hipotético, o ponto de aplicação de carga foi a cabeça femoral. A análise de tensão de von Mises baseia-se na determinação da energia de distorção associada com mudanças na forma do material testado.

As três situações testadas foram as seguintes:

Situação 1 - a área de trabalho da placa foi pequena, com os parafusos mais distal do fragmento proximal e mais proximal do fragmento distal colocados a 5 mm do traço de fratura. Situação 2 - a área de trabalho da placa foi intermediária, com os parafusos mais distal do fragmento proximal e mais proximal do fragmento distal colocados a 25 mm do traço de fratura. Situação 3 - a área de trabalho da placa foi grande, com os parafusos mais distal do fragmento proximal e mais proximal do fragmento distal colocados a 45 mm do traço de fratura.

Resultados

Deformação

Para o cálculo de deflexão da placa foi desprezado o defeito ósseo (traço de fratura), com a finalidade de analisar exclusivamente a livre deformação do implante extramedular. Todos os cálculos apresentados comportaram-se de forma linear.

Os valores máximos de deformação lidos no ponto superior da cabeça do fêmur (ponto de aplicação de carga) variaram de 0,49 mm na Situação 1 até 2,74 mm na Situação 3. Isso significa que quanto maior o comprimento fictício de flexão do implante, o que coincidiu com a área de trabalho da placa, maior a flexão dele. A simulação de deformação encontra-se na figura 3.

Figura 3
Simulação de deformação - foi aplicada uma carga de 1000 N na cabeça femoral e a quantidade de flexão na placa foi observada. Quanto maior o comprimento fictício de flexão da placa, maior a flexão dela.

Tensão

Os valores máximos de tensão de von Mises não apresentaram variações maiores do que 10%. A maior concentração de tensão na placa ocorreu na região dos parafusos mais próximos do defeito ósseo. Quanto mais próximos os parafusos do foco de fratura, maior foi a solicitação na placa. A simulação de tensão encontra-se na figura 4.

Figura 4
Simulação de tensão - a maior concentração de tensão na placa ocorreu nos parafusos mais próximos do defeito ósseo, de modo constante e similar em tensão. Notar que à medida que a área de trabalho aumentou, a tensão sobre a placa na região sem parafusos se reduziu - tensão de von Mises máxima de 483,72 N/mm2 para a Situação 1, 485,66 N/mm2 para a Situação 2 e 441,81 N/mm2 para a Situação 3. Quanto mais próximos os parafusos do foco de fratura, maior foi a solicitação na placa.

Discussão

O uso de ensaios mecânicos de ossos longos fraturados e com dispositivos de fixação aplicados é uma boa oportunidade para testar experimentalmente as propriedades estruturais da construção osso-fixação. O sucesso do tratamento das fraturas depende da rápida regeneração óssea, o que requer a apropriada manutenção das forças atuantes sobre o osso. Como regra, as forças básicas de compressão, cisalhamento, torção e flexão produzem comportamentos previsíveis no osso, são ideias para experimentos que visem a observar a rigidez de uma fixação, por exemplo.1212 Tencer AF. Biomechanics of fracture and fracture fixation. In: Bucholz RW, Heckman JD, Court- Brown CM, Tornetta P, editors. Rockwood & Green fractures in adults. 7th ed. Lippincott Williams & Wilkins; 2010. p. 2710. A aplicabilidade e a relevância desses experimentos visa a aperfeiçoar a fixação da fratura, minimizar transtornos biomecânicos que possam interferir negativamente com o processo de consolidação.

No presente estudo, foi feita análise de elementos finitos 2 D em um modelo hipotético do fêmur, com o objetivo de determinar qual a área de trabalho ideal em uma situação de fratura de traço simples transverso tratada com placa em ponte. O fêmur foi submetido a uma carga monotônica vertical de 1000 N, que simulou a força de compressão sofrida por esse osso durante o apoio monopodal de um indivíduo 96kg. Foi criado um defeito de 2 mm que simulou um traço de fratura simples e transverso, de modo que a razão de deformação percentual esperada fosse elevada.33 Perren SM. Physical and biological aspects of fracture healing with special reference to internal fixation. Clin Orthop Rel Res. 1979;(138):175-96. Outros estudos usaram e validaram o mesmo tamanho de defeito para estudar a resistência dos implantes usados para a fixação óssea.33 Perren SM. Physical and biological aspects of fracture healing with special reference to internal fixation. Clin Orthop Rel Res. 1979;(138):175-96.,1313 Aro HT, Wahner HT, Chao EYS. Healing patterns of transverse and oblique osteotomies in the canine tibia under external fixation. J Orthop Trauma. 1991;5(3):351-64.,1414 Cheal EJ, Mansmann KA, DiGioia AM 3rd, Hayes WC, Perren SM. Role of interfragmentary strain in fracture healing: ovine model of a healing osteotomy. J Orthop Res. 1991;9(1): 131-42. O implante usado no modelo experimental foi uma placa bloqueada de grandes fragmentos em titânio liga, de acordo com o princípio de estabilidade relativa (placa em ponte). Estudos têm mostrado a maior vantagem dos implantes de titânio sobre os de aço inoxidável, principalmente com relação a seu menor módulo de elasticidade - praticamente a metade do aço inoxidável, o que reduz a rigidez da fixação e permite suficiente deformação interfragmentar sob a placa.99 Nassiri M, MacDonald B, O'Byrne JM. Computational modelling of long bone fractures fixed with locking plates - how can the risk of implant failure be reduced? J Orthop. 2013;10(1):29-37.,1515 Panagiotopoulos E, Fortis AP, Lambiris E, Kostopoulos V. Rigid or sliding plate. A mechanical evaluation of osteotomy fixation in sheep. Clin Orthop Relat Res. 1999;(358):244-9.

Observou-se que quanto mais próximos os parafusos do traço de fratura (menor área de trabalho), maior a concentração de tensões na placa e menor a dissipação de esforços na forma de deflexão. Isso gera condições propícias à ocorrência de fadiga pelo alto ciclo visto nos implantes metálicos. Ao contrário, quanto maior a área de trabalho (mais distantes os parafusos do traço de fratura), menor a concentração de tensões na placa e maior a dissipação de esforços em forma de deflexão, o que melhora as condições de durabilidade do implante e minimiza o fenômeno de fadiga.1616 Chen G, Schmutz B, Wullschleger M, Pearcy MJ, Schuetz MA. Computational investigations of mechanical failures of internal plate fixation. Proc Inst Mech Eng H. 2010;224(1):119-26. Essa observação, embora empiricamente já seguida por muitos, até onde vai nosso conhecimento, não havia sido demonstrada com o modelo de análise de elementos finitos.

Sob o aspecto biomecânico, existem grandes diferenças entre a osteossíntese extramedular com placa de um defeito pequeno fixado pelo princípio de estabilidade absoluta e de estabilidade relativa. Enquanto na primeira acredita-se que a tensão seja mais baixa na placa quando a área de trabalho é pequena, agora se pode afirmar que na segunda o ideal é que a área de trabalho seja grande. Assim, quanto maior a capacidade elástica de deformação da placa em ponte, menor seu risco de quebra ou fadiga.1717 Black J. Orthopaedic biomaterials in research and practice. New York: Cuhrchill Livingstone; 1988. Com modelos artificiais de fêmur, Hoffmeier et al.1818 Hoffmeier KL, Hofmann GO, Mückley T. Choosing a proper working length can improve the lifespan of locked plates. A biomechanical study. Clin Biomech. 2011;26(4):405-9. e Kanchanomai et al.1919 Kanchanomai C, Muanjan P, Phiphobmongkol V. Stiffness and endurance of a locking compression plate fixed on fractured femur. J Appl Biomech. 2010;26(1):10-6. observaram redução na tensão superficial de placas bloqueadas em aço inoxidável e em titânio quanto maior a área de trabalho do implante. Isso mostra que comportamento de fadiga dependente, dentre outros fatores relacionados à técnica de osteossíntese, da área de trabalho.

Limitações do estudo

Uma limitação da presente investigação foi o uso de um modelo 2 D, e não 3 D, já que o último é considerado o ideal na análise de elementos finitos. Muito embora tenha sido possível determinar qual a área de trabalho ideal em uma fratura de traço simples transverso tratada com placa em ponte, não foi possível quantificá-la em valores reais ou percentuais. Como nitidamente observou-se um compromisso entre os dois fenômenos avaliados, deformação (E) e tensão (T), pode-se inferir que a área de trabalho deve ser grande quando o traço é simples e a deformação percentual é alta. Acreditamos que o ponto de encontro entre a menor tensão de von Mises e a maior deformação na placa irá representar numericamente a distância ideal entre os parafusos mais próximos do traço de fratura proximal e distalmente. Novos estudos devem ser feitos para desenvolver a análise de elementos finitos 3 D, multicorpos, em modelo real de fêmur para quantificar de forma exata a distância entre os parafusos mais próximos do traço de fratura proximal e distalmente (área de trabalho) nas condições do estudo atual.

Outra limitação do estudo foi a feitura de esforços em único plano. Seguimos o conceito original da mecanorregulação, que considerou somente a deformação percentual longitudinal, ao longo do eixo mecânico do osso.33 Perren SM. Physical and biological aspects of fracture healing with special reference to internal fixation. Clin Orthop Rel Res. 1979;(138):175-96. Aro et al.2020 Aro HT, Kelly PJ, Lewallen DG, Chao EYS. The effects of physiologic dynamic compression on bone healing under external fixation. Clin Orthop Rel Res. 1990;(256): 260-73. demonstraram que dinamizações axiais passiva e ativa com fixador externo em fraturas estáveis (defeito pequeno) e instáveis (defeito grande) produzem aumento na quantidade e melhor distribuição do calo periosteal, unem os fragmentos ósseos principais. Outros investigadores demonstraram que forças de compressão axiais e cíclicas aplicadas à diáfise dos ossos longos melhora a cicatrização através da formação de um calo cartilaginoso maior e de uma ponte óssea mais precoce.44 Claes LE, Heigele CA. Magnitudes of local stress and strain along bony surfaces predict the course and type of fracture healing. J Biomech. 1999;32(3):255-66.

5 Hutzschenreuter P, Perren SM, Steinemann S, Geret V, Klebl M. Some effects of rigidity of internal fixation on the healing pattern of osteotomies. Injury. 1969;1(1):77-88.

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-77 Yamaji T, Ando K, Wolf S, Augat P, Claes L. The effect of micromovement on callus formation. J Orthop Sci. 2001;6(6):571-5. Análises tridimensionais, entretanto, revelaram a existência de uma complexa e multidirecional deformação no foco de fratura.1414 Cheal EJ, Mansmann KA, DiGioia AM 3rd, Hayes WC, Perren SM. Role of interfragmentary strain in fracture healing: ovine model of a healing osteotomy. J Orthop Res. 1991;9(1): 131-42. Futuros estudos que associem os esforços em outros planos podem auxiliar na definição de um sistema de estado triplo de tensões para avaliações de diversas osteossínteses.

Finalmente, no presente estudo não foram avaliados outros fatores relacionados à qualidade da osteossíntese, tais como geometria, condições de modelagem e de modelos de materiais e propriedades dos implantes.1818 Hoffmeier KL, Hofmann GO, Mückley T. Choosing a proper working length can improve the lifespan of locked plates. A biomechanical study. Clin Biomech. 2011;26(4):405-9.,2121 Chao P, Conrad BP, Lewis DD, Horodyski M, Pozzi A. Effect of plate working length on plate stiffness and cyclic fatigue life in a cadaveric femoral fracture gap model stabilized with a 12-hole 2.4 mm locking compression plate. BMC Vet Res. 2013;24(9):125.,2222 Lin AS, Fechter CM, Magill M, Wipf F, Moore T, Guldberg RE. The effect of contouring on fatigue resistance of three types of fracture fixation plates. J Orthop Surg Res. 2016; 11(1):107. Sabe-se hoje, por exemplo, que a resistência dos implantes depende mais do material de que são fabricados do que da área de trabalho determinada pelo cirurgião.1818 Hoffmeier KL, Hofmann GO, Mückley T. Choosing a proper working length can improve the lifespan of locked plates. A biomechanical study. Clin Biomech. 2011;26(4):405-9.,2121 Chao P, Conrad BP, Lewis DD, Horodyski M, Pozzi A. Effect of plate working length on plate stiffness and cyclic fatigue life in a cadaveric femoral fracture gap model stabilized with a 12-hole 2.4 mm locking compression plate. BMC Vet Res. 2013;24(9):125. Embora não perfeitamente esclarecido, foi mostrado que em placas em aço inoxidável a área de trabalho não tem efeito significativo sobre a resistência e a rigidez da construção, são mais duráveis do que as de titânio. Por esse motivo, Hoffmeier et al.1818 Hoffmeier KL, Hofmann GO, Mückley T. Choosing a proper working length can improve the lifespan of locked plates. A biomechanical study. Clin Biomech. 2011;26(4):405-9. sugerem o uso de placas em aço inoxidável para o tratamento de fraturas instáveis, especialmente se for esperado algum grau de retarde na cicatrização. Em nosso experimento, entretanto, o modelo computacional usado simulou as condições mecânicas de uma placa bloqueada em titânio liga (Ti6Al4 V) empregada para a fixação de um defeito ósseo pequeno (2 mm), não caracterizou uma situação de instabilidade. Assim, mesmo se soubermos que nas placas em titânio quanto maior a área de trabalho, menor a rigidez da construção, nossos achados nos permitiram concluir que, nas condições estudadas, uma área de trabalho maior produz menos concentração de tensão na placa, o que pode aumentar notavelmente a vida útil do implante.

Conclusão

Ao usar uma placa bloqueada de grandes fragmentos em titânio liga para estabilizar uma fratura de traço simples e transverso pelo princípio de estabilidade relativa (placa em ponte), a distância entre os parafusos mais próximos do traço de fratura proximal e distalmente deve ser longa. Quanto mais distante essa fixação, menor a concentração de tensão na placa e maior a dissipação de esforços na forma de deflexão.

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  • Trabalho desenvolvido no Hospital Municipal Miguel Couto, Serviço de Ortopedia e Traumatologia Prof. Nova Monteiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2018

Histórico

  • Recebido
    28 Nov 2016
  • Aceito
    09 Jan 2017
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